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PESQUISA

EM PSICOLOGIA

autora
PROFA. DRA. MARÍLIA CAMMAROSANO

1ª edição
SESES
rio de janeiro 2018
Conselho editorial roberto paes e gisele lima

Autora do original marília cammarosano

Projeto editorial roberto paes

Coordenação de produção gisele lima, paula r. de a. machado e aline karina


rabello

Projeto gráfico paulo vitor bastos

Diagramação bfs media

Revisão linguística bfs media

Revisão de conteúdo rodrigo diaz de vivar y soler

Imagem de capa cosma | shutterstock.com

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2018.

Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento


Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa
Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063
Sumário
Prefácio 5

1. A prática da pesquisa em Psicologia 7


A abordagem científica 8

Fontes de ideias e problemas de pesquisa 15

Sujeitos e participantes de pesquisa 19

Ética na pesquisa em Psicologia 20

2. A classificação de pesquisas em Psicologia 25


A classificação de pesquisas em Psicologia 26
Quanto à abordagem: a pesquisa qualitativa e a pesquisa quantitativa 27
Quanto à natureza: a pesquisa básica e a pesquisa aplicada 31
Quanto aos objetivos: a pesquisa explicativa, a pesquisa descritiva e
a pesquisa exploratória 32
Quanto aos procedimentos 33

Etapas de uma pesquisa 37


Formulação da questão inicial 38
A exploração do tema 38
Formulação do problema de pesquisa 39
A construção do modelo de análise 39
A coleta de dados 40
A análise dos dados 41
As conclusões 41

3. O estudo sobre comportamento 45


Conceitos e variáveis de pesquisa 46

Estudos experimentais e não experimentais 52

A seleção da amostra 55

O efeito placebo-nocebo e o procedimento duplo-cego 57


4. Técnicas de coleta e análise de dados 63
Técnicas de coleta de dados 64
Observação 65
Entrevista 68
Questionário 73

Construção e validação de instrumentos 75

Técnicas de análise e interpretação de dados 79

5. Comunicação da pesquisa: elaboração do


projeto e do relatório final 83
A escrita científica 84

Tópicos essenciais do projeto de pesquisa 89

Tópicos essenciais de um relatório final de pesquisa 93


Prefácio

Prezados(as) alunos(as),

Quando estudamos a história da Psicologia, vemos que se trata de uma ciência


relativamente nova no mundo do conhecimento. Por ser um campo de estudos que
envolve o comportamento, traz muita curiosidade por parte das pessoas, de modo
geral, sendo que algumas ideias preestabelecidas ou crenças infundadas do senso
comum acabam se confundindo com o saber científico. Afinal, como podemos dis-
tinguir Psicologia enquanto ciência e senso comum? Qual a importância disso para
um psicólogo? O que a pesquisa em Psicologia tem a ver com isso tudo? Podemos
dizer que estamos falando de questões de extrema relevância para a formação de um
psicólogo. É muito importante que este profissional compreenda pontos fundamen-
tais relacionados à Psicologia como campo do saber formal e científico, e de que ma-
neiras a formação enquanto pesquisador poderá auxiliá-lo, seja na área acadêmica,
seja em qualquer outra área de atuação desse profissional. Saber distinguir ciência
e senso comum é fundamental para a cada vez mais concretizarmos esse campo do
conhecimento e obtermos resultados mais eficientes na prática.
De todo modo, podemos dizer que é muito difícil caminharmos com a prá-
tica sem a pesquisa e vice-versa. Por isso, você terá a oportunidade de entender
a relevância do olhar crítico e de que forma poderá desenvolver pesquisas para
responder a questões práticas de casos e da atuação do psicólogo de modo geral.
Neste livro, convidamos você a estudar pontos de muita importância para a
Psicologia enquanto ciência e para sua formação enquanto pesquisador e profis-
sional. Vamos abordar as principais etapas para a realização de uma pesquisa cien-
tífica nessa área de conhecimento, como a formulação de um problema de investi-
gação, a pergunta de pesquisa, o método a ser seguido, a coleta e análise de dados,
e a escrita dos resultados encontrados. Esperamos que você desfrute e aproveite
todo o conteúdo para que possa fortalecer ainda mais sua formação profissional.

Bons estudos!

5
6
1
A prática da
pesquisa em
Psicologia
A prática da pesquisa em Psicologia
A Psicologia é uma ciência relativamente jovem, e por isso, ainda há muito a se
desenvolver e investigar nessa importante área do conhecimento. Neste capítulo,
você vai compreender a diferença entre a Psicologia enquanto ciência e o senso
comum. É importante que antes de adentrar em tipos, métodos e técnicas de pes-
quisa, você entenda o que é uma abordagem científica, quais são os objetivos da
ciência, e como podemos levantar problemas de pesquisa. Vamos lá?

OBJETIVOS
• Diferenciar ciência e senso comum no campo da Psicologia;
• Definir o que é uma abordagem científica e os objetivos da ciência;
• Definir o que é conhecimento e seus níveis;
• Compreender quais fontes podem ser utilizadas para formular um problema de pesquisa;
• Discutir a importância da ética na pesquisa em Psicologia;
• Compreender o papel dos comitês e comissões de ética em pesquisa.

A abordagem científica

Observando acontecimentos ao nosso redor, muitas vezes fazemos afirmações,


inferências e relações entre fatos com base em nossa percepção. Vemos o mundo
por meio de nossos órgãos do sentido, isto é, visão, olfato, tato, audição e paladar,
e por meio deles, tiramos conclusões fundamentadas em nossas experiências.
Aprendemos de acordo com o que vivenciamos e, muitas vezes, também ad-
quirimos conhecimento por meio de nossos ascendentes e das pessoas com quem
nos relacionamos. Sabe aquela receita da avó para curar um resfriado? Ou ainda,
algumas crenças com base na experiência de terceiros? Aqueles fatos que ocorre-
ram com vários amigos ou conhecidos, e até mesmo conosco, nos fazem observar
uma repetição de acontecimentos que induzem a certas conclusões. Esse tipo de
conhecimento é, na maioria das vezes, adquirido pelo que denominamos “sen-
so comum”.
O senso comum trata, portanto, de convicções passadas culturalmente entre
os indivíduos de um grupo e é construído com base em nossa vivência. Cozby

capítulo 1 •8
(2003) dá um exemplo bastante claro sobre isso. Talvez você já tenha conhecido
casais que relatassem várias tentativas para engravidar, até que acabaram optan-
do por adotar uma criança ou por realizar um procedimento de fertilização ou
inseminação artificial. Após anos na expectativa de se tornarem pais, quando se
sentiram mais relaxados quanto ao assunto, ou ainda, por já terem alcançado tal
desejo por outros meios, acabaram engravidando naturalmente quando menos
esperavam.
Assim, é comum ouvirmos dizer que a pressão psicológica e a ansiedade possi-
velmente é que estavam interferindo nos resultados na concepção, o que dificulta-
va o sonho de ser alcançado. Tais conclusões, apoiadas em experiências como estas,
são obtidas por meio de vivências e formam o que chamamos de “senso comum”
ou conhecimento popular.

Hummm.... Hoje
acordei diferente.
Acho que vai chover!
Sempre é assim quando
acordo desse jeito.
©© SPECTRAL-DESIGN | SHUTTERSTOCK.COM

O senso comum ou conhecimento popular pode ser passível de crenças e afirma-


ções equivocadas, sendo muitas vezes ligadas a certas superstições e tradições, crenças
sem fundamentação e preconceitos. Isso não significa que o senso comum não seja
importante. Podemos dizer que se trata de uma forma de o ser humano buscar com-
preender o mundo onde vive e como percebe os fatos e fenômenos ao seu redor. É
justamente por meio de tais evidências que formulamos hipóteses que poderão ser,
em outro patamar, investigadas cientificamente. Por meio do raciocínio científico e
considerando nosso exemplo anterior, devemos então nos perguntar: na realidade,
será que há interferência na expectativa para engravidar e no fato consumado em si?

capítulo 1 •9
Podemos dizer que sim se basearmos em nossas experiências ou nos fatos daquilo
que costumamos escutar, isto é, no relato de terceiros. Porém, ainda assim, não po-
demos dizer que se trata de uma afirmação científica.
Há algum tempo, você deve ter ouvido falar por veículos da mídia sobre uma
substância utilizada para o tratamento do câncer que dividiu opiniões. Afirmar
que um determinado remédio ou substância pode curar ou amenizar os sintomas
de uma doença não é algo tão simples. Para provarmos sua eficácia e até mesmo in-
vestigar possíveis efeitos nocivos ou colaterais, é necessário que um passo a passo,
com base em pesquisas sérias e controladas, seja rigorosamente seguido. Podemos
criar expectativas sobre um determinado medicamento, e por isso, termos a sensa-
ção de melhora. No entanto, quando medimos essa melhora por técnicas científi-
cas, é possível afirmarmos com segurança quais são reais seus efeitos.

Verificamos aqui
pelos relatórios e
análises que há grande
possibilidade de chuva
para hoje.
©© DMITRI MA | SHUTTERSTOCK.COM

Isso também acontece na Psicologia. Estamos falando de uma ciência relati-


vamente nova, cujo objeto de estudo se refere a processos mentais e ao compor-
tamento humano, de modo geral. Uma técnica de intervenção com um determi-
nado público-alvo ou relacionada a algum transtorno específico, por exemplo, só
pode ser disseminada quando há comprovação de sua verdadeira eficácia. Até o
fim deste livro você vai compreender como podemos controlar certas situações e
como investigamos de forma científica hipóteses que são levantadas quanto aos
fenômenos que envolvem o comportamento humano, bem como determinados
aspectos mentais.

capítulo 1 • 10
SAIBA MAIS
No artigo de autoria de Michel Paty, intitulado “A ciência e as idas e voltas do senso co-
mum”, publicado em 2003, você pode aprofundar a discussão sobre a abordagem científica e
o senso comum. Para acessá-lo, utilize o link: <http://www.scielo.br/pdf/ss/v1n1/a01v1n1.
pdf>. Boa leitura!

Cervo, Bervian e Silva (2007) defendem a ideia de que o conhecimento impli-


ca dualidade de realidades, estando de um lado o sujeito que conhece (ou sujeito
cognoscente) e, do outro, o que é conhecido, isto é, o objeto em si, que está pos-
suído pelo sujeito que conhece. Conhecer, portanto, é uma relação que se esta-
belece entre o objeto e o sujeito. Por meio do conhecimento, o ser humano pode
penetrar nas diversas áreas da realidade para dela tomar posse.
Ao consultarmos o dicionário Aurélio, encontramos como definição de co-
nhecimento o “ato ou efeito de conhecer”, “prática da vida”, ou ainda “ciência”,
“discernimento”, “critério”. Podemos averiguar, assim, que o conhecimento pode
apresentar diferentes níveis e focos. Quando falamos de pesquisa e ciência, é fun-
damental que saibamos definir cada um deles. Mas, afinal, qual a diferença entre
esses tipos de conhecimento?
O conhecimento popular ou senso comum é adquirido pelo próprio sujei-
to na sua relação com seu ambiente e/ou com o meio em que vive, conforme já
discutimos anteriormente. Por meio desse tipo de conhecimento, a pessoa per-
cebe fatos, acontecimentos e objetos com explicações relacionadas à razão de ser
das coisas e das pessoas. É constituído por meio da experiência, do cotidiano e
por meio de inferências feitas sobre circunstâncias da vida (FRANCELIN, 2004).
Trata-se de um conhecimento acrítico, superficial, sensitivo, subjetivo, assistemá-
tico, e geralmente imediatista (MARCONI; LAKATOSI, 2007).
Já o conhecimento científico vai além da experiência em si. Ele busca enten-
der além da percepção por meio de métodos e técnicas de pesquisa para controlar
certas circunstâncias e mensurar resultados. Até a Renascença, no século XIV, a
ciência era compreendida como sistema de proposições rigorosamente demons-
tradas, constantes e gerais que expressavam as relações entre fatos, fenômenos,
objetos, e até mesmo entre os seres.

capítulo 1 • 11
Aceitava-se como ciência aquilo que era provado por demonstração e experi-
mentação. Assim, o conhecimento científico era visto como (CERVO; BERVIAN;
SILVA, 2007):
• Certo, com explicação e motivos de sua certeza;
• Geral, isto é, que poderia ser generalizado para casos da mesma espécie;
• Metódico e sistemático, pois o cientista acredita que os fatos estão ligados
por certas relações e o objetivo era investigar quais eram estas, o qual alcançada por
meio de leis e princípios, ou seja, pelo conhecimento ordenado.

Segundo Cervo, Bervian e Silva (2007), atualmente ainda se acrescenta a ob-


jetividade, o interesse intelectual e o espírito crítico como características impor-
tantes do conhecimento científico. No entanto, podemos dizer que a concepção
de ciência mudou, embora o objetivo ainda seja a aproximação com a verdade por
meio de métodos que proporcionem maior controle. Hoje a ciência não é conside-
rada algo acabado e pronto. Ela é entendida como a busca por explicações, revisões
e reavaliações de resultados que muitas vezes se modificam com novos pontos de
vista, concepções, modelos, novas tecnologias, entre outras questões de cada era da
história, que interferem nessa construção.
Um terceiro tipo de conhecimento é o que denominamos conhecimento fi-
losófico. Esse tipo de conhecimento tem base no dia a dia, porém ele difere do
conhecimento popular ou vulgar, pois questiona a natureza das coisas. Sua base é
interrogar o que parece ser verdade, sendo racional. No entanto, ele também não
é semelhante ao conhecimento científico, já que não se apoia em experimentos e
não se preocupa se as conclusões às quais se chegam são aceitas cientificamente.
Trata-se de um conhecimento advindo da curiosidade. Filosofar é interrogar
principalmente sobre fatos que cercam os indivíduos em seu contexto histórico,
que tende a mudar com o tempo (CERVO; BERVIAN; SILVA, 2007).
Por fim, temos o conhecimento religioso ou teológico que se apoia em dou-
trinas sagradas, reveladas pelo sobrenatural sendo falível e exato. Segundo Araújo
(2006), esse tipo de conhecimento pressupõe que o sujeito conhece tudo a sua
volta. O desafio não é produzir verdades sobre os fenômenos, mas sim aceitar um
conhecimento já tido como verdade pronta e revelada. O indivíduo não pratica
novas formulações, apenas aceita o que já está organizado com regras, hierarquias
e leis. Assim, não se pode contrariar um conhecimento sagrado (ARAÚJO, 2006).

capítulo 1 • 12
A figura 1.1 ilustra os tipos de conhecimentos e seus níveis.

Sujeito Conhecimento Objeto

Popular

Científico

Filosófico

Teológico

Figura 1.1 – O conhecimento e seus níveis. Cervo, Bervian e Silva (p. 6, 2007).

Com a delimitação dos tipos de conhecimento, fica mais fácil compreender a


importância do conhecimento científico para a prática da pesquisa em Psicologia
e em outras ciências. O objetivo é suprir as limitações dos demais tipos de co-
nhecimento, buscando informações mais precisas e confiáveis a respeito de um
determinado fenômeno a ser investigado (ARAÚJO, 2006).
Não podemos deixar de citar que, embora tenhamos diferenciado o conheci-
mento filosófico do conhecimento científico, a filosofia tem grande relevância na
construção da ciência. Mais precisamente, a epistemologia, que é o ramo do saber
filosófico que se preocupa com a estrutura, validação e sustentação do conheci-
mento de forma racional e lógica, tem um papel fundamental na construção da
Psicologia enquanto um campo do saber reconhecido. Podemos entender que a
epistemologia é a ciência que investiga o conhecimento, buscando a natureza do
saber científico e suas limitações.

capítulo 1 • 13
SAIBA MAIS
O que é Epistemologia?
É o “estudo crítico dos princípios, hipóteses e resultados das ciências já constituídas, e
que visa determinar os fundamentos lógicos, o valor e o alcance objetivo delas (Definição
contida no Novo Dicionário da Língua Portuguesa Aurélio).

Severino (2017), em uma equação básica, busca sintetizar o que vimos até
aqui. Para ele, ensinar e aprender significa conhecer. Já conhecer compreende
construir o objeto a ser conhecido, isto é, o que se pretende conhecer. Construir
o objeto é sinônimo de pesquisar. E pesquisar é igual a abordar o objeto em suas
fontes primárias. Assim, de forma simples:

Ensinar e aprender = conhecer


Conhecer = construir o objeto
Construir o objeto = pesquisar
Pesquisar = abordar o objeto em suas fontes primárias

A prática da pesquisa em Psicologia implica diversas questões importantes que


devem ser levadas em consideração pelo pesquisador e psicólogo. Ainda vemos
muitas afirmações advindas do senso comum relacionadas a vários assuntos da
Psicologia. O comportamento humano em si invoca naturalmente muita curiosi-
dade no próprio ser humano. Falar de sentimentos, pensamentos, processos cog-
nitivos, memória, relacionamentos, desenvolvimento, entre outras questões co-
nectadas às pessoas e a nós mesmos traz uma grande bagagem do conhecimento
popular. Isso também interfere na visão das pessoas sobre qual é o papel do profis-
sional psicólogo na sociedade, em suas funções e competências.
Não podemos nos esquecer de que Psicologia é ciência. Trata-se de um cam-
po de conhecimento construído por meio de diversas técnicas científicas com o
intuito de entender processos, fatos e fenômenos relacionados ao comportamento
humano e aos processos mentais, de modo geral. É fundamental que o pesquisa-
dor/psicólogo tenha a visão crítica sobre conceitos e aspectos relacionados ao seu
campo específico de saber. O raciocínio científico é de suma importância para a
constante construção da Psicologia enquanto ciência. Assim, a prática de
pesquisa na área e a compreensão de sua importância são aspectos essenciais.

capítulo 1 • 14
Vamos agora abordar fontes de ideias e questionamentos como ponto de par-
tida para a prática de pesquisa. Afinal, como formulamos uma pergunta de pes-
quisa? O que é uma problemática de pesquisa? Qualquer pergunta relacionada ao
comportamento humano pode ser investigada na Psicologia? Por onde começa-
mos a pesquisar? Tudo isso será abordado na próxima seção. Vamos lá?

