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Metodologias da Tradução

Apresentação
São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.
A palavra e a polissemia
Secretas vêm, cheias de memória.
As palavras são herança Inseguras navegam:
barcos ou beijos, as águas estremecem.
As palavras são histórias
As palavras falam Desamparadas, inocentes,
As palavras sentem leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
A palavra é afeto E mesmo pálidas
A palavra é exegese verdes paraísos lembram ainda.
A palavra é comunicação
Quem as escuta? Quem
A palavra é discurso
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras? Eugénio de Andrade
“Traduzir não é trair é universalizar” (José Jorge Letria)

▪ É difícil imaginar um mundo sem a tradução. O que seria da cultura literária,


científica, técnica? O que seria uma língua sem a tradução?
▪ Traduzir é trazer palavras, ideias transformadoras e libertadoras capazes de
cruzar fronteiras e desencadear movimentos sociais, estéticos e ideológicos.
▪ Quem traduz reinventa, dilata horizontes, faculta uma nova vida às palavras
que podem não mudar o mundo, mas podem mudar vidas, como defendia
Rimbaud.
▪ Traduzir é experienciar o mundo, refletindo sobre ele.
▪ Traduzir é trazer novos conhecimentos, novas ideias e novas visões do
mundo.
▪ Traduzir é transformar o mundo, agindo sobre ele.
▪ Quanto melhor se traduz, com experiência e critério, mais beneficiam a
língua de origem e a língua traduzida, bem como as próprias culturas.
A tradução não é

▪ Um trabalho sobre a língua


Não é um mero trabalho linguístico. Exige um conhecimento aprofundado
dos temas dos textos. Os conhecimentos linguísticos não chegam para ser um
bom tradutor. (economia, literatura…)
▪ Um trabalho de redação técnica ou de adaptação
a tradução é um
trabalho de
interpretação
É o que acontece quando se faz um aportuguesamento ou uma
condicionado pelo
autor do texto e pelo
localização de determinado produto (informática) – IBM e a localização
seu local de produção.
O tradutor não tem
No entanto tanto a redação técnica como a localização são ferramentas
total liberdade de
interpretação
fundamentais para a formação dos tradutores.
▪ Um trabalho de exegese
Claro que o sentido é fundamental e o tradutor tem de ter acesso a ele antes
da tradução. O tradutor está ao serviço de um texto com sentidos e intenções.
Traduzir pressupõe um exercício de humildade. Tradução pressupõe
comunicação, estabelecer um contacto. O tradutor é responsável pela
mensagem que transporta, dos valores deontológicos, éticos.
▪ Um trabalho subjetivo
A tradução deve ter em conta

▪ As diferentes modalidades de expressão das línguas


▪ As diferenças linguísticas e culturais das línguas
▪ Os atalhos e imagens das línguas (metonímia e metáfora)
Beber um copo está inscrito na língua, é partilhado por todos
os locutores e cada língua tem as suas metáforas e metonímias.
▪ A existência de um discurso (um enunciado linguístico em contexto e com
as suas relações intertextuais)
▪ A existência de um discurso vindo de uma pessoa com as suas
idiossincrasias, história, atividade e a sua própria lógica
O tradutor tem de estar consciente não só das informações do texto que
traduz, mas também do substrato, do referencial do texto. O sentido não
está só à superfície. (os não ditos, as implicações…)
O que é a tradução?

▪ Um discurso
▪ Uma leitura exímia
▪ Interpretação
▪ Restrições e idiossincrasias
▪ Alteridades e diferenças entre as línguas
▪ Compreensão e reexpressão
▪ Conhecimentos plurais do mundo
▪ Conhecimento ativo dos discursos equivalentes em várias línguas
▪ Fraseologias diferenciadas e comuns
▪ Deverbalização e reverbalização
▪ Elemento estruturante de dois discursos – o original e o traduzido
▪ Um trabalho de investigação
▪ Hipóteses, escolhas, verificações, observações, rigor, garantias
Tópicos:

