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A COMUNIDADE POLÍTICA, A IGREJA CATÓLICA E SUA CONTRIBUIÇÃO NA

RESPONSABILIDADE SOCIAL E AMBIENTAL

Karen Freme Duarte Sturzenegger1

RESUMO

O artigo em questão tem como Objetivo Geral refletir sobre a comunidade política, a Igreja Católica e sua contribuição na
Responsabilidade Social e Ambiental Metodologia: Como metodologia, utilizou-se a pesquisa bibliográfica, qualitativa,
descritiva, exploratória e documental. Introdução: Quando se fala de comunidade política ou se questiona o que seria
comunidade política, talvez, as pessoas possam imaginar, em um primeiro momento, que trata-se de um grupo de pessoas
engajadas em projetos ou ações políticas. Sim, também é isso, mas não somente isto. A comunidade política, segundo o
filósofo grego Aristóteles, “é aquela que é soberana entre todas e inclui todas as outras”. Desenvolvimento: Quando se fala
de Comunidade Política na Igreja Católica, entende-se que essa comunidade, este povo de Deus, está submetido ao
senhorio de Deus. Logo, “O povo de Israel, na fase inicial da sua história, não tem reis, como os demais povos, porque
reconhece tão somente o senhorio de Iahweh. Esta comunidade política atua em várias esferas como a social, econômica,
política e espiritual. Nesse sentido, o papa emérito Bento XVI, na encíclica Deus Caritas Est, de 2005, deixa claro: “A
Igreja não pode e nem deve tomar em suas próprias mãos a batalha política para realizar a sociedade mais justa possível.
Não pode e não deve colocar-se no lugar do Estado. Mas também não pode e nem deve ficar à margem da luta pela justiça”
Considerações Finais: Nesta pesquisa, fica claro como é primordial que os grupos sociais, iniciativa privada, pública,
comunidades políticas e, especialmente, comunidades políticas cristãs atuem de forma conjunta para o bem comum, para a
Casa Comum, para uma Ecologia Integral em que os todos os agentes sociais e eclesiais possam unir-se para a melhoria da
sociedade, da erradicação da pobreza, do abandono dos mais vulneráveis e por uma relação mais saudável e ética com o
meio ambiente.

Palavras-chave: Comunidade Política. Igreja Católica. Responsabilidade Social e Ambiental

1
Doutora em Teologia. Centro Universitário Internacional Uninter. E-mail: karen.sturzenegger@gmail.com
1
INTRODUÇÃO
Quando se fala de comunidade política ou se questiona o que seria comunidade política, talvez,
as pessoas possam imaginar, em um primeiro momento, que trata-se de um grupo de pessoas engajadas
em projetos ou ações políticas. Sim, também é isso, mas não somente isto.
A comunidade política, segundo o filósofo grego Aristóteles 2, “é aquela que é soberana entre
todas e inclui todas as outras. (Política, 1252 a3-5)”. Isto significa que “a comunidade política é a
cidade, que inclui todas as outras formas de comunidade (lares e vilarejos) que a compõe”. (CABRAL,
2022). Logo, Aristóteles tinha o entendimento que o ser humano necessita das coisas e,
principalmente, dos outros.
Entretanto, antes de adentrar no sentido da comunidade política, segundo a Doutrina Social da
Igreja e sua responsabilidade social e ambiental que é o tema deste artigo, vale trazer o sentido inicial
filosófico aristotélico, mesmo que de forma, panorâmica, para se apresentar as raízes do significado de
comunidade política.
Assim, Aristóteles dizia que o indivíduo é por excelência carente e imperfeito. Por isso, ele
encontraria na comunidade sua completude. A partir do momento, que o sujeito inicia seu contato com
outras pessoas e se relaciona com elas, automaticamente, ele se transforma em um ser naturalmente
político.