Fontes de ideias e problemas de pesquisa

Os questionamentos que muitas vezes nos fazemos no dia a dia são ótimos
provocadores para indagarmos determinada teoria ou técnica, a relação entre fa-
tos, ou algum conceito. Partir das crenças do próprio senso comum ou de expe-
riências profissionais também pode ser uma forma de estimularmos um início
para o raciocínio científico, e portanto para a prática em pesquisa. Por exemplo,
um psicólogo clínico pode observar, por meio de suas experiências e atuação, que
algumas técnicas aprendidas durante sua formação são mais eficazes para determi-
nadas queixas do que para outras. Com base em sua percepção, ele pode inferir
que algumas coisas repercutem em melhores resultados para algumas pessoas e
não para outras. Quando essas inferências passam a ser indagadas, inicia-se um
processo de construção de uma possível problemática de pesquisa.
Digamos que tudo começa por meio de um brainstorming (ou chuva de ideias),
muitas vezes resultado do acúmulo de leituras e experiências, de observação, ou até
mesmo, de ideias trocadas em conversas com outros profissionais.
No entanto, para de fato iniciarmos uma investigação, é necessário averiguar o
que já existe sobre o assunto. Será que outras pessoas já não investigaram o que esta-
mos nos questionando? É muito provável que a resposta seja sim, isto é, que outros
pesquisadores e profissionais já tenham feito questões semelhantes. Podemos nos
surpreender ao ver que, muitas vezes, já temos dados científicos que comprovam ou
refutam certas questões que nos despertaram interesses e indagações. É preciso, por-
tanto, termos um conhecimento prévio sobre o assunto para verificarmos se realizar
determinada pesquisa trará resultados e contribuições relevantes.
Realizar uma pesquisa, passo a passo, exige muita leitura e um bom plane-
jamento do que deverá ser seguido. O ponto de partida pode ser compreendido
como a formulação da pergunta de pesquisa. Mas o que seria isso? Uma pergunta
de pesquisa refere-se a uma questão central que queremos responder. Ela é fruto
de uma problemática que deve ser levantada por meio de informações científi-
cas confiáveis e obtidas por meio de fontes aceitas pelo mundo acadêmico e da

capítulo 1 • 15
pesquisa. Fazer uma boa pergunta é fundamental para que possamos ter uma di-
reção de pesquisa.
Mas, como saber se nossa pergunta já foi feita? Ou ainda, como posso lapidar
a pergunta de pesquisa com base no que já foi investigado sobre o assunto? Para
levantarmos um problema de pesquisa, é necessário verificarmos as lacunas de
conhecimento existentes sobre determinado tema. Para isso, devemos fazer uma
revisão das principais pesquisas, principalmente as recentes, isto é, aquelas publi-
cadas nos cinco anos anteriores. Chamamos isso de revisão da literatura.
A revisão da literatura consiste em levantamento, leitura e estudo das princi-
pais obras científicas publicadas sobre o tema e os conceitos centrais que envolvem
nossas ideias iniciais para formulação da pergunta de pesquisa. Por meio desse
passo, podemos então verificar o estado do conhecimento ou estado da arte sobre
um determinado assunto. O estado da arte consiste em averiguar onde paramos
na construção do conhecimento sobre certa temática, para assim, darmos conti-
nuidade a partir desse ponto.
Devemos conhecer a literatura clássica sobre a temática de nossa investigação,
mas primordialmente, devemos levantar e estudar o que foi pesquisado em anos
recentes sobre o assunto central (ou assuntos centrais) para a formação de uma
problemática. Mas onde podemos encontrar essas pesquisas? Qualquer meio de
publicação é viável? Posso simplesmente pesquisar na internet?
A revisão da literatura para o levantamento de um problema de pesquisa que
consequentemente vai nortear a formulação de nossa pergunta de pesquisa deve
ser feita por meio de obras aceitas no mundo científico. Livros, principalmente de
autores conceituados na área, são ótimos meios para compreendermos conceitos
e teorias já bem formuladas. No entanto, para uma revisão completa e atualizada,
é importante que façamos a consulta de artigos científicos publicados em revistas
ou periódicos.

SAIBA MAIS
Uma boa revisão de literatura implica leitura e conhecimento das principais pesquisas e
obras clássicas sobre o assunto a ser investigado e no levantamento de pesquisas recentes
sobre o tema. Atualmente, com o número de publicações que podem ser acessadas por meio
de periódicos eletrônicos nacionais e internacionais, consideramos recentes as pesquisas
publicadas nos últimos cinco anos.

capítulo 1 • 16
Quando falamos de artigos científicos encontrados em revistas, não estamos
nos referindo àquelas matérias contidas em revistas populares e constituídas a par-
tir de opiniões do meio jornalístico. Um paper ou artigo científico se trata de
pesquisa documentada, com partes bem delimitadas e definidas, que trazem ao
leitor informações conceituais relevantes, bem como resultados de investigações.
Nesse documento, de modo geral, temos a definição dos conceitos centrais a se-
rem pesquisados, a formulação de pergunta de pesquisa, o objetivo a ser seguido,
o método para se responder à pergunta formulada e, portanto para alcançar o
objetivo delineado, os principais resultados, sua discussão e principais conclu-
sões. Por meio da leitura das partes fundamentais de artigos recentes, podemos
compreender, então, o estado do conhecimento atual sobre certa temática. Vamos
abordar com mais detalhes as partes de um artigo no último capítulo, quando será
apresentado o assunto sobre a escrita científica.
Falamos sobre a busca por artigos científicos, mas ainda faltou abordar uma
questão importante: onde podemos encontrar esses documentos? Já dissemos que
estes não são publicados em revistas do meio midiático ou comerciais, certo? Mas,
então, onde são publicados? As revistas ou periódicos científicos são meios pelos
quais os pesquisadores comunicam seus principais achados, pesquisas de várias na-
turezas, resenhas, resumos, entre outros. Segundo a Associação Brasileira de
Normas e Técnicas (ABNT), um periódico científico é definido como editada
em unidades físicas sucessivas, com designações cronológicas ou numéricas que
podem ser continuadas indefinidamente. Ele tem esse nome justamente porque
suas publicações são realizadas em certos períodos, isto é, de tempos em tempos,
podendo ser anual, trimestral, semestral, entre outros.
No Brasil, um dos portais mais importantes que oferece uma boa base de
dados científica refere-se aos Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (Capes). Nesse portal é possível acessar publicações aca-
dêmicas respeitadas e aceitas no mundo científico, tanto de pesquisas desenvolvi-
das no âmbito nacional quanto internacional. Há, no entanto, revistas de acesso
público e gratuito, e outras que necessitam de assinatura. Geralmente as univer-
sidades têm acesso a tais bases de dados, sendo que o pesquisador pode acessá-los
por meio das redes dessas instituições.

capítulo 1 • 17
SAIBA MAIS
Para acessar o portal de Periódicos da Capes, utilize o link:
<www.peridicos.capes.gov.br>.
Você poderá fazer buscas por meio de assuntos, periódicos, livros e outras bases.

Além do portal de Periódicos da Capes, você pode fazer buscas por artigos
em outras bases de dados como o Scielo (www.scielo.br), Web of Science e Science
Direct, com publicações internacionais de acesso restrito às universidades, sendo
geralmente pagas por tais entidades, e até mesmo, o Google Acadêmico ou Google
Scholar. Para fazer uma busca, é importante utilizar palavras-chave relacionadas
aos principais conceitos sobre a temática da pesquisa que se pretende desenvolver.
Há alguns anos, a Capes tem avaliado a qualidade dos periódicos, evidencian-
do a relevância das pesquisas publicadas em seu corpo editorial. O Qualis Capes
é um conjunto de procedimentos utilizados pela Capes para classificar as revistas
científicas conforme critérios de avaliação, que permitem ao leitor compreender
as contribuições dos artigos de determinada revista científica. As publicações em
periódicos com boas classificações aumentam o prestígio do pesquisador e sua
produção científica.
Já um parâmetro internacional é o que denominamos Journal Citation Reports
(JCR) publicado pelo Institute for Scientific Information (ISI). O JCR é calculado
com base no número de citações de certo periódico em um campo de pesquisa,
indicando o seu “fator de impacto” em determinada área de conhecimento. Essas
questões são avaliadas com profundidade por pesquisadores experientes, sendo
importante que você, estudante, compreenda sua importância e sabia sua relevân-
cia para o mundo científico.
É possível que muitas investigações sobre o assunto envolvendo nossas per-
guntas de pesquisa sejam encontradas e é necessário que tomemos conhecimento
sobre o conteúdo delas. Nossa tarefa nessa etapa é verificar alguns pontos relevan-
tes, como após a revisão da literatura, o que ainda faltou responder? Quais lacu-
nas ainda podem ser encontradas? De que forma nossa pesquisa pode contribuir
com o conhecimento existente? Em que ela vai agregar? A partir disso, podemos
então levantar nosso problema de pesquisa, e realizar a pergunta norteadora de
forma mais precisa, apontando sua relevância e apresentando uma justificativa
para sua realização.

capítulo 1 • 18
De forma concomitante à formulação da pergunta a ser respondida em uma
investigação, também é importante que os objetivos sejam definidos. Eles de-
finem a natureza do trabalho, o material a ser coletado, entre outras questões
(MARCONI; LAKATOS, 2007). Geralmente, definimos um objetivo geral de
pesquisa, e a partir dele os objetivos específicos.

SAIBA MAIS
Os objetivos esclarecem o que é pretendido com a pesquisa e indicam as metas que
almejamos alcançar ao final da investigação. Os objetivos são normalmente categorizados
em geral e específicos:
a) Objetivo geral: dimensão mais ampla pretendida com a pesquisa;
b) Objetivos específicos: definem metas específicas da pesquisa que sucessivamente com-
plementam e viabilizam o alcance do objetivo geral.
REIS, A. S.; FROTA, M. G. C. Guia básico para elaboração do projeto de pesquisa.
Disponível em: <https://www.ufmg.br/proex/cpinfo/educacao/docs/06a.pdf>.
Acesso em: 7 ago. 2017.

O objetivo geral procura delimitar com clareza e objetividade o propósito do


estudo. Ainda se quer chegar? O que a pergunta de pesquisa visa responder? É escrito
com o verbo no infinitivo, como descrever, compreender, levantar etc. e devem espe-
cificar o que, de fato, se busca na investigação. Já os objetivos específicos significam
aprofundar as intenções do objetivo geral, isto é, trata-se de um passo a passo que
deverá ser seguido para alcançar o propósito da pesquisa (MARCONI; LAKATOS,
2007). Comumente também são escritos com verbos no infinitivo e são disponibi-
lizados em tópicos, não sendo esta uma regra encontrada nos projetos de pesquisa.

Sujeitos e participantes de pesquisa

Ao levantarmos o problema de pesquisa com base no estado da arte sobre um


determinado tema, que pode envolver um ou mais conceitos, fazemos um recorte
teórico e epistemológico do que pretendemos investigar. A pergunta de pesquisa
nos permite partir para as próximas etapas, como compreender os objetivos de
pesquisa, quem ou o que será investigado e até mesmo nos possibilita a tomada de
decisão quanto ao “como” vamos fazer essa averiguação.

capítulo 1 • 19
A questão sobre a forma como a pesquisa será feita envolve a delimitação
do método de pesquisa, que deverá seguir os objetivos de pesquisa. Tal assunto
será abordado em capítulos posteriores. Já questão sobre quem será investigado
envolve o objeto de estudo em si, se a pesquisa necessitará da participação do que
denominamos sujeitos ou participantes.
Muitas vezes, os estudos são realizados utilizando-se animais de laboratórios,
estudados em ambientes controlados e até mesmo em seu hábitat, dependendo
dos objetivos de nosso estudo. É muito comum que ratos e camundongos parti-
cipem como sujeitos de investigações, que nem sempre envolvem procedimentos
invasivos. Tudo vai depender do que será investigado.
Pesquisas também podem ser realizadas por meio da participação de seres hu-
manos. Por exemplo, ao se investigar os efeitos de determinado medicamento ou
substância para tratamento de uma doença, pessoas com certos pré-requisitos são
recrutadas para a participação em estudos científicos. É necessário, portanto, que
o número de sujeitos ou participantes seja delimitado com base em conhecimen-
tos prévios, bem como o perfil que necessitam apresentar, pois todos os fatores
serão importantes e podem interferir nos resultados do estudo. Vamos tratar com
mais profundidade sobre questões relacionadas à amostragem mais adiante.
Você deve estar se perguntando sobre um ponto muito importante que será
agora abordado: mas podemos fazer qualquer tipo de pesquisa com animais e seres
humanos? A resposta é: evidentemente não. As pesquisas que envolvem sujeitos ou
participantes necessitam de minuciosa análise de grupos de pesquisadores especialis-
tas que irão aprovar ou reprovar a realização da investigação, ou ainda, solicitar que
modificações importantes sejam feitas para que a pesquisa seja colocada em prática.
Iremos agora definir a importância do papel das Comissões e Comitês de Ética
em Pesquisa no Brasil.

Ética na pesquisa em Psicologia

Para garantir que as pesquisas com animais ou serem humanos sejam rea-
lizadas dentro de princípios éticos e jurídicos, grupos inter e multidisciplinares
são formados nas universidades e instituições de ensino superior, de modo geral.
Trata-se de colegiados independentes, de caráter consultivo, educativo e delibera-
tivo. Mas afinal, o que é ética?
Não vamos tratar aqui de questões da Filosofia mais aprofundadas sobre con-
ceitos envolvendo ética e moral. Mas é importante que você entenda o que é
ética na pesquisa em Psicologia. De modo geral, segundo o dicionário de Língua

capítulo 1 • 20
Portuguesa Aurélio, podemos definir ética como “estudo dos juízos de apreciação
referentes à conduta humana suscetível de qualificação do ponto de vista do bem
e do mal, seja relativamente à determinada sociedade, seja de modo absoluto”.
Assim, seguir padrões éticos significa analisar, conforme a legislação e regras prees-
tabelecidas, se determinado protocolo segue os passos necessários para assegurar os
diretos daqueles que participam de uma investigação.
Tais grupos são responsáveis pela análise de projetos de pesquisas. No Brasil,
temos as Comissões de Ética no Uso de Animais (CEUAs) e os Comitês de Ética
em Pesquisa com Seres Humanos (CEPs), cujas competências estão relacionadas à
garantia de bem-estar e dignidade dos participantes das investigações.
Segundo Feijó, Grey e Crippa (2014), os CEUAs são incumbidos de cumprir
a legislação relacionada às pesquisas com animais no ensino e campo investigati-
vo, previamente examinando os procedimentos que serão aplicados nos sujeitos,
cadastrando os projetos de pesquisa. É competência do CEUA interromper qual-
quer investigação que não esteja cumprindo os aspectos éticos delimitados, além
de criar normas para o desenvolvimento e manutenção dos animais em laborató-
rios e biotérios, garantindo questões de bem-estar e dignidade.
Da mesma forma, os CEPs têm a responsabilidade de avaliar os projetos de
pesquisa que envolvem a coleta de dados por meio de seres humanos. São compe-
tências dos CEP analisar o método de investigação, os propósitos da pesquisa, o
acompanhamento da formulação de termos de consentimento, entre outras ques-
tões. As pesquisas em seres humanos são aceitáveis quando respondem preliminar-
mente conveniências da terapêutica e do diagnóstico do próprio participante, com
o intuito de restabelecer sua saúde ou minimizar suas queixas (SCHNAIDER,
2008). Para garantir que o participante (ou responsável) esteja ciente do que se tra-
ta a pesquisa, consolidando sua anuência, é necessário o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE) seja devidamente assinado.

SAIBA MAIS
O que é o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)?
É um documento integrante do Protocolo de Pesquisa, elaborado pelo pesquisador em
linguagem acessível à compreensão dos participantes do estudo. O TCLE deverá ser obtido
após o participante ou seu responsável legal estar suficientemente esclarecido de todos os
possíveis benefícios, riscos e procedimentos que serão realizados, assim como fornecidas
todas as informações pertinentes à pesquisa (SCHNAIDER, 2008).

capítulo 1 • 21
Os projetos de pesquisa devem ser submetidos para análise no Sistema Nacional
de Informações Sobre Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos (SISNEP) de
responsabilidade do Ministério da Saúde. Por meio do site da Plataforma Brasil,
é possível escolher o Comitê de Ética que fará a avaliação, bem como acompanha
todo o processo. Todo pesquisador que investiga questões relacionadas a serem
humanos deve ter cadastro para submissão de seus projetos de pesquisa.

ATIVIDADES
01. Qual a diferença entre a Psicologia com base no senso comum e a Psicologia científica?

02. O conhecimento pode ser dividido em diferentes níveis. Defina cada um deles.

03. Qual a importância do conhecimento científico para a construção da Psicologia enquan-


to ciência?

04. O que é um problema de pesquisa?

05. Como formulamos uma pergunta de pesquisa?

06. O que são objetivos de pesquisa?

07. Qual a importância da ética na prática de pesquisa em Psicologia?

08. Qual o papel do Comitê de Ética em Pesquisa?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO, C. A. A. A ciência como forma de conhecimento. Ciência & Cognição. v. 8, p.127-142,
2006.
CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A.; SILVA, R. Metodologia científica. Pearson: São Paulo, 2007.
COZBY. P. C. Métodos de Pesquisa em Ciências do Comportamento, São Paulo: Atlas, 2003.
FEIJÓ, A. G. S.; GREY, N. C.; CRIPPA, A. A ética, a ciência e os animais não humanos na
experimentação. In: PICHLER, N A.; GIACOMINI, A. C. V. V. Ética em pesquisa com animais e
humanos: bem-estar e dignidade. Passo Fundo: Ed. Universidade de Passo Fundo, 2014.

capítulo 1 • 22
FRANCELIN, M. M. Ciência, senso comum e revoluções científicas: ressonâncias e paradoxos. Revista
Ciência da Informação. v. 33, n. 3, p. 26-34, 2004.
REIS, A. S.; FROTA, M. G. C. Guia básico para elaboração do projeto de pesquisa. Disponível em:
<https://www.ufmg.br/proex/cpinfo/educacao/docs/06a.pdf> Acesso em: 7 ago. 2017.
MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Técnicas de Pesquisa. São Paulo: Atlas, 2007.
PATY, M. A ciência e as idas e voltas do senso comum. ScientleStudia. v. 1, n. 1, p. 9-23, 2003.
SCHNAIDER, T. B. Ética e pesquisa. Acta Cirúrgica Brasileira. v. 23, n. 1, p. 107-111, 2008.
SEVERINO, A. J. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Cortez, 2017.

capítulo 1 • 23
capítulo 1 • 24
2
A classificação
de pesquisas em
Psicologia
A classificação de pesquisas em Psicologia
As pesquisas desenvolvidas tanto na área de Psicologia quanto em outros cam-
pos do conhecimento podem receber diferentes classificações, dependendo do que
se deseja investigar. Neste capítulo, você vai conhecer os principais tipos de pes-
quisa, sendo esta informação muito importante para que o pesquisador escolha
o método adequado para a coleta de dados, e assim para que atinja o objetivo de
investigação, respondendo à pergunta de pesquisa formulada no primeiro passo.

