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TEORIA DA CONSTITUIÇÃO

Professor Luiz A. Gonçalves


E-mail: luizalcionegoncalves@gmail.com

CONSTITUCIONALISMO

O Constitucionalismo nasceu da ideia de se ter um documento jurídico.

CONCEITO - O constitucionalismo é um movimento histórico, político e filosófico que defende a


limitação do poder do Estado por um instrumento geralmente escrito, chamado de Constituição.

ORIGENS:
Há várias correntes que divergem, sobre quando teria se manifestado pela primeira vez a
limitação do poder do Estado por meio de uma Constituição.
A doutrina tradicional defende que o fenômeno constitucional surgiu com o advento da Magna
Charta Libertatum, assinada pelo rei João Sem-Terra (Inglaterra, 1215). Trata-se, como veremos de um
documento que foi imposto ao Rei pelos barões feudais ingleses.
Já Carl Schmitt defende que a Magna Charta não pode ser considerada a primeira Constituição,
pois não era direcionada para todos, mas apenas para a elite formada por barões feudais. Dessa forma, a
primeira Constituição propriamente dita seria o Bill of Rights (Inglaterra, 1688/1689) que previa direitos
para todos os cidadãos, e não apenas uma classe deles.

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Por outro lado, Karl Loewenstain considera que a primeira Constituição teria surgido ainda na
sociedade hebraica, com a instituição da “Lei de Deus” (Torah). O autor alemão aponta que, já naquele
Estado Teocrático, a “Lei de Deus” limitava o poder dos governantes (chamados, naquela época, de
Juízes), assegurando aos projetos a legitimidade para fiscalizar os atos governantes que extrapolassem os
limites públicos.
Por fim, é de se apontar que, para a doutrina positivista, a primeira Constituição escrita, e com
essa denominação, seria a Constituição Americana, de 1787.
Mas a dúvida sobre qual foi a primeira constituição não é tão importante. O que interessa é saber
que a luta por direitos não é uma luta nova, é uma luta que nasce do próprio desejo do ser humano de
limitar o poder do Estado.
Dessa forma é preciso que entendamos o desenvolver histórico do constitucionalismo para que
nós então podemos ter uma noção de como ele surgiu.

CONSTITUCIONALISMO NA ATIGUIDADE – Tinha em mente que o povo não deveria ter um


documento acima das autoridades do Estado. Os hebreus já possuíam um “Estado” teocrático (poder
religioso) limitado pela Torah (Judeus) (Lei de Deus)

CONSTITUCIONALISMO MEDIEVAL – Vivíamos em um outro modelo de sociedade: Império,


Reinado, etc. Não caberia essa idéia revolucionária de submeter os reis e seus ministros a um documento
formal. A uma lei fundamental. A uma carta magna.
Por exemplo o Rei Luiz XIV reunia os seus súditos e dizia: O Estado sou eu. Com isso ele estava
dizendo que tudo no Estado dependia da figura do Rei. Ele só estava verbalizando aquilo que era comum
no continente velho, ou seja, na Europa.
A história do constitucionalismo medieval é, basicamente a história do movimento constitucional
na Inglaterra. No século XIII temos um documento expedido pelo Rei João Sem Terra em 1215, onde ele
reconheceu uma série de direitos ao povo inglês, chamado de MAGNA CHARTA. Para muitos a Magna
Charta, assinada pelo rei João Sem-Terra (Inglaterra, 1215) não pode ser considerado a primeira
Constituição, pois não era direcionada para todos, mas apenas para a elite formada por barões feudais.

IDADE MODERNA – Após a Magna Carta inglesa, o constitucionalismo deslancha em direção à


modernidade, ganhando novos contornos. A partir daí são elaborados importantes documentos,
destacando-se: o Petition of Rights, de 1628; o Habeas Corpus Act, de 1679; o Bill of Rights, de 1689; e o

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Act of Sttlement, de 1701. Pactos voltados para a proteção dos direitos individuais. Foram documentos
marcantes, porém direcionados a determinados homens e não sob a perspectiva da universalidade.
a) Revolução Gloriosa (Bill of Rights) – declaração de direitos (1688 entrando em vigor
em 1689) – Após a Revolução Gloriosa, passou a vigorar definitivamente na Inglaterra o regime
parlamentar, tal como hoje nós conhecemos: com a figura do Rei como mero Chefe de Estado, cabendo
a Chefia de Governo ao Primeiro-Ministro.
O Bill of Rights foi um documento que sacramentou a perda do poder absoluto do Rei, que passou
a dividir a tarefa de governar com o Parlamento. Na prática, instalou-se a partir daí a supremacia do
Parlamento.
b) Pacto de Mayflower (flor de maio) (1620) – Foi um pacto firmado entre os futuros
colonizadores dos EUA (saíram da Inglaterra), ainda abordo do navio que os levaria à Terra Nova, no qual
se reconheceram vários direitos básicos dos cidadãos.
c) Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia e Independência das 13 Colônias (1776) –
Com a independência declarada em 1776, as 13 colônias inglesas na América se declararam
independentes e passaram a formar, primeiramente, uma Confederação e (não abandonaram a sua
soberania), depois, uma Federação (Estrados Unidos da América)
Nesse contexto, as declarações de direitos proliferaram, garantindo aos cidadãos determinadas
prerrogativas básicas, o que desaguaria nas várias emendas realizadas à Constituição americana de 1787.

CONSTITUCIONALISMO MODERNO –Aqui a Constituição passa a ser considerada como uma


norma jurídica suprema, principalmente a partir das revoluções ocorridas nos EUA, França e Inglaterra (as
chamadas revoluções liberais, que visavam a instaurar um Estado de Direito (= Estado de poderes
limitados) em substituição ao Estado Absolutista que até então existia.
Dois são os marcos históricos e formais do constitucionalismo moderno:
a) Constituição Federal dos Estados Unidos da América (1787) – (sete artigos e 27 EC) É
considerada a primeira Constituição escrita da humanidade. Ressalte-se que essa Carta não possuía,
originalmente, qualquer declaração de direitos, que só foram incluídas com as sucessivas emendas que
lhe foram acrescidas (principalmente a Quinta emenda).
Não obstante, foi a primeira Constituição escrita da humanidade, o que significa um marco
histórico na defesa de direito básicos dos cidadãos.

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b) Revolução francesa (1789) e Constituições escritas (1791 e seguintes) – A Revolução francesa


representa a derrocada final do Absolutismo (em que o Rei tinha poder absoluto), justamente no país em
que tal fenômeno foi mais presente.
Embora, em termos cronológicos, a Revolução francesa tenha sido a última das três grandes
revoluções liberais (foi precedida pela Revolução Gloriosa, na Inglaterra, e pela Independência americana,
de 1776), teve uma importância histórica muito grande, pois “popularizou” a defesa dos direitos dos
cidadãos, como demonstra a declaração de 1791 (Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão).

CONSTITUCIONALISMO CONTEMPORÂNEO – Os textos das constituições sedimentam um


importante conteúdo social, estabelecendo normas programáticas (notas a serem atingidas pelo Estado,
programas de governo) e realçando o sentido de Constituição dirigente. A partir de 1789 consolidamos a
idéia de um documento formal e escrito que garantisse os direitos, os deveres e a organização do Estado.
Constitucionalismo é a teoria que ergue o princípio do governo limitado. A constituição vai limitar
os poderes do Estado que antes eram poderes absolutos. Mas ainda indispensável à garantia dos direitos
sociais, dos direitos em dimensões estruturantes e da organização dos direitos políticos do Estado.
Nesse sentido constitucionalismo representa uma técnica específica de limitação do poder do
Estado através de três limites:
a) Garantias do Direito – Através de definição de uma pauta de direitos do ser humano;
b) Separação dos Poderes - Separação das funções legiferenda, judicante e administrativa)
c) Estrutura Estatal – Forma legítima de aquisição e exercício do poder político.

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NEOCONSTITUCIONALISMO

A doutrina passa a desenvolver, a partir do século XXI, uma nova perspectiva em relação ao
constitucionalismo, denominada neoconstitucionalismo, ou, segundo alguns, constitucionalismo pós-
moderno, ou ainda, pós-positivismo.
Busca-se dentro dessa nova realidade, não mais atrelar o constitucionalismo à idéia de limitação
do poder político, mas, acima de tudo, buscar a eficácia da Constituição, deixando o texto de ter um
caráter meramente retórico e passando a ser mais efetivo, especialmente diante da expectativa de
concretização dos direitos fundamentais.
Nas palavras de Weber de Moura Agra, o constitucionalismo tem como uma de suas marcas a
concretização das prestações materiais prometidas pela sociedade, servindo como ferramenta para a
implementação de um Estado Democrático Social de direito. Ele pode ser considerado como um
movimento caudatório do pós-modernismo. Dentre suas principais características podem ser
mencionadas:
a) Onipresença dos princípios e regras;
b) Inovações hermenêuticas;
c) Densificação da força normativa do Estado;
d) Desenvolvimento da justiça distributiva.

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OBS: O caráter ideológico do constitucionalismo moderno era apenas o de limitar o poder, o


caráter ideológico do neoconstitucionalismo é o de concretizar os direitos fundamentais.
O Neoconstitucionalismo também é dotado de uma carga axiológica (valorativa). Esses valores
se pautam sobre a dignidade da pessoa humana e pela proteção dos direitos fundamentais que visa dar
concretude a esse princípio.

CONSTITUCIONALISMO MODERNO NEOCONSTITUCIONALISMO


Hierarquia entre as normas Hierarquia entre normas não apenas formal, mas
axiológica (valor)
Limitação do Poder Concretização dos direitos fundamentais

PONTOS MARCANTES DO NEOCONSTITUCIONALISMO:


Centralidade da Constituição (diploma mais importante do sistema jurídico)
Constituição como norma imperativa e superior – Tudo deve ser interpretado a partir da
Constituição.
Carga valorativa da Constituição: Dignidade Humana e Direita Fundamentais
Concretização dos valores constitucionais – Visa efetividade às suas normas
Eficácia irradiante frente ao Estado e aos particulares – Eficácia irradiante deve ser responsável
pelo Estado e pela sociedade.
Garantia de condições materiais e direitos sociais mínimos–O mínimo ético como garantia da
dignidade da pessoa humana.

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Nos três tópicos que se seguem, empreende-se o esforço de reconstituir, de maneira objetiva, a
trajetória percorrida pelo direito constitucional nas últimas décadas, na Europa e no Brasil, levando em
conta três marcos fundamentais: o histórico, o teórico e o filosófico. Neles estão contidas as idéias e as
mudanças de paradigma que mobilizaram a doutrina e a jurisprudência nesse período, criando uma nova
percepção da Constituição e de seu papel na interpretação jurídica em geral.

I. Marco histórico
O marco histórico do novo direito constitucional, na Europa continental, foi
o constitucionalismo do pós-guerra, especialmente na Alemanha e na Itália. No Brasil, foi a Constituição
de 1988 e o processo de redemocratização que ela ajudou a protagonizar. A seguir, breve exposição sobre
cada um desses processos.
A reconstitucionalização da Europa, imediatamente após a 2ª. Grande Guerra e ao longo da
segunda metade do século XX, redefiniu o lugar da Constituição e a influência do direito constitucional
sobre as instituições contemporâneas. A aproximação das idéias de constitucionalismo e de democracia
produziu uma nova forma de organização política, que atende por nomes diversos: Estado democrático
de direito, Estado constitucional de direito, Estado constitucional democrático. Seria mau investimento
de tempo e energia especular sobre sutilezas semânticas na matéria.
A principal referência no desenvolvimento do novo direito constitucional é a Lei Fundamental de
Bonn (Constituição alemã, de 1949, e, especialmente, a criação do Tribunal Constitucional Federal,
instalado em 1951. A partir daí teve início uma fecunda produção teórica e jurisprudencial, responsável
pela ascensão científica do direito constitucional no âmbito dos países de tradição romano-germânica. A
segunda referência de destaque é a da Constituição da Itália, de 1947, e a subseqüente instalação da Corte
Constitucional, em 1956. Ao longo da década de 70, a redemocratização e a reconstitucionalização de
Portugal (1976) e da Espanha (1978) agregaram valor e volume ao debate sobre o novo direito
constitucional.
No caso brasileiro, o renascimento do direito constitucional se deu, igualmente, no ambiente de
reconstitucionalização do país, por ocasião da discussão prévia, convocação, elaboração e promulgação
da Constituição de 1988. Sem embargo de vicissitudes de maior ou menor gravidade no seu texto, e da
compulsão com que tem sido emendada ao longo dos anos, a Constituição foi capaz de promover, de
maneira bem sucedida, a travessia do Estado brasileiro de um regime autoritário, intolerante e, por vezes,
violento para um Estado democrático de direito.

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Mais que isso: a Carta de 1988 tem propiciado o mais longo período de estabilidade institucional
da história republicana do país. E não foram tempos banais. Ao longo da sua vigência, destituiu-se
por impeachment um Presidente da República, houve um grave escândalo envolvendo a Comissão de
Orçamento da Câmara dos Deputados, foram afastados Senadores importantes no esquema de poder da
República, foi eleito um Presidente de oposição e do Partido dos Trabalhadores, surgiram denúncias
estridentes envolvendo esquemas de financiamento eleitoral e de vantagens para parlamentares, em
meio a outros episódios. Em nenhum desses eventos houve a cogitação de qualquer solução que não
fosse o respeito à legalidade constitucional. Nessa matéria, percorremos em pouco tempo todos os ciclos
do atraso.
Sob a Constituição de 1988, o direito constitucional no Brasil passou da desimportância ao
apogeu em menos de uma geração. Uma Constituição não é só técnica. Tem de haver, por trás dela, a
capacidade de simbolizar conquistas e de mobilizar o imaginário das pessoas para novos avanços. O
surgimento de um sentimento constitucional no País é algo que merece ser celebrado. Trata-se de um
sentimento ainda tímido, mas real e sincero, de maior respeito pela Lei Maior, a despeito da volubilidade
de seu texto. É um grande progresso. Superamos a crônica indiferença que, historicamente, se manteve
em relação à Constituição. E, para os que sabem, é a indiferença, não o ódio, o contrário do amor.

II. Marco filosófico


O marco filosófico do novo direito constitucional é o pós-positivismo. O debate acerca de sua
caracterização situa-se na confluência das duas grandes correntes de pensamento que oferecem
paradigmas opostos para o Direito: o jusnaturalismo e o positivismo. Opostos, mas, por vezes,
singularmente complementares. A quadra atual é assinalada pela superação – ou, talvez, sublimação –
dos modelos puros por um conjunto difuso e abrangente de idéias, agrupadas sob o rótulo genérico de
pós-positivismo.
O jusnaturalismo moderno, desenvolvido a partir do século XVI, aproximou a lei da razão e
transformou-se na filosofia natural do Direito. Fundado na crença em princípios de justiça universalmente
válidos, foi o combustível das revoluções liberais e chegou ao apogeu com as Constituições escritas e as
codificações. Considerado metafísico e anti-científico, o direito natural foi empurrado para a margem da
história pela ascensão do positivismo jurídico, no final do século XIX. Em busca de objetividade científica,
o positivismo equiparou o Direito à lei, afastou-o da filosofia e de discussões como legitimidade e justiça
e dominou o pensamento jurídico da primeira metade do século XX. Sua decadência é emblematicamente

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associada à derrota do fascismo na Itália e do nazismo na Alemanha, regimes que promoveram a barbárie
sob a proteção da legalidade. Ao fim da 2ª. Guerra, a ética e os valores começam a retornar ao Direito.
A superação histórica do jusnaturalismo e o fracasso político do positivismo abriram caminho
para um conjunto amplo e ainda inacabado de reflexões acerca do Direito, sua função social e sua
interpretação. O pós-positivismo busca ir além da legalidade estrita, mas não despreza o direito posto;
procura empreender uma leitura moral do Direito, mas sem recorrer a categorias metafísicas. A
interpretação e aplicação do ordenamento jurídico hão de ser inspiradas por uma teoria de justiça, mas
não podem comportar voluntarismos ou personalismos, sobretudo os judiciais. No conjunto de idéias
ricas e heterogêneas que procuram abrigo neste paradigma em construção incluem-se a atribuição de
normatividade aos princípios e a definição de suas relações com valores e regras; a reabilitação da razão
prática e da argumentação jurídica; a formação de uma nova hermenêutica constitucional; e o
desenvolvimento de uma teoria dos direitos fundamentais edificada sobre o fundamento da dignidade
humana. Nesse ambiente, promove-se uma reaproximação entre o Direito e a filosofia.

III. Marco teórico


No plano teórico, três grandes transformações subverteram o conhecimento convencional
relativamente à aplicação do direito constitucional: a) o reconhecimento de força normativa à
Constituição; b) a expansão da jurisdição constitucional; c) o desenvolvimento de uma nova dogmática da
interpretação constitucional. A seguir, a análise sucinta de cada uma delas.

