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4 Teoria da

norma jurídica
4 Conceito de norma
Teoria da norma jurídica

O conceito de norma jurídica tem caráter amplo e engloba os diferentes tipos de fonte de
direito reconhecidas pelo Estado, que criam condicionantes do agir social e fixam as bases
da organização das instituições públicas no Estado de Direito.
A norma jurídica se apresenta como heterônoma, na medida em que deriva de uma impo-
sição externa à consciência de seu destinatário, sendo dotada também de caráter obrigatório.

ATENÇÃO
Em outras palavras, o cumprimento das normas é algo impositivo a todos, sejam agentes públicos, sejam
particulares, independentemente da opinião pessoal do destinatário a seu respeito.

A ideia de norma jurídica traduz um tipo de generalização característica da Teoria Geral


do Direito, voltada à identificação de diversos traços comuns aos comandos jurídicos, que
se aplicam de modo genérico às diferentes espécies de fonte de direito.

Estrutura lógica e características da norma


De acordo com a sua natureza, as normas jurídicas podem apresentar uma estrutura lógica
própria a ser examinada em cada situação.

Normas de conduta

São também denominadas de normas primárias, exatamente porque cumprem a finalida-


de básica das regras de direito, que é a disciplina de comportamentos na sociedade.
Tais normas têm as pessoas como destinatárias e estabelecem um padrão de agir social se-
gundo uma estrutura lógica, na qual a norma prevê uma hipótese, correspondente a um fato
do mundo da vida e uma consequência jurídica para a ocorrência concreta do fato hipotético.
A ocorrência do fato deflagra um efeito previsto no denominado dispositivo da norma,
consistente em uma sanção jurídica, de acordo com o esquema a seguir:

CONCEITO
Estrutura da norma = hipótese (fato) + dispositivo (sanção)

O chamado silogismo normativo tem seu fundamento em considerar-se a prescrição


contida na norma como premissa maior do raciocínio, a verificação do enquadramento do
caso concreto na moldura legal como premissa menor e a aplicação da CONCEITO
lei ao caso como a denominada subsunção.
É bem verdade que a hermenêutica jurídica contemporânea se vale Hermenêutica jurídica
não apenas de parâmetros de lógica formal nesta operação, lançando Estudo dos processos de interpretação
mão de aportes de lógica material, tais como a lógica argumentativa e a das normas jurídicas.
lógica do razoável, mas a estrutura lógica do processo de interpretação
ainda segue o padrão do silogismo normativo concebido pelo positivis-
mo jurídico do Século XIX, com algumas adequações, decorrentes da
concepção culturalista que hoje prevalece no direito.

Normas de organização

Chamadas também de secundárias, fixam competências e atribuições


no âmbito do Estado, algo indispensável no Estado do Direito, no qual
prevalece o império da lei, estando as autoridades públicas subordina-
das a um princípio de legalidade estrita, segundo o qual as suas ações
somente podem ocorrer nos limites fixados pela lei.
Desse modo, verifica-se uma formalização na esfera pública, de acor-
do com a qual a atuação dos agentes do Estado circunscreve-se às maté-
rias normativamente estabelecidas, do mesmo modo que deve obedecer
a formas e procedimentos também fixados pelo ordenamento jurídico.
Sob o prisma da lógica, as normas de organização têm uma forma-
ção diferente das normas de conduta, uma vez que em regra não pos-
suem uma sanção específica, sendo o efeito do descumprimento deste
tipo de norma a nulidade do ato praticado.
Isto se explica pelo fato de que não há nesta modalidade de norma
exatamente uma prescrição do agir e sim a delimitação das atribuições
jurídicas dos agentes do Estado.

CONCEITO
O esquema lógico da norma de conduta é o seguinte:
Premissa Maior: previsão de um rito ou procedimento.
Premissa Menor: descumprimento de requisito formal ou material.
Efeito: nulidade do ato praticado.

SILOGISMO NORMATIVO
SILOGISMO NORMATIVO

PREMISSA MENOR: FATO

SUBSUNÇÃO: APLICAÇÃO DA NORMA AO FATO


As diversas classificações da norma
A norma jurídica comporta inúmeras classificações, que têm como referência aspectos
formais, materiais, temporais, de competência normativa, entre outros, que apresentam
natureza cumulativa.