OBJETIVOS
• Apresentar os principais tipos de pesquisa na Psicologia;
• Discutir sobre a classificação de uma pesquisa quanto a diferentes parâmetros;
• Descrever tipos de pesquisa quanto à abordagem, natureza, aos objetivos e procedimentos;
• Aprender a classificar uma pesquisa conforme a(s) pergunta(s) de pesquisa que se deseja
responder na investigação.

A classificação de pesquisas em Psicologia

No capítulo anterior, você aprendeu sobre a importância da formulação da


pergunta de pesquisa como primeiro passo para iniciar a investigação. Agora, va-
mos apresentar a você os tipos de pesquisa que podem ser realizadas na Psicologia,
bem como em outras áreas do conhecimento. Isso é muito importante para que
você possa decidir as técnicas de pesquisa que irá utilizar para cumprir seus obje-
tivos, formulando seu método.
Antes disso, é fundamental que você compreenda o que é um método de
pesquisa. Trata-se de uma parte primordial em uma investigação. Um método mal
formulado pode acarretar em decisões equivocadas e dados coletados de forma
falha que poderão invalidar a pesquisa. Assim, antes de iniciar a investigação, é
necessário que o método seja cuidadosamente formulado.
Como já discutimos no primeiro capítulo, inicialmente devemos realizar uma
revisão da literatura, encontrar as principais lacunas, e assim construir a proble-
mática de pesquisa que será respondida. Definindo os objetivos da investigação,
fica muito mais fácil decidir os próximos passos que serão tomados para dar

capítulo 2 • 26
prosseguimento a esse trabalho. Assim, o método de pesquisa trata da escolha de
procedimentos para a explicação do fenômeno que se pretende investigar.
Segundo Gerhardt e Souza (2009), é importante salientar a diferença entre
metodologia e método de pesquisa. Podemos dizer que a metodologia trata do
estudo dos caminhos a serem percorridos para que uma investigação seja con-
cretizada. Significa, portanto, o estudo dos passos e dos instrumentos a serem
utilizados para se realizar uma pesquisa científica. Já o método de pesquisa se
refere diretamente aos procedimentos escolhidos para se atingir os objetivos de
investigação, isto é, às técnicas propriamente definidas e que serão utilizadas para
se responder à pergunta norteadora inicialmente formulada.
Dessa forma, conforme o método de pesquisa definido, uma pesquisa pode
ser classificada quanto à sua abordagem, quanto à natureza, quanto aos objetivos
e quanto aos procedimentos. Mas para defini-lo de forma adequada, é crucial que
você aprenda sobre as principais características de cada um desses tipos de pesquisa
para ajustar suas técnicas a seus objetivos de investigação. Vamos lá?

Quanto à abordagem: a pesquisa qualitativa e a pesquisa quantitativa

Uma pesquisa pode ser definida como quantitativa ou qualitativa, conforme


os tipos de dados que serão coletados e investigados.
A pesquisa qualitativa se preocupa com dados não numéricos, isto é, que
envolvem a investigação de dados e informações não quantificáveis, como, por
exemplo, o aprofundamento da compreensão de um grupo social ou organização.
Esse tipo de pesquisa se preocupa em explicar o porquê das coisas sem quantificar
dados e sem se submeter à prova dos fatos. Geralmente, pesquisadores que adotam
este tipo de pesquisa recusam o modelo positivista para o entendimento de fenô-
menos (SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009).

SAIBA MAIS
Para saber mais sobre o positivismo, leia o artigo “Epistemologia positivista: qual a sua
influência hoje?”, de Silvino (2007). Você pode acessá-lo pelo link a seguir:
< h t t p : / / p e p s i c . b v s a l u d . o r g / s c i e l o . p h p ? s c r i p t = s ci _ a r t t e x t & p i d = S 1 4 1 4 -
98932007000200009>.
Boa leitura!

capítulo 2 • 27
Segundo Silveira e Córdova (2009), as principais características da pesqui-
sa qualitativa envolvem a definição do fenômeno; a hierarquização das ações de
descrever, compreender, explicar e relacionar o global e o local em determinado
fenômeno; a observação das diferenças entre o social e o natural; a interação entre
os objetivos, orientações teóricas e dados empíricos; a busca de resultados mais fi-
dedignos possíveis; e, por fim, a oposição ao pressuposto que defende um modelo
único de pesquisa para todas as ciências.

SAIBA MAIS
O que é fidedignidade?
Refere-se à consistência dos resultados obtidos em um procedimento de pesquisa, isto
é, à confiança das conclusões tiradas com base em determinadas informações e dados.
Medidas fidedignas são estáveis, consistentes e precisas (COZBY, 2004). Dizemos que os
resultados de uma pesquisa são fidedignos quando são confiáveis e apresentam veracidade
quanto ao fenômeno investigado.

Podemos dizer que a pesquisa qualitativa utiliza opinião, experiências,


crenças, significados, valores, atitudes, históricas de vida, entre outros dados,
buscando aprofundar informações. Para sua realização, o pesquisador deve ter
conhecimento sobre o assunto investigado e ter cuidado para não contaminar
a interpretação dos dados coletados com sua própria opinião e forma de ver o
mundo, trazendo um viés às conclusões (CERVO; BERVIAN; SILVA, 2007).
Segundo Minayo (2001), as principais críticas referentes a esse tipo de pesquisa
estão relacionadas à subjetividade, ao empirismo e ao próprio envolvimento
emocional do investigador.
Assim, o pesquisador deve se preocupar com alguns pontos muito importantes
ao realizar uma pesquisa qualitativa, como o excesso de confiança para interpretar
os dados, falta de detalhes e informações importantes para se chegar a conclusões
mais apuradas e precisas, envolvimento na situação pesquisada ou com os sujeitos
pesquisados, entre outras questões que podem trazer considerações errôneas sobre
um determinado fenômeno (SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009).

capítulo 2 • 28
SAIBA MAIS
O que é viés?
No mundo científico, compreende-se viés como uma visão tendenciosa, que pode trazer
interpretações errôneas.

Já a pesquisa quantitativa tem uma visão voltada para o pensamento positivis-


ta lógico, utilizando a quantificação de dados. Preocupa-se com dados numéricos,
e em geral envolve técnicas estatísticas para a análise de dados. Utiliza instrumen-
tos que possibilitam a contagem de determinadas informações importantes para
se responder à pergunta de pesquisa.
Esse tipo de pesquisa envolve a formulação de hipóteses que serão testadas
quantitativamente, sendo que crenças e valores pessoais não são considerados fon-
tes de influência no processo científico. A pesquisa quantitativa busca estabelecer
a relação entre variáveis previamente definidas, chegando a conclusões que permi-
tem refutar ou confirmar hipóteses.
Alguns autores discutem sobre a dificuldade da plena definição de uma pesqui-
sa como puramente quantitativa ou qualitativa, sendo que ambas as abordagens
se complementam em várias ocasiões quando se trata de pesquisa em Psicologia.
Ambas apresentam vantagens e desvantagens, sendo que o método escolhido de-
verá se adequar à pergunta de investigação (GÜNTHER, 2006).
A tabela a seguir ilustra as principais diferenças entre o método quantitativo e
o método qualitativo.

MÉTODO QUANTITATIVO MÉTODO QUALITATIVO


Tenta compreender a totalidade do fe-
Focaliza uma quantidade pequena de
nômeno, mais do que focalizar conceitos
conceitos
específicos

Tem poucas ideias preconcebidas e sa-


Inicia com ideias preconcebidas do modo lienta a importância das interpretações
pelo qual os conceitos estão relacionados dos eventos mais do que a interpretação
do pesquisador

capítulo 2 • 29
MÉTODO QUANTITATIVO MÉTODO QUALITATIVO
Utiliza procedimentos estruturados e ins- Coleta dados sem instrumentos formais
trumentos formais para coleta de dados e estruturados

Coleta os dados mediante condições de Não tenta controlar o contexto da pesqui-


controle sa, e sim captar o contexto na totalidade

Enfatiza a objetividade, na coleta e análi- Enfatiza o subjetivo como meio de com-


se dos dados preender e interpretar as experiências

Analisa os dados numéricos por meio de Analisa as informações narradas de uma


procedimentos estatísticos forma organizada, mas intuitiva

Tabela 2.1 – Comparação entre o método quantitativo e o método qualitativo. Polit et al.
(2004 apud SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009).

Devido às vantagens e desvantagens de ambas as abordagens, alguns estu-


diosos de metodologia científica apontam benefícios que têm sido observados
por proponentes tanto de métodos qualitativos quanto de quantitativos e que a
aplicação de ambos pode fortalecer resultados e aprimorar a discussão dos dados
encontrados (CUNNINGHAM, YOUNG; LEE, 2000; SIEBER, 1973). Nesse
caso, a principal razão para se utilizar métodos mistos está relacionada à melhor
qualidade das evidências (STAKE, 2011). Costumamos chamar essas pesquisas de
quanti-qualitativas.

SAIBA MAIS
Um artigo muito interessante que discute as vantagens e desvantagens das pesquisas
quantitativas e qualitativas, e as dificuldades de separarmos plenamente ambas as aborda-
gens pode ser acessado pelo link:
<http://www.scielo.br/pdf/%0D/ptp/v22n2/a10v22n2.pdf>.
O artigo é de autoria Hartmut Günther (2006)
Boa leitura!

A principal vantagem das pesquisas quanti-qualitativas é a obtenção de múl-


tiplas perspectivas sobre um mesmo objeto, pois pesquisadores quantitativos têm
o trunfo de estatísticas conclusivas, que objetivam quantificar a confiança de uma

capítulo 2 • 30
hipótese confirmada ou refutada, e os pesquisadores qualitativos apresentam bons
meios para se aumentar a profundidade de suas descobertas (CUNNINGHAM;
YOUNG; LEE, 2000; STAKE, 2011).
A tabela 2.2 aponta as principais diferenças entre a pesquisa quantitativa e
qualitativa, o que nos permite compreender que a pergunta de pesquisa é quem
determinará a melhor abordagem a ser escolhida (GÜNTHER, 2006).

PESQUISA PESQUISA
ASPECTO QUANTITATIVA QUALITATIVA
Enfoque na interpretação
Menor Maior
do objeto

Importância do contexto
Menor Maior
do objeto pesquisado

Proximidade do pesquisa-
dor em relação aos fenô- Menor Maior
menos estudados

Alcance do estudo no
Instantâneo Intervalo maior
tempo

Quantidade de fontes de
Uma Várias
dados

Ponto de vista do
Externo à organização Interno à organização
pesquisador

Quadro teórico e
Definidas rigorosamente Menos estruturadas
hipóteses

Tabela 2.2 – Comparação dos aspectos da pesquisa qualitativa com os da pesquisa quan-
titativa. Fonseca (2002).

Quanto à natureza: a pesquisa básica e a pesquisa aplicada

A pesquisa básica visa gerar conhecimentos novos geralmente por meio de


trabalhos teóricos e experimentais, sem aplicação ou utilização imediata (COZBY,
2004). Visa investigar fenômenos físicos e seus fundamentos, procurando o
progresso científico e a ampliação de conhecimentos teóricos (MARCONI;
LAKATOS, 2007). Podemos dizer que as pesquisas básicas antecedem as pesquisas

capítulo 2 • 31
aplicadas, pois são o início de uma série de investigações necessárias para se esgotar
dados coletados e analisados sobre um determinado fenômeno.
Como exemplo de pesquisa na Psicologia, podemos classificar as pesquisas
básicas aquelas realizadas com sujeitos (ou cobaias) em situações totalmente con-
troladas. Vamos supor que o objetivo da pesquisa seja analisar o possível efeito
ansiolítico da ingestão de determinada substância por meio de observações de
comportamentos, o que é muito comum em pesquisas realizadas com camundon-
gos em laboratórios. Assim, uma amostra experimental é testada e analisada para
se refutar ou validar uma determinada hipótese. Trata-se de pesquisa básica com o
intuito de investigar determinado fenômeno ainda sem aplicação prática imediata.
Já a pesquisa aplicada utiliza os conhecimentos adquiridos das pesquisas bá-
sicas para gerar aplicação prática e solucionar problemas específicos (COZBY,
2004). Um exemplo de pesquisa desse tipo seria a investigação da eficácia de de-
terminado medicamento para o tratamento da ansiedade em pessoas com trans-
tornos ansiosos, bem como seus efeitos colaterais e outros possíveis efeitos com-
portamentais. Trata-se, portanto, de uma pesquisa aplicada, prática, cujo objetivo
é bem definido e busca o tratamento de determinadas doenças.
As pesquisas aplicadas geralmente são antecedidas das pesquisas básicas, sendo
ambas complementares e fundamentais para a compreensão de fenômenos. Trata-
se de um passo a passo para a aplicação do conhecimento adquirido para a solução
de um determinado problema específico.

Quanto aos objetivos: a pesquisa explicativa, a pesquisa descritiva e a pesquisa


exploratória

Definindo os objetivos da investigação, também é possível classificá-la como


explicativa, descritiva ou exploratória.
Como a própria terminologia diz, a pesquisa explicativa tem o objetivo de
explicar o porquê das coisas por meio dos dados coletados. Ela registra fatos, faz
sua análise, interpreta e identifica causas, buscando definir leis mais amplas, rela-
cionar e gerar hipóteses por meio de dedução lógica, e estruturar e definir modelos
teóricos (MARCONI; LAKATOS, 2007).
Já a pesquisa descritiva visa simplesmente descrever um determinado fenôme-
no. Ela “delineia o que é”, abordando quatro aspectos: descrição, registro, análise e
interpretação dos fenômenos (MARCONI; LAKATOS, 2007). O objetivo desse
tipo de pesquisa é observar, registrar e analisar os fenômenos ou comportamentos

capítulo 2 • 32
de uma população sem aprofundamento de conteúdos e explicações. Nesse tipo
de pesquisa não deve haver interferência do investigador, que deverá apenas com-
preender a frequência de ocorrência de certo fenômeno ou como funciona certo
sistema, processo ou método.
A pesquisa exploratória, segundo Silva e Menezes (2005), tem como princi-
pal objetivo proporcionar maior familiaridade com determinado problema para
torná-lo mais explícito ou para construir hipóteses. Envolve a abordagem de pes-
soas ou sujeitos que são diretamente associadas a experiências práticas relaciona-
das à problemática levantada. Enfatizam a descoberta de ideias e discernimentos
(MARCONI; LAKATOS, 2007).

Quanto aos procedimentos

Considerando os procedimentos de uma pesquisa, esta também pode ser


classificada em vários tipos que abordaremos agora. Nesta seção, vamos falar de
muitos deles como a pesquisa bibliográfica, a pesquisa documental, a pesquisa de
campo, a pesquisa experimental, o estudo de caso, a pesquisa de levantamento, a
pesquisa survey, e a pesquisa-ação.
A pesquisa bibliográfica se trata de uma pesquisa teórica realizada em obras
acadêmicas e científicas para o levantamento de dados já publicados. Trata-se da
compreensão do estado da arte sobre um determinado assunto. Conforme você
viu no capítulo 1, sempre iniciamos uma pesquisa por meio do levantamento bi-
bliográfico e a revisão da literatura sobre o nosso tema para, assim, formularmos
a pergunta de pesquisa. Entretanto, dependendo do objetivo da investigação, a
própria pesquisa bibliográfica será suficiente para o que se deseja alcançar em um
trabalho científico.
Revisões sistemáticas da literatura são muito úteis para que os pesquisadores
possam compilar o conhecimento existente sobre determinada teoria ou assunto.
A partir dessas publicações teóricas, é possível que outros tipos de pesquisa possam
ser realizados com economia de tempo, pois o levantamento das principais obras
e conceitos já foram efetivados.
Ainda na linha das pesquisas teóricas, podemos abordar a pesquisa documen-
tal. Esta pode ser compreendida como a análise de documentos importantes sobre
determinado assunto ou fenômeno, por exemplo, registro de documentos anuais,
informações contidas em tabelas, jornais, filmes, relatórios de empresas, pinturas,
cartas, entre outros documentos oficiais (FONSECA, 2002). O que difere este

capítulo 2 • 33
tipo de pesquisa da pesquisa bibliográfica é o tipo de material analisado. Podemos
entender que na pesquisa documental são analisados documentos oficiais que con-
tenham informações suficientes para se responder à pergunta de pesquisa, e na
pesquisa bibliográfica são analisados dados de obras acadêmicas e científicas, o que
significa que, geralmente, envolve a análise de materiais já elaborados.
Se o objetivo de uma pesquisa fosse investigar o número de pacientes com
diagnóstico de depressão por determinado serviço de saúde na rede pública em
um período de dez anos, esta possivelmente seria uma pesquisa documental, pois
envolveria o levantamento dos atendimentos realizados nessas instituições especí-
ficas por meio de registros e documentos oficiais do passado. Já se o objetivo fosse
a compreensão das técnicas mais utilizadas em serviços de saúde nos últimos 10
anos, de modo geral, poderíamos realizar isso por meio de pesquisa bibliográfica,
levantando o que foi publicado sobre esse assunto nas principais bases de da-
dos científicas.
Além de análises de obras acadêmicas e científicas e de documentos, podemos
ainda realizar outro tipo de pesquisa, denominada pesquisa de campo. Esta en-
volve a coleta de dados em situações reais, in loco, muitas vezes com observações e
coleta de dados junto às pessoas. Segundo Marconi e Lakatos (2007), a pesquisa de
campo consiste nas observações de fatos tal como estes ocorrem espontaneamente.
Para a realização desse tipo de pesquisa, é muito importante que uma prévia
pesquisa bibliográfica seja realizada: afinal, o que já existe sobre o assunto? O que
teorias já existentes dizem sobre determinado fenômeno? Por meio da pesquisa de
campo, é possível confirmar tais teorias ou refutá-las, ou ainda, acrescentar infor-
mações importantes para complementá-las.
Outro tipo de pesquisa muito comum que podemos realizar na Psicologia
é a pesquisa experimental. Geralmente este tipo de pesquisa envolve pesquisas
em laboratório ou em campo, com controle de variáveis, sendo a análise do com-
portamento uma das linhas teóricas que mais utiliza este tipo de pesquisa. Sendo
assim, segue um planejamento rigoroso, iniciando-se por meio da formulação de
hipóteses bem delineadas, com delimitação de variáveis para controle, e assim a
compreensão do fenômeno a ser estudado (SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009).
A pesquisa experimental começa pela determinação precisa do objeto de
estudo, seleção de variáveis que poderiam influenciá-lo, definição de formas de
controle e de observação para compreensão dos efeitos de tais variáveis sobre o
fenômeno a ser estudado (GIL, 2007).