1. A força normativa da Constituição


Uma das grandes mudanças de paradigma ocorridas ao longo do século XX foi a atribuição à
norma constitucional do status de norma jurídica. Superou-se, assim, o modelo que vigorou na Europa
até meados do século passado, no qual a Constituição era vista como um documento essencialmente
político, um convite à atuação dos Poderes Públicos. A concretização de suas propostas ficava
invariavelmente condicionada à liberdade de conformação do legislador ou à discricionariedade do
administrador. Ao Judiciário não se reconhecia qualquer papel relevante na realização do conteúdo da
Constituição.
Com a reconstitucionalização que sobreveio à 2ª. Guerra Mundial, este quadro começou a ser
alterado. Inicialmente na Alemanha e, com maior retardo, na Itália. E, bem mais à frente, em Portugal e
na Espanha. Atualmente, passou a ser premissa do estudo da Constituição o reconhecimento de sua força
normativa, do caráter vinculativo e obrigatório de suas disposições. Vale dizer: as normas constitucionais

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são dotadas de imperatividade, que é atributo de todas as normas jurídicas, e sua inobservância há de
deflagrar os mecanismos próprios de coação, de cumprimento forçado. A propósito, cabe registrar que o
desenvolvimento doutrinário e jurisprudencial na matéria não eliminou as tensões inevitáveis que se
formam entre as pretensões de normatividade do constituinte, de um lado, e, de outro lado, as
circunstâncias da realidade fática e as eventuais resistências do status quo.
O debate acerca da força normativa da Constituição só chegou ao Brasil, de maneira consistente,
ao longo da década de 80, tendo enfrentado as resistências previsíveis. Além das complexidades inerentes
à concretização de qualquer ordem jurídica, padecia o país de patologias crônicas, ligadas ao
autoritarismo e à insinceridade constitucional. Não é surpresa, portanto, que as Constituições tivessem
sido, até então, repositórios de promessas vagas e de exortações ao legislador infraconstitucional, sem
aplicabilidade direta e imediata. Coube à Constituição de 1988, bem como à doutrina e à jurisprudência
que se produziram a partir de sua promulgação, o mérito elevado de romper com a posição mais
retrógrada.

2. A nova interpretação constitucional


A interpretação constitucional é uma modalidade de interpretação jurídica. Tal circunstância é
uma decorrência natural da força normativa da Constituição, isto é, do reconhecimento de que as normas
constitucionais são normas jurídicas, compartilhando de seus atributos. Porque assim é, aplicam-se à
interpretação constitucional os elementos tradicionais de interpretação do Direito, de longa data
definidos como o gramatical, o histórico, o sistemático e o teleológico. Cabe anotar, neste passo, para
adiante voltar-se ao tema, que os critérios tradicionais de solução de eventuais conflitos normativos são
o hierárquico (lei superior prevalece sobre a inferior), o temporal (lei posterior prevalece sobre a anterior)
e o especial (lei especial prevalece sobre a geral).
Sem prejuízo do que se vem de afirmar, o fato é que as especificidades das normas
constitucionais (v.supra) levaram a doutrina e a jurisprudência, já de muitos anos, a desenvolver ou
sistematizar um elenco próprio de princípios aplicáveis à interpretação constitucional. Tais princípios, de
natureza instrumental, e não material, são pressupostos lógicos, metodológicos ou finalísticos da
aplicação das normas constitucionais. São eles, na ordenação que se afigura mais adequada para as
circunstâncias brasileiras: o da supremacia da Constituição, o da presunção de constitucionalidade das
normas e atos do Poder Público, o da interpretação conforme a Constituição, o da unidade, o da
razoabilidade e o da efetividade.

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Antes de prosseguir, cumpre fazer uma advertência: a interpretação jurídica tradicional não está
derrotada ou superada como um todo. Pelo contrário, é no seu âmbito que continua a ser resolvida boa
parte das questões jurídicas, provavelmente a maioria delas. Sucede, todavia, que os operadores jurídicos
e os teóricos do Direito se deram conta, nos últimos tempos, de uma situação de carência: as categorias
tradicionais da interpretação jurídica não são inteiramente ajustadas para a solução de um conjunto de
problemas ligados à realização da vontade constitucional. A partir daí deflagrou-se o processo de
elaboração doutrinária de novos conceitos e categorias, agrupados sob a denominação de nova
interpretação constitucional, que se utiliza de um arsenal teórico diversificado, em um verdadeiro
sincretismo metodológico. Procede-se, a seguir, a uma breve comparação entre os dois modelos.
A interpretação jurídica tradicional desenvolveu-se sobre duas grandes premissas: (i) quanto
ao papel da norma, cabe a ela oferecer, no seu relato abstrato, a solução para os problemas jurídicos; (ii)
quanto ao papel do juiz, cabe a ele identificar, no ordenamento jurídico, a norma aplicável ao problema
a ser resolvido, revelando a solução nela contida. Vale dizer: a resposta para os problemas está
integralmente no sistema jurídico e o intérprete desempenha uma função técnica de conhecimento, de
formulação de juízos de fato. No modelo convencional, as normas são percebidas como regras,
enunciados descritivos de condutas a serem seguidas, aplicáveis mediante subsunção.
Com o avanço do direito constitucional, as premissas ideológicas sobre as quais se erigiu o
sistema de interpretação tradicional deixaram de ser integralmente satisfatórias. Assim: (i) quanto
ao papel da norma, verificou-se que a solução dos problemas jurídicos nem sempre se encontra no relato
abstrato do texto normativo. Muitas vezes só é possível produzir a resposta constitucionalmente
adequada à luz do problema, dos fatos relevantes, analisados topicamente; (ii) quanto ao papel do juiz, já
não lhe caberá apenas uma função de conhecimento técnico, voltado para revelar a solução contida no
enunciado normativo. O intérprete torna-se co-participante do processo de criação do Direito,
completando o trabalho do legislador, ao fazer valorações de sentido para as cláusulas abertas e ao
realizar escolhas entre soluções possíveis.
Estas transformações noticiadas acima, tanto em relação à norma quanto ao intérprete, são
ilustradas de maneira eloqüente pelas diferentes categorias com as quais trabalha a nova interpretação.
Dentre elas incluem-se as cláusulas gerais, os princípios, as colisões de normas constitucionais, a
ponderação e a argumentação. Abaixo uma breve nota sobre cada uma delas.
As denominadas cláusulas gerais ou conceitos jurídicos indeterminados contêm termos ou
expressões de textura aberta, dotados de plasticidade, que fornecem um início de significação a ser
complementado pelo intérprete, levando em conta as circunstâncias do caso concreto. A norma em

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abstrato não contém integralmente os elementos de sua aplicação. Ao lidar com locuções como ordem
pública, interesse social e boa fé, dentre outras, o intérprete precisa fazer a valoração de fatores objetivos
e subjetivos presentes na realidade fática, de modo a definir o sentido e o alcance da norma. Como a
solução não se encontra integralmente no enunciado normativo, sua função não poderá limitar-se à
revelação do que lá se contém; ele terá de ir além, integrando o comando normativo com a sua própria
avaliação.
O reconhecimento de normatividade aos princípios e sua distinção qualitativa em relação às
regras é um dos símbolos do pós-positivismo (v. supra). Princípios não são, como as regras, comandos
imediatamente descritivos de condutas específicas, mas sim normas que consagram determinados
valores ou indicam fins públicos a serem realizados por diferentes meios. A definição do conteúdo de
cláusulas como dignidade da pessoa humana, razoabilidade, solidariedade e eficiência também transfere
para o intérprete uma dose importante de discricionariedade. Como se percebe claramente, a menor
densidade jurídica de tais normas impede que delas se extraia, no seu relato abstrato, a solução completa
das questões sobre as quais incidem. Também aqui, portanto, impõe-se a atuação do intérprete na
definição concreta de seu sentido e alcance.
A existência de colisões de normas constitucionais, tanto as de princípios como as de direitos
fundamentais, passaram a ser percebida como um fenômeno natural – até porque inevitável – no
constitucionalismo contemporâneo. As Constituições modernas são documentos dialéticos, que
consagram bens jurídicos que se contrapõem. Há choques potenciais entre a promoção do
desenvolvimento e a proteção ambiental, entre a livre-iniciativa e a proteção do consumidor. No plano
dos direitos fundamentais, a liberdade religiosa de um indivíduo pode conflitar-se com a de outro, o
direito de privacidade e a liberdade de expressão vivem em tensão contínua, a liberdade de reunião de
alguns pode interferir com o direito de ir e vir dos demais. Quando duas normas de igual hierarquia
colidem em abstrato, é intuitivo que não possam fornecer, pelo seu relato, a solução do problema. Nestes
casos, a atuação do intérprete criará o Direito aplicável ao caso concreto.
A existência de colisões de normas constitucionais leva à necessidade de ponderação. A
subsunção, por óbvio, não é capaz de resolver o problema, por não ser possível enquadrar o mesmo fato
em normas antagônicas. Tampouco podem ser úteis os critérios tradicionais de solução de conflitos
normativos – hierárquico, cronológico e da especialização – quando a colisão se dá entre disposições da
Constituição originária. Neste cenário, a ponderação de normas, bens ou valores (v. infra) é a técnica a
ser utilizada pelo intérprete, por via da qual ele (i) fará concessões recíprocas, procurando preservar o
máximo possível de cada um dos interesses em disputa ou, no limite, (ii) procederá à escolha do direito

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que irá prevalecer, em concreto, por realizar mais adequadamente a vontade constitucional. Conceito-
chave na matéria é o princípio instrumental da razoabilidade.
Chega-se, por fim, à argumentação, à razão prática, ao controle da racionalidade das decisões
proferidas, mediante ponderação, nos casos difíceis, que são aqueles que comportam mais de uma
solução possível e razoável. As decisões que envolvem a atividade criativa do juiz potencializam o dever
de fundamentação, por não estarem inteiramente legitimadas pela lógica da separação de Poderes – por
esta última, o juiz limita-se a aplicar, no caso concreto, a decisão abstrata tomada pelo legislador. Para
assegurar a legitimidade e a racionalidade de sua interpretação nessas situações, o intérprete deverá, em
meio a outras considerações: (i) reconduzi-la sempre ao sistema jurídico, a uma norma constitucional ou
legal que lhe sirva de fundamento – a legitimidade de uma decisão judicial decorre de sua vinculação a
uma deliberação majoritária, seja do constituinte ou do legislador; (ii) utilizar-se de um fundamento
jurídico que possa ser generalizado aos casos equiparáveis, que tenha pretensão de universalidade:
decisões judiciais não devem ser casuísticas; (iii) levar em conta as conseqüências práticas que sua decisão
produzirá no mundo dos fatos.
Em suma: o neoconstitucionalismo ou novo direito constitucional, na acepção aqui desenvolvida,
identifica um conjunto amplo de transformações ocorridas no Estado e no direito constitucional, em meio
às quais podem ser assinalados, (i) como marco histórico, a formação do Estado constitucional de direito,
cuja consolidação se deu ao longo das décadas finais do século XX; (ii) como marco filosófico, o pós-
positivismo, com a centralidade dos direitos fundamentais e a reaproximação entre Direito e ética; e (iii)
como marco teórico, o conjunto de mudanças que incluem a força normativa da Constituição, a expansão
da jurisdição constitucional e o desenvolvimento de uma nova dogmática da interpretação constitucional.
Desse conjunto de fenômenos resultou um processo extenso e profundo de constitucionalização do
Direito.

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1.1 Noção Geral


A origem do Direito Constitucional está ligada ao triunfo político das revoluções liberais do século
XVIII (a americana e a francesa).
Com a vitória das revoluções democráticas abriu-se a oportunidade do surgimento das
Constituições escritas, das quais a Constituição americana de 1787 e a Constituição francesa de 1791
despontaram como os primeiros paradigmas (modelo) de documentos escritos e solenes.
É digno de nota o episódio histórico, ocorrido em 1791, quando a Assembleia Nacional
Constituinte da França decidiu que as faculdades de Direito seriam obrigadas a ensinar a Constituição
francesa aos jovens estudantes. Não menos importante, outrossim, para o aparecimento do Direito
Constitucional como a disciplina jurídica das Constituições, foi a Declaração Universal dos Direitos do
Homem e do Cidadão, de 1789, produzida pela Revolução francesa, que em seu artigo 16 assim dispõe
“toda sociedade na qual não esteja assegurada a garantia dos direitos nem determinada a separação
de poderes não possui Constituição”.
Contudo, as primeiras cadeiras de Direito Constitucional foram criadas, sob marcada e direta
influência da Revolução Francesa, ao norte da Itália dentre outros países da Europa.
No Brasil, depois de diversas tentativas frustradas, o Direito Constitucional finalmente foi criado,
como cadeira autônoma, em 1940.
Para José Afonso da Silva o Direito Constitucional “é o ramo do Direito Público que expõe,
interpreta e sistematiza os princípios e normas fundamentais do Estado”.

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1.2 Espécies
A doutrina costuma distinguir ou dividir o Direito Constitucional, relativamente ao seu conteúdo
científico, em três partes ou espécies, a saber:

1.2.1 Direito Constitucional Geral


O Direito Constitucional Geral corresponde a uma verdadeira Teoria Geral do Direito
Constitucional, que tem por objetivo a identificação e sistematização, numa perspectiva unitária, dos
princípios, conceitos e instituições comuns a diversos ordenamentos constitucionais e que se acham
presentes em várias Constituições de Estados distintos, que revelam características equivalentes ou
similares.
Constitui tarefa do Direito Constitucional Geral fixar o próprio conceito de Direito Constitucional,
suas relações com outras disciplinas e suas fontes; esboçar uma teoria da Constituição; dispor sobre a
teoria do poder Constituinte; sistematizar uma hermenêutica constitucional; acompanhar a evolução do
constitucionalismo, entre outras.
O que diferencia o Direito Constitucional geral do Direito Constitucional comparado é que,
enquanto este se interessa pelos grupos jurídico-constitucionais em sua singularidade e contraste frente
a outros grupos, o primeiro se preocupa somente com as notas gerais e comuns a esses grupos.

1.2.2 Direito Constitucional Positivo


Cuida-se do Direito Constitucional de um determinado Estado, que tem por objeto o estudo e
conhecimento de sua Constituição em vigor. É direito Constitucional de uma só Constituição, que se
preocupa em expor, examinar, interpretar e sistematizar os princípios e as regras constitucionais vigentes
em um dado Estado. Assim, temos o Direito Constitucional brasileiro, o direito Constitucional americano,
o Direito Constitucional alemão, o direito Constitucional francês, em consonância com as respectivas
Constituições em vigor.

1.2.3 Direito Constitucional Comparado


Trata-se do Direito Constitucional que se ocupa com o estudo teórico das normas constitucionais
positivas, mas não obrigatoriamente vigentes, de vários Estados, ou do mesmo Estado em época
diferentes, objetivando realçar as peculiaridades, os contrastes e as semelhanças entre elas. Não é o
Direito Constitucional de uma só Constituição, mas de uma pluralidade de Constituições.

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O Direito Constitucional comparado pode se valer de critérios variáveis. Um desses critérios


consiste em comparar no tempo as Constituições de um mesmo Estado, visando aferir as semelhanças e
dessemelhanças entre as normas constitucionais e instituições neste Estado (Ex.: Estudo das Constituições
brasileira de 1967 e 1988). Outro critério consiste em confrontar no espaço as Constituições de Estados
diferentes. Apesar de ambos os critérios servirem ao trabalho do Direito Constitucional comparado, o
mais utilizado vem sendo o critério espacial, que vem se revelando muito proveitoso, tendo em vista
que possibilita a análise da organização política e do funcionamento das instituições de Estados
diferentes, contribuindo no mais das vezes para a compreensão geral acerca do melhor modelo de Estado.

1.3 Importância e relação com os demais ramos do Direito


Mais do que um ramo do Direito, o direito Constitucional consiste no começo de todo o Direito,
o próprio tronco comum ao qual se prendem e do qual também derivam os vários domínios da ordenação
jurídica do Estado, de modo que cada um desses ramos o pressupõe, sendo gerados e amparados por ele,
que contém o gérmen de suas normas e instituições.
Entre os principais ramos com os quais mantém intensa e permanente relação, podemos
destacar os seguintes:
a) O Direito Constitucional e o Direito Administrativo – Entre todos os ramos do direito,
o Direito Administrativo talvez seja aquele que maior influência recebe do Direito Constitucional, ao ponto
de alguns autores chegarem a qualificar o Direito Administrativo como uma parte do Direito
Constitucional, que concebe o Estado no seu aspecto dinâmico e funcional, enquanto que o Direito
Constitucional cuida do Estado na sua parte estrutural e estática. É exatamente o Direito Constitucional
que disponibiliza ao Direito Administrativo os princípios gerais e os fundamentos da organização da
Administração Pública, bem assim as regras básicas para a elaboração dos regimes funcionais dos agentes
administrativos.
b) O Direito Constitucional e o Direito Penal – Fixa os fundamentos e os limites da
pretensão punitiva do Estado e garantindo o sagrado direito de defesa do acusado.
c) O Direito Constitucional e o Direito Processual – Garante o acesso à justiça; o devido
processo legal; o contraditório e a ampla defesa; a impassibilidade no processo de provas obtidas por
meios ilícitos; MS; HC, etc.
d) O Direito Constitucional e o Direito do Trabalho– Assegura os direitos sociais do
empregado

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e) O Direito Constitucional e o Direito Civil – Assegura a igualdade entre homens e


mulheres em direitos e obrigações; reconhece a união estável entre o homem e a mulher como entidade
familiar, sinalizando também para a união homoafetiva.
f) O Direito Constitucional e o Direito Tributário – Delineia o sistema tributário nacional,
dando o conceito de tributo, discriminando a competência tributária e estabelecendo um regime
tributário, através da fixação de limites ao poder de tributar.

2. A CONSTITUIÇÃO

2.1 Conceito e importância


A Constituição do Estado é a sua Lei Fundamental; a Lei das leis; a Lei que define o modo concreto
de ser e de existir do Estado; a Lei que ordena e disciplina os seus elementos essenciais (poder-governo,
povo, território e finalidade).
Dirley conceitua Constituição como sendo: Um conjunto de normas jurídicas supremas que
estabelecem os fundamentos de organização do Estado e da sociedade, dispondo e regulando a forma
de Estado, a forma e sistema de governo, o seu regime político, seus objetivos fundamentais, o modo
de aquisição e exercício do poder, a composição, as competências e o funcionamento de seus órgãos,

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os limites de sua atuação e a responsabilidade de seus dirigentes, e fixando uma declaração de direitos
e garantias fundamentais e as principais regras de convivência social.
A Constituição pode ser sentida e compreendida a partir de perspectivas ou concepções diversas,
segundo o ângulo de visão de seu observador. Efetivamente, o sociólogo vai conceber a Constituição
como um fato social ou produto da realidade social, dotada de força própria extraída dos elementos da
mesma realidade da qual proveio; o adepto da concepção política certamente verá a constituição a
síntese de uma decisão política fundamental de um povo acerca do modo e da forma concreta de
existência de sua comunidade; enquanto para o jurista a Constituição é uma lei pura, que se distingue das
demais em razão de sua superioridade jurídica.