Portanto,
conforme Aristóteles, o conceito de cidadão varia de acordo com o tipo de governo. Isso porque
o cidadão é aquele que participa ativamente da elaboração e execução das leis, sendo estas
elaboradas pelo rei (monarquia), por poucos (oligarquia) ou por todos os cidadãos livres
(democracia). (CABRAL, 2022).

No entanto,

nem todos os que moram na cidade são cidadãos. Aristóteles diferencia habitante de cidadão,
pois aqueles apenas moram na cidade, não participam dela, enquanto que esses dos que
realmente pensam sobre ela tem o direito de deliberar e votar as leis que conservam e salvam o
Estado. Dito de outro modo, cidadão é aquele que tem o poder executivo, legislativo e judiciário.
(CABRAL, 2022).

Percebe-se, dessa forma, que a comunidade política autêntica não é aquela que
somente vive em determinado local, mas para que participa ativamente de processos
decisórios de seu entorno.

2
Aristóteles nasceu na cidade de Estagira, na Macedônia, em 384 a.C. Foi um dos três grandes filósofos da Grécia Antiga,
tendo convivido e estudado com Platão. Sabe-se que, em sua juventude, teve uma sólida formação em ciências, o que
influenciou bastante a sua produção filosófica. Disponível em:
https://mundoeducacao.uol.com.br/filosofia/aristoteles.htm#:~:text=Quem%20foi%20Arist%C3%B3teles%3F,bastante
%20a%20sua%20produ%C3%A7%C3%A3o%20filos%C3%B3fica.
2
Aristóteles também destaca quatro pilares que seriam a base das comunidades políticas. Seriam
pessoas com um objetivo comum, unidas por sentimentos como amizade e justiça, ou seja, por algum
tipo de vínculo social/afetivo.
As características dessa comunidade seriam as seguintes:

 Causa Material: Lares, vilarejos, etc. É a partir de onde nasce a cidade. (CABRAL, 2022).
 Causa Formal: O regime ou Constituição que ordena a relação entre suas partes, dando forma
a ela. (CABRAL, 2022).
 Causa Eficiente: Desenvolvimento natural. Para Aristóteles, a cidade é um ser natural, um
organismo vivo. (CABRAL, 2022).
 Causa Final: A finalidade da cidade é a Felicidade, ou seja, alcançar o bem soberano.
(CABRAL, 2022).

Dessa forma, segundo Aristóteles, “toda comunidade visa um bem”, não necessariamente um
bem que beneficie a todos ou um bem coletivo, mas tem como finalidade algum tipo de bem.
“Sendo assim, toda comunidade tem um fim como meta, uma vantagem que deve ser aquela
principal e que contém em si todas as outras. Portanto, a maior vantagem possível é o bem
soberano”. (CABRAL, 2022).
Dentro dessa linha de pensamento, valoriza-se muitíssimo a comunidade política, segundo o
filósofo grego, até mesmo mais que as demais comunidades, pois o cidadão que é um ser político,
que delibera e cria leis, destaca-se por enxergar coletivamente as necessidades alheias.
Por isso, estimula-se que cidadão ou animal político (conforme Aristóteles), não seja apenas
uma pessoa com robustez física, mas que seja um sujeito que goza de direitos e deveres, sendo
capaz de comandar, deliberar, sugerir e opinar.
Conforme conclui o professor de Filosofia sobre a visão aristotélica, João Francisco Cabral, “a
cidade é soberana porque visa o bem comum, soberano. O indivíduo livre é soberano porque é
senhor de si”. (CABRAL, 2022).

1. A COMUNIDADE POLÍTICA

Na Introdução, abordou-se os aspectos filosóficos aristotélicos do indivíduo político. Sem


embargo, surge a pergunta: Como esse tema se aplica quando a referência está na Doutrina Social da
Igreja? Quando se fala em Igreja, vale lembrar que a instituição em questão nesse artigo refere-se à
Igreja Católica Apostólica Romana.