▪ Língua normativa e língua criativa


▪ A gramática da língua e a ação dos falantes/autores/tradutores
▪ As idiossincrasias
▪ Traduzir é ler
▪ Da voz do autor à voz do tradutor
▪ A terceira voz no texto, a língua de ninguém (Barrento, Miguel Serras
Pereira)
▪ Da experiência à reflexão (Antoine Berman)
▪ Da letra da tradução (Antoine Berman)
▪ Domesticação e alteridade
▪ Traduzibilidade e intraduzibilidade
▪ A analítica da tradução segundo Berman: as tendências deformantes (racionalização,
clarificação, alongamento, enobrecimento…)
▪ Schleiermacher e as duas direções da tradução (levar o autor ao leitor (perspetiva
domesticante/etnocêntrica) ou o leitor ao autor (perspetiva estrangeirante/de
alteridade)
▪ As estratégias de tradução e a reflexão sobre tradução : empréstimo, decalque,
transposição, modulação, equivalência, adaptação, paráfrase, mudanças/alterações
(coesão, estrutura frásica…), filtragem cultural…
▪ Processos de transformação ou “regras de reescrita”
▪ As topologias culturais (segundo Steiner) “estudar o estatuto do sentido é estudar a
substância e os limites da tradução” - tradução é transformação e transmutação
“Poderíamos chamar topológicas estas
transformações múltiplas, a estas reordenações
de relações entre um acto verbal e as sucessivas
ocorrências, sob outras formas, verbais ou não.”

“uma cultura é uma sequência de traduções e


transformações constantes (tenhamos presente
que ‘tradução’ tende sempre para ‘transformação’)”
Steiner e as transformações topológicas

▪ Reformulação cultural (mantêm-se as relações iconográficas,


mudanças formais, mudanças de tom)

▪ Paráfrase (reelaboração, recriação, criatividade dentro dos limites do


sentido)

▪ Substituição (A equivalência é visada através da substituição de


signos “iguais” ao original.)

▪ Permutação (opera mais em aspetos temáticos. Elementos


formuladores moldam formas de expressão duradouras)

▪ Interanimação (identidade do sujeito reforçada e redefinida graças à


reciprocidade. Alusões.)
Crítica de tradução

▪ crítica e recensão
▪ confronto analítico e comparativo do texto original e da respetiva
tradução
▪ inventariar e comentar semelhanças e diferenças de estrutura e
linguagem entre o texto-fonte e alvo
▪ processo de tradução individual
▪ estratégias adotadas pelo tradutor
▪ apreciação do processo de tradução
▪ papel dos fatores e condicionantes
Uma crítica de tradução pressupõe :

▪ uma análise do texto-fonte


▪ tipo de texto e estratégias de tradução
▪ o texto-alvo: análise (semelhante à do texto-fonte)
▪ hierarquia de princípios de equivalência
▪ comparação
▪ apreciação
Crítica de tradução

▪ Análise e compreensão do texto-fonte


▪ Fatores externos ao texto (extralinguísticos, intertextualidades…)
▪ A intenção do autor
▪ Autonomia semântica
▪ Um discurso e uma situação de comunicação
▪ Uma mensagem e os seus indícios
▪ O sentido do texto é dinâmico e resulta de exegeses diversas
▪ Local de produção do texto
▪ As realidades políticas, sociais, económicas, culturais
▪ Os realia e as particularidades da situação de produção
▪ O fator tempo (produção e receção-fonte e tradução e receção-alvo)
Fatores internos do texto

▪ Texto e comunicação – e a instância leitor


▪ Temática e nível lexical (isotopias - uma cadeia de elementos lexicais ligados
entre si constituem um plano isotópico, o qual deverá ser mantido na
tradução e que pode remeter para o programa temático do texto)
▪ Conteúdo - a informação semântica (referência a um estado das coisas ou
factos reais de uma realidade extralinguística que pode, ou não, ser fictícia) -
semântica do vocabulário e estruturas utilizadas
▪ Estrutura – macroestrutura (parágrafos, marcações de capítulos) e
microestrutura (construções de frases)
▪ Léxico (formação de palavras, metáforas, repetições, seleção lexical,
características semânticas
▪ Sintaxe (tipos de frases, tipos de proposições/parataxe e hipotaxe, ligações
frásicas, conetores
▪ Semântica (polissemias, homonímias…)
▪ Estilo - utilização criativa e individual dos recursos da língua, modo como a
informação é transmitida, modos de formulação, intenções
“Cada texto es único y, simultáneamente, es la traducción
de otro texto. Ningún texto es enteramente original
porque el lenguaje mismo, en su esencia, es ya una
traducción: primero, del mundo no verbal y, después,
porque cada signo y cada frase es la traducción de otro
signo y de otra frase. Pero ese razonamiento puede
invertirse sin perder validez: todos los textos son
originales, porque cada traducción es distinta. Cada
traducción es, hasta cierto punto, una invención y así
constituye un texto único.”

Octavio Paz

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