2.1.1 O sentido sociológico


Proposta pelo alemão Ferdinand Lassalle no livro "A essência da Constituição". Enxerga a
Constituição sob o aspecto da relação entre os fatos sociais dentro do Estado. Para Lassalle havia uma
Constituição real (ou efetiva - definição clássica - é a soma dos fatores reais de poder que regem uma
determinada nação), e umaConstituição escrita não passa de uma folha de papel). Esta soma poderia ou
não coincidir com a Constituiçãoescrita, que sucumbirá se contrária à Constituição real ou efetiva,
devendo se coadunar com a Constituição real ou efetiva.
Se a Constituição não exprimisse o pensamento das forças dominantes, ela seria uma mera
“Folha de Papel”.

2.1.2 O sentido político


Defendida pelo alemãoCarl Schmitt no livro "Teoria da Constituição". Busca-se o fundamento da
Constituição na decisão política fundamental que antecede a elaboração da Constituição- aquela
decisão sem a qual não se organiza ou funda um Estado. Ex: Estado unitário ou federação, Estado
Democrático ou não, parlamentarismo ou presidencialismo, quais serão os direitos fundamentais etc. -
podem estar ou não no texto escrito. O autor diferencia Constituição de Lei Constitucional. A 1ª traz as
normas que decorrem da decisão política fundamental, normas estruturantes do Estado, que nunca
poderão ser reformadas. A 2ª será que estiver no texto escrito, mas não for decisão política fundamental,
ex: art. 242, §§ 1º e 2º, CF - é matéria adstrita à lei, mas que está na Constituição, podendo ser reformadas
por processo de reforma constitucional.

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2.1.3 O sentido jurídico


Defendido pelo austríacoHans Kelsen - "Teoria Pura do Direito ". A Constituição é puro dever-
ser, (ou seja, como são e as coisas como devem ser), norma pura, não devendo buscar seu fundamento
na filosofia, na sociologia ou na política, mas na própria ciência jurídica. Logo, é puro"dever-ser".
Constituição deve poder ser entendida no sentido:
a) lógico-jurídico: norma fundamental hipotética: fundamental porque é ela que nos dá o
fundamento da Constituição; hipotética porque essa norma não é posta pelo Estado é apenas
pressuposta. Não está a sua base no direito positivo ou posto, já que ela própria está no topo do
ordenamento;
b) jurídico-positivo: é aquela feita pelo poder constituinte, constituição escrita, é a norma que
fundamenta todo o ordenamento jurídico. No nosso caso seria a CF/88. É algo que está no direito positivo,
no topo na pirâmide. A norma infraconstitucional deve observar a norma superior e a Constituição, por
conseqüência. Dessa concepção nasce a idéia de supremacia formal constitucional e controle de
constitucionalidade, e de rigidez constitucional, ou seja, necessidade de proteger a norma que dá validade
a todo o ordenamento. Para ele nunca se pode entender o direito como fato social, mas sim como norma,
um sistema escalonado de normas estruturas e dispostas hierarquicamente, onde a norma fundamental
fecha o ordenamento jurídico dando unidade ao direito.

2.1.4 O sentido cultural (sociológico, político e jurídico)


Remete ao conceito de Constituição total, que é a que possui todos os aspectos vistos
anteriormente. De acordo com esta concepção, a Constituição é fruto da cultura existente dentro de
determinado contexto histórico, em uma determinada sociedade, e ao mesmo tempo, é condicionante
dessa mesma cultura, pois o direito é fruto da atividade humana. José Afonso da Silva é um dos autores
que defendem essa concepção. Meirelles Teixeira a partir dessa concepção cultural cria o conceito de
Constituição Total, segundo o qual: "Constituição é um conjunto de normas jurídicas fundamentais,
condicionadas pela cultura total, e ao mesmo tempo condicionantes desta, emanadas da vontade
existencial da unidade política, e reguladoras da existência, estrutura e fins do Estado e do modo de
exercício e limites do poder político"

2.1.5 O sentido dirigente


Segundo Canotilho a Constituição deve ser um plano que irá direcionar a atuação do Estado,
notadamente através das normas programáticas inseridas no seu texto.

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O Sentido dirigente ou compromissória é aquela que traça os objetivos a serem perseguidos


pelo Estado. Recebem, ainda, o nome de constituição programática ou diretiva.
As normas programáticas consubstanciam programas e diretrizes para atuação futura dos órgãos
estatais. Sua função é estabelecer os caminhos que os órgãos estatais deverão trilhar para o atendimento
da vontade do legislador constituinte, para completar sua obra.
Segundo Jorge Miranda, são de aplicação diferida, e não de aplicação ou execução imediata; mais
do que comandas-regras, explicitam comandos-valores; conferem elasticidade ao ordenamento
constitucional; têm como destinatário primacial - embora não único - o legislador, a cuja opção fica a
ponderação do tempo e dos meios em que vem a ser revestidas de plena eficácia (e nisso consiste a
discricionariedade); não consentem que os cidadãos as invoquem já (ou imediatamente após a entrada
em vigor da Constituição), pedindo os tribunais o seu cumprimento so por si, pelo que pode haver quem
afirme que os direitos que delas constam, máxime os direitos sociais, tem mais natureza de expectativas
que de verdadeiros direitos subjetivos; aparecem, muitas vezes, acompanhadas de conceitos
indeterminados ou parcialmente indeterminados.
Normas de conteúdo programático são aquelas que, apesar de possuírem capacidade de
produzir efeitos, por sua natureza necessitam de outra lei que as regulamente, lei ordinária ou
complementar. Essas normas, portanto, são de eficácia mediata, e segundo essa corrente de
entendimento têm que ser completadas posteriormente, só assim produzindo os efeitos desejados pelo
legislador. Entretanto, constituem um marco constitucional, já que impedirão que se produzam normas
infraconstitucionais que as contrariem no todo ou em parte, ensejando atos de declaração de
inconstitucionalidade quando for o caso de afronte a seus preceitos.
A Carta Magna de 1988 é um exemplo de Constituição dirigente, pois consagra inúmeras normas
programáticas, como, por exemplo, as que estabelecem os objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil previstos no artigo 3º, in verbis:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:


I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.

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Grandes exemplos deste tipo de Constituição são a Constituição Portuguesa de 1976 e a nossa
Constituição Federal de 1988, que, apesar de estabelecer normas garantidoras de direitos individuais
(como nas Constituições-garantia), evidencia mais seu caráter dirigente, através de suas normas
programáticas e diretrizes a serem cumpridas pelo Estado.

2.1.6 O sentido ontológico (estuda a existência e a realidade do ser)


Segundo a doutrina, quanto ao critério ontológico, que busca identificar a correspondência entre
a realidade política do Estado e o texto constitucional, é possível classificar as constituições em
normativas, nominalistas e semânticas.
a) Constituições normativas: o processo de poder está de tal forma disciplinado que as relações
políticas e os agentes do poder subordinam-se às determinações do seu conteúdo e do seu controle
procedimental.
b) Constituições nominalistas: contêm disposições de limitação e controle de dominação
política, sem ressonância na sistemática de processo real de poder, e com insuficiente concretização
constitucional.
c) Constituições semânticas: reflexos da realidade política, servindo como mero instrumento dos
donos do poder e das elites políticas, sem limitação do seu conteúdo.

A CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES:

Serve para sistematizar um conjunto de idéias para auxiliar, facilitar o estudo. Estabelece como
categorias de análise o mesmo fundamento.
As cartas políticas podem ser classificadas segundo os mais variados critérios – formais e
substanciais. Todavia, qualquer classificação depende de critérios assinalados pelos estudiosos ao longo
do curso da história, pois as constituições não se apresentam com um modelo rigorosamente uniforme.
As Constituições brasileiras de 1988 e 1967 não são iguais; basta ressaltar que enquanto a Constituição
de 1988 tem origem democrática, a Constituição de 1967 teve procedência autoritária. A constituição de
1988, por outro lado, não é igual à Constituição dos E.U.A (1787), nem é igual à Constituição da Inglaterra.
Vem daí a importância em classificar as Constituições, visando identificar os seus vários tipos ou
espécies:

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a) Quanto à forma: escritas e não-escritas (costumeiras)


Escritas: É um conjunto de regras codificado e sistematizado e um único documento, que
estabelece as normas fundamentais de um Estado, elaborada racionalmente por um órgão constituinte.
A Constituição escrita é produto das revoluções liberais do século XVIII, que reivindicaram a
consolidação de seus objetivos de liberdade e limitação do poder em texto escrito e solene, pois essa seria
a única forma capaz de assegurar certeza, clareza e precisão de seu conteúdo e garantir segurança aos
governados contra o abuso dos governantes.
Constituição dos EUA de 1787 e a Constituição da França de 1791 foram as primeiras
Constituições escritas do mundo.

Não escritas: é um conjunto de regras baseado em leis esparsas, costumes, jurisprudências e


convenções (exemplo: Constituição inglesa). Na atualidade, no entanto, inexistem Constituições
totalmente costumeiras ou consuetudinárias. Isso porque mesmo a Inglaterra mantém princípios
constitucionais em textos escritos, a despeito de os costumes serem valores constitucionais relevantes,
por exemplos a Magna Charta (1251), o Bill of Rights (1689).

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As Constituições não-escritas ou costumeiras sempre existiram e precederam às Constituições


escritas, perdendo a primazia, entretanto, a partir do final do século XVIII.
Em suma, as Constituições escritas e não-escritas distinguem-se fundamentalmente porque,
enquanto aquelas são elaboradas em documento único pelo órgão constituinte, estas são importas pela
prática ou pelos costumes.

b) Quanto ao conteúdo: material e formal


Material: Trazem um conjunto de regras materialmente constitucionais, tais como as normas
fundamentais e estruturais do Estado, a organização de seus órgãos, os direitos e garantias fundamentais,
inseridas ou não no texto escrito. Isto é, só é Constituição material aquele conjunto de normas que se
limitam a dispor sobre matéria essencialmente constitucional, que são aquelas que se revestem de maior
importância tendo em vista se relacionarem aos pontos cardeais de existência do Estado, pouco
importando a forma dessa disposição (se por escrito ou por meio de costume). O fundamental é a matéria
ou conteúdo objeto da norma, sendo irrelevante a localização desta. Se se refere a aspecto fundamental
do Estado, temos uma norma materialmente constitucional.
Formal: Inserem matéria de aparência constitucional. Assim se designa exclusivamente por haver
sido introduzida na Constituição, enxertada no seu corpo normativo e não porque se refira aos elementos
básicos ou institucionais da organização política. (Estrutura do Estado, a organização do poder e os
direitos e garantias fundamentais), embora não sejam materialmente constitucionais, somente poderão
suprimir-se ou alterar-se mediante um processo diferente, mais solene e complicado (maioria qualificada,
votação repetida em legislaturas sucessivas, ratificação pelos Estados-membros em algumas organizações
federativas, conforme a prescrição constitucional.
"Constituição material consiste no conjunto de regras materialmente constitucionais, estejam ou
não codificadas em um único documento; enquanto constituição formal é aquela consubstanciadas de
forma escrita, por meio de um documento solene estabelecido pelo poder constituinte originário."
"Normas fundamentalmente constitucionais são as contém regras referentes à estrutura do
Estado, à formação dos poderes públicos, forma de governo e aquisição do poder de governar,
distribuição de competências, direitos e garantias e deveres dos cidadãos."
A distinção é relativamente simples, a primeira delas (material) parte do conteúdo, ou seja, é
constituição em sentido material as normas que dizem respeito aos assuntos mais importantes do Estado
(estrutura, exercício do poder, direitos fundamentais).

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Já a constituição em sentido formal refere-se ao documento propriamente dito, ao documento


"Constituição". Por exemplo, nossa Constituição é formal, pois consta de um documento único, elaborado
em determinado momento.
Em geral, as constituições em sentido formal - como a nossa - possui regras tanto materialmente
constitucionais (art. 18 a 43 - Da Organização do Estado), entretanto possui regras formalmente
constitucionais (art. 242,§2ª). Estas últimas são consideradas constitucionais apenas formalmente,
porque constam do texto constitucional e não porque tratam de assuntos relevantes ao Estado Brasileiro.

c) Quanto ao modo de elaboração: dogmáticas e históricas


Dogmáticas: apresentam-se como documento sempre escrito e sistematizado por um órgão
constituinte, consubstanciando os preceitos estruturais e fundamentais do Estado, dentro da perspectiva
da teoria política e do direito dominante, ou seja, a partir de dogmas ou ideias fundamentais da ciência
política e do direito dominante na ocasião.
Este modelo de Constituição coincide com as Constituições escritas. De fato, a Constituição
dogmática é assim denominada em razão dela consolidar em seu texto escrito os dogmas ou princípios
fundamentais vigentes no momento em que elaborada.
Histórica – Sempre não-escrita, mas existem documentos escritos. É aquela cuja elaboração é
lenta e ocorre sob o influxo dos costumes e das transformações sociais. A sua formação resulta da
demorada e contínua evolução histórica das tradições de um determinado povo, que se protrai no tempo.
Ex.: Constituição Inglesa.

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d) Quanto à origem: outorgadas, promulgadas, cesaristas e pactuadas. A origem analisa a


forma do nascimento do documento intitulado Constituição. Este documento é o que rege a vida de um
Estado, como ele nasceu.
Outorgadas: são constituições impostas de maneira unilateral pelo arbítrio de governantes
(ditadores, imperadores e junta militar), que não receberam o mandato do povo para atuar em nome
dele, ou seja, sem qualquer participação do povo. No Brasil são exemplos deste tipo de Constituição, as
Cartas de 1824 (outorgada pelo Imperador D. Pedro I, após dissolver a Assembleia constituinte), de 1937
(imposta pela ditadura de Getúlio Vargas) e 1967/69 (outorgada por juntas militares).
Promulgadas, também denominadas de democráticas ou populares, nascem do trabalho de
uma Assembleia Nacional Constituinte livremente escolhida pelo povo para em nome dele atuar
(exemplo: Constituições brasileiras de 1891, 1934, 1946 e 1988).
Cesaristas, (Napoleônicas) segundo José Afonso da Silva, a constituição cesarista (…) não é
propriamente outorgada, mas tampouco é democrática, ainda que criada com participação popular (…),
é formada por plebiscito (antes do ato) popular sobre um projeto elaborado por um Imperador
(plebiscitos napoleônicos) ou um Ditador (plebiscito de Pinochet, no Chile). “A participação popular,
nesses casos, não é democrática, pois visa apenas ratificar a vontade do detentor do poder”, ou seja, de
um imperador, mas de certa forma representa a vontade de um povo.
Pactuadas, segundo Paulo Bonavides, a Constituição pactuada é aquela que exprime um
compromisso instável de duas forças políticas rivais: a realeza absoluta debilitada, de uma parte, e a
nobreza e a burguesia, em franco progresso, doutra. Surge então como termo dessa relação de equilíbrio
a forma institucional da monarquia limitada. (…) Foram igualmente formas de Constituição pactuada
diversos documentos constitucionais ingleses, como o Bill ofRights, de 1969, Magna Carta (1215), bem
como as Constituições da Espanha de 1845 e 1876, a da Grécia de 1844 e a da Bulgária, de 1879”.Não
mais existe, somente para estudo.

e) Quanto à estabilidade: rígidas, flexíveis, semi-rígidas e imutáveis


Rígidas: exigem um processo legislativo mais dificultoso para a sua alteração. É o modelo ideal
de Constituição porque nela se reúnem as duas necessidades das Constituições contemporâneas: a
evolução e a estabilidade. A Constituição de 1988 é rígida, é o que prevê o art. 60, §§1º e 2º, in verbis:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:


I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;

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II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação,
manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.
§ 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado
de defesa ou de estado de sítio.
§ 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos,
considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.

Flexíveis: (alterabilidade é igual a das demais normas) em regra, não escritas, podem ser
alteradas pelo processo legislativo ordinário. Pedro Lenza lembra: (…), a dificuldade em alterar a
constituição é a mesma encontrada para alterar uma lei que não é constitucional”.Assim, não existe
hierarquia entre constituição e lei infraconstitucional, podendo esta alterar aquela se assim
expressamente o declarar (exemplo: Constituição inglesa, pois as partes escritas da Constituição podem
ser juridicamente alteradas pelo Parlamento com a mesma facilidade com que se altera a lei ordinária).
Semi-rígidas: (Há um mix) a constituição semi-rígida ou semiflexível é aquela que traz dois tipos
de regras: i) as que poderão ser alteradas pelo processo legislativo ordinário comum; e ii) as que só
poderão ser alteradas por um processo legislativo mais dificultoso (exemplo: Constituição brasileira de
1824).
Imutáveis: constituições inalteráveis. Não prevê nenhum processo de alteração de suas normas,
sob o fundamento de que a vontade do poder constituinte se exaure com a manifestação da atividade
originária. Em termos de constituição escrita não há exemplos hoje de Constituição imutável, não
passando este tipo de Constituição de simples lembranças históricas, todavia, cumpre lembrar que a
Constituição do Império do Brasil (1824) foi provisoriamente imutável, pelo período de quatro anos após
a sua outorga, tendo em vista o que o seu art. 174: “Se passados quatro anos depois de jurada a
Constituição do Brasil, se conhecer, que algum dos seus artigos merece reforma, se fará a proposição por
escrito, a qual deve ter origem na Câmara dos Deputados, e ser apoiada pela terça parte deles.”
Fixa: Diz-se daquela que só pode ser alterada pelo próprio poder constituinte originário,
circunstância que implica, não em alteração, mas em elaboração, propriamente, de uma nova ordem
constitucional. Também não se tem registro desse tipo de Constituição, diante, certamente, das
dificuldades, e falta de sentido, de ser convocar o poder constituinte originário toda vez que se pretender
alterar a Constituição.