Quanto ao tipo de comando

Segundo um critério estritamente de ordem formal, a norma jurídica pode ser classificada
em função do tipo de comando nela contido, compreendendo as seguintes espécies:

É aquela que exige de seu destinatário uma conduta positiva ou uma ação,
NORMA sendo antijurídica qualquer atitude diferente da prescrita na lei ou a omissão.
IMPERATIVA Um exemplo seria uma norma que exige o recolhimento de um determinado
OU COGENTE valor de imposto, diante da ocorrência da hipótese legal (fato gerador). O não
(PRECEPTIVA) recolhimento do tributo pelo contribuinte ou o seu recolhimento em desconfor-
midade com o montante previsto na lei denotam uma violação à ordem jurídica.

Parte exatamente da premissa oposta da norma imperativa: neste caso, a pos-


tura juridicamente admitida pressupõe uma omissão por parte do destinatário
da prática da conduta prevista pela norma. A hipótese legalmente estabelecida
NORMA
não pode acontecer do contrário enseja aplicação de uma sanção jurídica. É
PROIBITIVA
exatamente o exemplo de uma norma que proíbe fumar em determinado local e
fixa uma penalidade em dinheiro, para aquele que praticar o ato. O que o direito
exige neste caso é um não agir por parte do destinatário da norma.

Este tipo de norma compreende aquelas situações em que a ordem jurídica cria
um padrão de agir, mas permite ao destinatário optar por uma atuação diferen-
NORMA te, de acordo com o princípio da autonomia privada. No Direito Civil, a legislação
SUPLETIVA cria regimes jurídicos padronizados para a destinação dos bens no casamento
(PERMISSIVA) e na sucessão por morte, mas permite aos nubentes a celebração de um pacto
antenupcial, no primeiro caso, e ao falecido a elaboração de legados ou testa-
mentos, no segundo, dispondo de forma diversa do padrão legal.

Em relação à norma permissiva ainda cabe uma observação importante, no sentido de


que o princípio da legalidade, que é um dos pilares do Estado de Direito, funda-se na pre-
missa de que todos são livres para agir até onde a lei limita a sua atuação, preceito que pode
ser sintetizado no princípio de que ninguém é obrigado a fazer ou a deixar fazer alguma
coisa, senão em virtude de lei. Diante deste fato, em não havendo imposição legal (norma
imperativa) ou vedação legal (norma proibitiva), entende-se pela existência de uma norma
permissiva implícita, fundada exatamente na esfera de autonomia privada decorrente da
conjugação entre liberdade e legalidade.
Quanto à amplitude

A presente classificação se refere ao alcance fático da hipótese contida na norma. Trata-se


de uma classificação de cunho relacional, uma vez que é possível comparar o alcance de
duas normas e, então, afirma-se que uma é “mais genérica” ou “específica” do que a outra:

A hipótese nela prevista tem conteúdo aberto, sendo aplicável a uma infi-
NORMA nidade de situações. As normas que trazem em si princípios de direito ou
GENÉRICA garantias fundamentais tendem a ter uma dicção genérica: “todos são iguais
perante a lei”, por exemplo.

Disciplina certas situações de modo pontual, buscando um regramento deta-


lhado do direito em questão ou simplesmente trata de uma matéria muito espe-
NORMA cializada. Ratificando a observação feita anteriormente, entre as normas espe-
ESPECÍFICA ciais é possível identificar normas mais específicas do que outras. São normas
(PARTICULAR) específicas, por exemplo, as que disciplinam o contrato de locação imobiliária
residencial, exatamente porque há uma infinidade de modalidades contratuais
e dentro do contrato locação há também diferentes espécies.

Tem aplicação a uma situação determinada, perfeitamente identificável no tem-


po e no espaço, havendo casos em que sua disciplina jurídica se exaure na
incidência sobre um fato específico ou perdura durante reduzido período de
tempo. Como o conceito de norma jurídica abarca não apenas as leis, mas tam-
NORMA bém os atos normativos elaborados pelas autoridades político-administrativas,
INDIVIDUALIZADA no exercício do chamado poder regulamentar, é usual a atribuição de formato
(“DE EFEITOS de norma a atos administrativos, como um Decreto de nomeação de alguma
CONCRETOS”) pessoa em um cargo público, por exemplo. Esta é uma hipótese clara de norma
individualizada, uma vez que o seu único destinatário é o cidadão nomeado para
o cargo. São também de efeitos concretos normas de tombamento de imóveis
e a Lei Orçamentária Anual, que determina os valores que serão aplicados em
cada órgão e projeto do Estado a cada exercício financeiro.