capítulo 2 • 34
Por exemplo, vamos supor que nosso objetivo de pesquisa seja compreender a
eficácia de técnicas de relaxamento como estratégia de intervenção para pacientes
com transtorno de ansiedade generalizada (TAG). Como podemos medir o efeito
de tais técnicas? Como saberemos se não se trata de efeito placebo? Devemos lem-
brar que nossos resultados devem ser fidedignos para que afirmações e conclusões
certeiras sejam alcançadas. Nesse caso, poderíamos trabalhar com dois grupos de
pessoas, sendo ambos formados por pacientes com o diagnóstico de TAG. Um
grupo, chamado de controle, participaria de encontros semanais, porém sem re-
ceber intervenções precisas com as técnicas de relaxamento. Poderíamos dizer que
seria um “grupo de bate-papo”. Já o outro grupo, chamado de grupo experimen-
tal, participaria de encontros semanais com psicoterapeutas, com intervenções
programadas com técnicas de relaxamento bem elaboradas a serem investigadas.
É importante que os participantes saibam dos objetivos de pesquisa, mas em um
primeiro momento, não tenham a informação se fazem parte do grupo controle
ou experimental, para que as próprias expectativas não gerem possíveis vieses nos
resultados.
Ao final, sendo que todos participaram do mesmo número de encontros, no
mesmo ambiente, mudando apenas o “tipo de tratamento” recebido, poderíamos
mensurar, por meio de entrevistas, questionários, entre outros instrumentos que
abordaremos a seguir, os resultados em relação aos sintomas da TAG. Se o grupo
experimental, de fato, apresentar diferenças significativas de melhorias de sinto-
mas da TAG em relação ao grupo controle (o que pode ser medido por meio
de técnicas estatísticas, por exemplo), podemos, então, tirar conclusões quanto à
eficácia de tais técnicas.
Devido a sua importância e uso na Psicologia, a pesquisa experimental será
aprofundada em capítulo posterior.
Outro tipo de pesquisa também muito utilizado na Psicologia é o estudo de caso.
Segundo Fonseca (2002), um estudo de caso pode ser compreendido como um estudo
aprofundado sobre determinada entidade, unidade social, pessoa, instituição ou pro-
grama. Visa compreender como e por que determinado fenômeno ocorre em situações
pontuais. Como exemplo, podemos dizer que uma psicobiografia é um tipo de estudo de
caso em que o pesquisador aplica a teoria psicológica para explicar a vida de uma pessoa.
Os estudos de caso são muito importantes para o levantamento de caracterís-
ticas de situações raras. Geralmente levam à formulação de hipóteses que podem
ser estudadas por meio de outros métodos de pesquisa (COZBY, 2004).

capítulo 2 • 35
Embora o estudo de caso apresente como vantagem a visão aprofundada sobre
determinado fenômeno, a principal crítica relacionada a esse tipo de pesquisa refe-
re-se à generalização dos resultados. Ao estudarmos um caso único, não podemos
generalizá-lo para todos os outros casos semelhantes, no entanto, o estudo apro-
fundado de determinadas situações trazem informações muito importantes para a
compreensão de um fenômeno, sendo que a repetição de resultados em estudos de
vários casos análogos pode trazer dados relevantes.
Existem ainda pesquisas que envolvem o estudo de casos múltiplos, isto é,
quando em uma mesma investigação há a análise de vários casos parecidos ou
que apresentem determinadas características comuns, sendo comparados os dados
divergentes e/ou convergentes em relação ao que se está investigando.
Dando continuidade aos tipos de pesquisa, uma investigação também pode ser
classificada como pesquisa de levantamento. Este tipo de pesquisa geralmente é utili-
zado em estudos exploratórios e descritivos. Trata-se do levantamento de determinadas
informações ou características sem a manipulação de dados. O objetivo é apenas des-
crever ou explorar um determinado fenômeno por meio do levantamento de dados.
Segundo Cozby (2004), pesquisas de levantamento utilizam entrevistas e
questionários a fim de levantar informações sobre as pessoas, como atitudes, dados
sociodemográficos, crenças, valores, isto é, envolvem um método para solicitar às
pessoas que falem sobre si mesmas.
Para alguns autores, há grande relação entre as pesquisas de levantamento e
as pesquisas tipo survey. Estas últimas envolvem a busca por dados diretamen-
te com pessoas envolvidas com o fenômeno a ser investigado (FORZA, 2002).
Segundo Hair Jr. et al. (2005), esse é um procedimento utilizado para coleta de
dados com base em indivíduos e envolve grandes amostras, geralmente utilizando-
se questionários previamente elaborados. O propósito de uma pesquisa tipo survey
não é necessariamente a criação de uma teoria, mas sim o desenvolvimento e apri-
moramento de teorias já existentes. Alguns autores consideram que as pesquisas
de levantamento e pesquisas survey tratam do mesmo tipo de pesquisa, entretanto,
considerando as definições de cada uma delas, podemos dizer que as survey são, de
fato, pesquisas de levantamento, porém, as pesquisas de levantamento podem ser
mais abrangentes do que se propõem as pesquisas survey.
Por fim, o último tipo de pesquisa que abordaremos conforme o procedimento
é a pesquisa-ação. Esta pressupõe participação planejada do pesquisador na situação
investigada. O pesquisador deixa o papel de observador do fenômeno para obter atitu-
de participativa e de papel de sujeito/participante na investigação. Tal tipo de pesquisa

capítulo 2 • 36
recebe várias críticas por conta do envolvimento do investigador na mesma, mas é bas-
tante utilizada por pesquisadores com ideologias participativas (FONSECA, 2002).
Segundo Tripp (2005), a pesquisa-ação apresenta como principais características: é
um tipo de pesquisa inovadora, contínua, proativa estrategicamente, participativa, in-
tervencionista, problematizada, deliberada, documentada, compreendida e disseminada.
Tal tipo de pesquisa é muito comum na área da educação, sendo uma estraté-
gia para o desenvolvimento de professores/pesquisadores a fim de que eles possam
utilizar suas investigações para aprimorar seu ensino e assim o aprendizado de seus
alunos (TRIPP, 2005).
Conhecendo esses tipos de pesquisa, você deve estar se perguntando: mas de-
vemos classificar uma pesquisa em um único tipo? Será que uma pesquisa pode se
enquadrar em mais de um tipo dentro os que estudamos aqui? A resposta é sim.
Uma pesquisa pode se enquadrar em mais de um tipo de pesquisa, por exemplo,
ser uma pesquisa de campo experimental. Mas para classificar sua investigação, é
importante que você compreenda suas características e siga os critérios para enten-
der onde ela se encaixa.

Etapas de uma pesquisa

No primeiro capítulo abordamos o passo inicial para começarmos uma pes-


quisa. Para que seu estudo a respeito dos métodos de pesquisa fique ainda mais
claro, vamos agora abordar as principais etapas de uma pesquisa.
A tabela 2.3 ilustra as principais etapas de uma investigação. Vamos abordar
cada uma delas a seguir.

Etapa 1 - A questão inicial

Etapa 2 - A exploração do tema

Etapa 3 - A problemática

Etapa 4 - A construção do modelo de análise

Etapa 5 - A coleta de dados

Etapa 6 - A análise dos dados

Etapa 7 - As conclusões

Tabela 2.3 – Etapas da pesquisa. Quivy e Campenhoudt (1995, apud GERHARDT, 2009).

capítulo 2 • 37
Segundo Gerhardt (2009), uma pesquisa apresenta sete etapas principais para
sua elaboração, sendo elas: a questão inicial, a exploração do tema, a problemá-
tica, a construção do modelo de análise, a coleta de dados, a análise dos dados, e
as conclusões.

Formulação da questão inicial

Inicialmente, é importante que você pense em um possível tema a ser pes-


quisado, formulando algumas perguntas iniciais. Por meio delas, você terá mais
clareza sobre seus interesses e o que pretende investigar, o que irá lhe auxiliar nas
próximas etapas.

EXERCÍCIO DE APLICAÇÃO
Formulação de uma questão inicial:

01. Formule uma questão inicial.

02. Teste esta questão com um grupo de colegas ou amigos, de forma a assegurar que ela
está clara e precisa e, portanto, pode ser compreendida por todos da mesma forma. Formule
a questão ao grupo sem expor seu sentido ou dar explicações. Cada pessoa do grupo deve
expor a forma como compreendeu a pergunta. A questão será precisa se as interpretações
convergirem e corresponderem às intenções do pesquisador.

03. Verifique se a questão contém igualmente as outras qualidades apresentadas.

04. Caso contrário, reformule a questão e reinicie o processo.


Quivy; Campenhoudt, p. 36, 1995, apud Gerhardt, p. 46, 2009.

A exploração do tema

Esta etapa envolve a exploração de possíveis assuntos e temas para o desenvol-


vimento de uma pesquisa. Geralmente se inicia por meio de brainstorming, com
a leitura de diversas fontes para levantamento de informações. Trata-se de uma
etapa que exige bastante estudo e leitura para busca do foco da pesquisa científica.

capítulo 2 • 38
Conforme vimos no primeiro capítulo, não devemos nos basear em sites de
senso comum ou qualquer outro tipo de referências sem reconhecimento científi-
co. A leitura deve ser cuidadosa e realizada em fontes seguras, geralmente livros e
artigos de periódicos conceituados.
Nesta fase, é comum realizarmos fichamentos e resumos das leituras realiza-
das. Em meio a tantas informações iniciais, muitas vezes podemos nos perder sem
um mapeamento dos artigos e dos dados que realmente nos interessaram. Por
isso, ao realizar suas leituras, você pode organizar em um quadro o título da obra,
autores, ano de publicação, principais objetivos, achados e conclusões. Trata-se
de uma forma de sistematizar as pesquisas nas quais irá se basear. Isso facilitará a
formulação das próximas etapas e a escrita própria de seu relatório de pesquisa,
conforme veremos no último capítulo.

Formulação do problema de pesquisa

Após o levantamento das principais pesquisas sobre o tema escolhido, uma


revisão de literatura consistente e o levantamento de lacunas, conforme vimos
no capítulo 1, conseguimos formular a problemática da pesquisa a ser realizada.
Assim, conseguimos delimitar os objetivos de nossa investigação para buscar os
melhores meios para alcançá-los.
O problema de pesquisa é crucial para que as próximas decisões da investi-
gação sejam tomadas. Segundo Gerhardt (2009), esta etapa trata da perspectiva
teórica que decidimos adotar para tratar a questão inicial, sendo fundamental para
a próxima fase: a construção do modelo de análise.

A construção do modelo de análise

Nesta etapa, o pesquisador deverá definir os conceitos que serão utilizados,


as possíveis variáveis de pesquisa, a formulação de hipóteses (se for o caso) e o
método a ser utilizado. Aqui ele deverá planejar como irá responder às pergun-
tas de pesquisa e como irá atingir os objetivos delineados. Isso envolve decisões
como: a pesquisa a ser realizada será teórica ou de campo? Prática ou aplicada?
Quantitativa ou qualitativa? Um estudo de caso, um experimento, um levanta-
mento? Entre outras questões.
O método de pesquisa é delineado nesta fase e deverá ser seguido nas próximas
etapas da investigação.

capítulo 2 • 39
EXERCÍCIO DE APLICAÇÃO
Definição de conceitos de base e formulação das hipóteses principais da pesquisa
Para efetuar este exercício com sucesso, eis algumas sugestões:

01. Parta de uma questão precisa, revista e corrigida pelo trabalho exploratório e pela
problemática.

02. Não queime etapas. Este exercício constitui o fim natural de um trabalho exploratório
corretamente realizado e de uma reflexão sobre sua problemática.

03. Consulte autores reconhecidos. Não hesite em utilizar seus conceitos e inspirar-se em
suas hipóteses. Nesse caso, preocupe-se em indicar claramente as referências utilizadas.
Trata-se de uma questão de honestidade intelectual e também de validade externa de seu
trabalho.

04. Cuide da coerência de seu modelo de análise: coloque claramente em evidência como
você concebe as relações entre conceitos e hipóteses.

05. Procure sempre ser claro e objetivo. Lembre-se de que a qualidade é mais importante
que a quantidade: um ou dois conceitos centrais e uma ou duas hipóteses principais são, na
maior parte dos casos, suficientes. Não se preocupe com conceitos e hipóteses secundários,
pois, após ter adquirido certeza dos conceitos e hipóteses centrais, formulará mais facilmente
outros conceitos e hipóteses.
Quivy; Campenhoudt, p. 36, 1995, apud Gerhardt, p. 46, 2009.

A coleta de dados

Após o delineamento do método de pesquisa, chega o momento de coletar os


dados. Já com a pesquisa planejada, o pesquisador deverá saber quais dados cole-
tar, com quem coletar e como coletar.
Por isso, o planejamento prévio e cuidadoso de como a pesquisa será de fato
realizada é fundamental para manter a fidedignidade da investigação. Tudo deve
ser detalhado e minuciosamente pensado para diminuir as chances de erro no alvo

capítulo 2 • 40
a ser acertado. O público-alvo deve estar bem definido, a forma de abordá-lo, as
perguntas a serem realizadas, os instrumentos de investigação, enfim, todos os
pontos que envolvam as perguntas qual, quem e como devem estar bem definidos.
Se a forma como os dados são coletados e as próprias informações obtidas
propriamente ditas não forem bem definidas, o pesquisador corre o risco de inva-
lidar sua investigação. Assim, esta etapa reflete todo o cuidado tomado nas etapas
anteriores, que envolvem a exploração e o planejamento da pesquisa.

A análise dos dados

Após a coleta dos dados, chega o momento em que estes devem ser analisados.
Esta etapa também deve ser predefinida, pois o investigador deve ter domínio
quanto às técnicas que serão utilizadas para a interpretação das informações que
levantou.
Assim, no planejamento da pesquisa, a forma como os dados serão analisados
também já deve estar bem descrita no método. Imagine-se como um pesquisador
com inúmeras entrevistas realizadas com várias pessoas em um serviço de saúde
sem saber como fazer para interpretá-las? É importante que você compreenda,
ao menos em parte as possibilidades de análise dos dados, se, por exemplo, estas
envolveram técnicas quantitativas, estatísticas e ainda que tipo de técnicas ou téc-
nicas qualitativas, com análises de discurso e conteúdo. A forma de interpretação
dos dados também é crucial para manter a fidedignidade de uma pesquisa.
A análise dos dados pode demandar bastante tempo, e seguramente exige
muito estudo quanto às técnicas de pesquisa, bem como cuidado para se interpre-
tar informações e chegar a conclusões.

As conclusões

Aqui, enfim, o pesquisador chega à etapa final de uma pesquisa.


Podemos dizer que após a realização de todas as etapas, é possível verificar se
os objetivos previamente definidos foram atingidos de forma satisfatória ou não.
Afinal, quais respostas foram encontradas para a pergunta de pesquisa? A proble-
mática levantada foi compreendida? Quais foram as principais contribuições da
investigação? Quais foram suas principais limitações e dificuldades de realização?
Ainda nesta etapa, o pesquisador deve apontar um direcionamento para pes-
quisas futuras, formulando questões que podem aprimorar o tema investigado.

capítulo 2 • 41
RESUMO
Neste capítulo, você estudou as possíveis classificações de uma pesquisa quanto à na-
tureza, abordagem, aos objetivos e procedimentos. São informações fundamentais para que
você, futuro profissional e possível pesquisador, possa realizar sua própria investigação e ain-
da compreenda a importância do mundo científico na aplicação prática dentro da Psicologia.
Ainda, compreender as etapas de uma pesquisa é fundamental para que possamos juntos,
continuar nossos estudos sobre a pesquisa em Psicologia. Abordamos as etapas iniciais para
a realização de uma investigação, falamos sobre a importância do planejamento da pesquisa
e sobre o delineamento preciso do método. Agora iremos aprofundar um tipo de pesquisa
muito importante na Psicologia: a pesquisa experimental! Vamos lá? Espero você!

ATIVIDADES
01. Qual a diferença entre método de pesquisa e metodologia?

02. Quais são as principais diferenças entre pesquisas qualitativas e quantitativas?

03. As pesquisas aplicadas são melhores do que as pesquisas básicas? Por quê?

04. Quais são as principais etapas de uma pesquisa?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A.; SILVA, R. Metodologia científica. Pearson: São Paulo, 2007.
COZBY. P. C. Métodos de Pesquisa em Ciências do Comportamento, São Paulo: Atlas, 2003.
CUNNINGHAM, L.; YOUNG, C.; LEE, M. (2000). Methodological triangulation in measuring public
transportation service quality. Transportation Journal, v. 40, p. 35-47.
FONSECA, J. J. S. Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza: UEC, 2002.
GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2007.
MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Técnicas de Pesquisa. São Paulo: Atlas, 2007.

capítulo 2 • 42
POLIT, D. F.; BECK, C. T.; HUNGLER, B. P. Fundamentos de pesquisa em enfermagem: métodos,
avaliação e utilização. Trad. de Ana Thorell. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2004.
SIEBER, S. D. (1973). The integration of survey research and field work: contributions to data
collection. American Journal of Sociology, v. 78, n. 6, p. 1335-1359.
SILVA, E .L.; MENEZES, E. M. (2005). Metodologia da pesquisa e elaboração de dissertação. 4.
ed. Florianópolis: UFSC.
STAKE, R. E. (1999). The Art of case study research. Thousand Oaks: Sage.
TRIPP, D. (2005). Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. Educação e Pesquisa, v. 31, n. 3, p.
443-466.

capítulo 2 • 43
capítulo 2 • 44
3
O estudo sobre
comportamento
O estudo sobre comportamento
Neste capítulo, você vai compreender questões muito importantes para o es-
tudo científico do comportamento dos seres humanos e dos organismos, de modo
geral. Vamos apresentar conceitos fundamentais para que, como pesquisador e
psicólogo, você aprenda a definir variáveis e compreenda métodos de mensuração
comportamentais muito importantes para a pesquisa em Psicologia. Entender as
relações entre variáveis para explicar fenômenos que envolvem o comportamento
é de suma importância para a evolução da Psicologia enquanto ciência e até mes-
mo para intervenções na prática clínica, visto que possibilita um olhar científico e
crítico para várias questões.
Recomendamos como leitura complementar o livro Métodos de Pesquisa em
Ciências do Comportamento de autoria de Paul C. Cozby, uma das obras mais ci-
tadas e tradicionais para os pesquisadores do comportamento para aprofundar os
conceitos que serão estudados aqui. Vamos começar?