3
Para isso, se trará alguns conceitos esboçados no Compêndio da Doutrina Social da Igreja e do
documento DOCAT3 – Como Agir, que é um livro que apresenta a Doutrina Social da Igreja em uma
linguagem jovem e dinâmica. Para àqueles que desejarem maiores detalhes sobre a Doutrina Social,
sugere-se a leitura do Compêndio da Doutrina Social da Igreja de forma mais aprofundada. 4
Quando se fala de Comunidade Política na Igreja Católica, entende-se que essa comunidade,
este povo de Deus, está submetido ao senhorio de Deus. Logo, “O povo de Israel, na fase inicial da sua
história, não tem reis, como os demais povos, porque reconhece tão somente o senhorio de Iahweh. É
Deus que intervém na história através de homens carismáticos, conforme testemunha o Livro dos
Juízes”. (CDSI, 377).
O protótipo do rei escolhido por Iahweh é Davi,

cuja condição humilde o relato bíblico ressalta com complacência (cf. 1 Sam 16, 1-13). Davi é o
depositário da promessa (cf. 2 Sam 7, 13 ss; Sal 89, 2-38; 132, 11-18), que o coloca na origem de
uma tradição real, precisamente a tradição «messiânica», a qual não obstante todos os pecados e
as infidelidades do mesmo Davi e de seus sucessores, culmina em Jesus Cristo, o «ungido de
Iahweh» (isto é, «consagrado do Senhor» cf. 1 Sam 2, 35; 24, 7.11; 26, 9.16; Ex. 30, 22-32) por
excelência, filho de Davi (cf. as duas genealogias em Mt 1, 1-17 e Lc 3, 23-38; ver também Rm
1, 3). (CDSI, 378)

Ainda assim, com as limitações pessoais e históricas das realezas, não se desaparecerá o ideal
de um rei, que governe com justiça e sabedoria. Constantemente, vê-se essa esperança nos Salmos, nos
livros do Antigo Testamento, como exemplo, Isaías, Jeremias, Zacarias e Provérbios5.
A personificação perfeita da autoridade política e espiritual somente se concretiza na pessoa de
Jesus Cristo. “Jesus rejeita o poder opressivo e despótico dos grandes sobre nações (cf. Mc 10, 42) e
suas pretensões de fazerem-se chamar benfeitores (cf. Lc 21, 25), mas nunca contesta diretamente as
autoridades de seu tempo. Na diatribe sobre o tributo a ser pago a César (cf. Mc 12, 13-17; Mt 22, 15-
22; Lc 20, 20-26). (CDSI, 379).
E mais,
Ele afirma que se deve dar a Deus o que é de Deus, condenando implicitamente toda tentativa de divinizar
e de absolutizar o poder temporal: somente Deus pode exigir tudo do homem”. Ao mesmo tempo o poder
temporal tem o direito àquilo que lhe é devido: Jesus não considera injusto o tributo a César. Jesus, o
Messias prometido, combateu e desbaratou a tentação de um messianismo político, caracterizado pelo
domínio sobre as nações (cf. Mt 4, 8-11; Lc 4, 5-8). Ele é o Filho do Homem que veio «para servir e
entregar a própria vida» (Mc 10, 45; cf. Mt 20, 24-28; Lc 22, 24-27). Aos discípulos que discutem sobre
qual é o maior, Jesus ensina a fazer-se último e a servir a todos (cf. Mc 9, 33-35), indicando aos

