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Volume 56
DIRETORESCOLAR
educadorou gerente?
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação(CIP)
(CâmaraBrasi[eira do Livro, SPIBrasi])
ISBN 978-85-249-2316-6
14-13272 CDD-371.1024
82326
Sumário
Apresentação. 13
Introdução..... 17
2. Diretor e direção....... 37
Referências 121
11
Lista de Siglas
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t
37
Diretor e direção
na literatura sobre administraçãoescolar.é generalizado [...] Assim. por exemplo, considere-seque uma cousaé ser
diretor, outra é ser administrador. Direção é função do mais
(embora não exclusivo) o uso indistinto de administrador(ou
alto nível que, como a própria denominação indica, envolve
gestor) escolar e de diretor escolar com o mesmo significado.
linha superior' e geral de conduta, inclusive capacidade de
Entretanto, parece ser quase unânime a preferência liderança para escolhade filosofia e política de ação. Admi-
pela expressão"diretor escolar", quando se trata de deno- nistração é instrumento que o diretor pode utilizar pessoal-
minar oficialmente, por meio de leis, estatutos ou regimen- mente ou encarregar alguém de fazê-lo sob sua responsabi-
tos, aquele que ocupa o cargo hierarquicamente mais ele- lidade. Por outras palavras: direção é um todo superior e
vado no interior de uma unidade de ensino. Mesmo entre mais amplo do qual a administração é parte, aliás, relativa-
a população usuária, quando alguém se refere ao cargo, é mente modesta. Pode-sedelegar função administrativa;
ao de diretor que se reporta, não ao de administrador; e função diretiva, parece-nos,não se pode, ou, pelo menos.
não se deve delegar. (p. 22)
praticamente ninguém vai à escola à procura do adminis-
trador, mas sim do diretor escolar.
Essacontribuição de R=ibeiroajuda a pautar a diferença
Parece que, quando tratados genericamente, ou seja, que pretendo estabelecerentre administração e direção,
"a olho nu", os termos administração e direção escolar se além de elucidar o papel que cabe a esta última na organi-
conftlndem, mas quando se trata de exigir rigor e especifi- zação da escola básica. Esse ponto de vista assume que a
cidade, a direção se impõe como algo diverso da adminis- direção,em certo sentido, contém a administração e simul-
tração. E não parece descabido que isso aconteça. Quando taneamente Ihe é mais abrangente. A direção engloba a
se trata da direção da escola e do responsável por ela, pre- administração nos dois momentos desta, de racionalização
tende-se uma maior abrangência de ação e um ingrediente do trabalho e de coordenação,mas coloca-seacima dela.
político bastantenítido, que a administração,muito mais em virtude do componentede poder que Ihe é inerente.
técnica, parece não conter: o diretor é aquele que ocupa a naHa[,v-Br..oH;aa+' n.]a ,] H;ran a à a aH]rn;vn;obrar'an n rne iHa Hn
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mais alta hierarquia de poder' na instituição. poder necessário para fazer-se a responsável última pela
Quem faz boa análise a respeito desse assunto é José instituição, ou seja, para garantir seu funcionamento de
Querino Ribeiro (1968). O autor que, mais de uma vez, acordo com "uma filosofia e uma política" de educação
identifica em suas obras direção e administração, faz ques- (Ribeiro, 1952).