OBJETIVOS
• Compreender o que são conceitos dentro de uma pesquisa;
• Entender as diferenças entre variáveis dependentes e independentes;
• Entender as diferenças entre as pesquisas experimentais e não experimentais;
• Compreender como fazer a seleção de amostras para pesquisas experimentais;
• Entender o conceito do efeito placebo e do efeito nocebo;
• Entender o que é o procedimento duplo-cego.

Conceitos e variáveis de pesquisa

Você já deve ter refletido sobre por que as pessoas se comportam de determi-
nadas formas, não é mesmo? Por que algumas pessoas se comportam de maneira
violenta? Por que muitas vezes afirmamos que homens e mulheres se comportam
de forma diferente? O que faz uma criança aumentar a frequência de seus com-
portamentos de birra? Muitas vezes escutamos afirmações e explicações sobre esses
tipos de questionamentos, mas que, em sua maioria, são fundamentados na visão
do senso comum.

capítulo 3 • 46
Já vimos que a Psicologia enquanto ciência não se contenta e não pode ser
construída com base em teorias populares ou explicações superficiais sobre o com-
portamento. É necessário senso crítico e olhar científico para se chegar a conclu-
sões que tenham certa fidedignidade. Estamos falando, muitas vezes, de questões
qualitativas, isto é, difíceis de mensurar em alguns aspectos, por exemplo a violên-
cia, os sentimentos, tipos de personalidade etc. e, portanto, a inferência e a expec-
tativa por encontrar causalidades podem fazer as pessoas caírem na armadilha de
explicações errôneas e levianas. Assim, o estudo do comportamento envolve uma
série de pontos importantes que devem ser pensados, considerados e controlados
para que possamos validar nossas conclusões.
Quando iniciamos uma pesquisa, definimos seu tema e a pergunta à qual
desejamos responder utilizando a revisão da literatura, conforme abordamos an-
teriormente. Ao trabalhar como pesquisadores, verificamos que dentro de um
mesmo tema podemos encontrar diferentes definições para o mesmo conceito.
Mas afinal, o que é um conceito? Podemos dizer se trata da compreensão e defi-
nição de um objeto, de um conjunto de ideias, ou até mesmo de um fenômeno.
Cervo, Bervian e Silva (2007) apresentam a definição do dicionário Michaelis
(2000), que o define como uma opinião ou reputação, e de Lakatos (1983) que
compreende conceito como a expressão de uma abstração, formada por meio de
generalizações de observações.

PERGUNTA
O que é um conceito?
Podemos dizer se trata da compreensão e definição de um objeto, de um conjunto de
ideias, ou até mesmo de um fenômeno.

No campo da Psicologia, é comum vermos em pesquisas o que chamamos de


construto. Alguns autores consideram que construto e conceito se referem à mes-
ma coisa (CERVO; BERVIAN; SILVA, 2007). Entretanto, podemos compreen-
der construto como um conceito não observável, como os “valores pessoais”, por
exemplo. Ainda, para que um conceito seja de fato um construto científico, ele
deve ter embasamento teórico consistente e definição apurada e bem delineada.

capítulo 3 • 47
PERGUNTA
O que é um construto?
Construto pode ser compreendido como um conceito não observável (exemplo: sentimen-
tos, valores, personalidade, etc.). Para que um conceito seja de fato um construto científico,
ele deve ter um embasamento teórico consistente e uma definição apurada e bem delineada.

Como podemos entender que um conceito apresenta diferentes defini-


ções? Vamos pensar em “personalidade. De que forma podemos definir esse con-
ceito? Ao estudarmos o desenvolvimento humano e a formação da personalidade,
vemos que há várias ópticas sobre este mesmo conceito, isto é, vários autores que
consideram questões peculiares a suas teorias para definir o que é personalidade.
Por isso, quando estamos pesquisando, temos que assumir e explanar qual será o
nosso ponto de vista, em qual teoria vamos ter base, qual a definição do conceito
abordado em nossa investigação.
Dessa forma, a apresentação de um determinado conceito deve ser predeter-
minada em nossa pesquisa com base nas teorias nas quais vamos nos embasar para
efetivar a investigação. É necessário compreender, principalmente no campo da
Psicologia, que as diferentes vertentes teóricas irão influenciar a óptica pela qual
iremos desenvolver nosso trabalho científico. Falar de comportamento para os es-
tudiosos que se fundamentam nas teorias do behaviorismo radical de Skinner, por
exemplo, consistirá em entender este conceito de uma visão diferente em relação
aos estudiosos que se apoiam nas teorias psicanalíticas.

PERGUNTA
O que é uma teoria?
Pode ser compreendida como um conjunto de leis ou regras sistematizadas para explicar
determinado conceito (CERVO; BERVIAN; SILVA, 2007).

É imprescindível definirmos, então, a teoria que embasa nossa investigação


para assim entendermos o problema de pesquisa e as variáveis envolvidas. Antes de
falarmos de variáveis, é fundamental a compreensão do que denominamos “teo-
ria”. Segundo Cervo, Bervian e Silva (2007), uma teoria refere-se ao conhecimento

capítulo 3 • 48
em oposição à prática como ação. Pode ser compreendida como um conjunto de
leis ou regras sistematizadas para explicar determinado conceito.
A teoria é um conjunto de construtos (conceitos) inter-relacionados, defi-
nições e proposições que apresentam concepção sistemática dos fenômenos me-
diante a especificação de relações entre variáveis com o propósito de explicá-los e
prevê-los (KERLINGER, 1973 apud CERVO; BERVIAN; SILVA, 2007).
Entendendo tudo isso, vamos agora buscar compreender o que são as variáveis
de uma pesquisa. Considerando a definição apresentada, podemos entender que
uma teoria é formada pela sistematização de conceitos (e que devemos definir
nossa posição em uma pesquisa científica. Qual será nossa vertente teórica?), que
por sua vez podem ser estudados por meio de diferentes variáveis de pesquisa. Para
Cozby (2004), uma variável é qualquer situação, comportamento, evento, fato
que apresente, ao menos dois valores, por exemplo, sexo, estado civil, agressão,
raiva, idade etc. As variáveis, como o próprio nome diz, podem variar conforme
categorias ou valores numéricos.

PERGUNTA
O que é uma variável?
Uma variável é qualquer situação, comportamento, evento, fato que apresente, ao menos
dois valores, por exemplo, sexo, estado civil, agressão, raiva, idade etc.

De modo geral, as variáveis podem ser divididas em quatro grupos, sendo eles:
variáveis situacionais, variáveis de resposta, variáveis do participante e variáveis
intervenientes (COZBY, 2004). As variáveis situacionais descrevem as caracte-
rísticas de uma situação ou de ambiente (por exemplo: densidade espacial de uma
sala de espera, número de pessoas envolvidas numa situação de emergência etc.).
As variáveis de resposta podem ser compreendidas como os comportamentos
dos indivíduos (por exemplo: reação, desempenho, comportamentos específicos
que se deseja mensurar etc.). As variáveis do participante consistem nas carac-
terísticas da pessoa ou do sujeito que participa da pesquisa (por exemplo: sexo,
estudo civil, inteligência etc.). Por fim, as variáveis intervenientes se referem aos
“processos psicológicos que medeiam os efeitos de uma variável situacional sobre
uma resposta particular” (COZBY, p. 82, 2004).

capítulo 3 • 49
A definição das variáveis intervenientes é fundamental para que o pesquisador
possa medi-las e manipulá-las para compreender determinado fenômeno a ser
investigado. Isso faz o pesquisador definir operacionalmente o que vai investigar
de forma detalhada, o que envolve a discussão de conceitos abstratos em termos
concretos (MARCONI; LAKATOS, 2007). Muitas vezes, esse processo pode fa-
zer o pesquisador compreender que certas variáveis são amplas demais para serem
estudadas cientificamente, e que há a necessidade de definição do conceito a ser
investigado para se concretizar a pesquisa. Assim, uma pesquisa científica necessita
ter foco. Os conceitos precisam estar bem delineados para que as variáveis inter-
venientes sejam definidas e, assim, observadas e/ou manipuladas na investigação.
Um erro ou abstração excessiva nesse processo pode invalidar a pesquisa.
Segundo Cozby (2004), muitas pesquisas estudam as relações entre duas ou
mais variáveis. Também conhecemos o estudo dessas relações como “estudos cor-
relacionais”. O objetivo é compreender qual a relação entre variáveis para explicar
determinado fenômeno. Essas relações podem ser positivas, negativas, curvilineares,
ou ainda, o pesquisador pode chegar à conclusão de que não existem relações entre
as variáveis.
Em uma relação linear positiva, os aumentos dos valores de uma variável são
acompanhados pelo aumento dos valores na outra variável. Por exemplo, vamos
supor que nossa pesquisa irá investigar a relação entre idade e independência finan-
ceira. O intuito é verificar se essas duas variáveis têm alguma relação e qual o tipo
de relação que é estabelecida. Ao levantarmos os dados junto a pessoas de diferentes
idades e sua situação de dependência ou independência financeira, e após a análise
dos dados, poderíamos supostamente encontrar uma relação positiva entre elas, isto
é, quanto mais velhas são as pessoas (maior idade), maior sua independência finan-
ceira. Isso significa que se uma variável aumenta, a outra também aumenta.
Já em uma relação linear negativa podemos encontrar o oposto, isto é, quan-
do os valores de uma variável aumentam, os valores da segunda diminuem. Vamos
a um exemplo hipotético. Suponha que o objetivo seja investigar o tempo de
trabalho em uma determinada empresa e a pretensão de sair do emprego para
buscar outra oportunidade (chamamos de intenção de turnover, isto é, quando o
funcionário tem a pretensão de sair da empresa, o que muitas vezes causa prejuízo
a esta devido à alta rotatividade de pessoas entre os cargos).
Após coleta e análise dos dados, poderíamos encontrar supostamente uma
relação negativa entre as duas variáveis definidas, isto é, quando maior o tempo

capítulo 3 • 50
de trabalho na empresa, menos a intenção de deixá-la. Esse seria um exemplo de
relação negativa entre as variáveis.
Em uma relação curvilinear podemos ter um terceiro tipo de situação. Os
aumentos nos valores de uma variável são acompanhados tanto por aumento
quanto por diminuição nos valores da outra. Se colocássemos a relação entre as
variáveis em um gráfico, nesse caso, teríamos um U invertido. Isso significa que,
até certo ponto, as variáveis têm alguma relação positiva, e que a partir dele, essa
relação começa a mudar para uma situação negativa. As relações aqui não são li-
neares, isto é, não formam uma reta. Por isso, falamos em “curvas”, o que faz com
que obtenhamos o U invertido.
Já quando não há uma relação entre as variáveis, o que se obtém é um grá-
fico horizontal, o que descreve a ausência de relação entre as duas variáveis.
A figura 3.1 ilustra os quatro tipos de relações entre variáveis.
Relação Linear Positiva Relação Linear Negativa
12 12
10 10
8 8
6 6
4 4
2 2
0 0
A B A B

Sem Relação Relação Curvilinear


1,2
2,5
1
2
0,8
1,5 0,6
1 0,4
0,5 0,2
0 0
A B A B

Figura 3.1 – Quatro tipos de relações entre variáveis. Cozby (2004).

Agora que você já sabe quais os tipos de relações que as variáveis podem apre-
sentar, podemos ainda compreender as variáveis de uma pesquisa como dependen-
tes ou independentes. Mas, o que seria isso?
De modo geral, em uma investigação em que se almeja averiguar as relações
entre variáveis, considera-se que uma pode ser a “causa” e a outra, o “efeito”. Assim,

capítulo 3 • 51
nos nossos exemplos dados, poderíamos considerar que a idade afeta a indepen-
dência financeira, ou ainda, que o tempo de empresa afeita a intenção de turnover.
Dessa forma, podemos dizer que as variáveis que são causa podem ser compreen-
didas como variáveis independentes, e as variáveis que são efeito com variáveis
dependentes. Como o próprio nome diz, a variável independente é aquela que,
se sofrer qualquer mudança ou variação, afetará a variável que depende dela, isto
é, a variável dependente. Para cada problema de pesquisa, as variáveis dependen-
tes e independentes devem ser sempre definidas com base na situação específica
pesquisada, pois tais relações podem mudar conforme a pergunta da investigação.

CURIOSIDADE
A variável (ou variáveis) independente(s) é aquela em que se supõe ter relação com uma
variável dependente, sendo que a primeira é a causa e a segunda é efeito. As manipulações
sobre a variável independente serão sentidas pela variável dependente.

Vamos a outro exemplo para que isso fique mais claro. Suponha que o obje-
tivo da pesquisa seja averiguar se as pessoas que possuem determinados valores
pessoais têm traços de introversão ou extroversão. Nesse caso, teríamos como va-
riáveis independentes os “valores pessoais”, e como variáveis dependentes “traços
de introversão ou extroversão”. Para esse exemplo, conforme houvesse variação
dos valores, as pessoas poderiam ser mais introvertidas ou mais extrovertidas, se
de fato, a relação entre tais variáveis se concretizasse por meio de pesquisa. Assim,
nesse tipo de pesquisa, a variação das variáveis independentes (causa) acarretará
efeito nas variáveis dependentes.
É importante ressaltar que cientistas do comportamento não se preocupam
com questões puramente de causa e efeito, como verdades absolutas. Eles estão
mais interessados em descrever o comportamento de forma cuidadosa, estudar
como as variáveis afetam umas às outras e desenvolver teorias que expliquem de-
terminados fenômenos sobre o comportamento (COZBY, 2004).

Estudos experimentais e não experimentais

Falamos na seção passada de variáveis e do controle das mesmas para a realiza-


ção de estudos. Mas, será que todos os estudos terão o que chamamos de variáveis

capítulo 3 • 52
dependentes e independentes? A resposta é não. Tudo vai depender se nosso estu-
do for experimental ou não experimental. Vamos entender melhor isso.
Um estudo que envolve um método em que devemos realizar o controle das
variáveis, isto é, em que vamos analisar os efeitos das variáveis independentes so-
bre as variáveis dependentes são denominados experimentais. Falamos um pouco
sobre a pesquisa experimental no capítulo passado. Portanto, é aqui que ela se
enquadra. Assim, o pesquisador irá manipular a variável de interesse e observar a
resposta por meio do controle experimental.
Segundo Cozby (p. 92, 2004), o controle experimental permite que as va-
riáveis sejam mantidas constantes. “Se uma variável é mantida constante, ela não
pode ser resultado do experimento”. Assim, para se efetivar uma pesquisa expe-
rimental é necessário que todos os participantes sejam tratados da mesma forma,
sendo do grupo controle ou do grupo experimental. Este último é composto por
pessoas em que as variáveis independentes serão variadas, isto é, sofrerão alguma
alteração para que os feitos sobre as variáveis dependentes sejam analisados. Já no
grupo controle, as pessoas serão observadas sobre determinadas condições sem
manipulação das variáveis, para comparar os resultados entre os dois grupos.
Por exemplo, vamos supor que nosso objetivo seja analisar se a quantidade de
luz no ambiente pode interferir no desempenho dos funcionários de uma fábrica
de meias. No grupo experimental, a intensidade da luz receberá variações, sendo
mensurado o desempenho dos funcionários com base nessas mudanças. Aqui a
variável independente é a luz, e a variável dependente refere-se ao desempenho
das pessoas. Para verificar se o desempenho não mudou por outras questões, por
exemplo, pelo simples fato de as pessoas saberem que estão sendo observadas em
uma pesquisa, ou que com o tempo de observação, o desempenho pode sofrer
alterações devido ao cansaço ou outras questões, um grupo controle também é
observado para comparação. Neste, o desempenho é mensurado sem qualquer
variação da intensidade de luz, que é mantida do início ao fim. Ao se analisar os
resultados do grupo experimental e do grupo controle em relação ao desempenho,
podemos tirar conclusões sobre a variação da luz durante o tempo em que o expe-
rimento foi realizado.
Em alguns casos, manter uma variável constante pode ser difícil, sendo que
existem outras variáveis (que chamamos de covariáveis) que podem influenciar
os resultados e trazer erros e vieses para nossas interpretações. Para isso, pode-se
utilizar o que chamamos de randomização, que é uma forma estatística de tornar
nossa variável ou amostra aleatória.

capítulo 3 • 53
CONCEITO
Veja o exemplo de Cozby (2004, p. 93) para compreender melhor o que é esse conceito:
Para tornar o conceito de designação randômica mais concreto, você pode tentar fazer um
exercício parecido com o que eu fiz com uma caixa cheia de figurinhas velhas de jogadores
de beisebol. A caixa continha figurinhas de 50 jogadores da Liga Norte-Americana e de 50
jogadores da Liga Nacional. Misturei completamente as figurinhas e, em seguida, selecionei
32 delas e as designei a “grupos”, usando a lista de números aleatórios (...). À medida que se-
lecionada cada figurinha, usava a seguinte regra: se o número randômico fosse par, o jogador
iria para o ‘Grupo 1’, e se o número fosse ímpar, ele iria para o ‘Grupo 2’. Em seguida, procurei
verificar se meus dois grupos diferiam em termos da representação da Liga. O Grupo 1 tina 9
jogadores da Liga Norte-Americana e 7 jogadores da Liga Nacional, enquanto o Grupo 2 tinha
igual número de jogadores de ambas as ligas. Os dois grupos eram praticamente idênticos.