3
DOCAT. A Doutrina Social da Igreja Para os Jovens. Disponível em: https://www.jovensconectados.org.br/docat/
4
Compêndio da Doutrina Social da Igreja. Disponível em:
https://www.vatican.va/roman_curia/pontifical_councils/justpeace/documents/rc_pc_justpeace_doc_20060526_compendio-
dott-soc_po.html
5
O fracasso, no plano histórico, da realeza não ocasionará o desaparecimento do ideal de um rei que, em fidelidade a
Iahweh, governe com sabedoria e exerça a justiça. Esta esperança reaparece repetidas vezes nos Salmos (cf. Sal 2; 18; 20;
21; 72). Nos oráculos messiânicos é esperado, para um tempo escatológico, a figura de um rei dotado do Espírito do
Senhor, pleno de sapiência e em condição de trazer justiça aos pobres (cf. Is 11, 2-5; Jr 23, 5-6). Verdadeiro pastor do povo
de Israel (cf. Ez 34, 23-24; 37, 24) levará a paz aos povos (cf. Zc 9, 9-10). Na literatura sapiencial, o rei é apresentado
como aquele que emite justos juízos e aborrece a iniqüidade (cf. Pr 16, 12), julga os pobres com equidade (cf. Pr 29, 14) e é
amigo do homem de coração puro (cf. Pr 22, 11). Torna mais explícito o anúncio de tudo quanto os Evangelhos e os demais
autores do Novo Testamento vêem realizado em Jesus de Nazaré, encarnação definitiva da figura do rei descrita no Antigo
Testamento. (CSDI, 378).
4
filhos de Zebedeu, Tiago e João, que ambicionam sentar-se à Sua direita, o caminho da cruz (cf. Mc 10,
35-40; Mt 20, 20-23). (CDSI, 379)

Desta forma, as primeiras comunidades cristãs começam a construir o senso de coletividade,


sempre compreendendo que o poder absoluto e perfeito emana de Deus. Ainda assim, os cristãos se
submetem às demais autoridades com submissão, mas não de forma passiva, mas de forma respeitosa,
com dever cívico, de temor e deferência. Quem destaca esses direitos e deveres é o apóstolo São Paulo,
que define as relações dos cristãos com as autoridades. Ressalta-se que “o Apóstolo certamente não
pretende legitimar todo poder, pretende antes ajudar os cristãos a «fazer o bem diante de todos os
homens» (Rm 12, 7), também nas relações com a autoridade, na medida em que esta está ao serviço de
Deus para o bem da pessoa (cf. Rm 13, 4; 1 Tm 2, 1-1; Tt 3, 1) e «para fazer justiça e exercer a ira
contra aquele que pratica o mal» (Rm 13, 4)”. (CSDI, 380).
Em vista disso, para a Igreja Católica, baseada na Doutrina Social da Igreja, a comunidade
política é a “comunidade que regula os negócios públicos de uma sociedade, a res publica, como os
romanos a designavam, em contraste com os interesses privados”. (DOCAT, 195). Deste modo, a
comunidade política cristã é um grupo de pessoas que compreendem e respeitam suas autoridades civis
e espirituais, mas sua crença basilar está na crença de um Deus absoluto e soberano e que rege todas as
coisas.
Isto posto, essa crença em um Deus monoteísta e absoluto não deve ser algo meramente
abstrato, sem alcançar as realidades sociais e temporais. Trata-se de uma crença que se materializa na
vida social, econômica, espiritual e política. Por isso, da relevância do entendimento do significado da
comunidade política a partir dos princípios da Doutrina Social da Igreja.
Para melhor ilustrar essa percepção, segue ilustração de como ocorre esse movimento do
Modelo de Desenvolvimento baseados na DSI6:

6
Sigla para Doutrina Social da Igreja.
5
2. COMO O INDIVÍDUO É POLÍTICO NO CRISTIANISMO?
Diante do que foi explanado até o momento, poderá surgir a seguinte pergunta: Como a Igreja e
o cristão devem posicionar-se quando o tema é a política? Nesse sentido, o papa emérito Bento XVI,
na encíclica Deus Caritas Est, de 2005, deixa claro: “A Igreja não pode e nem deve tomar em suas
próprias mãos a batalha política para realizar a sociedade mais justa possível. Não pode e não deve
colocar-se no lugar do Estado. Mas também não pode e nem deve ficar à margem da luta pela justiça”.
(BENTO XVI, 2005).
Nesse quesito, a Igreja sempre deve ter em vista um modelo de desenvolvimento que promova
um progresso equitativo, levando em consideração uma economia de comunhão e inclusão, gerando
líderes que respeitem, protejam e acolham a sociedade e o meio ambiente, tendo um olhar especial
para formar uma sociedade isonômica e sem pobres.
Ou seja, a Igreja não deve colocar-se no lugar do Estado, mas não pode ser omissa. Nesse
sentido, a máxima também vale para os indivíduos, com a diferença, que os cidadãos leigos tem
autorização e, quando sentir-se impelidos, envolver-se com mais afinco em projetos políticos para
favorecer a sociedade de forma mais justa e igualitária.
Algo a ser sublinhado neste artigo é que em vários momentos, utilizou-se a palavra “coletivo”,
“grupo”, “comunidade”, entretanto, algo a ser evidenciado quando se trata do Cristianismo, é a visão
individual e particular de cada sujeito, de cada pessoa.
Como citado claramente no DOCAT (2016),

6
Em contraste com os autores antigos, o cristianismo sublinha, antes de tudo, o valor incondicional da
pessoa, e isto independentemente do seu rendimento na vida pública e política. Mesmo um deficiente ou
um idoso tem esta dignidade, de ser criado à imagem e semelhança de Deus. Por isso, todo o pensamento
político no cristianismo toma como referência a dignidade do homem que lhe é dada por Deus. O homem
é um ser individual e social. Ele vive num sistema de relações triangulares: 1. Consigo mesmo; 2. com os
outros e 3. com Deus. O homem é medida e fim da política. (DOCAT, 196, 2016).

E em que medida a política é importante? Aqui se tem a pedra angular sobre a importância da
política para o Cristianismo: Para os cristãos, o Estado nunca vem em primeiro lugar, mas sim a
pessoa, o indivíduo. Como citado no DOCAT (2016, 197), “para os cristãos, o `Estado` vem sempre
depois da pessoa, ou seja, da comunidade de pessoas que hoje designamos como ´sociedade civil´”. E
segue: “Em primeiro lugar, o homem encontra-se a si mesmo e a sua dignidade na relação com Deus
(→TRANSCENDÊNCIA), depois realiza-se na relação com os seus semelhantes (relação social)”.
(DOCAT, 2016, 197).
Por fim, finaliza: “Estas duas dimensões estão intimamente relacionadas entre si. Em todo o
caso, deve vir em primeiro lugar o direito da pessoa, a seguir a sociedade e, finalmente, a organização
política do Estado”. (DOCAT, 2016, 197).
Quando se tem esse entendimento, sobre a sadia relação entre a pessoa, a comunidade e o
Estado, as necessidades que surgem, os debates, as políticas públicas e as ações práticas se tornam
cada vez mais acessíveis para os cidadãos e o seu entorno.
E esse entorno são as pessoas e seus agrupamentos, bem como os espaços de moradia e habitat
em que se encontram. O Meio Ambiente. Este é um outro termo que muito se têm falado e que a
comunidade política tem papel essencial que é a Responsabilidade Socioambiental, tão debatida entre
as organizações internacionais e difundida pelo Papa Francisco, em especial, na Carta Encíclica,
Laudato Si´7, sobre o cuidado da Casa Comum e, posteriormente, através do livro escrito por
Francisco, Vamos Sonhar Juntos.
As ações políticas têm papel fundamental para que essa Casa Comum seja lar para as pessoas,
as comunidades e, por fim, para o Estado e que assim, se tenha uma relação harmoniosa e de respeito e
não de exploração e extermínio da fauna, flora e abandono dos mais pobres. Sendo assim, se adentrará
neste tema, mesmo que se forma breve, para complementar o que se está discorrendo até este
momento.