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f) Quanto à extensão: sintéticas ou analíticas


Sintéticas: são as constituições concisas, breves, sumárias, sucintas. Preveem somente os
princípios gerais de regência do Estado, pois enunciam apenas as regras básicas de organização do Estado
e os preceitos fundamentais. Exemplo lembrado é o da Constituição americana que dispõe de apenas sete
artigos e vinte e seis emendas e está em vigor há mais de 200 anos.
Analíticas: descem às minúcias, desdobrando-se numa infinidade de normas com o objetivo de
constitucionalizar todos os direitos e deveres que o povo entender como fundamentais. Gilmar Mendes
pondera que (…), é comum exaltarem-se as virtudes das constituições sintéticas – à frente a dos estados
Unidos, velha de mais de duzentos anos – e criticarem-se as constituições analíticas, como a nossa
Constituição de 1988, com 250 artigos na parte permanente e 94 artigos na parte transitória, totalizando
344 artigos, cujos textos, reputados volumosos, detalhistas e inchados, dificultariam as interpretações
atualizadoras, obrigando o constituinte derivado a sucessivos esforços de revisão.

g) Quanto à finalidade: Garantia e Dirigente


a) Garantia
A Constituição garantia foi paradigma de Constituição adotado após as revoluções do século XVIII
para servir de instrumento de garantia das liberdades públicas individuais, visando limitar o poder.
Assim a finalidade maior desta Constituição é garantir as liberdades públicas contra a
arbitrariedade estatal, limitando-se praticamente a isso.
b) Dirigente
É uma consequência do constitucionalismo social do século XX, que provocou a evolução do
modelo de Estado, de Estado liberal (passivo) para Estado Social (intervencionista)
Quanto à ideologia: Ortodoxa e Eclética
a) Constituição ortodoxa
É aquela que resulta da consagração de uma só ideologia. São exemplos dela as constituições da
União Soviética de 1923, 1936 e 1977.
b) Constituição eclética
É aquela que logra contemplar, plural e democraticamente, várias ideologias aparentemente
contrapostas, conciliando as ideias que permanecem as discussões na Assembleia Constituinte.
É exemplo de Constituição eclética, a constituição brasileira de 1988, que adotou como
fundamento do Estado, o princípio do pluralismo político.

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h) Quanto ao modo de ser:


Constituição normativa: segundo Alexandre de Moraes é aquela cujo texto da Carta
Constitucional já contém verdadeiros direcionamentos para os problemas concretos, a serem resolvidos
mediante aplicação pura e simples das normas constitucionais”.
Constituição semântica: a interpretação de suas normas depende da análise de seu conteúdo
significativo e do contexto sociológico, ideológico, metodológico.

Classificação da Constituição brasileira de 1988

2.2 Objeto da Constituição


O objeto e conteúdo mínimo de toda Constituição é a organização fundamental do Estado.
Nesse contexto, toda Constituição, em qualquer época e em qualquer lugar, tem por objeto o Estado,
dispondo a fixar-lhe os fundamentos de sua organização. Esse objeto, porém, mantido aquele conteúdo
mínimo, pode variar de tempo (objeto de diferentes constituições do mesmo Estado) e espaço (objeto de
constituições vigentes de Estados distintos).
As Constituições têm por objeto estabelecer a estrutura do Estado, a organização de seus
órgãos, o modo de aquisição do poder e a forma de seu exercício, limites de sua atuação, assegurar os
direitos e garantias dos indivíduos, fixar o regime político e disciplinar os fins sócio-econômicos do
Estado, bem como os fundamentos dos direitos econômicos, sociais e culturais.

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Nem sempre tiveram as constituições objeto tão amplo. Este vem estendendo-se com o correr
da história. A cada etapa desta, algo de novo entra nos textos constitucionais.
2.3 Estrutura da Constituição

2.3.1 Preâmbulo
É um pequeno parágrafo que encontramos em nossa constituição, em menos de uma pagina,
dizendo quais são os objetivos/ finalidade da CF. Toda constituição tem que ter preambulo? Não, pois não
é obrigatório. No Brasil, o preambulo sempre esteve presente, só não esteve presente da CF/69 (pois nem
era tida formalmente como constituição, era tida como uma emenda constitucional). Qual a natureza do
preambulo? Em posição majoritária, segundo o STF, o preambulo não é norma jurídica, não é norma
constitucional, mas tem uma importância interpretativa. Em consequência disso, o preambulo não pode
ser usado como parâmetro no controle de constitucionalidade, nem é norma de repetição obrigatória
pelos Estados-membros.

2.3.2 Parte Dogmática


É o conteúdo propriamente dito da Constituição, é composto não só pelo corpo da Constituição
de 1988 atualizada, mas também por tratados internacionais que o Brasil é signatário e também por
Emendas.

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Vai do art. 1º até 250. Encontramos vários elementos constitucionais. O primeiro deles são os
elementos orgânicos, no qual organizam a estrutura do Estado. Elementos limitativos, no qual limitam o
poder do Estado. Elementos sócios ideológicos, no qual fixam uma ideologia estatal. Elementos de
estabilização constitucional, havendo um tumultuo constitucional, esses elementos servem para trazer a
estabilidade.

2.3.3 Parte Transitória


Serve de ponte do ordenamento jurídico anterior para o atual, através de regras de transição que
com decurso do tempo terão eficácia exaurida ou esgotada. Mesmo sem efeito a norma permanece
vigente, não sendo revogada pelo decurso de tempo.

2.4 Elementos
Constituições, nada obstante se apresentem como um todo unitário e orgânico, contêm normas
que incidem sobre as mais variadas matérias e que tem finalidades diversas. Em razão disso, tem-se
afirmado que as Constituições têm caráter polifacético (que possui muitas faces), possibilitando que a
doutrina distinga, dentro de cada constituição, os seus elementos formativos. São elementos formativos
das Constituições:

2.4.1 Elementos Orgânicos (que origina de algo, pertinente a)


São normas que regulam a estrutura do Estado e o Poder. Normas que regulam: Organização do
Estado; Organização dos Poderes e do sistema de governo; Forças Armadas; Segurança Pública;
Tributação; Orçamento

2.4.2 Elementos Limitativos


São os que se manifestam nas normas que consagram o elenco dos direitos e garantias
fundamentais (do Título II da Constituição - Dos Direitos e Garantias Fundamentais), excetuando-se os
Direitos Sociais, que entram na categoria seguinte.

2.4.3 Elementos Sócio-ideológicos


Normas que tratam do COMPROMISSO das constituições entre o Estado individual(liberal) e o
Estado social(intervencionista): Direitos Sociais; Ordem Social; Da ordem econômica e Financeira;

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2.4.4 Elementos de Estabilização Constitucional


Normas destinadas a assegurar: I) solução de conflitos constitucionais. II) defesa das instituições
democráticas; III) defesa do Estado; IV) defesa da Constituição; V) paz social. Exemplos: Controle de
Constitucionalidade; Restrições à Emendas Constitucionais; Estado de sítio; Estado de Defesa; Intervenção
Federal

2.4.5 Formais de Aplicabilidade


Contêm normas que orientam a aplicação de constituição. Exemplos: preâmbulo; ADCT; §1º do
Artigo 5°.

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EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

A Constituição é a lei fundamental e suprema de um Estado, que contém um conjunto de normas


reguladoras referentes, entre outras questões, à forma de governo, à organização dos poderes públicos,
à distribuição de competências e aos direitos e deveres dos cidadãos.
O Brasil tem na sua história oito constituições, uma no período monárquico e sete no período
republicano. As mudanças constitucionais, em geral, ocorrem no contexto de importantes modificações
sociais e políticas do país.
Destas, quatro foram outorgadas (Constituições de 1824,1937 e 1967 e 1969). Foram impostas
pelo chefe de Estado. As outras quatro (Constituições de 1891, 1934, 1946 e 1988) resultaram de um
processo democrático, sendo votadas.

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1. CONSTITUIÇÃO DE 1824

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Foi a primeira Constituição Brasileira e não foi democrática. Por sua vez, foi outorgada na
Vigência de Dom Pedro I, em 24 de março de 1824, após a dissolução da Assembléia Constituinte de
1823.
Possuía 179 artigos e prevaleceu durante 69 anos.

1.1 Características:
- A monarquia era a forma de governo de caráter hereditário.
- A religião católica era que denominava na época.
- O direito de petição era garantido; todo cidadão poderia apresentar, por escrito,
reclamações, queixas ou petições, e expor qualquer infração da Constituição Imperial, requerendo
perante a autoridade competente responsabilidade dos infratores.
- Além dos três poderes (Executivo, Judiciário e Legislativo) foi criado um novo poder, o
Moderador, por Dom Pedro I, conforme o art. 10.
Poder Moderador: Era um poder autoritário que conferia a D. Pedro I poderes como chefe
supremo da Nação, além de dar ao Imperador a competência para intervir nos Poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário. A pessoa do Imperador é inviolável e sagrada; ele não está sujeito a
responsabilidade alguma, conforme o art. 99 previa.
Além de subjugar os três poderes, também instituiu o regime de Padroado, subjugando o poder
da igreja católica ao poder do imperador.
O Senado era composto de membros vitalícios, escolhidos pelo próprio Imperador,
constituindo uma representação da Aristocracia Imperial.

1.2 Consequências:

- Provocou diversas reações armadas, como exemplo a Revolução Pernambucana de 1824, que
proclamou a Confederação do Equador.
- O duelo entre a Nação e o Imperador culminou com a abdicação deste, a 7 de abril de 1831.
A reação do espírito liberal brasileiro corporificou-se, a seguir, na reforma
da Constituição Imperial de 1834.

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2. CONSTITUIÇÃO DE 1891

Foi uma Constituição decretada e promulgada pelo congresso constituinte de 1891, convocado
pelo governo provisório da república recém proclamada.
A Assembleia Constituinte foi eleita em 1890, em 24 de fevereiro de 1891 a
primeira Constituição da República do Brasil. Teve como Relator o Senador Rui Barbosa, sofrendo forte
influência da Constituição Norte Americana de 1787 e da França, consagrando o Sistema de governo
Presidencialista, e a forma de Estado Federal. Abandonando assim o unitarismo e a forma de governo
republicano em substituição à monárquica.

2.1 Formas de Governo e Regime Representativo:


- Nos termos do art. 1 da Constituição de 91, a Nação adotou como forma de governo, sob
regime representativo, a República Federativa, proclamada em 15 de novembro de 1889. Declarando
a união perpétua e indissolúvel das antigas províncias, transformando-as em Estados Unidos do Brasil,
vedando qualquer tipo de segregação.

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2.2 Características:
- Instituiu a forma federativa de Estado e a forma republicana do governo (art. 1º)
- Os poderes voltaram a ser 3, sendo excluído o Poder Moderador, conforme determinação do
art. 15: “são órgãos da soberania nacional o poder Legislativo, o Executivo e o Judiciário, harmônicos e
independentes entre si”.
- O vice-presidente da república era o presidente do senado.
- Não podiam votar os mendigos, os analfabetos, os religiosos de ordem monástica e os
militares de baixa patente (art. 70).
- As penas de Galés (pena que sujeitava os condenados a andar com correntes de ferro nos
pés, e de banimento judicial foram abolidas).
- Previu-se expressamente o habbeas corpus.

2.3 Consequências:
- Separação de Igreja e Estado, não sendo mais assegurada a religião católica o status de
religião oficial.
- Estabelecido o direito de culto externo a todas as religiões. (art. 11, inc. 2)

3. CONSTITUIÇÃO DE 1934

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A confusão política, econômica e financeira, a infiltração de doutrinas totalitárias, o


esfacelamento dos ideais da revolução de 1930, agravados pela agitação da campanha presidencial
indicaram ao então presidente Getúlio Vargas, o golpe de Estado como medida de salvação pública.
Essa revolução inovou ao criar os direitos sociais no Brasil, que teve como comissão a do
Itamaraty.
A Constituição de 1934 teve como inspiração para o texto constitucional, a Constituição Alemã
de Weimar (1919) e a Constituição da Espanha de 1931. Essa Constituição ficou conhecida por
reconhecer os direitos dos trabalhadores, e foi promulgada em 16 julho de 1934.

3.1 Características:

- Determinou-se a proibição de diferença de salário para um mesmo trabalho, por motivo de


idade, sexo, nacionalidade ou estado civil.
- Instituiu-se o salário-mínimo, capaz de satisfazer, conforme as condições de cada região, as
necessidades normais do trabalhador, ou seja, jornada de oito horas diárias, repouso semanal e férias
remuneradas.
- Houve uma reforma eleitoral com a introdução do voto secreto e do voto feminino.

3.2 Consequências:

- O Supremo Tribunal Federal passou a chamar-se de Corte Suprema.


- Foi criado o mandado de segurança, para defesa de direito certo e incontestável ameaçado
ou violado por ato manifestante inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade.

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4. CONSTITUIÇÃO DE 1937

A Constituição de 1937 foi imposta pelo Ditador Getúlio Vargas em 10 de Novembro de 1937,
com o fundamento na ideia da continuidade de Vargas no poder, baseada em ideias fascista, e ficou
conhecida como Polaca, por causa da semelhança com a Constituição Polonesa de 1935.
Getúlio Vargas, o chefe de Estado era o único titular do Poder Constituinte. Esse período d a
história brasileira ficou conhecido como Estado Novo (1937 – 1945).

4.1 Características:

- Nesse período foram instituídos os seguintes documentos legais em vigor até hoje: Código
Penal, Código de Processo Penal, Leis das Contravenções Penais e consolidação das Leis
Trabalhistas (CLT).
- Foi determinado em todo o Brasil estado de emergência que perdurou durante todo o Estado
Novo.
- Pelo art. 178, os parlamentos foram fechados e as eleições suspensas. O chefe de Estado
exercia a função legislativa, por intermédio das leis constitucionais e dos decretos-leis.

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4.2 Consequências:

- Reduziu a esfera dos direitos individuais, desconstitucionalizando o mandado de segurança e


a ação popular.
- Foram abolidos os partidos políticos e a liberdade de imprensa.
- Pelo fato de ser um regime ditatorial, houve uma excessiva perseguição aos oposi tores do
governo.

5. CONSTITUIÇÃO DE 1946

A Constituição de 1946 surgiu com a renúncia de Getúlio Vargas em 1945, toma o poder o
presidente José Linhares, presidente na época do Supremo Tribunal Federal.
No período pré-eleitoral foram criados novos partidos políticos, dentre eles, Partido Social
Democrático, União Democrático Nacional Partido Trabalhista Brasileiro e Partido Comunista Brasileiro.

5.1 Características:

- A justiça do trabalho foi constitucionalizada e passou a ser um ramo do poder judiciário.

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- Para estabelecimento de impostos, era necessária lei prévia obrigatória (princípio da


legalidade tributária).
- Os juízes e tribunais só podiam ser naturais, ficando vedado os juízes de exceção. O foro
privilegiado ficou proibido.
- A retroatividade da lei Penal ficou vedada.
- A extradição de brasileiro ou estrangeiro por crime político ou de opinião não seria deferida.

5.2 Consequências:
- O Tribunal do Júri voltou a ter previsão constitucional.
- Foi garantida a assistência judiciária para os necessitados.
Com o fim das eleições assumiu a presidência do Brasil o General Eurico Gaspar Dutra,
iniciando os trabalhos para elaboração de uma nova constituição.
Com a renúncia do Presidente Jânio Quadros em 25 de agosto de 1961, ocorreu uma crise
inconstitucional que culminou com a implementação do parlamentarismo no país por meio da Emenda
Constitucional nº. 4 de 02 de setembro de 1961. Assumindo o cargo de primeiro ministro Tancredo
Neves, tomando assim a presidência da república João Goulart. Através de referendo popular em
janeiro de 1963, o parlamentarismo foi afastado do sistema político brasileiro.

6. CONSTITUIÇÃO DE 1967

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O Presidente Castelo Branco nomeou uma comissão de quatro juristas para que elaborassem
uma nova Constituição. A comissão dos quatro, era composta pelos Constitucionalistas: Levy Carneiro,
Seabra Fagundes, Orizombo Novato e Temístocles Brandão.
Por meio do AI – 4, Castelo Branco convocou o Congresso Nacional que estava fechado para
analisar, deliberar e aprovar o projeto de Constituição. Em 24 de janeiro de 1967, o projeto foi votado
e aprovado pelo Congresso com algumas mudanças determinadas pelo Ministro da Justiça Carlos
Medeiros da Silva.

6.1 Características:

- Competia à União a apuração das infrações penais contra a segurança nacional e a ordem
política e social, bem como determinar a censura em diversões públicas.
- O Presidente da República podia expedir decretos com força de Lei sobre matéria de
segurança nacional e finanças públicas.
- O Ministério Público era uma seção conjugada ao poder Judiciário.
- Toda pessoa natural ou jurídica era responsável pela segurança nacional.

6.2 Consequências:

- Reduziu a autonomia dos municípios estabelecendo a nomeação de prefeitos de alguns


municípios pelo governador.
- Houve uma criação de suspensão de direitos políticos e individuais.
- Baseou toda a estrutura de poder na segurança nacional.

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7. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº. 1 DE 1969

Em virtude de a emenda constitucional nº. 1, de 17 de outrubro de 1969, ter modificado, por


completo, a constituição de 1967, afirmamos que de fato, ela foi uma nova Constituição.
Assim, em 17 de outubro de 1969 essa Constituição foi promulgada, não de direito, mas sim
de fato, uma nova Constituição imposta, ou seja, outorgada, pelo Regime Militar.

7.1 Características:

- A garantia constitucional do Habeas Corpus ficou suspensa nos casos de crimes políticos e de
crimes contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e economia popular.
- Determinou-se o banimento, do território nacional do brasileiro que, comprovadamente, se
tornasse inconveniente, nocivo ou perigoso à segurança nacional.
- A pena de morte foi reintroduzida nos casos de guerras externas, psicológica adversa ou
revolucionária ou subversiva.
- Todos os atos praticados pelo Comando Supremo da Revolução de 31 de março de 1964 foram
aprovados e excluídos e eventual apreciação jurídica, conforme art. 181, EC. 1/69.