Dessa forma, podemos minimizar ou até eliminar a influência de covariáveis


por meio da randomização e do controle experimental de variáveis, o que nos per-
mite concluir em pesquisas desse tipo que os efeitos encontrados de fato se referem
à influência das variáveis de interesse estudadas. Apesar disso, uma questão im-
portante que deve ser levada em consideração é que pesquisas na área de Ciências
Humanas apresentam certas limitações, sendo que muitas vezes não podem ter
seus resultados generalizados ou ainda, determinadas variáveis não podem ser con-
troladas e mantidas constantes, sendo assim desenvolvidos outros tipos de estudos.
Porém, nem todo estudo é caracterizado como experimental. Em pesquisa em
Psicologia, também podemos encontrar os estudos não experimentais. Estes se
referem a observações do comportamento diretamente como ocorrem, sem mani-
pulação de variáveis. Por exemplo, em um estudo em que se deseja compreender
quais tipos de comorbidadades psicológicas uma amostra de pessoas com diag-
nóstico de transtorno depressivo apresenta, poderíamos utilizar um método não
experimental. Nesse caso, com base em um grupo de pessoas com determinadas
características (diagnóstico de depressão, em nosso exemplo), o pesquisador in-
vestigaria quais outros transtornos psicológicos poderiam ser encontrados de for-
ma concomitante, verificando quais outros tipos de transtornos pessoas com esse
diagnóstico específico poderiam apresentar.
No entanto, nesse tipo de estudo, um dos problemas apontados é a direção
de causa e de efeito. Alguns autores acreditam ser difícil determinar qual variável

capítulo 3 • 54
causa outra (MARCONI, LAKATOS, 2007). Afinal, pessoas com depressão pos-
suem a tendência a ter outro tipo de transtorno psicológico ou outros tipos de
transtorno podem aumentar as chances de o paciente ter depressão? Os resul-
tados podem ser ambíguos e as conclusões podem ser errôneas. Assim, estudos
experimentais, por meio do controle de variáveis, podem auxiliar na supressão
desse problema.

A seleção da amostra

Um dos pontos importantes que deve ser cuidadosamente pensado se refere


à seleção da amostra em uma pesquisa. O tamanho e as características da mesma
serão fundamentais para determinar se os resultados de nossa pesquisa poderão ser
generalizados ou não, ou ainda, para que possamos caracterizar nosso estudo (por
exemplo, como um estudo de caso). Para isso, podemos usar técnicas estatísticas
que nos permitem realizar diferentes tipos de pesquisa.
Em um estudo em que se pretende analisar o efeito de um remédio sobre o com-
portamento de pessoas com um determinado diagnóstico, por exemplo, é necessário
que, além do controle de variáveis, a amostra tenha tamanho adequado para que se
possa concluir que tais resultados serão sentidos pela população, de modo geral, e
não apenas pelos participantes do estudo. Alguns autores utilizam como parâmetros
o número de variáveis que se deseja investigar para, assim, determinar o tamanho da
amostra adequado para permitir generalizações, ou ainda, considerar os resultados
aceitáveis do ponto de vista estatístico (HAIR JR. et al., 2005). Em alguns casos, a
repetição dos procedimentos do estudo em diferentes amostras é utilizada para veri-
ficar se os resultados são semelhantes e em quais pontos podem divergir.
Geralmente, pesquisas nas quais cabem as generalizações dos resultados são
quantitativas e por isso, as técnicas estatísticas são fundamentalmente utilizadas.
Não caberá aqui a definição dos procedimentos estatísticos utilizados para definir
um tamanho correto de amostra ou para analisar dados, visto que tudo dependerá
do tipo de estudo que você irá realizar e das variáveis que serão investigadas. Mas é
importante que você saiba que nesse momento, a estatística é grande aliada à pes-
quisa em Psicologia. Para isso, o conhecimento em estatística e/ou a ajuda de um es-
pecialista na área pode ser fundamental para que você possa fazer a seleção adequada
da amostra, e ainda utilizar os métodos corretos para a análise de dados. É necessário
que essas decisões sejam pensadas já no projeto de sua pesquisa, para não dar passos
errados e acabar perdendo a coleta de dados realizada ou invalidando resultados.

capítulo 3 • 55
SAIBA MAIS
Para saber mais sobre como aplicar a estatística em pesquisa, você pode consultar o livro
de autoria de Hair Jr. et al. (2005), intitulado Fundamentos de Técnicas de Pesquisa em Admi-
nistração. Por ser um livro de Ciências Humanas Aplicadas, podemos utilizar muitas técnicas
em estudos realizados na Psicologia. Vale a pena conferir!

Quando temos com um número representativo da população geral, sendo a


amostra aleatória, dizemos que ela é uma amostra probabilística. Já quando a esco-
lha dos elementos não é feita de forma aleatória, podendo ser intencional ou por
conveniência (isto é, com base na disponibilidade dos participantes), obtém-se
uma amostra não probabilística. Em pesquisas na área da Psicologia, é comum que
o pesquisador utilize amostras por conveniência, pois muitas vezes dependemos de
voluntários para coletar dados.
©© ARTHIMEDES | SHUTTERSTOCK.COM

Em pesquisas em que não se pretende generalizar dados, mas sim iniciar uma
série de investigações, ou ainda realizar pesquisas em profundidade, podemos uti-
lizar, por exemplo, um único participante (ou alguns participantes), tendo assim
um estudo de caso (ou estudos de casos). Ou ainda, realizar entrevistas com pes-
soas específicas para se responder perguntas pontuais, relacionadas àquela amostra
em si. Esses procedimentos são muito comuns na Psicologia, sendo que a profun-
didade da investigação e a riqueza de análise dos dados podem trazer importantes

capítulo 3 • 56
contribuições para a compreensão de certo fenômeno ou para encontrar respostas
para perguntas de pesquisa diversas.
Nesses casos, técnicas de análises qualitativas, como a análise de discurso e
análise de conteúdo, podem ser utilizadas para a interpretação dos dados. Tudo
dependerá do tipo de investigação que será realizada. Isso será determinante para
que você defina e selecione sua amostra e eleja a melhor técnica de análise dos
dados coletados. Esse assunto será abordado mais adiante, no próximo capítulo.

SAIBA MAIS
Para saber mais sobre a análise de discurso realizada em estudos na área de Psicologia,
você pode se aprofundar com o artigo “Método de análise de conteúdo: ferramenta para a
análise de dados qualitativos no campo da saúde”, que pode ser acessado pelo link:
<http://www.scielo.br/pdf/reben/v57n5/a19v57n5.pdf>.
Boa leitura!

Um ponto muito importante é garantir que as pessoas ou sujeitos (em casos


de pesquisa com animais, por exemplo) apresentem as características semelhantes
necessárias para comporem uma amostra. Assim, é necessário que as variáveis dos
participantes sejam bem definidas, a fim de se entender quem deverá participar
do estudo. Muitas vezes, tais características são tão raras que compor uma amos-
tra ideal para a pesquisa pode ser um passo bastante difícil, e é por esse motivo
que muitas investigações acabam utilizando amostras não probabilísticas e por
conveniência na Psicologia, ou ainda, realizando estudos em profundidade com
participantes bastante específicos.
Lembre-se que, ao mesmo tempo em que o pesquisador deve se preocupar
com a amostra que irá compor o estudo, questões éticas também devem ser consi-
deradas. Tal tópico foi abordado no primeiro capítulo quando falamos sobre ética
em pesquisa.

O efeito placebo-nocebo e o procedimento duplo-cego

O efeito placebo é um fenômeno debatido por pesquisadores de várias áreas,


sendo a Psicologia uma ciência cujos seus impactos devem ser cuidadosamente
considerados. Mas, o que é efeito placebo? Segundo Teixeira (2009), com base

capítulo 3 • 57
em artigos internacionais sobre o assunto, o efeito placebo ocorre quando as ex-
pectativas dos participantes de uma pesquisa sobre o efeito de determinado me-
dicamento ou tratamento trazem vieses para os resultados, não representando os
mecanismos reais do tratamento em si.
No mundo da farmacologia, placebo é uma substância inerte, sem proprieda-
des farmacológicas intrínsecas. Porém, acredita-se que o placebo possa gerar efei-
tos terapêuticos por conta da expectativa dos participantes, e não pelos seus efeitos
em si. De modo geral, na área científica, o “efeito placebo” não se trata apenas de
medicamentos, mas pode envolver fatores genéticos, cognitivos, mecanismos de
aprendizagem, entre outros (DIAS; SARTORI, 2015).

PERGUNTA
O que é efeito placebo?
Trata-se de um fenômeno em que melhoras de sintomas ou doenças são relatadas por
pacientes que receberam tratamentos aparentemente inespecíficos ou inertes, sendo que
a própria expectativa positiva da pessoa acaba gerando tais resultados (TEIXEIRA, 2009).

O termo começou a ser utilizado nas áreas medicas e farmacológicas, sendo


que determinados medicamentos inefetivos eram prescritos a pacientes apenas
para acalmá-los ou reduzir seu sofrimento, sem de fato ter um efeito sobre sua
saúde. Tratava-se de um recurso para gerar algum conforto, possivelmente “mera-
mente psicológico” diante de situações que muitas vezes não se sabia o tratamento
correto (ROCHA; DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2008).
Também tem se encontrado na literatura científica o termo “efeito nocebo”,
quando a expectativa negativa em relação ao tratamento acaba sendo vivenciada
dessa forma pelo paciente. Digamos que é o contrário do efeito placebo, que indi-
ca uma expectativa de melhora.

PERGUNTA
O que é efeito nocebo?
É um fenômeno oposto ao efeito placebo, sendo que a expectativa negativa em relação a
algum tipo de tratamento possa conduzir a agravação de um sintoma ou doença (TEIXEIRA,
2009).

capítulo 3 • 58
Podemos dizer quem uma falsa cirurgia no olho, isto é, algum procedimen-
to que o pesquisador/médico possa realizar no paciente, porém sem intervenção
terapêutica cirúrgica, por exemplo, pode acarretar em relatos de melhoras dos
pacientes. O contexto de atendimento em si, a relação que se estabelece com o
paciente (ou participante de pesquisa) pode de fato produzir “resultados de cura
ou melhoras” sentidas por este.
Assim, em intervenções psicológicas, há determinados questionamentos que
vinculam essas questões: a melhora relatada por pacientes reflete de fato a inter-
venção em si ou a simples presença do psicólogo (ou a expectativa de melhora do
paciente) é que o fizeram se sentir melhor? No artigo de Rocha et al. (2008), o
debate sobre esses pontos é bastante interessante, sendo apontadas algumas formas
de controle do “efeito placebo” nas pesquisas realizadas na Psicologia.
Ainda, é importante pensarmos que, além das expectativas do participante,
também devemos lidar com as expectativas dos pesquisadores. Ao interpretar os
dados, os responsáveis por uma investigação podem sobrepor seus próprios valores
e pontos de vista, com base em suas expectativas quanto aos resultados, trazendo
vieses na compreensão dos mesmos.
Uma das ferramentas apontadas para se eliminar o efeito placebo (ou o efeito
nocebo) é o que denominamos procedimento duplo-cego (ou condição de duplo-
cego). Nesse delineamento, os participantes não têm conhecimento das condições
de tratamento a que estão sendo submetidos e conduzidos pelos pesquisadores, ou
pelos que estão avaliando os resultados da pesquisa. Nesse procedimento, nem as
pessoas que estão sendo examinadas nem aqueles que estão examinando (investi-
gadores) sabem quais são as variáveis em um determinado momento da pesquisa.
Vamos a um exemplo para que fique mais claro.
Suponha que o objetivo da pesquisa seja investigar a eficácia de determinado
medicamento em comprimidos para melhorar ou suprir tremores de pacientes
diagnosticados com Parkinson (doença progressiva do sistema neurológico que
tem como um dos sintomas mais marcantes tremores incontroláveis pelos seus
portadores). Comprimidos contendo o medicamento ativo e comprimidos feitos
com farinha (placebos) poderiam ser utilizados para a pesquisa, sendo que nem o
participante nem o pesquisador que vai aplicar a intervenção saberiam quais são
os que contêm o medicamento em si e quais são os placebos. Tais comprimidos
poderiam ter algum código, apenas para controlar essa questão. Assim, teríamos
dois grupos: um que receberia apenas comprimidos com o princípio farmacoló-
gico ativo e outro que receberia apenas placebos (isso poderia ser controlado por

capítulo 3 • 59
outros pesquisadores, que não aplicariam as intervenções e que não analisariam os
dados em si). Após a intervenção medicamentosa, os resultados seriam medidos e
interpretados, e nessa fase sim, seria revelado qual grupo tomou os comprimidos
placebos e qual recebeu o medicamento para tratamento real da doença. Com esse
procedimento, o efeito placebo ou o efeito nocebo poderiam ser controlados.
Apesar de sua importância e benefícios, tais procedimentos devem ser
analisados pelo Comitê de Ética em Pesquisa, antes da realização de qualquer in-
tervenção desse tipo, visto que algumas críticas são feitas pelo fato do paciente não
saber o que está tomando, por exemplo. Isso infringe certas questões apontadas
como fundamentais em pesquisas com seres humanos, sendo que estes precisam
ter ciência do que será aplicado, e dos passos do procedimento ao qual serão sub-
metidos e consentir sua participação.

ATIVIDADES
01. O que é conceito, construto, teoria e variável de pesquisa?

02. O que são variáveis do participante?

03. O que são variáveis dependentes e independentes? Dê um exemplo abordado no capítulo.

04. Quais as principais diferenças entre estudos experimentais e não experimentais?

05. O que é efeito placebo? Por que o pesquisador deve tomar cuidado com isso?

06. O que é procedimento duplo-cego e para que ele é utilizado? Descreva o exemplo dado
no capítulo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAMPOS, C. J. G. Método de análise de conteúdo: ferramenta para análise de dados qualitativos no
campo da saúde. Revista Brasileira de Enfermagem. v. 57, n. 5, p. 611-614, 2004.
CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A.; SILVA, R. Metodologia científica. Pearson: São Paulo, 2007.
COZBY. P. C. Métodos de Pesquisa em Ciências do Comportamento, São Paulo: Atlas, 2003.

capítulo 3 • 60
DIAS, E. V.; SARTORI, C. R. Compreendendo o efeito placebo. Revista Ciências em Saúde. v. 5, n. 4,
p. 1-12, 2015.
HAIR JR., J. et al. (2005). Fundamentos de métodos de pesquisa em administração. Porto
Alegre: Bookman.
MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Técnicas de Pesquisa. São Paulo: Atlas, 2007.
ROCHA, M. M. et al. (2008). Placebo na pesquisa psicológica: algumas questões conceituais,
metodológicas e éticas. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas. v. 4, n. 2, p. 39-54, 2008.
TEIXEIRA, M. Z. Bases neurofisiológicas do fenômeno placebo-nocebo: evidências científicas que
valorizam a humanização da relação médico-paciente. Revista da Associação Médica Brasileira. v.
55, n. 1, p. 13-18, 2009.

capítulo 3 • 61
capítulo 3 • 62
4
Técnicas de coleta
e análise de dados
Técnicas de coleta e análise de dados
Até aqui, abordamos os principais pontos iniciais para planejamento de uma
investigação, bem como discutimos questões fundamentais que devem ser pre-
viamente analisadas para que o objetivo de pesquisa seja cumprido. Agora, você
vai conhecer as ferramentas mais utilizadas para uma próxima etapa: a coleta de
dados, e posteriormente, compreender de que forma o pesquisador pode fazer a
análise e interpretação dos mesmos. Neste capítulo, iremos estudar os instrumen-
tos mais comuns usados nas pesquisas em Psicologia e as ferramentas para inter-
pretações e análises que irão auxiliar o investigador a responder à sua pergunta de
pesquisa. Vamos lá?

OBJETIVOS
• Definir o que são técnicas de coleta de dados;
• Abordar o que é, os tipos e como elaborar um roteiro de entrevista;
• Possibilitar o entendimento sobre como extrair dados de pesquisa por meio de observação;
• Apresentar as etapas para a construção de um questionário de pesquisa;
• Discutir sobre a validação dos instrumentos de pesquisa;
• Apresentar conceitos de mensuração;
• Apresentar as principais ferramentas para a análise dos dados coletados em uma pesquisa.

Técnicas de coleta de dados

Após a delimitação do tema a ser abordado e a elaboração da pergunta de


pesquisa que se quer responder, é hora de pensarmos, enquanto pesquisadores, no
próximo passo: e agora? Como vou alcançar o objetivo proposto? De que forma
a pesquisa será concretizada? Para responder a essa questão, é fundamental par-
tirmos nesse momento para o planejamento do que denominamos método de
pesquisa, isto é, a parte em que os procedimentos para a coleta e análise de dados
são cuidadosamente pensados e planejados para a efetiva interpretação dos dados
e discussão dos resultados.
Você vai aprender agora que existem vários instrumentos que podem ser uti-
lizados para a coleta de dados. A escolha desses instrumentos está estritamente

capítulo 4 • 64
atrelada ao tipo de pesquisa que você irá desenvolver, assunto que vimos no capí-
tulo 2. Assim, a forma como os dados serão coletados e, posteriormente, analisa-
dos vai determinar a classificação da investigação dentro dos vários tipos de pes-
quisa que estudamos. Iremos abordar a seguir três instrumentos muito utilizados
nas pesquisas em Psicologia: a observação, a entrevista e o questionário. Vamos lá?

Observação

A observação é uma técnica de coleta de dados para que o pesquisador obte-


nha informações por meio dos sentidos, mas não consiste apenas em ver e ouvir,
mas também analisar os fatos estudados (MARCONI; LAKATOS, 2007). Nesta
técnica, o pesquisador pode obter informações, provas e dados de que os indiví-
duos que participam da investigação muitas vezes não têm consciência.

PERGUNTA
O que é observação enquanto técnica de coleta de dados?
É um método que o pesquisador pode utilizar para levantar dados e informações impor-
tantes para sua investigação, com base em sua pergunta e objetivo de pesquisa. Ela pode ser
de quatro tipos, dependendo de como é realizada: segundo os meios utilizados (sistemática
x assistemática); segundo a participação do observador (não participante x participante);
segundo o número de observações ou observadores (individual x em equipe); e segundo o
local onde ocorre (na situação real x em laboratório).