7
Para aprofundar-se. Carta Encíclica Laudato Si´. Disponível em:
https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html.
Acesso em: 22 mar. 2022.
7
3. VAMOS SONHAR JUNTOS

O livro Vamos Sonhar Juntos (2020), escrito por Francisco, posterior à Laudato Si´ (2015), o
papa vem fazer uma importante reflexão e alerta. Ele diz: “Durante muito tempo pensamos que
podíamos ter saúde num mundo que estava doente. Mas a crise nos fez perceber quão importante é
trabalhar por um mundo são”. (FRANCISCO, 2020, p. 37)

Francisco reflete:

O mundo é um dom de Deus à humanidade. A história bíblica sobre a Criação tem um refrão
constante: “E Deus viu que era bom” (Gn 1, 12). “Bom” significa generoso, vivificante, belo. A
beleza é a porta de entrada para a consciência ecológica. Quando ouço A Criação, de Haydn, sou
transportado à glória de Deus na beleza das coisas criadas. No final, no longo dueto de Adão e Eva,
encontra-se um homem e uma mulher extasiados pela beleza que lhes foi oferecida. A beleza, como a
própria Criação, é puro dom, um sinal do Deus repleto de amor por nós. Se alguém que ama você lhe
dá um presente bonito e valioso, como você lida com ele? Tratá-lo com desdém é tratar com desprezo
quem lhe deu aquilo. Se você dá valor ao presente — se o admira, cuida dele, não desdenha dele —,
você o respeita e se sente grato. O ato de danificar o nosso planeta nasce da perda dessa
consciência de gratidão. Nós nos acostumamos a ter, e pouco ou nada a agradecer. (grifo nosso).
(FRANCISCO, 2020, p.37)

É interessante notar que, nesse livro, Francisco relata uma experiência pessoal de consciência
sobre a importância do ecossistema. Ele narra que essa primeira tomada de entendimento começa a
acontecer em uma reunião de bispos da América Latina no santuário de Aparecida, no Brasil, em
2007. Ele disse que: “Eu fazia parte do comitê de redação do documento final do encontro e, a
princípio, fiquei um pouco incomodado com o fato de os bispos brasileiros e alguns de outros
países quererem tantas referências à Amazônia. Para mim, parecia excessivo”. (FRANCISCO,
2020, p. 38).
Foi assim que em 2019, o Papa Francisco convocou um Sínodo especial sobre a Amazônia.
Mas, antes do encontro desses dois momentos na vida do papa, ele mesmo relata, que começou a
acompanhar com mais afinco notícias relacionadas ao meio ambiente. Ele destaca uma notícia
chamou sua atenção sobre um governante de uma ilha do Pacífico, que comprou terras da Ilha de
Samoa para transferir toda a sua população para essa nova localidade, visto que onde viviam,
dentro de vinte anos, a ilha estaria abaixo do nível do mar.
O papa comenta que “e assim, depois de muitos encontros, diálogos e acontecimentos, meus
olhos foram se abrindo, com num acordar”. (FRANCISCO, 2020, p.38). E ainda acrescenta: “Foi
este o meu processo: muito sereno, muito tranquilo, com dados dos quais ia tomando
conhecimento, até que tive convicção de que a coisa era séria”. (FRANCISCO, 2020. p. 38).
E, de fato, a coisa é séria, seríssima. Segundo o relatório, de nome Relatório Fronteiras 2022,
do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), aponta riscos e temas de