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7.2 Consequências:

- Elevação do período presidencial para cinco anos.


- Competência presidencial para fazer cessar a vigência de dispositivos constitucionais
mediante decretos.
- Foi reaberto o congresso nacional que elegeu no dia seguinte o novo presidente da república
General Emílio Garrastazu Médici, indicado pelas autoridades militares do governo revolucionário.
- Foram estruturados em novas bases os partidos políticos, considerados como pessoas
jurídicas de direito público e interno em conformidade com a Lei nº. 5682/71.

8. CONSTITUIÇÃO DE 1988

Primeiramente é importante citar os antecedentes da Constituição de 1988, dentre eles, a


redemocratização no Brasil que ocorreu durante o governo de Ernesto Geisel. Houve também uma
tentativa de retorno de eleições diretas para presidência da república, movimento conhecido como
“Diretas Já”.
Decretada e promulgada pela Assembleia Nacional Constituinte a Constituição de 1988 deu
forma ao regime político vigente. Manteve o governo presidencial garantindo que fossem eleitos pelo

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povo, o presidente da república, os governadores dos estados, os prefeitos municipais e os


representantes do poder Legislativo, bem como a independência e a harmonia dos poderes
constituídos.

8.1 Características:

- Os alicerces da República Federativa do Brasil são: a Soberania, Cidadania, Dignidade da


pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.
- Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos.
- Estabeleceu a faculdade do exercício do direito de voto ao analfabeto e os jovens entre 16 e
17 anos.
- Estabeleceu novos direitos trabalhistas.

8.2 Consequências:

- Poder Judiciário voltou a ter independência, com autonomia funcional administrativa e


financeira.
- Fim da censura.

8.3 Alegações finais

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é a atual lei fundamental e suprema


do Brasil, servindo de parâmetro de validade a todas as demais espécies normativas, situando -se no
topo do ordenamento jurídico.
No perambulo de nossa atual Constituição diz o seguinte:
“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para
instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos
de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida,
na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a
proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL”.

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CONCLUSÃO:

Diante de todo o exposto, concluí que as Constituições aparecem como um elemento


fundamental na organização e funcionamento das nações democráticas. São textos que devem trazer
em si os elementos integrantes (componentes ou constitutivos) do Estado, os quais são eles: soberania,
finalidade, povo e território.
A história das Constituições brasileiras mostra, na maioria dos casos, a presença de um
comprometimento deste diploma legal com os interesses das classes economicamente dominantes,
havendo, desse modo, uma legalidade direcionada para satisfação de interesses de poucos.
Em decorrência desse fato, em grande parte de nossa história, a maioria da população
brasileira se viu submetida a intensos prejuízos.
Contudo, há de se ressaltar que, a atual Constituição em vigor, apresenta inúmeros benefícios
para todas as pessoas e, além disso, apresenta mecanismos pelos quais possa haver o controle de
constitucionalidade das leis e atos das instituições, sem os quais não se poderia elaborar meios a fim
de assegurar a prevalência da ordem institucional e o respeito aos direitos garantidos a todos os
cidadãos brasileiros

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EFICÁCIA E APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

CONCEITO:

Entende-se por normas constitucionais todas as disposições inseridas numa constituição ou


reconhecidas por ela, independentemente de seu conteúdo.

Vale dizer, pouco importa o que expressam; pelo só fato de aderirem a um texto constitucional,
ou serem admitidas por ele, essas normas são constitucionais, sejam elas materiais, sejam elas formais.

AS CONDIÇÕES DE APLICABILIDADE DA NORMA CONSTITUCIONAL

As normas jurídicas, notadamente as constitucionais, são criadas para serem aplicadas. O Direito
existe para realizar-se. Dado o seu caráter instrumental, o direito é elaborado com vistas à produção de
efeitos práticos. A aplicabilidade da norma significa exatamente a possibilidade de sua aplicação. E
aplicação da norma nada mais é do que a sua atuação concreta, para reger as relações da vida real.
Mas uma norma só é aplicável se, primeiro, estiver em vigor, segundo, se for válida ou legítima;
terceiro, se for eficaz. Para essa direção apontam as lições de José Afonso da Silva, quando afirma que,
juridicamente, a aplicabilidade das normas constitucionais “depende especialmente de saber se estão
vigentes, se são legítimas, se têm eficácia. A ocorrência desses dados constitui condição geral para a
aplicabilidade das normas constitucionais.

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Em suma, são condições de aplicabilidade das normas constitucionais:

a) A vigência
b) A validade ou legitimidade;
c) A eficácia.

a) Vigência das normas constitucionais. A vacatio constitucionais.

Vigência é a qualidade de uma norma regularmente promulgada e publicada, que faz a norma
existir juridicamente e que a torna de observância obrigatória.

b) Validade ou legitimidade
Uma norma jurídica é válida quando se compadece com o sistema normativo. Considerando o
escalonamento das normas que compõem o sistema jurídico, com a existência de normas superiores e
normas inferiores, é de sustentar-se que a validade de uma norma repousa na validade de outra norma
que lhe é superior, e assim sucessivamente, até chegar à constituição, que é a fonte de validade de todo
a ordem jurídica.

c) Eficácia

A aplicabilidade da norma constitucional depende, outrossim, de sua eficácia. Ou seja, para que
possa ser aplicada, a norma deve produzir efeitos jurídicos. “Uma norma só é aplicável na medida em que
é eficaz”. Logo, “eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais constituem fenômenos complexos,
aspectos talvez do mesmo fenômeno. Encarados por prismas diferentes: aquela como potencialidade;
esta como realizabilidade, praticidade.
Enquanto a vigência refere-se à obrigatoriedade da norma e a validade à conformidade dela com
o texto constitucional, a eficácia diz respeito à capacidade de produzir os efeitos a que se preordenara.

NORMAS CONSTITUCIONAIS DE EFICÁCIA PLENA

A primeira categoria de normas refere-se às de aplicabilidade direta, imediata e integral que


são aquelas normas da Constituição que produzem todos os efeitos jurídicos possíveis de pronto, e não

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necessitam de legislação integrativa. Trata-se de normas completas, ou seja, que possuem todos os
elementos necessários para a sua aplicabilidade e eficácia plena.
No entendimento de José Afonso da Silva; “desde a entrada em vigor da Constituição,
produzem, ou têm possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses,
comportamentos e situações, que o legislador constituinte, direta ou indiretamente, quis regular”.
São aqueles, para o mesmo autor, que receberam do constituinte normatividade suficiente à
sua incidência imediata. Situam-se predominantemente entre os elementos orgânicos da Constituição.
Não se necessita de elemento ulterior para sua aplicação.
São, pois, normas que já contém em si todos os elementos necessários para sua plena aplicação,
sendo despiciendo que uma lei infraconstitucional a regulamente.
Novelino explica que “estas normas possuem aplicabilidade direta e imediata”, não dependem
de legislação posterior para que possam operar de forma integral e “não podem sofrer restrições por
parte do legislador infraconstitucional”, mas podem ter seus interesses regulados, quando necessário.
Estas normas são consideradas completas e precisas na indicação das condutas que elencam os deveres
a serem cumpridos e os direitos a serem garantidos.
São exemplos na Constituição Federal de 1988, segundo José Afonso da Silva, deste tipo de
norma constitucional:
Art. 1º, § único: Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos
ou diretamente, nos termos desta constituição.
Art. 2º: São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo
e o Judiciário.
Em geral, estas normas são responsáveis pela criação de órgãos e atribuição de competência
aos entes federativos (como podemos ver, especialmente, nos Títulos III e IV da CF), bem como, por
exemplo, são normas que estabelecem proibições (art. 145, § 2º), vedações (art. 19), isenções (art. 184,
§ 5º, I), imunidades (arts. 53 e 150, I a VI) ou prerrogativas (art. 128, § 5º, I), não exijam a elaboração
de novas normas legislativas que lhes completem o alcance e o sentido, ou lhes fixem o conteúdo,
porque já se apresentam suficientemente explicitas na definição dos interesses nelas regulados.

NORMAS CONSTITUCIONAIS DE EFICÁCIA CONTIDA

A segunda categoria apresentada por José Afonso da Silva refere-se as normas constitucionais
de eficácia contida, ou seja, têm aplicabilidade direta e imediata, mas possivelmente não integral, que

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possui eficácia plena desde sua entrada em vigor, porém seus efeitos jurídicos podem ser restringidos
pelo Poder Público em dadas circunstâncias.
De acordo com José Afonso da Silva, são aquelas em“que o legislador constituinte regulou
suficientemente os interesses relativos à determinada matéria, mas deixou margem à atuação restritiva
por parte da competência discricionária do poder público, nos termos que a lei estabelecer ou nos
termos de conceitos gerais nelas enunciados (...) que ulteriormente se lhe estabeleçam mediante lei,
ou de que as circunstâncias restritivas, constitucionalmente admitidas, ocorrem (atuação do Poder
Público para manter a ordem, a segurança pública, a defesa nacional, a integridade nacional, etc., na
forma permitida pelo direito objetivo”.
Conforme destaca Pedro Lenza, embora tendo condições de produzir todos os seus efeitos
quando da entrada em vigor da CF, podem ter sua abrangência reduzida por normas
infraconstitucionais posteriores, sofrendo restrições em sua eficácia e aplicabilidade originais, ou até
mesmo pela incidência de outras normas constitucionais na previsão de situações especiais, como da
decretação de estado de defesa ou de sítio (arts. 136, § 1 º e 139: restringem o art. 5º, XVI), bem como
por motivos de ordem pública, bons costumes e paz social.
Marcelo Novelino explica que, enquanto não existir uma outra norma que venha a restringir a
abrangência de tal norma constitucional, esta terá aplicabilidade integral. Sua aplicação original e
integral não depende de intervenção do legislador, mas sua eficácia plena é passível de res trição por
parte de, por exemplo, uma lei ordinária.
Em regra, estas normas são as que tratam de direitos individuais ou de entidades públicas ou
privadas, que são passíveis de limitação por uma lei futura, como o direito de greve no art. 9º da CF,
que foi restringido, conforme já previsto no § 1º, pela lei 7.783/89, no que se refere a serviços e
atividades essenciais.
Outros exemplos são os artigos: 5º, XII (que trata do sigilo das comunicações, restringido pela
lei 9.296/96) e 5º, XIII (restringido pelo Estatuto da OAB, no que se refere ao exercício da advocacia).
Podemos citar também como exemplos de normas constitucionais de eficácia contida os
seguintes dispositivos da Carta Magna: art. 5º, incisos VII, VIII, XXV, XXXIII, art. 15, inciso IV, art. 37, inciso
I, etc.
Resta, pois, demonstrado que a norma constitucional de eficácia contida, embora não dependa
de lei regulamentadora para ser aplicada, pode ter sua abrangência reduzida por outra norma.

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NORMAS CONSTITUCIONAIS DE EFICÁCIA LIMITADA

A terceira categoria refere-se às normas constitucionais, como ressalta Alexandre de Moraes,


de “eficácia relativa dependente de complementação legislativa”. É o que Novelino, como citado acima,
considerou como uma tendência da Constituição de 1988. De imediato, no momento da promulgação
da CF, ou, como destaca Pedro Lenza, mesmo com a “introdução de novos preceitos por Emendas à
Constituição, ou na hipótese do art. 5º, § 3º [que trata de tratados internacionais de direitos
humanos]”, não têm poder efetivo para produzir todos os seus efeitos.
José Afonso da Silva as classifica como normas que apresentam “aplicabilidade indireta,
mediata e reduzida, de eficácia limitada, porque somente incidem totalmente sobre esses interesses,
após uma normatividade ulterior que lhes desenvolva a aplicabilidade”.
Ele ainda observa que estas normas, não que não tenham eficácia, mas, na verdade, possuem
um mínimo efeito, pelo menos, vinculando o legislador infraconstitucional no sentido de proporcionar
que o interesse indicado por tal norma seja efetivado, estabelecendo um dever ao legislador ordiná rio,
condicionando a legislação futura sobre a matéria ao critério de constitucionalidade, declarando nossa
concepção de Estado e sociedade, inspirando o ordenamento jurídico visando seus fins sociais,
proteção de valores e busca do bem comum, dando sentido à interpretação, integração e aplicação das
leis, condicionando a atividade do Poder Público e, principalmente, estas normas “possuem eficácia ab -
rogativa da legislação precedente incompatível”, destaca Novelino, e impedem “que o legislador edite
normas em sentido oposto ao assegurado pela Constituição”.
Segundo a classificação de José Afonso da Silva, as normas de eficácia limitada possuem duas
subespécies: normas de princípio instituitivo (ou organizatório) e normas de princípio programático.

Normas de princípio institutivo


(ou organizativo)
EFICÁCIA LIMITADA (Precisa de regulamentação
para produzir os seus efeitos) Normas de princípio programático

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1. Normas de princípio instituitivo

As normas de princípio instituitivo, comenta Novelino, “dependem da lei para organizar ou dar
estrutura a entidades, órgãos ou instituições previstos na Constituição”. Possuem conteúdo
organizatório e regulativo, indicando que uma legislação futura deverá dar eficácia e aplicação efetiva
ao dispositivo. Estabelecem esquemas gerais para o legislador ordinário complementar o que foi
iniciado, com critérios, requisitos, condições e circunstâncias previstos na norma constitucional. São
exemplos os arts.: 18, § 2º; 22, parágrafo único; 25, § 3º; 33; 37, XI; 88; 90, § 2º; 91, § 2º; 93; 102, § 1º;
107, § 1º; 109, VI; 109, § 3º; 113; 121; 125, § 3º; 128, § 5º; 131; 146; 161, I; 163; 192 e 224.
Podem ser normas impositivas, determinando obrigatoriamente a criação de uma legislação
integrativa para a matéria (ex.: art. 20, § 2º; 32, § 4º; 33; 88; 90, § 2º; 107, parágrafo único; 109, VI;
111, § 3º; 113; 121 e 128, § 5º), ou normas facultativas/permissivas, indicando, sem obrigar, o
desenvolvimento de norma posterior que regule a situação envolvida (ex.: art. 22, parágrafo único; 25,
§ 3º; 125, § 3º; 154, I e 195, § 4º).
Mas, segundo José Afonso da Silva, estas normas são de pouca eficácia, pois não trazem
nenhuma sanção específica caso as determinações ou indicações não “saiam do papel”, e o legislador
não poderá ser constrangido a legislar, e, caso haja lei preexistente que não seja incompatível, esta lei
não é revogada, continua podendo ser usada no caso concreto, “aliviando a barra” do legislador.
As normas constitucionais de princípio institutivo são aquelas às quais o constituinte preferiu
deixar a sua regulamentação, ou seja, como ela produzirá seus efeitos jurídicos, a cargo do legislador.
Assim, é a lei ordinária que fará com que estas normas constitucionais sejam aplicadas integralmente,
atingindo sua eficácia plena.

2. Normas de princípio programático

As normas programáticas são aquelas que carregam em seu conteúdo um princípio, um


programa, uma meta. Tem caráter ético-social. Elas trazem em si a finalidade do Estado. Estas normas
não requerem do legislador ordinário apenas uma lei. Elas demandam de todos os poderes públicos o
estabelecimento e respeito a uma orientação ideológica específica.
São aquelas em que o legislador não regula nem direta nem indiretamente um interesse, mas
indica princípios que o Estado deve adotar como fim e objetivo. Elas impõem ao Estado uma obrigação,
mas não apontam, diferentemente das anteriores, com que meios os resultados esperados deverão ser

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atingidos. Como destaca Lenza, elas “veiculam programas a serem implementados pelo Estado, visando
a realização de fins sociais (art. 6.º – direito à alimentação; 196 – direito à saúde; 205 – direito à
educação; 215 – cultura; 218, caput – ciência e tecnologia; 227 – proteção da criança…)”.
Localizadas especialmente nos Títulos VII e VIII da CF, o conteúdo delas traz esquemas
genéricos, diretrizes e programas de ação que preveem, inclusive, a interferência do Estado na ordem
econômico-social a fim de garantir a promoção da democracia, e se subdividem em três subcategorias:
normas programáticas vinculadas ao princípio da legalidade, referidas aos poderes públicos e as
dirigidas à ordem econômico-social em geral.
As vinculadas ao princípio da legalidade indicam que o programa previsto deverá ser
implementado por legislação futura, dependendo da atividade do legislador.
São exemplos, segundo José Afonso da Silva, de normas programáticas vinculadas ao princípio
da legalidade na Constituição Federal de 1988:
Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhor ia
de sua condição social: XI: participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e,
excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei;
Art. 7º, XX: proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos
termos da lei;
Neste caso, destacamos o exemplo do art. 37, VII da constituição brasileira (o direito de greve
será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica), que determina que o direito de
greve dos servidores públicos será exercido nos termos da lei. Para Afonso da Silva trata-se de norma
constitucional limitada, ou seja, o direito de greve do servidor público somente poderá ser exercido
após a emissão de lei complementar.
Na prática, é quase o mesmo que recusar o direito prometido; primeiro porque, se a lei não
vier o direito não existirá; segundo porque, vindo, não há parâmetro para seu conteúdo, tanto pode
ser mais aberta como mais restritiva. Depende da correlação de forças, por isso, é melhor constar o
direito com esses condicionamentos do que não ser constitucionalmente reconhecido (SILVA, 1998)
As referidas aos poderes públicos não mencionam legislação, e nem sempre precisam de lei
para os programas serem implementados, mas vinculam todo o Poder Público a uma obrigação (ex.:
art. 21, IX; 48, IV; 184; 211, § 1º; 215, caput e § 1º; 216, § 1º; 217; 218 e 226).
Já as dirigidas à ordem econômico-social postulam que qualquer conduta neste âmbito
praticada no sentido oposto ao da determinação constitucional será considerada inconstitucional, uma
violação ao Ordenamento Magno, passível de invalidação (ex.: art. 170; 193; 196 e 205)

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A noção de supremacia da Carta Maior frente às outras normas jurídicas decorre de sua gênese,
embasado em um poder fundador e instituidor dos demais poderes, nascendo daí seu epíteto, poder
constituinte. O poder constituinte pode ser analisado em uma tripla perspectiva, qual seja: originário,
derivado e o revisor, o primeiro trata-se do poder de elaborar as cartas constitucionais, o segundo tem
como atribuição a reforma das constituições, como objetivo de adequá-las ao contexto social e político
vigente e o terceiro aconteceu extraordinariamente cinco anos após a promulgação da Constituição de
1988.
As normas confeccionadas pelo poder constituinte – seja o originário, derivado ou revisional –
estão insertas em um corpo normativo, à Constituição, situado em uma posição de primazia às demais
normas do ordenamento jurídico.