Devido a suas vantagens e desvantagens, trata-se de uma técnica que, na maio-


ria das vezes, é utilizada com outras técnicas de pesquisa. Segundo Marconi e
Lakatos (p. 88, 2007), podemos apontar como vantagens:
• Possibilita meios diretos e satisfatórios para estudar uma ampla variedade
de fenômenos;
• Exige menos do observador do que outras técnicas;
• Permite a coleta de dados sobre um conjunto de comportamentos;
• Depende menos de introspecção e reflexão;
• Permite a evidência de dados não constantes do roteiro de entrevistas ou
de questionários.

capítulo 4 • 65
Todas essas vantagens devem ser consideradas quando o pesquisador escolhe
a técnica de observação para sua coleta de dados. Entretanto, deve também estar
atento às limitações atreladas a ela (MARCONI; LAKATOS, p.89, 2007):
• O observador acaba tendo impressões favoráveis ou desfavoráveis em rela-
ção ao observado;
• Em algumas ocasiões, o observador pode não conseguir presenciar o fato
que deseja observar;
• Fatores imprevistos podem interferir na observação do pesquisador;
• A duração dos acontecimentos que se quer observar pode ser rápida demais
ou demorar muito, trazendo dificuldades para a coleta de dados;
• Aspectos relacionados à vida particular ou a determinados comportamentos
podem ser de difícil acesso ao pesquisador.

Após conhecer também suas desvantagens, o investigador poderá, então, do-


sar a melhor forma de fazer uma observação para a coleta de dados.
É importante que você entenda que não temos apenas uma forma de fazer
uma observação científica. Há, basicamente, quatro tipos de observação, sendo
elas classificadas (ANDER-EGG, 1978 apud MARCONI; LAKATOS, p. 88,
2007):
a) Segundo os meios utilizados;
b) Segundo a participação do observador;
c) Segundo o número de observações e;
d) Segundo o lugar onde se realiza.

Vamos estudar cada um deles para facilitar sua compreensão.


a) Segundo os meios utilizados;
A observação, segundo os meios utilizados para sua realização, pode ser classi-
ficada como observação não estruturada (assistemática) e observação estrutu-
rada (sistemática). Podemos dizer que a primeira é realizada de forma espontânea,
livre e informal, isto é, sem planejamento prévio ou controle sistemático. Consiste
em recolher e registrar fatos da realidade sem que o pesquisador utilize meios téc-
nicos especiais ou precise fazer perguntas diretas. Já a segunda é planejada e con-
trolada, feita por meio de instrumentos previamente elaborados, como quadros,
escalas, anotações etc. Os propósitos a serem observados são preestabelecidos.

capítulo 4 • 66
b) Segundo a participação do observador;
A observação também pode ser classificada com base na participação do ob-
servador, sendo observação não participante e observação participante. Na
primeira o observador não se integra à realidade observada. Ele entra em contato
com o observado, porém, não participa das situações analisadas. Também é conhe-
cida como observação passiva, visto que o pesquisador faz o papel de espectador,
nesse caso. Já na segunda, o pesquisador participa da comunidade ou do grupo
observado, incorporando as características do mesmo. O objetivo inicial seria, por
exemplo, ganhar a confiança de um grupo a ser pesquisado.
c) Segundo o número de observações;
A observação também pode ser classificada como observação individual ou
observação em equipe. Na observação individual é a técnica de observação reali-
zada por apenas um pesquisador. Já a observação em equipe é realizada por vários
estudiosos, sendo que vantagem é a visão de mais de um pesquisador sobre deter-
minado fato ou fenômeno. Um maior número de informações pode ser registrado,
nesse caso.
d) Segundo o lugar onde se realiza.
Conforme o local onde a observação é realizada, ela pode ser compreendida
como observação na vida real ou observação em laboratório. Como o próprio
nome diz, a primeira está atrelada à condição natural na qual o fato a ser observa-
do ocorre, sendo de forma espontânea. Já a segunda está relacionada a condições
controladas e artificiais, criadas especificamente para a pesquisa. A vantagem desse
tipo de observação é o controle de outras variáveis que podem interferir na coleta
de dados.

É importante ressaltar que não existe um tipo de observação melhor do que o


outro, mas sim, o mais adequado conforme o que o pesquisador planejou para sua
investigação e o objetivo que se propôs a chegar. Por isso, novamente ressaltamos a
importância do bom delineamento e elaboração da pergunta de pesquisa, e conse-
quentemente, dos objetivos a serem atingidos. Com uma boa revisão de literatura,
é possível traçar o melhor método de pesquisa para cada investigação.

capítulo 4 • 67
A figura 4.1 ilustra os tipos de observação que podem ser utilizadas em
uma pesquisa:
OBSERVAÇÃO
MEIOS
SISTEMÁTICA X
UTILIZADOS
ASSISTEMÁTICA

PARTICIPAÇÃO DO OBSERVAÇÃO
OBSERVADOR PARTICIPANTE X
NÃO PARTICIPANTE
OBSERVAÇÃO
NÚMERO DE OBSERVAÇÃO
OBSERVAÇÕES INDIVIDUAL X
EM EQUIPE

LOCAL DA OBSERVAÇÃO EM
OBSERVAÇÃO LABORATÓRIO X
VIDA REAL

Figura 4.1 – Tipos de observação. Ander-Egg (1978 apud MARCONI; LAKATOS, p. 88,
2007).

Como já falamos, a coleta de dados pode ser feita por vários instrumentos.
Vamos agora conhecer os tipos de entrevista e como podemos elaborar um roteiro
para nossa investigação.

Entrevista

Na Psicologia, a entrevista é uma técnica muito utilizada para a coleta de dados,


principalmente para o estudo em profundidade de determinados casos ou fenômenos
específicos. Segundo Hair Jr. et al. (2005), a entrevista, de modo geral, pode ser defi-
nida como o encontro entre duas pessoas: o pesquisador e o participante da pesquisa.
Trata-se, portanto, de uma conversação face a face, de cunho profissional, com o obje-
tivo de levantar dados e informações a respeito de questões que envolvem o problema
de pesquisa, e auxiliarão a atingir o objetivo traçado. Não pode ser entendida como
uma simples conversa, mas sim uma conversa com objetivos bem definidos.
A entrevista é uma técnica utilizada quando o número de participantes é limi-
tado, visto que necessita de planejamento e tempo para execução. O pesquisador/
entrevistador deve ter tempo e disponibilidade para sua realização. É, portanto,
uma técnica para a coleta de dados em profundidade (mais do que para quantida-
de de participantes).

capítulo 4 • 68
Assim como a observação, a entrevista apresenta vantagens e desvantagens,
apesar de ser considerada um dos instrumentos de maior excelência para a coleta
de dados no campo da Psicologia. Para Marconi e Lakatos (p. 94, 2007), suas
principais vantagens são:
• Pode ser utilizada para diversas populações;
• Fornece amostragem melhor da população geral;
• Há maior flexibilidade, podendo o pesquisador repetir perguntas, esclarecer
dúvidas, reformular, repetir, para garantir que o entrevistado entenda o que está
sendo perguntado;
• Oferece maior oportunidade para avaliar atitudes e condutas, sendo que as
reações também podem ser registradas;
• Possibilita a obtenção de dados que não se encontram em documentos e que
sejam relevantes para a investigação;
• Possibilita a obtenção de informações mais precisas;
• Permite que os dados possam ser quantificados e submetidos a tratamento
estatístico, quando há planejamento prévio para isso.

Apesar de suas inúmeras vantagens, a entrevista também apresenta algumas


limitações que devem ser conhecidas pelo investigador. É importante estar aten-
to a tais pontos para que os dados sejam analisados considerando-se os possí-
veis erros que podem ocorrer. Como limitações, podemos apontar (MARCONI;
LAKATOS, p. 95, 2007):
• Dificuldade de expressão e comunicação de ambas as partes. O entrevista-
dor precisa de treino para garantir uma boa coleta de dados;
• Incompreensão da pergunta por parte do entrevistado ou de informações
por parte do entrevistador, o que pode levar a uma falsa análise de dados;
©© NARONG JONGSIRIKUL | SHUTTERSTOCK.COM

capítulo 4 • 69
• Possibilidade de influência do entrevistado pelo entrevistador;
• Disposição do entrevistado para dar as informações necessárias;
• Retenção de dados importantes, com receio de identificação (por isso, o
anonimato e sigilo das informações é tão importante. E isso deve ser previamente
descrito do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme vimos em
capítulos anteriores);
• Pode demorar muito tempo ou ser difícil de realizá-la, dependendo do que
se deseja investigar.

A entrevista pode ser classificada em três tipos principais, dependendo do


quanto as perguntas e o roteiro seguido são flexibilizados: a entrevista não estrutu-
rada, a entrevista semiestruturada e a entrevista estruturada.
Podemos encontrar nas pesquisas em Psicologia a entrevista não estruturada
ou sem padrão quando o roteiro tem grande flexibilidade. O entrevistador e o
entrevistado têm liberdade na conversação, sendo uma forma de explorar de forma
mais abrangente determinado fato ou fenômeno a ser investigado. As perguntas
são bem abertas e a conversação acaba tendo um cunho mais informal.

ATENÇÃO
A entrevista pode ser de três tipos, dependendo da flexibilidade em que é realizada:
entrevista não estruturada, entrevista semiestruturada e entrevista estruturada. A escolha do
tipo de entrevista vai depender o planejamento para sua investigação, considerando o objeti-
vo que se pretende atingir e a pergunta de pesquisa que se deseja responder.

Quando a entrevista ganha um roteiro mais direcionado, porém ainda há certa


flexibilidade para sua realização, ordem e complementação de perguntas, temos a
entrevista semiestruturada. Esse tipo de entrevista é muito comum, pois possibi-
lita que o entrevistador não se esqueça de nenhum detalhe importante, tendo algo
para dirigi-lo na coleta de dados, mas também tenha a flexibilidade de acrescen-
tar e ampliar pontos que julga importantes na hora da coleta, conforme o andar
da conversa.
Já a entrevista estruturada é assim denominada, pois segue um padrão e um
roteiro preestabelecido. Segundo Marconi e Lakatos (2007), as perguntas feitas ao
indivíduo são determinadas previamente. Em geral, esse tipo de entrevista é feita

capítulo 4 • 70
por meio de formulários bem delineados, sendo que sempre as mesmas pergun-
tas são feitas a todos os entrevistados, o que recebe uma padronização maior nas
respostas. Aqui o pesquisador não é livre para adaptar suas perguntas conforme o
caminhar da entrevista e não pode alterar a ordem das perguntas ou acrescentar
novas questões.

PERGUNTA
O que é um formulário para entrevista?
É uma lista informal, catálogo ou inventário, destinado à coleta de dados resultantes de
observações e interrogações, sendo seu preenchimento feito pelo investigador. As perguntas
são fechadas e padronizadas. Devem ser simples de aplicar, interpretar e analisar (CERVO;
BERVIAN; SILVA, 2007).

Quando o pesquisador decide pela coleta de dados por meio da entrevista, é


importante que haja preparação para a mesma, principalmente no caso das en-
trevistas semiestruturadas e estruturadas. Alguns pontos devem ser atentamente
considerados, sendo eles (MARCONI; LAKATOS, 2007):
• Planejamento da entrevista: mesmo as entrevistas não estruturadas preci-
sam desse planejamento, que consiste em delinear bem o objetivo da entrevista. É
importante que o roteiro ou formulário sejam planejados com antecedência;
• Conhecimento prévio do entrevistado: para a coleta de dados, precisamos
escolher os participantes que poderão, de fato, contribuir com o objetivo deli-
neado. O entrevistado precisa estar envolvido com o problema de pesquisa e ser
selecionado por meio de critérios predefinidos;
• Oportunidade da entrevista: marcar com antecedência para assegurar que
a entrevista poderá ocorrer. Preferencialmente, faça uma estimativa do tempo ne-
cessário para a sua realização, informando o entrevistado previamente quanto a
sua duração;
• Garantia de anonimato e sigilo ao entrevistado: já discutidos essas
questões quando tratamos da ética em pesquisa em Psicologia. No Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) é importante que estes pontos sejam
bem claros para o participante;
• Conhecimento prévio do local da entrevista: para evitar perder tempo
com a adequação do local.

capítulo 4 • 71
Ao iniciarmos uma entrevista, é importante realizarmos aquilo que denomi-
namos rapport. Mas o que seria isso? O rapport é o contato prévio entre entre-
vistado e entrevistador momentos antes da coleta de dados. Isso significa tornar
o ambiente amistoso e agradável para que o entrevistado se sinta à vontade para
falar. Sentindo que o ambiente está preparado, o pesquisador pode iniciar a entre-
vista, buscando ser natural, fazendo uma pergunta de cada vez, conforme o tipo
de entrevista que delineou.
As respostas dos participantes devem ser anotadas ou gravadas, sendo que para
este segundo procedimento, deve haver uma autorização prévia do entrevistado,
informação que também deve estar descrita no TCLE. É importante não deixar
para anotar as respostas depois da entrevista, pois é possível que o pesquisador se
esqueça de pontos importantes ou se confunda com tantas informações.
Após todas as perguntas serem feitas e todas as respostas serem dadas, chega a
etapa de finalização da entrevista. O pesquisador/entrevistador deve, então, fazer
seus agradecimentos e se colocar à disposição para qualquer dúvida, mesmo após
os dados já terem sido coletados. Além disso, pode também oferecer um resumo
dos principais dados da pesquisa para o participante, se este assim o desejar. Esse
ponto geralmente também é descrito no TCLE.

SAIBA MAIS
O que é rapport?
É a criação de um ambiente agradável e amistoso para que o entrevistado possa falar
à vontade e espontaneamente. No link a seguir você pode ter algumas dicas de como fazer
um rapport. Acesse:
<https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/educacao/tecni -
cas-de-rapport/33461>.
Boa leitura!

Uma dúvida muito comum de pesquisadores iniciantes é: quantas pessoas


devemos entrevistar? Tudo vai depender da disponibilidade dos participantes e do
objetivo de pesquisa. Um procedimento muito utilizado é a repetição dos dados.
A partir do momento que as informações passam a ser redundantes e repetidas
entre os vários entrevistados, pode-se concluir que informações suficientes sobre
o fenômeno investigado foram coletadas para uma interpretação eficaz dos dados.

capítulo 4 • 72
Questionário

Outro instrumento muito utilizado em pesquisas no campo da Psicologia e


nas Ciências Humanas, em geral, é o questionário. O questionário consiste em
uma série de perguntas organizadas que devem ser respondidas pelo participante
da pesquisa com ou sem a presença do entrevistador. Isso facilita bastante a coleta
de dados, pois o questionário pode ser entregue aos participantes e recolhido pos-
teriormente, possibilitando maior retorno e abrangência da coleta.
Podemos apontar diversas vantagens na utilização desse instrumento, sendo as
principais (MARCONI; LAKATOS, 2007):
• Economiza tempo, viagens e obtém grande número de dados;
• Atinge grande número de pessoas simultaneamente;
• Abrange maior área geográfica;
• Economiza pessoal para a coleta de dados;
• Obtém respostas mais rápidas e precisas;
• Há maior liberdade nas respostas, devido ao anonimato;
• Menos risco de influência do pesquisador.

Esse instrumento geralmente é empregado para a coleta de dados em volume,


isto é, com vários participantes, sendo muito utilizado nas pesquisas tipo survey,
que estudamos no capítulo 2. É geralmente instrumento escolhido para a cole-
ta de pesquisas quantitativas, visto que os dados poderão ser tabulados, quando
se tratam de perguntas fechadas, e analisados por meio de técnicas estatísticas
específicas.
O questionário pode ser aplicado em conjunto pelo pesquisador, isto é, sele-
cionar uma amostra de participantes que permanecem juntos em uma sala, por
exemplo, e respondem às perguntas ao mesmo tempo, podendo ou não ter uma
duração estabelecida, o que vai depender dos objetivos de pesquisa e do método
utilizado. Para haver tempo para respostas, deve haver um porquê. O questionário
pode ser aplicado sem a presença do pesquisador, quando cada participante pode
respondê-lo no tempo que considerar adequado. Assim, há dois meios em que isso
pode ser feito: o impresso, quando os questionários são entregues em papel para
os participantes, ou on-line, quando o mesmo é disponibilizado por meio de links
específicos. Atualmente, este último tem sido muito empregado nas pesquisas em
Psicologia, devido a sua facilidade e rapidez. De qualquer forma, é importante que
um convite e/ou uma carta explicativa seja enviada ou entregue ao participante,

capítulo 4 • 73
para que ele compreenda os fins da pesquisa. O TCLE também deve estar contido,
garantindo a anuência do participante em relação à coleta de dados.
Embora o participante possa responder o questionário conforme seu ritmo (a
menos que haja uma justificativa para o tempo de respostas), é muito importante
que o pesquisador coloque uma data de início e finalização para a coleta de dados,
informando sobre o recolhimento ou prazo de envio do questionário respondido.
Em média, a taxa de retorno dos instrumentos respondidos é de 30%, sendo que
algumas técnicas podem ajudar a aumentá-lo. Uma delas consiste no envio de
algumas “ondas” ou disparos de convites por meio de e-mails ou redes sociais (isso
quando se trata de coleta de dados on-line). Em geral, utilizamos três “ondas” para
relembrar os participantes quanto ao convite de participação da pesquisa.
Apesar de ter muitas vantagens, a coleta de dados on-line apresenta limitações
como a não garantia de que o real participante tenha respondido as perguntas, por
exemplo. Ou ainda, a participação pouco interessada ao responder as questões.
Podemos apontar ainda como limitações do questionário, seja impresso ou on-li-
ne, alguns pontos como (MARCONI, LAKATOS, 2007):
• Taxa de retorno relativamente baixa;
• Grande número de perguntas sem respostas (casos omissos), sendo que em
questionários on-line isto pode ser sanado;
• Não pode ser aplicado a pessoas analfabetas;
• Impossibilidade de auxílio ao participante na interpretação das perguntas;
• Influência entre as questões: ao ler uma questão, o participante pode ser
influenciado para responder a outra;
• Devolução tardia, o que muitas vezes acaba inutilizando o questionário
respondido;
• Desconhecimento do ambiente no qual foi respondido, dificultando o con-
trole do pesquisador quanto a outras variáveis;
• Exige um universo mais homogêneo;
• Não há garantia do participante que realmente o respondeu.