Uma observação importante, correlata a este tema, diz respeito à existência de ramos
do direito cujas normas tendem a ser consideradas mais genéricas, se comparadas às de
outras áreas do Direto.
Alguns ramos do Direito seriam dotados de caráter matricial em relação a outros e
suas normas poderiam ser consideradas genéricas em comparação com as dos ramos
deles derivados.
Este tipo de correlação existe entre o Direito Civil e o Direito do Trabalho, que seria
um desdobramento do regime da locação de serviços, o Direito do Consumidor, ramo que
disciplina uma modalidade peculiar de compra e venda e de locação de serviço, e o próprio
Direito Ambiental, que tem uma proximidade com o regime originário dos direitos de vizi-
nhança. Tendo em vista o caráter especializado destes ramos do Direito, as normas de Di-
reito Civil lhes forneceriam parâmetros gerais, desde que não existente uma norma própria
dentro do ramo do direito respectivo.
EXEMPLO Quanto ao elemento espacial

O Direito Civil e também o Direito Pro- Na tipologia das normas, adota-se também um critério de abrangên-
cessual Civil, por exemplo, seriam ra- cia territorial ou espacial, que está intimamente ligado às competên-
mos do direito de “natureza genérica”, cias políticas em termos legislativos, fixadas pela Constituição e pelo
não obstante o fato de apresentarem Direito Internacional.
na sua legislação própria normas gené-
ricas e específicas. As relações entre os Estados na ordem internacional con-
tam com normas estabelecidas com base em tratados,
convenções e costumes internacionais, cujo fundamento
se encontra no princípio da “autolimitação da soberania”,
segundo o qual, os Estados se submetem voluntariamen-
NORMA DE te às regras de direito internacional, a elas aderindo e
DIREITO recepcionando no direito interno, de acordo com os pro-
INTERNACIONAL cedimentos previstos na legislação de cada país. Não
há uma sujeição compulsória dos Estados às normas do
direito internacional, que serão a eles aplicadas, via de re-
gra, quando houver uma submissão voluntária, motivada
por variados fatores, como política internacional, interes-
ses estratégicos, econômicos etc.

De modo geral, a norma jurídica é associada à norma de di-


reito interno, que é criada pelo Estado, no exercício do seu
poder soberano, e que se impõe a todos que se encontram
NORMA DE em seu território. A Constituição brasileira adotou a forma
DIREITO federativa de Estado, na qual são atribuídas competências
INTERNO legislativas aos entes públicos: União, Estados e Municí-
(FEDERAL, pios. Dessa forma, cada ente conta com uma franquia de
ESTADUAL, temas em torno dos quais poderá elaborar suas próprias
MUNICIPAL) normas, nos limites da Constituição. Naturalmente, as nor-
mas editadas por um determinado ente da federação terão
sua aplicação circunscrita ao território respectivo, sendo a
legislação federal aplicável em todo o território nacional.

O modelo hierarquiza-
A hierarquia entre
do de inspiração kelsenia-
na fixa um tipo de corre-
as normas não pode
lação entre as normas na ser confundida
qual prepondera a Cons- com a repartição
tituição, que serve de fun- político-territorial de
damento de validade para
competências legislativas.
a lei (conceito que engloba
as diferentes espécies legislativas previstas constitucionalmente), que,
por sua vez, dá validade aos chamados regulamentos, que são elabora-
dos pelas autoridades administrativas.
Situação diversa ocorre na repartição de competências normativas entre os entes da fe-
deração, na qual não há hierarquia entre eles, mas tão somente uma delimitação constitu-
cional das matérias sobre as quais cada um pode legislar. Assim, ao tratar de tema que não
é de sua competência, a lei federal viola a Constituição, do mesmo modo que uma lei de um
Estado que discipline matéria afeta a legislação federal não estará violando lei federal e sim
o texto constitucional, uma vez que inexiste hierarquia entre os entes públicos, no que se
refere à competência de produção de suas próprias normas.