1. ESBOÇO HISTÓRICO

A análise do Poder Constituinte, nos traços que hodiernamente se conhece, remete-se


indispensavelmente, ao movimento constitucionalista do Século XVIII (Revolução francesa – 1789 e

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Constituição americana – 1787), que teve como foco a real participação dos cidadãos na formação de um
Estado Democrático de Direito.
Gerado nos estudos do abade francês Joseph Sieyés, o Poder Constituinte, é fundamentalmente
um poder de características políticas e filosóficas, vez que funda a disposição constitucional que irá
gerenciar a vida de certa nação.
Foi exatamente o abade Sieyés quem explicitou, pela primeira vez, na antevéspera da Revolução
Francesa, o Poder Constituinte como fonte da Constituição e dos demais poderes, no revolucionário
panfleto intitulado Que é o Terceiro Estado?cujas ideias principais delinearemos a seguir:
O próprio movimento constitucionalista remete-se à análise do Estado e a conformação no qual
este se expôs durante a história, tendo como foco inicialmente a delimitação de sua teoria, no intuito de
construir fundamentos teóricos pertinentes e necessários ao rompimento com Absolutismo reinante a
época.

2. O PODER CONSTITUINTE E O PENSAMENTO DE SIEYÈS

Emmanuel Joseph Sieyès (1748-1836), mais conhecido como abade Sieyès, teve participação
decisiva para eclosão da Revolução Francesa em face da publicação de seu panfleto intitulado Qu´est-ce
que le tirs Éta?, que foi um dos mais importantes e notórios estopins da Revolução, representando um
manifesto da causa revolucionária, onde foram lançadas as reivindicações do Terceiro Estado (a
burguesia), na sua luta contra o absolutismo e os privilégios dos outros dois Estados, o clero e a nobreza.

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Sieyès identificou a nação (ou povo) ao terceiro Estado (a burguesia). Em seu opúsculo, ele partiu
de três indagações que ele mesmo se dispôs a responder:

1) O que é o Terceiro Estado? Tudo;


2) O que tem sido ele, até agora, na ordem política? – Nada;
3) O que é que ele pede? – Ser alguma coisa.

O Terceiro Estado era tudo porque desempenhava todas as tarefas necessárias à vida de uma
comunidade, reunindo todas as condições para constituir uma nação. Apesar disso ele era nada, porque
a nação contava com privilégios, haja vista que o clero e a nobreza, que nada faziam, concentravam os
privilégios e usurpavam os direitos do povo. Assim, reagindo a essa situação, o Terceiro Estado
apresentou, por meio de Sieyès, uma pauta de reivindicações, com as seguintes petições:

1) Que os representantes do Terceiro Estado sejam escolhidos apenas entre os cidadãos que
realmente pertençam ao Terceiro Estado;
2) Que seus Deputados sejam em número igual ao da nobreza e do clero; e
3) Que os Estados Gerais votem por cabeça, não por ordem.

No seu manifesto, Sieyès distinguiu três fases na formação da sociedade política. Na primeira,
ele indicou a existência de indivíduos isolados, que, pelo fato de desejarem se reunir, seriam a eles
atribuídos direitos de uma nação. Na segunda, esses indivíduos, agora reunidos, passaram a deliberar
sobre as necessidades comuns e a forma como satisfazê-las. Finalmente, numa terceira fase, em razão da
grande quantidade de indivíduos e de sua dispersão por um território extenso, ficam eles impossibilitados
de adotar diretamente posições comuns, ensejando a necessidade de delegarem as decisões da
coletividade a alguns integrantes desta, que passariam a ser seus representantes. É exatamente aqui, na
terceira fase, que Sieyès sustenta a necessidade de uma constituição para organizar esse corpo de
representantes, as suas formas, as funções que lhe são destinadas e os meios para desempenhá-las.
O abade Sieyès, portanto, defende a existência de um poder legítimo, cujo titular seria a nação,
para criação da constituição. Esse poder, para ele, é um poder de direito, que não encontra limites em
direito positivo anterior, mas apenas no direito natural, existente antes da nação e acima dela. Ademais
esse poder é permanente e incondicionado. Ele distingue, outrossim, o Poder Constituinte dos poderes
constituídos. Aquele, ilimitado, autônomo e incondicionado, é que cria a Constituição. Este, limitado e
condicionado, desempenha apenas as funções e atribuições que o poder originário lhe concede.

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3. ESQUEMATIZAÇÃO DO PODER CONSTITUINTE.

O poder constituinte se divide em poder constituinte originário e poder constituinte derivado.


Este último ainda se subdivide em reformador, revisor, decorrente,e difuso, conforme abaixo:

4 . CONCEITO DE PODER CONSTITUINTE.

Os conceitos formulados pelos doutrinadores brasileiros são análogos e seu objeto evoca a
formação de uma Carta Constitucional. Vejamos o que dizem os grandes doutrinadores do tema:
CANOTILHO diz que: “o poder constituinte, como próprio nome indica, visa constituir, criar,
positivar normas jurídicas de valor constitucional”.
Para BONAVIDES o poder constituinte é “um poder político, um poder de fato, um poder que não
se analisa em termos jurídicos formais e cuja existência e ação independem de configuração jurídica”.
O poder constituinte não se subordina a qualquer outro, possui sua própria natureza, é
absolutamente livre, se expressando do modo que lhe convier, se funda sobre si mesmo, precisamente
por ser antecedente ao ordenamento jurídico e consequentemente aos poderes constituídos.
Resta demonstrado homogeneidade doutrinária acerca da conceituação do Poder Constituinte.

4.1 -NATUREZA - A natureza do Poder Constituinte está relacionada diretamente à disputa entre
as correntes jusnaturalista e juspositivista acerca do que é o Direito.

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Para os adeptos da corrente jusnaturalista, o Poder Constituinte é, inegavelmente, um poder de
direito, porque assentado no direito natural, que lhe é anterior e superior. Essa era a posição de Sieyès,
para quem antes da nação e acima dela só há o direito natural, que fixa os fundamentos de existência e
exercício do próprio Poder Constituinte.

O poder Constituinte, assim, para os jusnaturalistas é um poder jurídico que decorre do direito
natural, anterior ao próprio Estado que funda. Contudo para o positivismo jurídico, que entende que
o Direito somente é Direito quando positivado, o Poder Constituinte é um poder de fato, porque se
impõe como tal, funda a si mesmo e não em Direito pré-existente.

Com efeito, no pensamento jurídico contemporâneo, o Poder Constituinte é o poder que cria e
organiza o Estado, através da Constituição. A Constituição, por sua vez, é a primeira norma jurídica posta,
e fundamento maior e último de validade de todas as demais manifestações normativas do Estado. O
Poder Constituinte, fundamento de validade da própria Constituição, evidentemente precede ao próprio
Direito, não se baseando em nenhuma regra jurídica precedente. Nesse sentido, pode-se afiançar a tese
de ele ser um poder de fato, ou seja, um poder que se impõe como tal, como força ou energia social; um
poder exclusivamente político ou histórico, não jurídico, anterior ao Estado. Essa é a posição dominante,
porque dominante é a corrente juspositiva.

5. TITULARIDADE E EXERCÍCIO DO PODER CONSTITUINTE (ART. 1º PARÁGRAFO ÚNICO CF/88).

Importante ponto a assinalar sobre a matéria é que modernamente a titularidade do poder


constituinte é dada ao povo (e não à nação), uma vez que é ele quem detém a legitimidade para
determinar quando e como deverá ser elaborada a nova constituição.

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Hodiernamente, é dominante na doutrina brasileira que a titularidade do Poder Constituinte
concerne ao povo, pois o Estado emana da soberania popular, cujo conceito é mais amplo do que o de
Nação, assim, os anseios constituintes na verdade são aspirações populares propagadas por meio de seus
representantes.
A doutrina contemporânea afirma ainda que o Poder Constituinte se originou do advento das
Constituições escritas, com a finalidade de limitar o poder do Estado e preservar os direitos e garantias
individuais.
MELLO legitimando este ponto de vista, ensina que as “Assembleias Constituintes não titularizam
o Poder Constituinte. São apenas órgãos aos quais se atribui, por delegação popular, o exercício dessa
magna prerrogativa”.
A Carta Magna de 1988 no seu art. 1ºParágrafo único afirma ser o povo o detentor da soberania,
onde todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos
termos desta Constituição.
O povo reconhecidamente é titular do Poder Constituinte, mas a ele não cabe o exercício direto
do mesmo, havendo uma titularidade passiva, ao qual se atribui uma vontade constituinte que é sempre
executada por um pequeno grupo social.
Assim há distinção do titular do Poder Constituinte daquele que o exerce, onde o titular é
necessariamente o povo e o exercente aquele que, em nome do povo, constrói o Estado, editando e
reformando a carta constitucional.

6. PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO (GENUÍNO; PRIMÁRIO; DE PRIMEIRO GRAU).

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O Poder constituinte originário, genuíno ou de 1ºgrau instaura novo agrupamento social e
político, com fulcro de organizar e conceber poderes com fins de reger os anseios de uma sociedade.
Teoricamente ele é percebido como uma manifestação soberana da máxima aspiração política
de um povo, social e juridicamente aparelhado. A inteligência de um Poder Constituinte é amparo racional
de que há um documento legal súpero ao resto do ordenamento jurídico, que em princípio não pode ser
alterado pelos poderes estabelecidos, já que ele é fonte de autoridade e soberania destes.
É o poder que tem como razão de existência o início de uma nova ordem jurídica, seja pelo
nascimento de um Estado, por exemplo, como ocorreu com os Estados Unidos da América em 1776, ou
porque uma Constituição é abandonada em detrimento de outra, como no caso da República Federativa
do Brasil de 1988, esta pode ser realizada por diversas formas, tais como: democrática, revolucionária e
por golpe de Estado.
O poder constituinte de primeiro grau é a legitimação de uma nova forma de Poder, assentado
na concepção de soberania nacional e popular, conferindo expressão jurídica às estes termos, imbuídos
de filosofia iluminista e do pensamento mecanicista, historicista e antiautoritário das razões francesas.
Esta espécie de poder se traduz incessantemente como um atributo de força, legitimação com
competência de garantir, criar ou destruir uma constituição de um determinado Estado, alterando a sua
estrutura e informando novos valores a nação.

6.1 CONCEITO – Cuida-se do poder que estabelece a Constituição. Por isso mesmo, não se prende
a quaisquer limites: é essencialmente político, ou seja, é poder de fato, na dicção da generalidade da
doutrina. É poder político supremo, destinado a elaborar o texto da Constituição do Estado e que, para
tal mister, não encontra qualquer condição ou limites pré-estabelecidos no Direito, pois a este precede.

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6.2. CARACTERÍSTICAS DO PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO

Na teoria de Sieyes, Poder Constituinte originário, tem como características ser inicial, autônomo
e onipotente. Inicial porque não há anterior a ele nenhum outro poder, situando-se nele por primazia o
desejo da vontade soberana. É um poder autônomo, pois é o único capacitado a deliberar o modo e o
tempo da nova Constituição, e Onipotente porque não se encontra subordinado a nenhuma forma ou
comando.
Destaca-se, ainda que o Poder Constituinte é imperecível, vez que não desparece com a
consumação de sua obra, ou seja, com a criação de uma nova Constituição. Sieyés, ao tratar sobre o tema,
diz que “o Poder Constituinte não esgota sua titularidade, que permanece latente, manifestando-se
novamente mediante uma nova Assembleia Nacional Constituinte ou um ato revolucionário”.

Autônomo- Só ao seu exercente cabe fixar os termos em que a nova Constituição será
estabelecida e qual o Direito deverá ser implantado.

Inicial – Inaugura uma nova ordem jurídica, rompendo com a anterior. Isso significa que ele
revoga a Constituição anterior e todas as normas infraconstitucionais que com a nova ordem forem

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incompatíveis. Por isso mesmo, o Poder Constituinte é, simultaneamente, Constituinte e Desconstituinte,
na medida em que quando constitui uma nova ordem, desconstitui, ipso facto, a anterior.

Incondicionado – É Incondicionado, porque não se sujeita a nenhum processo ou procedimento


prefixado para a sua manifestação. Pode agir livremente, sem condições ou formas pré-estabelecidas.
Não está condicionado a nenhuma fórmula prefixada.

Ilimitado – Porque é soberano e não sofre qualquer limitação prévia do Direito, exatamente pelo
fato de que a este preexiste. Chama-se a atenção para o fato de que a doutrina moderna vem rejeitando
esta compreensão. Isso porque, assim como o povo não dispõe de um poder absoluto sobre a
Constituição, o Poder Constituinte Originário também possui limites, pois não é capaz de emprestar à
Constituição todo e qualquer conteúdo, sem atender a quaisquer princípios.

Permanente - Pois não se exaure com a elaboração da Constituição. Ele continua presente, em
estado de hibernação, podendo a qualquer momento ser ativado pela vontade sempre soberana do seu
titular.

6.3 FORMAS DE EXPRESSÃO DO PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO

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Não existe procedimento determinado pelo qual se apresenta o poder constituinte originário,
uma vez que tem como características ser incondicionado e ilimitado. Analisando historicamente a
constituição de diversos países, há a possibilidade de assinalar duas formas básicas de expressão do poder
constituinte originário, qual seja:

6.3.1 HISTÓRICO - Aquele poder atribuído a um número determinado de seres humanos, que
irão exercer um poder soberano em nome de todos os demais integrados numa sociedade política,
estável, e âmbito geral e de base territorial tendo por fim governar pessoas e administrar os meios
segundo os fins dessa associação, a qual conhecemos como Estado. Será este poder, então, capaz de
estabelecer uma nova ordem constitucional, sendo assim responsável pelas leis fundamentais de sua
respectiva nação. É dotado deste poder todo o indivíduo a quem se atribui a tarefa de criar as leis
fundamentais do Estado, que servirão de orientadoras para todas as leis infraconstitucionais, ou seja,
aquelas subordinadas e convalidadas pela Constituição.
No Brasil, a última Assembleia Constituinte instaurada foi justamente a que apresentou o texto
da Constituição Federal de 1988, que vigora até hoje.

6.3.2 REVOLUCIONÁRIO –É o que elabora uma nova Constituição que substitui a anterior,
rompendo de forma estrutural, com a antiga ordem política e social. A expressão revolução é empregada
para demonstrar a profunda ruptura com o sistema político e social que vigorava em determinado Estado.
Não há necessidade que se trate de uma revolução bélica, isto é, armada, contenciosa, podendo ser
também uma revolução branca, pacífica, oriunda de plebiscito ou outra manifestação popular. É essencial,
no entanto, para que seja realmente um poder constituinte originário, que haja essa ruptura profunda
com a estrutura central da ordem política. A Constituição brasileira de 1.967, por exemplo, consagrou a
ditadura militar, rompeu com o sistema democrático vigente. Já a impropriamente chamada Constituição
de 1.969 não alterou a estrutura do poderio militar, manteve a ditadura então vigente, por isso, não pode
ser considerada Constituição, mas sim uma emenda constitucional. Quanto à Constituição de 1.988,
representou sim a ruptura definitiva com o regime militar ditatorial e a consagração do regime
democrático, sendo, pois, fruto de um Poder Constituinte Originário Revolucionário, embora a revolução
tenha sido branca.

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7. PODER CONSTITUINTE DERIVADO (INSTITUIDO. CONSTITUÍDO OU DE SEGUNDO GRAU)

Como o próprio nome indica, o poder constituinte derivado é aquele que deriva do poder
originário, o qual por essa razão também é chamado de instituído, constituído ou de segundo grau. São
características principais desse poder:

Derivado • Deriva do poder originário

• Limita-se aos próprios termos do


Limitado poder constituinte originário.

• Condiciona-se ao que foi


Condicionado estabelecido na constituição.

É o poder criado pelo poder constituinte originário, para proceder às outras criações normativas
de índole constitucional, seja alterando o texto constitucional original, seja criando outras de nível menor.
Nos Estados de organização federal, como o Brasil, o Poder Constituinte Derivado não se limita a
reformar a Constituição. Abrange também a competência para a instituição e organização de
coletividades políticas regionais (os chamados Estados-membros da Federação).
O poder constituinte derivado pode ser: reformador que é aquele destinado a alterar a
Constituição, podendo essa reforma consistir em acréscimo, modificação ou supressão de parte do seu
texto; Já o decorrente é aquele cuja competência consiste em elaborar ou modificar as Constituições dos
Estados-membros da Federação. Por fim revisor, como o próprio nome diz, revisou a Constituição por
meio de regras mais simplificada.
O Poder Constituinte Derivado, é um poder essencialmente limitado, porque se insere na
Constituição e é limitado por ela. As limitações constitucionais do Poder Derivado abrangem as suas duas

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espécies e alcançam todas as suas manifestações – o poder de reforma, por meio de emendas e de
revisões; e o poder decorrente, por meio de elaboração e da alteração das Constituições estaduais. Essas
limitações, todavia, são mais visíveis e diretamente relacionadas ao Poder Constituinte de Reforma,
manifestando-se como vedações às reformas constitucionais, diante de certas contingências valoradas
constitucionalmente.