Ç tão de deixar nítida a diferença entre ambas: O mesmo José Querino Ribeiro, ao falar sobre "âloso-
{
empresa está na situação de quem estabelece os fins da primeiro ciclo, ou pümeiras quatro' sériesdo EnsinoFun-
organização,ou é investido do poder de fazê-los realizar-se. damental, vê a direção e a administração de um modo menos
ou ambas essas atribuições ao mesmo tempo. No âmbito da hierarquizado, dizendo que "a peculiaridade da direção é a
administração há. pois, o emprego do esforço humano co- integração't Assim, o diretor não precisa ser o controlador,
lam-;vrn.hn lnnlTlnl.rra n nnnv/lona-/'rl/\ fqo('c'Qno nrrln flnnlnrqn
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DIY J a \lvul Dita\fclv LA\..#oovLJol\il\fLI Jvvl \i "ele é o integrador da parte administrativa" que se refere às
nação esta que pode referir-se ora ao todo ora a partes do formas de Cozeras coisas acontecerem na unidade escolar.
empreendimento-Mas isso não impede que essasatividades C)mais â'equente em nossasociedadeé que a direção
sejam subsumidas pela direção, da qual depende, em última esteja nas mãos de poucos, que estabeledbm os objetivos e
instância, o "rumo" ou a "orientação" que deve seguir o determinam que eles se.jamatingidos,restandoà grande
empreendimento em termos de seus fins. maioria executar as ações necessárias ao cumprimento dos
Na pesquisa de campo foi perguntado aos educadores âns da empresa por meio de seu esforço. Isso não impede
se eles faziam distinção entre administrador e diretor. Lour- de se pensar numa hipótese em que os fins sejam estabele-
des. a diretora. diz identificar o administrativo mais como cidos pelos próprios indivíduos que despendem esforço em
um "procedimento" que envolve princípios de economia de realiza-lose que se investem também da função de zelar
reclursos,de efetividade de ações, etc., e que "a direção é o diretamente por seu cumprimento. O que teríamos, então,
norte, o caminho.. . Então. quando eu digo: 'nós vamos fazer seria uma espécie de "sobreposição" da administração e da di-
reção, cada uma, porém, mantendo sua ftlnção característica.
esteprocedimento na rematrícula' [explica o procedimento],
isto é direção." Em outras palavras, a direção estaria articu- Mas é o conceito de direção do senso comum, em que
lada com a autoridade, com a capacidade de traçar o cami- poucos exercem seu comando sobre muitos, que viga em
nho e levar os outros a segui-lo, enquanto a administração nossos sistemas de ensino com relação ao papel do diretor
envolveria os procedimentos, as condutas, as medidas de escola. Este é, em geral, não apenas o encarregado da
adotadas para fazer valer determinada direção. Perguntada administração escolar. ao zelar pela adequação de meios a
sobre se haveria uma hierarquia, ela concorda que o dire- âns -- pela atenção ao trabalho e pela coordenação do es-
tivo está acima do administrativo . forço humano coletivo --, mas também aquele que ocupa
o mais alto posto na hierarquia escolar com a responsabili-
Para Dirce, professora de Informática, o diretor é aque-
dade por seu bom ftlncionamento. Pode até acontecer de
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le que se preocupa com o político-pedagógico na escola, e,
{
nização conselhos de escolasou outras instituições auxilia- pital) e o da escola (construção, pela educação, de sujeitos
res da gestão com atribuições deliberativas ou não --, humano-históricos)sejam obtidos de forma idêntica, ou
mas quem responde, em última instância, pelo cumprimen- semelhante, sem levar em conta a singularidade' do pro-
to das leis do ensino e pela ordem no âmbito da escola (ou cessode produção pedagógico nem questionar os efeitos
seja, pelo funcionamento da empresa escolar) é o diretor. deletérios de uma coordenação do esforço humano coletivo
na escola nos moldes do controle do trabalho alheio ineren-
.Mém disso, a concepção que se tem do diretor escolar
te à gerência capitalista?
não costumadiferir da concepçãode diretor de qualquer
outra empresa da produção económica.Assim, o espírito Essasindagações estão no centro da questão aqui exa-
que rege o tratamento dado ao diretor de escola e as expec- minada, qual seja: dados o caráter político da direção da
tativas que se tem sobre ele são cadavez mais semelhantes escola ftlndamental, sua subsunção da administração escolar
ou idênticos ao modo de considerar o típico diretor da em- e a necessária adequação entre meios e fins como princípio
presa capitalista' (Félix, 1984; Paro, 2012b). administrativo, como se configura a ação administrativa do
Seconsiderarmos o que foi dito anteriormente sobrea diretor de escola fundamental, diante dos fins da educação
necessária adequação entre meios e fins para a efetivação e da especificidade do processo de produção pedagógico?