Quanto ao elemento temporal

No momento da classificação da norma jurídica, leva-se em consideração também o seu


período de vigência, podendo ela ser permanente ou temporária:

O usual é que uma norma ao entrar em vigor, assim permaneça até que outra
NORMA
norma a revogue, salvo se ela própria criar algum tratamento específico para a
PERMANENTE
sua incidência temporal.

Situação excepcional no direito, se traduz por uma norma cuja vigência é limita-
da no tempo por disposição expressa daquele que a criou ou pelo exaurimento
das hipóteses concretas por ela alcançadas. Uma norma prevendo uma anistia
ou um parcelamento de um débito fiscal normalmente terá uma data limite para
que os interessados requeiram o benefício. Findo tal prazo, o regime diferencia-
do não mais poderá prevalecer, valendo a regra geral. Uma modalidade peculiar
NORMA de norma temporária se expressa pelas chamadas disposições transitórias, por
TEMPORÁRIA vezes inseridas em textos legislativos, com a finalidade de disciplinar algumas
situações pontuais que escapam ao regramento trazido pela nova lei ou que de-
mandam uma disciplina excepcional, tendo em vista o impacto que determinadas
mudanças podem trazer para a esfera jurídica de certas pessoas. Cria-se, então,
o regime híbrido, diferente do trazido pela mudança legislativa, que preserva even-
tualmente alguns traços da legislação revogada durante determinado período de
tempo ou até a ocorrência de determinados fatos previstos na legislação.

Quanto aos efeitos sobre o fato

Matéria que é objeto de discussão aprofundada no ponto sobre aplicação da lei no tempo,
a incidência da norma jurídica sobre os fatos ocorridos antes da sua entrada em vigor, tam-
bém inspira uma classificação própria.
CONCEITO Com base no princípio da irretroatividade da lei, em regra
a mudança legislativa operará apenas em relação aos fa-
Ex nunc tos ocorridos após a entrada em vigor das novas normas,
Os efeitos NÃO retroagem. NORMA
o que se chama de efeito prospectivo, ex nunc, sendo
Ex tunc DE EFEITO
importante destacar que tal princípio no direito brasileiro
Os efeitos retroagem. PROSPECTIVO
é balizado pelos fenômenos da coisa julgada, do direito
adquirido e do ato jurídico perfeito, que serão estudados
em item específico.

A exceção no direito é a atribuição à norma de efeitos


retroativos, também chamados de ex tunc. Nas situações
pontuais em que uma nova legislação deita efeitos para
NORMA
o passado, normalmente estar-se-á falando de normas de
DE EFEITO
conteúdo benéfico, que concedem algum benefício aos
RETROATIVO
seus destinatários, sem causar prejuízos a terceiros, uma
vez que a regra no direito brasileiro é a irretroatividade da
lei, com a preservação das situações constituídas.

Quanto às fontes

Como destacado no início deste item, a Teoria da Norma Jurídica é re-


sultado de um tratamento genérico das diferentes fontes de direito e
pretende identificar traços em comum entre elas, a fim de dar-lhes um
tratamento padronizado.
A classificação da norma segundo as fontes faz o caminho inverso,
ao distinguir as normas em função da maneira como o direito se mani-
festa (lei, costume, analogia, princípios de direito, jurisprudência etc.),
temática que é detalhada, também em item próprio.

Os planos da vigência, validade e eficácia


da norma

Os planos da normatividade jurídica representam um tema de substan-


cial relevância não apenas para a Teoria do Direito, mas também para
diversos outros campos do Direito, como o Direito Constitucional, a
Sociologia do Direito e a Antropologia Jurídica, por exemplo, principal-
mente porque consolidam a ideia de que a norma jurídica representa
um conjunto indiviso de três planos.
Quando algum deles se mostra ausente ou falho, a plenitude norma-
tiva do direito se vê comprometida, como em seguida será debatido.
Da Vigência

Também denominada de validade formal, funda-se no preenchimento pela norma dos


requisitos estabelecidos pelo processo legislati-
A vigência representa
vo constitucionalmente instituído.
Ao preencher os mecanismos de reconheci-
a porta de entrada
mento criados pela ordem jurídica, uma norma de uma norma no
pode ser dita como vigente. ordenamento jurídico.

Competência e legitimidade do órgão responsável pela edição da norma


Os pressupostos para a vigência de uma norma decorrem de ser o órgão responsável pela
sua edição não apenas competente para criar normas jurídicas naquele sistema jurídico,
mas também dotado de legitimidade para a edição daquela modalidade de norma.