7.1 PODER CONSTITUINTE DERIVADO REFORMADOR (De emenda; de mudança):

➢ Reforma normas criadas pelo Poder Constituinte Originário;


➢ Emendas Constitucionais;
➢ Congresso Nacional

Conceito – É aquele que se destina à reforma da Constituição. Sua existência está ligada ao fato
de ser muito complicado, na prática e sem qualquer sentido, na teoria, convocar o Poder Constituinte
Originário todas as vezes em que fosse necessário alterar a Constituição. Alguns preferem denomina-lo,
acertadamente, de competência reformadora.
Entre nós, o poder reformador, atualmente, manifesta-se apenas por meio do procedimento de
Emendas à constituição, na forma do art. 60 da Constituição Federal. As Emendas Constitucionais são
proposições destinadas à alteração pontual do texto constitucional, cujo procedimento se encontra

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definido na própria Constituição, que adota, com rigor, formalidades solenes e complexas, tornando a
nossa Constituição rígida.

7.2 CARACTERÍSTICAS DO PODER CONSTITUINTE DERIVADO REFORMADOR:

O poder constituinte derivado reformador não esboça as mesmas particularidades do Poder


constituinte originário, pois um advém do outro, daí se arrebata a sua exordial característica, qual seja, a
derivação, já que ele se origina de outro poder que é estabelecido na própria constituição, além de
descender, ele é também subordinado ao Poder constituinte que o criou, existindo uma série de limites
que podem ser explícitos, quando aparecem no texto constituinte, e implícitos, já que não constam
expressamente na constituição.
A doutrina tem o hábito de diferenciar a titularidade do exercício do Poder Constituinte, sendo
entendimento majoritário que a primeira é pertencente ao povo, ou seja, os anseios do constituinte é a
vontade do povo, que se apresenta por meio de seus representantes legais. No Brasil, a atribuição para
exercício do poder constituinte derivado predito pela Constituição Federal de 1988 compete aos membros
do Congresso Nacional, na figura dos deputados federais e senadores devidamente eleitos, que efetuam
função legislativa proveniente do Poder legislativo e extraordinariamente idem exercem a função
reformadora que advém do poder constituinte derivado.
Maior parte da doutrina afirma que a reforma constitucional é um procedimento técnico de
alteração constitucional, sendo ela tida como gênero do qual são espécies a revisão constitucional e a
emenda.
A emenda constitucional é uma modificação da constituição de um Estado, resultando em
mudanças pontuais do texto constitucional, advindos de um processo legislativo rígido previsto na própria
Carta Magna. Já a revisão é ampla alteração da redação do texto constitucional, destinando-se ao
processo de transformações constitucionais pelos procedimentos e conformação as demarcações
estabelecidas na Magna Carta.
a) É derivado – Porque é poder de direito, juridicamente estabelecido, fundado no Poder
Constituinte Originário. Ou seja, provém ou deriva deste.
b) É limitado – Porque a Constituição lhe impõe limitações, que podem ser temporais,
circunstanciais, materiais ou procedimentais, explícitas ou implícitas, restringindo o seu exercício;
c) É condicionado – Porque só pode manifestar-se de acordo com as formalidades traçadas
pela Constituição. Está sujeito, pois, a um processo especial previamente estabelecido pela Carta Magna.
d)

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7.3 LIMITES AO PODER CONSTITUINTE DERIVADO REFORMADOR

É o poder que garante a possibilidade de reforma e modificação da constituição, restringindo-se


às limitações impostas pelo texto constitucional, conforme seguem.

Essas limitações estão dispostas no artigo 60 e seguintes da CF de 1988, ao dispor sobre a forma
de modificação da constituição através de emendas:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:


I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-
se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.
§ 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de
defesa ou de estado de sítio.
§ 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos,
considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.
§ 3º A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do
Senado Federal, com o respectivo número de ordem.
§4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;

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II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
§ 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode
ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.

Limitações materiais

São as limitações dispostas no parágrafo 4º do artigo 60, transcrito acima. As disposições


inseridas no referido parágrafo são chamadas de cláusulas pétreas.

Limitações circunstanciais

Em que circunstancias a CF de 1988 não poderia ser alterada? Nos casos do artigo 60, parágrafo
1º:

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Limitações formais ou procedimentais

São as limitações impostas à propositura de emenda constitucional (quem pode propor e


quórum), bem como relativamente às demais fases do processo legislativo de sua criação.

Ainda nessa lógica, pode uma proposta de emenda que foi rejeitada ser votada novamente na
mesma sessão legislativa? Não, essa é também uma limitação formal.

Limitações temporais

É válido assinalar a existência dessa limitação, embora ela não tenha sido prevista na CF de 1988.
Trata-se do caso em que se impõe previsão de tempo para alteração de uma constituição. No nosso caso,

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no dia seguinte à promulgação da CF de 05 de outubro de 1988, ou seja, no dia 06 do mesmo mês e ano
já se poderia alterá-la.

8. PODER CONSTITUINTE DERIVADO DECORRENTE (Secundário Federativo):

Cada Estado tem capacidade de: Auto-organização; Autogoverno e Autoadministração.

Quem irá exercer o poder constituinte derivado decorrente em cada Estado? As assembleias
legislativas.

O poder decorrente é o que foi atribuído aos estados a fim de que possam elaborar suas próprias
constituições. É preciso salientar que pelo princípio da simetria, o poder constituinte derivado decorrente
não permite que os estados estruturem suas constituições de encontro aos preceitos limitativos da CF de
1988. Entretanto, isso não significa que não possam complementá-la, pois lhes é dado o direito de atuar
de forma residual. Portanto, é certo dizer que: O poder constituinte derivado decorrente autoriza os
estados-membros a estabelecerem em suas Constituições estaduais disposições que, embora não estejam
previstas pela CF, complementem-na. (CESPE – TCE – 2015).
Assim como o poder constituinte derivado, esse poder também encontra limitações. São
exemplos os princípios constitucionais sensíveis, os princípios constitucionais estabelecidos ou
organizatórios e os princípios constitucionais extensíveis, conforme seguem:

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9. LIMITES AO PODER CONSTITUINTE DERIVADO DECORRENTE

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10. PODER CONSTITUINTE DERIVADO REVISOR.

Ele revisa a Constituição Federal por meio de regras mais simplificada, branda, pois é transitório,
ou seja, mais brando do que a EC.
O poder constituinte derivado revisor foi um mecanismo extraordinário. Foi somente uma vez no
ano de 1993, cinco anos após a promulgação da nossa Constituição. Dessa forma nunca mais pode passar
por este tipo de revisão, somente a revisão ordinária.
Por que houve necessidade de realizar uma revisão da Constituição Federal em 5 anos após a sua
promulgação? Foi o tempo necessário para a sociedade se adaptar à nova Constituição e verificar todas
as reformas necessárias.

Qual a diferença entre Poder Constituinte Derivado Reformador e o Poder Constituinte


Derivado Revisor?

A diferença é que a atuação do Poder Constituinte Derivado Revisor é extraordinário, conforme


está prevista no art. 3º do ADCT, já a atuação do Poder Constituinte Derivado Reformador é ordinária,
conforme art. 60.

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Art. 60 CF/88 – Poder Art. 3º - Poder Constituinte


Constituinte Derivado Derivado Revisor
Reformador

-2 turnos na Câmara dos -Um turno no Congresso


deputados; Nacional em sessão
-2 turnos no Senado Federal; unicameral;
-Quorum: maioria qualificada -Quorum: Maioria absoluta.
(3/5)

Outras espécies de Poder Constituinte: Difuso e Supranacional

Somadas a essas duas formas tradicionais de poder constituinte, (originário e derivado) doutrinas
contemporâneas acolhem a existência de mais duas espécies de poder constituinte, quais sejam: o poder
difuso e o poder constituinte supranacional.

11. PODER CONSTITUINTE DIFUSO

É manifestado mediante as chamadas mutações constitucionais, que podem ser concebidas


como mudanças interpretativas no texto da Constituição, sem que haja uma alteração em sua estrutura

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formal. A norma expressa conserva-se com a mesma escrita, alterando apenas a sua acepção
interpretativa, onde é adotada uma nova interpretação ao texto constitucional.
Pode ser caracterizado como um poder de fato e que serve de fundamento para os mecanismos
de atuação da MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL.
Se por um lado a mudança implementada pelo poder constituinte derivado reformador se
verifica de modo formal, palpável, por intermédio das Emendas Constitucionais, a modificação produzida
pelo poder constituinte difuso se instrumentaliza de modo informal e espontâneo e que decorre dos
fatores sociais, políticos e econômicos. Trata-se de processo informal da mudança da Constituição,
alterando o seu sentido interpretativo, e não o seu texto que permanece intacto e com a mesma
literalidade

12. PODER CONSTITUINTE SUPRANACIONAL

➢ Cidadania universal (Tratados e Convenções Internacionais);


➢ Monismo (único ordenamento jurídico mundial);
➢ Constitucionalismo global.

Baseia-se na ideia de cidadania universal, na qual há uma maior relativização no princípio da


soberania estatal, onde as Constituições assentem ao direito comunitário, tornando-se Textos
Constitucionais supranacionais, globalizando o direito constitucional e acolhendo em especial, a influência
do Direito Internacional dos Direitos Humanos.

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Em intreressante estudo, Marcelo Neves demonstra a tendência mundial de superação do
“constitucionalismo provinciano pelo transconstitucionalismo”, mais adequado para solução dos
problemas de direitos fundamentais ou humanos e de organização legítima de poder.

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PRINCIPIOS FUNDAMENTAIS DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

No decorrer da história, uma série de princípios foram criados para nortear e estruturar o Estado
de Direito1. Esses princípios podem ser observados nas Constituições existentes no mundo, pois elas são
responsáveis por definir a estrutura básica, fundamentos e bases para determinado sistema.
Os princípios foram influenciados principalmente pelas Revoluções Francesa e Americana. No
Brasil, desde o século XIX, havia certa resistência na elaboração de uma Constituição Brasileira, visto que,
o país era comandado por um rei que tinha suas regras próprias. Com o passar dos anos, foram criadas
sete constituições que fizeram mudanças na história do país. A partir delas, muitos princípios foram
implantados e, atualmente, representam o pilar do Estado Brasileiro.

1.1 O QUE É PRINCÍPIO?

A palavra princípio no dicionário significa o início de algo, o que vem antes, a causa, o começo e
também um conjunto de leis, definições ou preceitos utilizados para nortear o ser humano. É uma verdade
universal, aquilo que o homem acredita como um dos seus valores mais inegociáveis.

1 Modelo de estado onde a lei conduz a vida social e também a do Estado. Através da lei, todas as competências e funções dos
órgãos do Estado são definidos, além disso, os cidadãos estarão protegidos por meio de mecanismos que lhes darão o direito de
requerer do Estado, quando este não tiver cumprido os seus objetivos.

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Por exemplo, ouvimos em diversos lugares que: “Todos têm direitos iguais”. Esse trecho está
presente no Artigo 5º da Constituição Federal. Ele é apenas uma pequena parte da infinidade de
benefícios, se pode dizer assim, pertinentes à população.
Uma vez que seja direito de todo cidadão brasileiro ter ciência dos seus benefícios e garantias –
e deveres, é claro – é uma iniciativa ponderada e a prática da cidadania exercer esse direito do cidadão
que também é um princípio.
Se por um lado a palavra “principio”, que vem do termo latino principium, principii, traz ínsita a
ideia de começo, origem, base, ponto de partida, podemos imaginar, também, que os princípios
fundamentais significam, do mesmo modo, o ponto de chegada em interessante ciclo que se fecha.

1.2 PRINCIPIOS FUNDAMENTAIS

Os princípios fundamentais encontram-se no início da Constituição, mais precisamente no Título


I, arts. 1º a 4º. Por meio deles, o constituinte fixou a estrutura do Estado brasileiro, condensando as
escolhas políticas fundamentais de conformação da vida estatal.

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DICA: Tudo o que estiver no Título I da CF é igual a Princípios Fundamentais. Todo fundamento da
República Federativa do Brasil é um princípio fundamental, mas nem todo princípio fundamental é
um fundamento da República Federativa do Brasil.

Passemos a tratar de cada um dos artigos.

✓ art. 1º, caput: estabelece que a República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito;
✓ art. 1º, I a V: define os fundamentos da República Federativa do Brasil;
✓ art. 1º, parágrafo único: trata da democracia semidireta ou participativa;
✓ art. 2º: estatui a separação de “Poderes”;
✓ art. 3º: trata dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil;
✓ art. 4º: estatui os princípios que regem a República Federativa do Brasil em suas relações
internacionais.

1.3 FUNDAMENTOS DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL:

O art. 1º, I a V, enumera os fundamentos da República Federativa do Brasil. Vamos detalhar cada
um desses incisos:

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Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I – a soberania;
II – a cidadania;
III – a dignidade da pessoa humana;
IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V – o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos
ou diretamente, nos termos desta Constituição.

✓ Soberania: A soberania aqui tratada é a soberania nacional, enquanto poder do Estado


supremo e independente do conjunto formado pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
Discute-se, na atualidade, a amplitude da soberania de determinado Estado, especialmente diante da
ideia de um poder constituinte transnacional ou supranacional. Esse parece ser o grande desafio, qual
seja encontrarmos um equilíbrio entre a soberania do Estado e a necessidade de adequação ao conjunto
dentro da ideia de um constitucionalismo globalizado.
Soberania é a capacidade de criar o ordenamento jurídico próprio. Divide-se em soberania
interna e externa. Soberania interna é a supremacia do Estado, em relação a toda a ordem interna e, de
outro lado, a soberania externa corresponde à sua independência no plano internacional, de modo a agir
apenas em coordenação a países estrangeiros, e não em subordinação.

✓ Cidadania: Materializada tanto na ideia de capacidade eleitoral ativa (ser eleitor) e


passiva (ser eleito) como na previsão de instrumentos de participação do indivíduo nos negócios do
Estado. Assim, o conceito de cidadania não se restringe a direitos políticos, mas nessa visão muito mais
abrangente e que engloba, também, os direitos e deveres fundamentais. É a capacidade de o indivíduo
participar efetivamente da Constituição e organização do poder político estatal de forma direta ou
indireta, ou seja, votando e sendo votado.

✓ Dignidade da pessoa humana: Assume relevo como valor supremo de toda a sociedade
para o qual se reconduzem todos os direitos fundamentais da pessoa humana. É a regra matriz dos direitos
fundamentais. Assim, diante de colisões, a dignidade servirá para orientar as necessárias soluções de

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conflitos. O princípio da dignidade da pessoa humana deve expressar para a sociedade a segurança e a
realização do objetivo de igualdade dos indivíduos no meio onde vivem e que isso seja feito de forma
harmônica e sem discriminação.

✓ Valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa: Nos termos do art. 170, caput, da CF/88,
a ordem econômica, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça
social, funda-se em dois grandes pilares, quais sejam, a valorização do trabalho humano e a livre-iniciativa.
Dessa maneira, o constituinte, além de privilegiar o modelo capitalista, estabelece como finalidade da
ordem econômica, assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social, afastando-
se, assim, de um Estado absenteísta nos moldes do liberalismo;

✓ Pluralismo político: É fundamento que assegura a realização dos postulados


democráticos, garantindo a multiplicidade de opiniões, de crenças, de convicções e de ideias. A partir
dessa ideia, enaltece-se uma sociedade plural, em que se consagra o respeito à pessoa humana e sua
liberdade. É alicerce da democracia e direito essencial para a forma representativa e democrática
escolhida pelo Estado para a organização do Poder.

PRINCÍPIO REPUBLICANO

O princípio Republicano define a forma de Governo, vale dizer, a forma como os governantes e
governados ascendem ao Governo e como se dá a relação entre governantes e governados. República é

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uma forma de Governo. Nasceu do mesmo ato político que impôs a Federação no Brasil. Desde a
Constituição de 1891 vem sendo consagrada como Princípio Fundamental.
No texto de 1891 a República surge como cláusula pétrea e assim é mantida em todas as
Constituições, exceto na de 1988 em que aparece como princípio sensível (art. 34, VII, “a”).
Apesar de não ser cláusula pétrea, por meio de plebiscito, o “povo” confirmou a forma
republicana, não podendo, portanto, emenda à constituição instituir a Monarquia, sob pena de se violar
a soberania popular, a não ser que haja, necessariamente, nova consulta popular (art. 2º do ADCT).

PRINCÍPIO FEDERATIVO:

Em 15 de novembro de 1889, por meio do Decreto nº 01, que se proclamou entre nós uma
República Federativa, com a transformação das Províncias então existentes em Estados federados. Em
seguida, foi a Federação consagrada como Princípio Fundamental na Constituição de 1891 e por todas as
demais Constituições que lhe seguiram, inclusive a Constituição de 1988 (arts. 1º e 18º).
A forma de Estado adotada pelo texto de 1988 é a Federação que e constitui a partir de uma
união indissolúvel de organizações políticas autônomas, instituída por uma Constituição rígida.
O nosso federalismo se deu por desagregação a partir do Estado unitário e estabelece-se no texto
de 1988 a Federação como cláusula pétrea, nos termos do art. 60, § 4º, I.
A solidez do sistema está na consagração da ideia de indissolubilidade do vínculo federativo
(inexistência do direito de secessão), havendo instrumentos de estabilização de eventual crise, como, no
caso, a intervenção federal (art. 34, I).
A República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel da União Federal, dos Estados-
Membros, do Distrito Federal e dos Municípios em verdadeiro federalismo assimétrico, em razão da falta
de homogeneidade entre os entes federativos (art. 1º, caput, c/c art. 18).

PRINCÍPIO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO:

A Constituição de 1988 declara ser a República Federativa do Brasil um Estado Democrático de


Direito. A designação Estado Democrático de Direito é novidade entre nós e sintetiza um movimento
tendente a orientar o Estado de Direito a realizar os postulados da Democracia.