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preocupação relacionados ao meio ambiente e desequilíbrios ambientais globais com possíveis
impactos negativos para a humanidade. (AGÊNCIA BRASIL, 2022).
Abaixo, se transcreverá parte desse relatório para explanar a seriedade do tema. A edição foi
feita pela Agência Brasil8:
O documento identificou a ampliação da poluição sonora nos centros urbanos, com potenciais
problemas para o bem-estar e a saúde pública. Esse fenômeno pode resultar em doenças cardíacas,
diabetes, de audição e distúrbios mentais.
O documento identificou a ampliação da poluição sonora nos centros urbanos, com potenciais
problemas para o bem-estar e a saúde pública. Esse fenômeno pode resultar em doenças cardíacas,
diabetes, de audição e distúrbios mentais.
Segundo o estudo, a poluição sonora ocasionou 12 mil mortes prematuras na União Europeia.
Entre os grupos populacionais mais atingidos estão segmentos vulneráveis que moram próximos a
estradas e rodovias, jovens e idosos. Esse problema também pode afetar animais, alterando as
comunicações entre espécies.
Os autores recomendam que gestores, urbanistas e arquitetos promovam projetos que
dificultem a circulação da poluição sonora, valorizem sons naturais, privilegiem formas alternativas
de transporte e promovam espaços verdes nas localidades. A pandemia trouxe um novo incentivo à
vivência em espaços abertos e a redução de barulho do tráfego, o que pode ser aproveitado, diz o
documento.

Incêndios
Conforme a pesquisa, os incêndios tendem a crescer no mundo. Entre 2002 e 2016, uma área do
tamanho da União Europeia foi queimada, cerca de 4,2 milhões de quilômetros quadrados. Esse
cenário tende a piorar e atingir novos locais para além de savanas e florestas mistas. Nos últimos
anos, ganharam visibilidade grandes incêndios nos Estados Unidos, Austrália e Grécia.
Essa situação está relacionada às mudanças climáticas, que geram temperaturas maiores e
estações mais secas. Os autores listaram entre as causas dessa piora, fenômenos humanos, como
desflorestamento, expansão urbana e exploração comercial de madeira. Essas práticas foram
destacadas em locais como América Latina. Em 2019, mais de seis milhões de hectares foram
queimados em áreas da Bolívia, Brasil, Colômbia, Peru e Paraguai.
“Com efeitos conjuntos de um clima mais quente que estende as estações de fogo e podem gerar
mais eventos naturais e da mudança no uso da terra que introduz mais combustíveis e riscos de
ignição desses eventos, e de mais comunidades na interface entre terras selvagens e áreas urbanas,
desafios importantes estão postos”, alerta o relatório.

8
AGÊNCIA BRASIL. Relatório da ONU aponta ameaças ao meio ambiente. Disponível em:
https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2022-02/relatorio-da-onu-aponta-ameacas-ao-meio-ambiente. Acesso em: 22
mar.2022.
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Entre os prejuízos causados pelos incêndios estão a perda de vidas, a evacuação de populações de
suas casas e poluição dos ares em áreas para além do local dos incêndios, além de prejuízos à
biodiversidade.

Mudanças climáticas
O relatório do Pnuma indica que as mudanças climáticas estão impactando diretamente os ciclos
de vida de plantas e animais, levando estas a reagir a alterações em condições ambientais. Eventuais
mudanças afetam, por exemplo, quando plantas crescem, geram flores e frutos, obtêm a polinização e
encaminham os procedimentos de seu ciclo de vida.
A preocupação, alertam os autores do estudo, é que nem sempre as espécies se adaptam da mesma
forma e no mesmo ritmo, o que pode ampliar os desequilíbrios. Determinadas espécies de plantas
podem mudar seu ciclo, entrando em desajuste com animais herbívoros, dificultando as formas de
alimentação destes.
Essas mudanças também podem trazer consequências para a produção de alimentos e para a
captura e processamento de animais com fins alimentares.

Logo, confirma-se que, realmente, os desequilíbrios ambientais trazem sérios impactos negativos
para a humanidade. Entre eles, a mudança climática não é apenas uma ameaça para o planeta e as
pessoas, mas também para a economia local e mundial como um todo.
Segundo o Grupo IBERDROLA, “trata-se de um problema que exige a colaboração entre o
setor público e o privado a fim de transformar o modelo produtivo para em que garanta e impulsione o
desenvolvimento e o crescimento econômico sustentável”. (IBERDROLA, 2022).
O Grupo Iberdrola ainda cita que,