EXEMPLO
Utilizando-se o exemplo da competência da União, Estados e Municípios para legislar no direito brasileiro, para
que uma norma seja despida de vícios, não basta que o ente público tenha competência legislativa, sendo preci-
so que ele seja legitimado pela Constituição para criar a disciplina jurídica de uma determinada matéria.

Da Validade

O campo da validade da norma jurídica situa-se em uma posição média entre a questão
formal e material do direito.
Levando-se em consideração que a norma inicialmente se incorpora à ordem jurídica
(plano da vigência), a aferição da validade normativa consiste em verificar a compatibilida-
de da norma com o restante das normas do ordenamento jurídico.
São hipóteses de invalidade das normas:

A sua inconstitucionalidade, consistente na afronta de seu comando a prescrição constitucio-


nal ou no descumprimento de algum requisito do processo de produção normativa constitucio-
nalmente estabelecido.

A revogação tácita, que decorre da aferição da incompatibilidade dos conteúdos de uma norma mais
antiga e uma mais recente, concluindo-se pela revogação da primeira.

A própria questão da nulidade da norma, da qual a inconstitucionalidade seria uma espécie, pois se
sabe que os regulamentos possuem natureza de norma jurídica e eventualmente afrontam as leis e
não a Constituição de forma direta.

Verifica-se, portanto, que o foco no plano da validade pode até levar o aplicador do di-
reito a concluir pela própria falta de vigência da norma, como no caso da revogação tácita,
incidindo em um campo mais de ordem formal, ou pela incompatibilidade sistêmica de
uma norma em vigor, o que refletirá em uma esfera fática ou material, identificada com a
dimensão da eficácia, a seguir examinada.

Da Eficácia

Refere-se à efetiva aplicação ou execução da norma jurídica. Este representa o plano


em que a norma jurídica repercute na vida das pessoas, disciplinando concretamente
as relações sociais.
Como se pode observar no item precedente,
A norma jurídica
a validade ou não da norma jurídica repercutirá
somente alcança a diretamente na esfera da sua eficácia.
sua plenitude quando No momento em que os órgãos do Poder Judi-
presentes os três ciário reconhecem que uma norma carece de vali-

aspectos ora debatidos: dade por ser incompatível com as demais normas
do sistema jurídico, o efeito prático de tal decisão
de vigência, validade e será exatamente o da proibição da sua aplicação
eficácia. aos casos concretos.
Trata-se de uma norma vigente no ordenamento, mas que apresenta um vício jurídico,
que a tornará ineficaz a partir de uma decisão judicial neste sentido.
Cumpre ressaltar que a invalidade da norma não gera a sua revogação, mas tão somente a
suspensão de sua eficácia, em decorrência do fato de que somente a autoridade competente
para a elaboração da norma poderá retirá-la da ordem jurídica, cabendo ao Judiciário apenas
torná-la ineficaz.

O desuso das leis e as leis anacrônicas


Pelo que se observou até agora, a ineficácia de uma norma jurídica seria uma decor-
rência da declaração de sua ineficácia, segundo uma escala na qual a norma se torna
vigente, tem aferida a sua validade e se torna eficaz desde que compatível com o orde-
namento jurídico.
Há, contudo, dois fenômenos identificados pela doutrina que fogem a esse padrão e
que exigem para a sua compreensão um exame de perfil sociológico do fenômeno jurídico.
Essas seriam situações excepcionais, em que uma norma jurídica é vigente, formalmente
válida, mas não é socialmente aceita ou simplesmente não é aplicada no dia a dia.
São leis em desuso ou leis anacrônicas, que têm o mesmo efeito em termos práticos (a
ineficácia social da norma), mas que se diferenciam pelo aspecto temporal.

É ineficaz desde o seu nascedouro.