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A origem do Estado de Direito está vinculada à luta da burguesia contra o absolutismo que
dominava até a metade do século XVIII. Tinha por bandeira, basicamente, a submissão de todos,
sobretudo do Estado, ao império da lei; a separação de poderes e a declaração de direitos individuais.
A previsão desse regime jurídico é reforçada pelo princípio democrático que marcou o texto de
1988 e pela cláusula contida no parágrafo único do art. 1º, ao dispor que todo poder emana do povo, que
o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Estamos diante da democracia semidireta ou participativa, um “sistema híbrido”, uma
democracia representativa, com peculiaridades e atributos da democracia direta.
Enfim, atenta a esses aspectos, a Constituição de 1988 inovou e reuniu, em um mesmo princípio,
as bases do Estado de Direito e do Estado Democrático, provocando a conexão entre os seus postulados.
Assim, se é certo que o elemento básico do Estado de Direito é a lei, não menos certo é que a lei deixa de
ser entendida como mero enunciado formal do legislador, desprovida de conteúdo material ou
substancial, para ser concebida e exigida como um ato de concretização dos valores humanos, morais e
éticos fundamentais consagrados na Constituição, numa perspectiva democrática imposta pela soberania
popular. Desse modo, lei que não atende a essa exigência é lei inconstitucional que deve ser desprezada.
O Estado Democrático de direito, portanto, é Estado Constitucional submetido à constituição e
aos valores humanos nela consagrados.

PRINCÍPIO DA SOBERANIA POPULAR:

A Constituição de 1988 consagra a Soberania Popular como Princípio Fundamental, ao destacar,


no parágrafo único do art. 1º, que “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
Adota, assim, uma Democracia representativa, que combina representação e participação
popular direta, tendendo para uma democracia participativa. Vejamos:
Quando a Constituição afirma que o povo exerce o seu poder por meio de representantes eleitos,
ela explicita a Democracia representativa; contudo, quando indica que o povo exerce o seu poder
diretamente, ela exprime a Democracia direta. Da conjugação da democracia representativa e da
Democracia direta temos um modelo misto de Democracia semidireta, que nada mais é senão uma
Democracia representativa com alguns institutos ou mecanismos de participação direta do povo na
formação da vontade política nacional. Da Democracia semidireta se desenvolve a chamada Democracia
participativa.

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Ora, a Constituição de 1988, no art. 14, estabelece que a soberania popular será exercida pelo
sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos (eis a Democracia
representativa), e, nos termos da lei mediante: I – plebiscito; II – referendo; III – iniciativa popular (eis os
institutos da democracia semidireta). Plebiscito é consulta popular prévia acerca de determinada questão
política ou programa governamental; referendo é consulta popular a posteriori destinada a obter do povo
a ratificação ou não de proposta legislativa já aprovada ou programa já adotado; e iniciativa popular é
prerrogativa atribuída aoi povo de diretamente apresentar projetos de lei ao Poder Legislativo, atendidas
certas condições.

PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES:

O art. 2º consagra serem Poderes da União, independentes e harmônicos entre si:

✓ Legislativo;
✓ Executivo
✓ Judiciário

Os “poderes” (órgãos) são independentes entre si, conforme dito acima, cada qual atuando
dentro de sua parcela de competência constitucionalmente estabelecida e assegurada quando da

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manifestação do poder constituinte originário, daí ser mais adequado falarmos em órgãos que exercem
funções, típicas (inerentes à essência) e atípicas (do órgão, mas sem ser a sua essência).

✓ Dessa forma, diante do princípio da inexigibilidade de atribuições, nenhum Poder


(órgão) poderá transferir função que lhe é típica ou expressamente prevista como atípica a outro.
Lembre-se de que a CF/88 erigiu à categoria de cláusula pétrea a separação de Poderes,
conforme se observa pelo art. 60, § 4º, III.

OBJETIVOS FUNDAMENTAIS DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:


I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.
Os objetivos fundamentais estão previstos no art. 3º da CF/88. Uma vez estruturada a República
Federativa do Brasil, ela terá metas a serem atingidas, orientadoras das políticas governamentais,
destacando-se:

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✓ Construir uma sociedade livre, justa e solidária: a solidariedade aparece aqui como
consagração dos direitos de 3ª dimensão, tendo sido fundamento para algumas importantes decisões
como a que autorizou a pesquisa de células-tronco embrionárias (ADI 3.510);
✓ Garantir o desenvolvimento nacional: é dever do Estado o desenvolvimento nacional,
e esse objetivo vem justificando os diversos programas governamentais;
✓ Erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais:
como desdobramento dessa idéia, podemos lembrar o fundo de combate e erradicação da pobreza,
prorrogado por prazo indeterminado nos termos da EC nº 67/2010;
✓ Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação: sem dúvida esse foi um importante argumento para o STF
reconhecer a união estável entre pessoas do mesmo sexo.

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PRINCIPIOS QUE REGEM A REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL NAS RELAÇÕES


INTERNACIONAIS:

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes
princípios:
I - independência nacional;
II - prevalência dos direitos humanos;
III - autodeterminação dos povos;
IV - não-intervenção;
V - igualdade entre os Estados;
VI - defesa da paz;
VII - solução pacífica dos conflitos;
VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
X - concessão de asilo político.
Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política,
social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana
de nações.

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O artigo acima dispõe que a República Federativa do Brasil é regida nas suas relações
internacionais pelos seguintes princípios:
✓ Independência nacional, que na verdade corresponde ao próprio conceito de soberania
nacional, examinado acima;
✓ Prevalência dos direitos humanos, situação que mostra o compromisso do Estado
brasileiro com a proteção e efetividade dos direitos fundamentais, quer no âmbito interno, quer no
âmbito externo;
✓ Autodeterminação dos povos, que repele qualquer idéia de colonização ou de tutela
internacional dos povos de uma nação livre;
✓ Não intervenção, que rejeita qualquer intenção de o Estado brasileiro interferir nos
negócios atinentes e particulares de outro Estado, sem permissão deste;
✓ Igualdade entre os Estados, em razão do respeito recíproco que a noção de soberania
impõe;
✓ Defesa da paz, pois esse é o objetivo maior no mundo civilizado;
✓ Solução pacífica dos conflitos, que é o principio conexo com o anterior. Destina-se a
garantir o prévio exaurimento das vias diplomáticas na tentativa de compor os conflitos internacionais
sem o recurso à guerra. Contudo, a adoção do princípio em tela não constitui obstáculo incontornável a
que o Brasil recorra às armas para a defesa dos seus interesses no cenário internacional, até porque a
própria Constituição autoriza o Presidente da República a declarar guerra, no caso de agressão
estrangeira, autorizado pelo Congresso Nacional (art. 84, XIX);
✓ Repúdio ao terrorismo e ao racismo;
✓ Cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
✓ Concessão de asilo político, que consiste na proteção oferecida pelo Estado a
estrangeiro perseguido por crime político no país em que se encontra.

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1. CONCEITO

A doutrina faz uma verdadeira confusão terminológica a respeito dos direito


fundamentais. Podemos registrar, por exemplo, autores que usam nomes tão díspares quanto “direitos
humanos”, “direitos humanos fundamentais”, “liberdades públicas”, “direitos dos cidadãos”, “direitos da
pessoa humana”, “direitos do Homem”.
No direito interno, a nomenclatura mais adequada é a que ora utilizamos, ou seja, direitos
fundamentais. Essa é a posição de Dirley da Cunha Jr., Dimitri Dimoulis, dentre outros. Isso porque a
Constituição utiliza essa terminologia. Ademais, as outras nomenclaturas são inadequadas, por vários
motivos.
Quando se trata de assuntos internos, a Constituição costuma se referir a “Direitos e garantias
fundamentais”, ao passo que, quando trata de tratados internacionais, se refere a direitos humanos.
Com base nisso, poderíamos definir os direitos fundamentais como os direitos considerados
básicos para qualquer ser humano, independentemente de condições pessoais específicas. São direitos
que compõem um núcleo intangível de direitos dos seres humanos submetidos a uma determinada
ordem jurídica.
Desse modo, direitos fundamentais, em sentido material, são pretensões que cada momento
histórico se revela a partir de valor da dignidade da pessoa humana. Cabe ao interprete analisar as
circunstâncias históricas e culturais do momento para decidir quais pretensões podem ser consideradas
como exigências desse valor.

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2. ANÁLISE DA EXPRESSÃO DIREITOS E GARANTIAS:

Direitos e garantias fundamentais não são expressões sinônimas.


Direito é uma norma de conteúdo declaratório, portanto, são normas que declaram a
existência de um interesse, de uma vantagem. Ex: direito à vida, à propriedade etc.
Por outro lado, a garantia é uma norma de conteúdo assecuratório, que serve para assegurar
o direito declarado. Ex: Habeas Corpus que serve para tutelar o direito de liberdade.

3. CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS


Em cada um dos estados democráticos, o tratamento que é dispensado aos direitos
fundamentais varia, sofrendo influências de fatores peculiares da história e da cultura de cada povo.
Entretanto, algumas características sempre são relacionadas aos direitos fundamentais como:

3.1 Historicidade
Os direitos fundamentais são uma construção histórica, isto é, a concepção sobre quais são os
direitos considerados fundamentais varia de época para época e de lugar para lugar.

3.2 Relatividade
Nenhum direito fundamental é absoluto. Mesmo os direitos fundamentais sendo básicos, não
são absolutos, na medida em que podem ser relativizados. Primeiramente, porque podem entrar em
conflito entre si – e, nesse caso, não se pode estabelecer a priori qual direito vai “ganhar” o conflito, pois
essa questão só pode ser analisada tendo em vista o caso concreto. E, em segundo lugar, nenhum direito
fundamental pode ser usado para a prática de ilícitos.

3.3 Imprescritibilidade
Os direitos fundamentais são imprescritíveis, é dizer, não são perdidos pela falta de uso
(prescrição).
Trata-se de uma regra geral, mas não absoluta, pois alguns direitos são prescritíveis, como é o
caso da propriedade, que pode ser perdida pelo instituto da usucapião.

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3.4 Inalienabilidade
Em regra geral, os direitos fundamentais não podem ser alienados, nem doados, nem
emprestados etc. Possuem uma eficácia objetiva, isto é, não são meros direitos pessoais (subjetivos), mas
são de interesse da própria coletividade. Claro que existem exceções: por exemplo, o direito à
propriedade é, por óbvio, alienável.

3.5 Indisponibilidade (irrenunciabilidade)


Geralmente, os direitos fundamentais são indisponíveis. Não se pode fazer com eles o que bem
se quer, pois eles possuem eficácia objetiva, isto é, importam não apenas ao próprio titular, mas sim
interessam a toda a coletividade.
Também aqui há exceções, pois existem alguns direitos fundamentais que são disponíveis, tais
como a intimidade e a privacidade. Isso, ressalte-se, é a exceção.
Mesmo assim, a renúncia a direitos fundamentais só é admitida de forma temporária, e se não
afetar a dignidade humana.

3.6 Indivisibilidade
Os direitos fundamentais são um conjunto, não podem ser analisados de maneira separada,
isolada. Assim, o desrespeito a um deles é, na verdade, o desrespeito a todos.
Abrir exceção com relação a um é fazê-lo em relação a todos. Não se pode desrespeitar direitos
fundamentais “só um pouquinho”, ou “só para uma pessoa”.

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4. GERAÇÕES (DIMENSÕES) DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Trata-se de uma classificação que leva em conta a cronologia em que os direitos foram
paulatinamente conquistados pela humanidade através de um processo histórico e gradativo.
Importante ressaltar que uma geração não substitui a outra, antes se acrescenta a ela, por isso a
doutrina prefere a denominação “dimensões”.

4.1. Direitos de primeira geração (individuais ou negativos)


São oriundos da Revolução Liberal Burguesa. Foram os primeiros a ser conquistados pela
humanidade e se relacionam à luta pela liberdade e segurança diante do Estado. Por isso, caracterizam-
se por conterem uma proibição ao Estado de abuso do poder: o Estado NÃO PODE desrespeitar a
liberdade de religião, nem a vida etc. Trata-se de impor ao Estado obrigações de não fazer. São direitos
relacionados às pessoas, individualmente.

4.2. Direitos de segunda geração (sociais, econômicos e culturais ou direitos positivos)


São direitos sociais os de segunda geração, assim entendidos os direitos de grupos sociais menos
favorecidos, e que impõem ao Estado uma obrigação de fazer, de prestar (direitos positivos, como saúde,
educação, moradia, segurança pública e alimentação).

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Começaram a ser conquistados após a Revolução Industrial, quando grupos de trabalhadores
passaram a lutar pela categoria.Trata-se, portanto, de direitos positivos (impõem ao Estado uma
obrigação de fazer).

4.3. Direitos de terceira geração (difusos e coletivos)


São direitos transindividuais, isto é, direitos que são de várias pessoas, mas não pertencem a
ninguém isoladamente. Transcendem o indivíduo isoladamente considerado. São também conhecidos
como direitos metaindividuais (estão além do indivíduo) ou supraindividuais (estão acima do indivíduo
isoladamente considerado).
Os chamados direitos de terceira geração têm origem na revolução tecnocientífica (terceira
revolução industrial), a revolução dos meios de comunicação e de transportes, que tornaram a
humanidade conectada em valores compartilhados. Dessa forma a humanidade passou a perceber que,
na sociedade de massa, há determinados direitos que pertencem a grupos de pessoas, grupos esses, às
vezes, absolutamente indeterminados.

4.4. Direitos de quarta geração


Há autores que se referem a essa categoria, mas ainda não há consenso na doutrina sobre qual
o conteúdo desse tipo de direitos. Há quem diga tratar-se dos direitos de engenharia genética (é a posição
de Norberto Bobbio), enquanto outros referem-nos à luta pela participação democrática (corrente
defendida por Paulo Bonavides).

5. TITULARIDADE DO DIREITO FUNDAMENTAL

5.1. Pessoas físicas


Costuma-se dizer que os direitos fundamentais são universais. Porém, para alguns autores, essa
afirmação deve ser encarada com ressalvas, uma vez que alguns direitos fundamentais são voltados a
destinatários específicos (veja-se, por exemplo, o direito à nacionalidade).
Acrescente-se, ainda, que os direitos fundamentais, como são reconhecidos em um determinado
Estado, limitam-se, necessariamente, ao âmbito de incidência do ordenamento jurídico desse País. Seria
um tanto quanto pretensioso, por exemplo, o Brasil declarar que os direitos fundamentais previstos na
CF são destinados a todos os indivíduos, universalmente.

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Fazendo uma interpretação gramatical do art. 5º, caput, da CF, poderia levar à conclusão de que
apenas os brasileiros (natos ou naturalizados) e os estrangeiros residentes no país seriam titulares de
direitos fundamentais.
Porém, o STF entende que estrangeiros de passagem pelo país também podem ser protegidos –
embora, obviamente, não possam titularizar todos os direitos fundamentais (pois alguns são privativos
de brasileiro, e outros de brasileiros natos).
Aliás, a Corte Suprema tem um entendimento bastante ampliativo dos direitos fundamentais.
Considera-se que tal espécie de direitos é aplicável até mesmo a estrangeiros fora do país, caso sejam
atingidos pela Lei brasileira.
Em resumo, poderíamos dizer, então, que podem ser titulares de direitos fundamentais (pessoas
físicas): a) brasileiros natos; b) brasileiros naturalizados; c) estrangeiros residentes no Brasil; d)
estrangeiros em trânsito pelo território nacional; e) qualquer pessoa que seja alcançada pela lei brasileira
(pelo ordenamento jurídico brasileiro).
Pode-se dizer que existe, então, uma verdadeira gradação na ordem enumerada anteriormente:
os brasileiros natos possuem mais direitos que os brasileiros naturalizados que possuem mais direitos que
os estrangeiros residentes, etc.

5.2. Pessoas jurídicas


Os direitos fundamentais também se aplicam às pessoas jurídicas (inclusive as de Direito Público),
desde que sejam compatíveis com a natureza delas. Assim, por exemplo, pessoas jurídicas têm direito ao
devido processo legal, mas não à liberdade de locomoção, ou à integridade física.

6. FONTES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Primeiramente as fontes dos direitos fundamentais vem da Constituição. Porém, o rol de direitos
e garantias fundamentais expressos na Carta Magna não é fechado, exaustivo, mas sim meramente
exemplificativo (art. 5º, §2º). Logo, não é porque um direito não está expressamente previsto que não
será reconhecido.
E os tratados internacionais sobre direitos humanos ingressam no ordenamento brasileiro com
que hierarquia?
A jurisprudência tradicional do STF considerava que os tratados internacionais ingressavam no
sistema constitucional brasileiro com força de mera lei ordinária, o que autorizava até a revogação por
uma lei posterior. A EC 45/04, no entanto, incluiu um §3º no art. 5º, prevendo que “Os tratados e

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convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso
Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às
emendas constitucionais”.
Após a referida Emenda, portanto, passou-se a ter a seguinte situação: a) os tratados
internacionais que não fossem sobre direitos humanos continuavam a valer com força de meras leis
ordinárias; mas b) os tratados sobre direitos humanos e que forem aprovados pelo mesmo trâmite das
emendas constitucionais passaram a ter força de emenda constitucional, isto é, força de norma
constitucional (derivada), incorporando-se ao texto da Constituição.
Porém, uma questão ficou ainda em aberto: e os tratados internacionais de direitos humanos,
mas que tinham sido aprovados antes de 2004, quando ainda não havia o trâmite de aprovação
equiparado ao das emendas constitucionais? Deveriam ter qual hierarquia?
O STF decidiu que eles teriam uma força intermediária, é dizer, supralegal. Estão acima das leis,
mas abaixo da Constituição. Estão acima das leis porque tratam de direitos humanos; estão abaixo da CF
porque não foram aprovados pelo trâmite das emendas constitucionais.

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