da administração,e contrastarmosos âns que sebuscam Ostermos desseproblema envolvem uma variedade de
na empresa tipicamente capitalista com os objetivos da temas que merecem ser examinados, mas, em suma, há que
escola básica, em especial a escola fundamental, vem à tona se considerar os determinantes que interferem no compor-
a seguinte indagação:é possível,em termos políticos ou tamento do diretor da escolapública fundamental. Investido
técnicos, igualar a direção de uma escola à direção de uma na direção, ele concentra um poder que Ihe cabe como fun-
empresa capitalista, desconsiderando o que há de especíâ- cionário do Estado,que espera dele cumprimento de condu-
co na empresa escolar em termos de seu objetivo e da tas administrativas nem sempre (ou quase nunca) coerentes
maneira de alcança-lo? com objetivos autenticamente educativos. Ao mesmo tempo
Em outras palavras:se a administração(subsumida é o responsável último por uma administração que tem por
pela direção) é mediaçãopara a realizaçãode fins, será objeto a escola, cuja atividade-fim, o processo pedagógico,
razoável que fins tão antagónicos quanto os da empresa condiciona as atividades-meio e exige,para que ambas se
capitalista (apropriação do excedentede trabalho pelo ca- desenvolvam com rigor administrativo, determinada visão
de educação e determinadas condições materiais de realiza-
/ ção que não Ihe são satisfatoriamenteprovidas quer pelo
3. Sempre que nos referirmos à "empresacapitalista" estamos supondo o
modo de produção tipicamente capitalista em que o proprietário dos meios de Estado quer pela sociedade de modo geral.
produção(o capitalista) paga ao trabalhador o valor de sua força de trabalho que,
na produção. produz um valor económico maior que seu próprio valor. sendo o
excedente apropriado pelo capitalista. 4. Este tema será desenvolvido no capítulo 3, item 3.5
120
VITORHENRIQUEPARO 121
Em síntese,diante da atual configuraçãoadministrati- ALMEIDA .JÚNIOR, Antõnio F. de. (Org.). Ánzzíího do erzdno do
va e didática da escolabásica, que se mantém presa a pa- agrado de 8ão PazíZo.São Paulo: Tipografia biqueira, 1935-1936.
radigmas arcaicos, tanto em termos técnico-cientí6cos
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de escola,que esteja de acordo com uma concepçãode
a gestão democrática da rede de ensino do município de Aracqju.
mundo e de educaçãocomprometida com a democracia e
In: SINDIPEMA. Democratização íZasescolasíh recuede en$írzodo
a formaçãointegral do ser humano-histórico, e que se fun-
mzz?zícípíode Àxaczz/zl:Leis ns. 3.074 e 3.075, de dezembro de 2002
damente nos avanços da Pedagogiae das ciências e disci-
Aracaju: Sindipema, [2003]. p. 15-26.
plinas que Ihe dão subsídios.
Secretaria Municipal de Educação. .Escola abenzzSemed:
Assim sendo, qualquer que soja o caminho que venham
vamos todos construí-la. Aracqju: Semed, 2006.
a tomar as políticas públicas dirigidas à superação da atual
escolabásica, há que se ter como horizonte uma adminis- BECKER,Gare S. Investment in human capital: a theoretical
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tração e uma direção escolar que levem em conta a educa-
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ção em sua radicalidade, contemplando sua sÍngu7aHíüde
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6 2
VITOR HENRIQUE PARO
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DOAÇÃO 26/03/2015
Origem: Prof Vitor Paro