O desuso de uma norma tem causas variadas, podendo ser resultado do fe-
nômeno da norma defectiva, que prevê hipótese, mas não contém sanção; ser
LEI EM DESUSO
decorrente de uma hipótese legal de impossível cumprimento em termos con-
cretos ou de uma exigência jurídica irrazoável, injusta ou que afronte o senso
comum que predomina na sociedade.
LEI ANACRÔNICA
É aquela que durante um determinado período até teve
EXEMPLO
(VELHA,
aplicação na sociedade, mas que sofreu um enfraqueci- Um caso clássico é o uso do cinto de
ULTRAPASSADA,
mento de sua normatividade com o passar dos anos. segurança pelos condutores de auto-
DEFASADA)
móveis, que era algo raro, apesar de exi-
No caso da lei anacrônica, a sua ineficácia pode derivar de mudan- gido pela legislação de trânsito, e que
ças ocorridas na sociedade desde a época em que ela entrou em vigor e hoje é de uso corrente pelas pessoas,
que motivaram a sua não aplicação pelos tribunais ou de modificações em decorrência de campanhas de cons-
no conteúdo do próprio ordenamento jurídico, com o passar do tempo, cientização, do endurecimento da fisca-
que propiciaram uma melhor disciplina por uma nova lei daquela maté- lização e da autuação dos descumprido-
ria tratada pela lei antiga ou a introdução de algum procedimento mais res da lei. Pode-se, então, concluir que
eficiente ou vantajoso para os destinatários da norma. não é a mera não aplicação da lei que
Importante observar que a ineficácia de uma norma formalmente gera o fenômeno do desuso e sim uma
válida é produto de uma constatação de ordem prática, enquanto a inefi- flagrante discrepância entre a previsão
cácia da norma declarada inválida pelo Poder Judiciário resulta de uma legal e a experiência social vivenciada
imposição da ordem jurídica. pelos seus destinatários.
Justamente por causa disso é que a perspectiva positivista do direito
entende que uma lei em desuso ou anacrônica pode ser em tese aplicada,
eis que não revogada. Esta não é ótica do culturalismo jurídico, que adota
uma visão abrangente do fenômeno jurídico e entende que a ineficácia
notória de uma regra de direito, em decorrência de seu distanciamento
em relação à realidade social que busca disciplinar é um fator que conta-
mina a sua própria validade, tornando-a inaplicável em definitivo.

ATENÇÃO
Não se pode, entretanto, confundir desuso e ineficácia da norma com o fato
de que determinadas regras de direito são reiteradamente descumpridas como
resultado da falta de exigibilidade de sua observância por parte das autoridades
públicas competentes.

Há situações conhecidas na realidade brasileira em que determinadas


regras permaneceram sem cumprimento por longos períodos, até que o
poder público adotou as providências de fiscalização e punição necessárias
para a sua observância, tornando-as plenamente eficazes a partir de então.

Direito costumeiro e validade normativa


A partir do estudo da Teoria das Fontes de Direito, pode-se constatar que
a fonte costumeira do direito se afirma pela reiteração, pela notoriedade.
Neste caso, a correlação entre vigência, validade e eficácia da norma
jurídica ocorre de uma maneira um pouco diferente daquela observada
em relação à fonte legislativa. A validade jurídica do direito tem como
fundamento a comprovação da sua eficácia, ou seja, a consagração de
uma prática reiterada, com relevância jurídica, que passará a ser reco-
nhecida como regra de direito pelo Estado.
RESUMO
Na Teoria da Norma são examinados os diferentes referenciais para a classificação das regras de direito,
de acordo com a sua estrutura interna, que compreende o tipo de comando nelas contido, os parâmetros
de ordem temporal e espacial de sua aplicação, dentre outros fatores.
Ainda fazem parte da discussão da Teoria da Norma as dimensões formadoras das normas jurídicas, com-
preendidas nas esferas da vigência, validade e eficácia das normas.

ATIVIDADE
1. Sobre a norma jurídica, é correto afirmar que:
a) Existe hierarquia entre a legislação federal, a estadual e a municipal.
b) Nem toda norma jurídica tem caráter permanente.
c) A ineficácia de uma norma compromete a sua vigência.
d) A norma de organização tem como destinatária a sociedade.
e) A norma de “efeitos concretos” e a específica são idênticas.

2. Os planos da normatividade jurídica são os seguintes:


a) Unidade, coerência e completude.
b) Vigência, validade e eficácia.
c) União, estados e municípios.
d) Poder legislativo, poder judiciário e poder executivo.
e) Hierarquia, antinomias e lacunas.

Questão discursiva
Com relação aos fenômenos do desuso da norma e da lei anacrônica, estabeleça relações abordando suas
repercussões na prática do direito.

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