além de seu grave impacto no meio ambiente e nas pessoas, a mudança climática
também é uma das maiores ameaças para a estabilidade econômica. As ondas de calor
reduzem a capacidade de trabalho e a produtividade. Os furacões, ciclones e tufões
deixam milhões de pessoas na mais absoluta pobreza após arrasar cidades com total
indiferença. As secas reduzem as colheitas, dificultando cada vez mais a árdua tarefa de
alimentar uma população mundial que chegará a 10 bilhões de pessoas em 2050
(Perspectivas da População Mundial 2019, ONU). O Banco Mundial adverte: se não
adotarmos medidas de caráter urgente, os impactos causados pela mudança climática
poderão levar mais 100 milhões de pessoas à pobreza até 2030. (IBERDROLA, 2022).

O grande questionamento que se faz pela liderança internacional é: É possível frear a mudança
climática e impulsionar a economia?
“Apesar das reticências iniciais da comunidade empresarial, cada vez mais estudos e atuações
demonstram que as medidas destinadas a combater o aquecimento global são uma oportunidade de
ouro para garantir o desenvolvimento sustentável e impulsionar o crescimento econômico”.
(IBERDROLA, 2022).

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E: “Tal como explica a Comissão Mundial sobre a Economia e o Clima em um relatório do
final de 2018, a adoção de medidas climáticas ambiciosas poderia gerar um lucro econômico de 26
bilhões de dólares até 2030, assim como 65 milhões de novos empregos com baixas emissões de
carbono”. (IBERDROLA, 2022).
Logo, entende-se, tanto como a fala do Papa Francisco, como do Relatório da ONU e do Grupo
IBERDROLA, que sim, a Responsabilidade Ambiental não é apenas algo ideológico, fantasioso, mas
urgente e necessário, pois impacta a vida de todos.
Como disse Francisco no livro Vamos Sonhar Juntos, “é uma consciência, não é uma ideologia”.
(FRANCISCO, 2020, p.39). E Francisco ainda ressalta: “A Laudato Si´ (Louvado Sejas) não é uma
encíclica social. O verde e o social caminham juntos: o destino da Criação está unido ao destino de
toda a humanidade”. (FRANCISCO, 2020, p.40)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Desta maneira, a partir de tudo que foi apresentado nesta pesquisa, fica claro como é primordial
que os grupos sociais, iniciativa privada, pública, comunidades políticas e, especialmente,
comunidades políticas cristãs atuem de forma conjunta para o bem comum, para a Casa Comum, para
uma Ecologia Integral em que os todos os agentes sociais e eclesiais possam unir-se para a melhoria da
sociedade, da erradicação da pobreza, do abandono dos mais vulneráveis e por uma relação mais
saudável e ética com o meio ambiente.
Como dito por Francisco: “Temos de achar maneiras para que aqueles deixados de lado se
convertam em atores de um novo futuro. Temos de envolver o povo num projeto comum que não
beneficie apenas um pequeno grupo de pessoas. Temos de mudar o modo
como a sociedade funciona após a crise da Covid-19”. (FRANCISCO, 2020, p.19)
E por fim, acrescenta: “Quando falo de mudança, não significa apenas que precisamos cuidar
melhor de um grupo de pessoas ou de outro. O que quero dizer é que essas pessoas que hoje estão na
periferia devem se tornar os protagonistas das transformações sociais. É nisso que acredito, de
coração”. (FRANCISCO, 2020, p.19).
E é nisso que se deve acreditar e atuar, em uma mudança real, vivencial e de transformação
social e, principalmente, humana.

REFERÊNCIAS

AGÊNCIA BRASIL. Relatório da ONU aponta ameaças ao meio ambiente. Disponível


em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2022-02/relatorio-da-onu-aponta-
ameacas-ao-meio-ambiente. Acesso em: 20 mar. 2022.

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ARISTÓTELES. Política. Ed. Edipro. São Paulo, 2019.

BENTO XVI. Carta Encíclica Deus Caritas Est do Sumo Pontífice Bento XVI aos
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