Segundo Hair Jr. et al. (2005), a construção do questionário e validação de


suas perguntas é fundamental para garantir que o instrumento, de fato, mensura
aquilo que se propõe a medir. Assim, é importante que procedimentos prévios
sejam realizados antes da efetiva coleta de dados.
Embora em menor grau, podemos dizer que essa regra também vale para a
entrevista, visto que o planejamento e a qualidade na elaboração das perguntas
irão garantir maior eficiência na coleta de dados.

capítulo 4 • 74
Vamos agora abordar algumas questões importantes para a construção e vali-
dação de instrumentos.

Construção e validação de instrumentos

Conforme vimos nas seções anteriores, a coleta de dados pode ser realizada por
meio de vários instrumentos. Quando realizamos a revisão da literatura, devemos
levantar se já existem instrumentos organizados e validados por outras pesquisas
com assuntos semelhantes ao da nossa investigação. Seguramente, utilizar, por
exemplo, um instrumento já construído e validado irá garantir créditos, relevância
e fidedignidade à pesquisa, e consequentemente, maior solidez em relação aos re-
sultados encontrados. Isso vai economizar tempo para a coleta de dados, visto que
já estaremos usando um instrumento validado.
Mas o que significa utilizar um instrumento já validado? Quando falamos de
pesquisa em Psicologia, é muito comum encontrarmos diversas investigações que
se propõem a construir e comprovar que determinado questionário, formulário/
inventário, escala, ou teste mensuram um determinado tipo de comportamento ou
fenômeno, a fim de que pesquisas mais práticas possam utilizá-los posteriormente,
ou ainda, que tais instrumentos possam ser aplicados em situações práticas, seja
na clínica ou saúde, nas organizações, ou ainda na área da educação, por exemplo.

ATENÇÃO
Para garantir a fidedignidade de uma pesquisa, é necessário que os instrumentos de coleta
de dados apresentem confiabilidade (capacidade para diferenciar, de forma constante, entre
um valor e outro, ou seja, obter os mesmos resultados quando aplicada a uma mesma amostra)
e validade (capacidade da escala para medir as qualidades a que se propõe, devendo ser clara
e objetiva) (TAMAYO; TAMAYO, 1995 apud BERMUDES; SANTANA; BRAGA; SOUZA, 2016).

Dentre os instrumentos de medida para pesquisa, podemos ter um questio-


nário, que como vimos, é um instrumento de coleta de dados constituído por
uma série ordenada de perguntas que devem ser respondidas por escrito. De modo
geral, as perguntas podem ser abertas (respostas livres) ou fechadas (respostas
predeterminadas).

capítulo 4 • 75
Os formulários também são instrumentos bastante utilizados, conforme ci-
tamos anteriormente, sendo importantes principalmente para entrevistas. Este
consiste em uma lista formal, catálogo ou inventário, sendo seu preenchimento
feito pelo próprio pesquisador. Segundo Cervo, Bervian e Silva (2007), o que
caracteriza um formulário é o contato face a face entre pesquisador e participante,
funcionando como um tipo de roteiro de entrevista.
Também é possível utilizarmos uma escala como instrumento para a coleta de
dados. Ela pode ser compreendida como um instrumento organizado em técnicas
escalares que permitem transformar dados qualitativos em quantitativos ou variá-
veis, podendo ser aplicadas técnicas estatísticas e de mensuração.
Segundo Bermudes, Santana, Braga e Souza (2016), podemos encontrar qua-
tro tipos de escalas, sendo eles: nominal, ordinal, intervalar e proporcional. A esco-
la nominal é utilizada quando se deseja classificar ou categorizar dados (exemplo:
sexo do participante: masculino x feminino). A escala ordinal é mais definida e
pode variar entre um patamar mínimo a um máximo (exemplo: classes sociais). A
escala intervalar é uma forma quantitativa de se registrar um fenômeno (exemplo:
medidas de opinião como “mais satisfeito”, “menos satisfeito”, “neutro”). A escala
proporcional é a mais complexa de todas, sendo definido um ponto de partida ou
ponto zero. Nesta escala, uma unidade de medida é definida em relação à sua dife-
rença com o ponto zero e uma intensidade conhecida (exemplos: altura, volume).
Um tipo de escala muito comum em Psicologia, que é um tipo de escala intervalar,
é a denominada “Escala Likert”, que dá “valores” às respostas já predeterminadas. No
exemplo a seguir, temos uma escala de mensuração de 4 pontos, que pode ser analisada
com técnicas estatísticas, transformando dados qualitativos em quantitativos.

EXEMPLO
Qual o grau de satisfação com seu trabalho:
( ) 1 insatisfeito ( ) 2 pouco satisfeito ( ) 3 satisfeito ( ) 4 muito satisfeito

Já os testes são instrumentos utilizados com a finalidade de obter dados que


permitam medir comportamentos de forma quantitativa. Como exemplo, temos
os testes de personalidade. Tal técnica está diretamente relacionada ao campo
da Psicometria, que segundo Pasquali (2009) se fundamenta na teoria da medida

capítulo 4 • 76
das ciências, sendo uma área da Psicologia vinculada às ciências exatas. O objetivo
é explicar o sentido das respostas dos participantes e propor técnicas de medidas
para o comportamento e/ou processos mentais.

SAIBA MAIS
Para que você compreenda com mais detalhes o passo a passo da validação de testes
em Psicologia, recomendamos a leitura do artigo de Luiz Pasquali (2009), que pode ser
acessado pelo link:
<http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v43nspe/a02v43ns.pdf>.
Boa leitura!

Vamos a um exemplo prático. Um livro muito utilizado na área de Psicologia


Organizacional que contém instrumentos construídos e já validados em relação ao
comportamento nas empresas foi organizado por Mirlene Maria Matias Siqueira
(2008), sendo que vários pesquisadores contribuíram com a construção dessa
obra. Lá é possível encontrar instrumentos que mensuram, por exemplo, satis-
fação no trabalho, sendo estes frutos de diversas pesquisas que seguiram passo a
passo os procedimentos necessários para a construção dos itens e validação esta-
tística dos mesmos.
De acordo com a Comissão Internacional de Testes (International Test
Comission – ITC), a elaboração de um teste psicométrico deve seguir três etapas
principais:
1) Procedimentos teóricos, elaboração dos itens e evidências de validade com
base no conteúdo;
2) Evidências de validade da estrutura interna do instrumento (geralmente com
emprego de técnicas estatísticas específicas) e;
3) Evidências de validade apoiadas nas relações com variáveis externas.

É evidente que para construir e validar um instrumento com tal grau de exi-
gência dependerá da experiência do pesquisador, estudo e auxílio estatístico para
tal. Para um pesquisador iniciante, é necessário treino e pesquisas iniciais para
entender como elaborar um instrumento de medida.

capítulo 4 • 77
LEITURA
Para exemplos de instrumentos validados no campo de Psicologia Organizacional, re-
comendados a leitura do livro Medidas do Comportamento Organizacional, organizado por
Mirlene Maria Matias Siqueira, publicado em 2008 pela editora Artmed.
Boa leitura!

De modo geral, para a elaboração de um instrumento de medida em Psicologia,


é necessário que as normas sejam observadas para aumentar sua eficácia e valida-
de. O pesquisador deve conhecer a fundo o assunto investigado, sendo que o
processo de elaboração e validação do questionário pode ser longo e complexo e
os itens feitos devem estar de acordo com os objetivos de pesquisa (MARCONI,
LAKATOS, 2007). O tamanho do instrumento é algo relevante para uma pes-
quisa, pois instrumentos muito longos podem causar fadiga e desinteresse, no
entanto, é importante assegurar um número de questões que abranja o fenômeno
ou comportamento a ser medido.

CONEXÃO
Veja o manual com as Diretrizes Internacionais para Utilização de Testes, elaborado pela
Comissão Internacional de Testes (ITC), por meio do link:
<https://www.intestcom.org/files/guideline_test_use_portuguese.pdf>.

Segundo Hair Jr. et al. (2005), antes da aplicação de um instrumento de pes-


quisa, é comum que o pesquisador faça um pré-teste ou teste-piloto para verificar
possíveis falhas e reformular o que for necessário antes de disparar a coleta de
dados. É necessário que a redação dos itens esteja clara, bem como as instruções
de preenchimento. A parte estética e a disponibilização das questões também são
pontos relevantes e que devem ser cuidadosamente observados pelo pesquisador
nessa etapa. Também podem ser verificados alguns elementos muito importantes
em um teste-piloto, como a fidedignidade (qualquer pessoa que o aplique obterá
sempre os mesmos resultados), validade (os dados recolhidos são suficientes para a
pesquisa) e operatividade (vocabulário acessível e claro).

capítulo 4 • 78
©© ESB PROFESSIONAL | SHUTTERSTOCK.COM

Sendo considerado apto para a coleta de dados, o instrumento poderá, então,


ser disparado para a coleta efetiva das informações necessárias para a pesquisa.
Os dados serão posteriormente tabulados e organizados para então serem inter-
pretados pelo pesquisador, que poderá assim gerar o relatório de pesquisa com os
principais achados da mesma.

Técnicas de análise e interpretação de dados

Após a coleta dos dados, o pesquisador deverá preocupar-se com a organiza-


ção dos dados para sua interpretação, e assim, verificação e escrita dos resultados
encontrados no relatório de pesquisa.
Os dados coletados por meio de perguntas fechadas, escalas e testes, isto é,
pelas técnicas quantitativas, poderão ser tabulados. É comum utilizarmos softwa-
res específicos como o Microsoft Excel e até mesmo programas estatísticos, como o
Minitab ou o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), que são muito utili-
zados em pesquisas quantitativas nas Ciências Sociais Aplicadas e Humanas, o que
incluir a Psicologia. Isso você poderá aprender com a prática, com a orientação
de um pesquisador mais experiente e com a leitura de diversos artigos científicos
da área, para compreender de que forma podem ser utilizados nas investigações
em Psicologia.
Após a tabulação e organização dos dados, o pesquisador deverá agora se aten-
tar para a técnica estatística que será utilizada para a interpretação dos dados.

capítulo 4 • 79
Antes que isso seja feito, é importante que ele já tenha pesquisado sobre a técnica
mais adequada, o que faz parte do planejamento da pesquisa, antes mesmo da
coleta de dados propriamente dita. Conforme abordamos no capítulo anterior,
existem várias técnicas estatísticas que podem ser utilizadas, dependendo do obje-
tivo de pesquisa, sendo que um estudo mais aprofundado é necessário nesse caso.
Por meio das análises dos dados, o pesquisador poderá interpretá-los e fazer
inferências com o intuito de responder à sua pergunta de pesquisa e assim cum-
prir os objetivos estabelecidos. Em pesquisas quantitativas, é comum termos a
elaboração de hipóteses, isto é, o que o pesquisador espera encontrar, sendo estas
confirmadas ou refutadas, seja parcialmente ou completamente. É nessa etapa que
o investigador irá, de fato, trazer sua contribuição ao campo de conhecimento ao
qual se propôs acrescentar dados e resultados por meio de sua pesquisa.

Já para os dados qualitativos, as técnicas mais comuns utilizadas nas pesquisas


em Psicologia são a análise de conteúdo e a análise de discurso.
Muitos autores se referem à análise de conteúdo como uma técnica de pesquisa
que trabalha com a palavra, permitindo que inferências práticas e objetivas sejam
produzidas em relação ao conteúdo (CAREGNATO; MUTTI, 2006). Ressalta-se
que a subjetividade das respostas não pode ser evitada, sendo esta uma possível
limitação da pesquisa qualitativa. Ela deve ser admitida, mas deve ser controlada
pelos recursos metodológicos do autor (ROSA; ARNOLDI, 2008), e pelos dados
da revisão da literatura.
Seguindo Graneheim e Lundman (2004), para se realizar a análise de conteú-
do de dados qualitativos, verifica-se primeiramente o conteúdo a ser explorado,
isto é, o conteúdo manifesto, que se refere ao aspecto visível e óbvio dos com-
ponentes, e posteriormente o conteúdo latente, que envolve a interpretação do
significado subjacente ao texto. Uma segunda decisão importante é em relação à
unidade de análise, ou seja, à definição do objeto de estudo, o que será analisado
e o que se pretende investigar. Por fim, cabe olhar para a unidade de significado,
sendo essa definida como palavras, sentenças ou parágrafos inter-relacionados por
meio de conteúdos e contextos, ou seja, dos dados obtidos por meio das perguntas
abertas em si. Com isso, deve-se realizar a condensação dos dados, reduzi-los em
dados menores, por meio de abstração, como códigos (instrumentos de classi-
ficação), categorias (grupo de conteúdo que divide códigos comuns) ou temas
(compostos por unidades de significados condensadas, códigos ou categorias em

capítulo 4 • 80
nível interpretativo no nível mais amplo), preservando o significado essencial
(GRANEHEIM; LUNDMAN, 2004).
Já a análise de discurso trabalha com o sentido do discurso em si, sendo que
existem diversas linhas para que tal análise seja realizada. Essa técnica considera
a língua, a história e o sujeito em si. Segundo Caregnato e Mutti (2006) não se
trata de uma metodologia, mas sim de uma disciplina de interpretação. O sentido
do discurso, sendo este verbal e não verbal, é compreendido como a forma que o
sujeito se posiciona em relação a um determinado fenômeno. “Na análise de dis-
curso, a linguagem vai além do texto, trazendo sentidos pré-construídos que são
ecos da memória do dizer.” (CAREGNATO; MUTTI, p. 681, 2006).
Finalizando a interpretação dos dados, chega o momento em que o pesquisa-
dor deverá fazer a redação final de seu relatório de pesquisa. É claro que este pode
ser feito passo a passo, conforme a investigação ocorre. Mas com os resultados em
mãos, poderá cumprir com efetividade o que se propôs ao planejar sua pesquisa.
É por meio destes relatórios que elaboramos artigos científicos, trabalhos para
eventos científicos, dissertações e teses.

ATIVIDADES
Vamos treinar um pouco agora!
Neste capítulo, abordamos a importância do planejamento de uma entrevista antes que
a mesma seja aplicada para a coleta de dados. Suponha que seu objetivo de pesquisa seja
realizar um estudo de caso com um participante que apresente transtorno de ansiedade
generalizada (TAG), com o intuito de investigar a eficácia de técnicas autoaplicáveis de rela-
xamento. Faça um roteiro para uma entrevista semiestruturada e elabore perguntas que você
poderia fazer para cumprir esse objetivo de investigação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDER-EGG, E. Introducción a las técnicas de investigación social: para trabajadores sociales:
Buenos Aires: Humanitas, 1978.
BERMUDES, W. L.; SANTANA, B. T.; BRAGA, J. H. O.; SOUZA, P. H. Tipos de escalas utilizadas em
pesquisas e suas aplicações. Vértices, v. 18, n. 2, p. 7-20, 2016.
CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A.; SILVA, R. Metodologia científica. Pearson: São Paulo, 2007.

capítulo 4 • 81
CAREGNATO, R. C.; MUTTI, R. Pesquisa qualitativa: análise de discurso versus análise de conteúdo.
Texto Contexto Enfermagem, v. 15, n. 4, p. 679-684, 2006.
GRANEHEIM, U. H.; LUNDMAN, B. Qualitative content analysis in nursing research: concepts,
procedures and measures to achieve trust worthiness. Nurse EducationToday, v. 24, n. 2, p.105-112,
2004.
HAIR JR., J. et al. (2005). Fundamentos de métodos de pesquisa em administração. Porto
Alegre: Bookman.
MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Técnicas de Pesquisa. São Paulo: Atlas, 2007.
PASQUALI, L. Psicometria. Revista da Escola de Enfermagem da USP, v. 43, n. especial, p. 992-
999, 2009.
ROSA. M. V. F. P.; ARNOLDI, M. A. G. C. A Entrevista na pesquisa qualitativa. Belo Horizonte:
Autêntica, 2008.
SIQUEIRA, M. M. M. Medidas do comportamento organizacional: ferramentas de diagnóstico e de
gestão. Porto Alegre: Artmed, 2008.

capítulo 4 • 82
5
Comunicação
da pesquisa:
elaboração do
projeto e do
relatório final
Comunicação da pesquisa: elaboração do
projeto e do relatório final

Neste capítulo, vamos abordar de que forma a redação de todos os passos da pes-
quisa finalizada pode ser concretizada e comunicada à sociedade científica. Vimos ao
longo deste livro como começar uma investigação, a importância da revisão de lite-
ratura, a formação da pergunta de pesquisa, os objetivos, o delineamento do método
de pesquisa, os tipos de pesquisa que podem ser realizados, as principais técnicas
de coleta e de análise de dados e agora, a comunicação dos resultados de todo esse
trabalho. Todo esse caminho é fundamental para que outros pesquisadores tenham
a consciência do que está sendo desenvolvido no âmbito científico.
É necessário apresentar à comunidade os achados de nossa investigação, contri-
buindo com a construção do conhecimento. A escrita científica é pré-requisito para
que muitos alunos de graduação colem grau, isto é, desenvolvam o que comumente
chamamos de Trabalho de Conclusão de Curso (o famoso TCC), que pode ser a
escrita de uma monografia ou artigo, por exemplo. Mas, devemos pensar muito
mais longe do que isso. Comunicar resultados de uma investigação vai muito além
do que um trabalho acadêmico. E são esses valores que queremos passar a vocês com
a finalização desta obra: a importância da Pesquisa em Psicologia para sua formação
profissional, acadêmica e para concretização desse campo do saber.

OBJETIVOS
• Apresentar as principais características da escrita científica;
• Apresentar os tópicos essenciais de um projeto de pesquisa;
• Apresentar os tópicos essenciais de um relatório final de pesquisa;
• Explanar os principais tipos de obras científicas: artigos, monografias, dissertações e teses.

A escrita científica

A escrita de um documento científico, seja do projeto de pesquisa, isto é,


em que está todo o planejamento da nossa investigação antes de ela acontecer,
seja do relatório final, quando a pesquisa foi concluída, deve ser feita de maneira

capítulo 5 • 84
especial. É importante que autor tenha consciência de que ele está escrevendo
para um leitor, e portanto, a coerência e coesão do texto são fundamentais para
esta comunicação. A qualidade textual é um requisito muito importante para a
escrita científica.
Além disso, o autor deve reconhecer que estará escrevendo para uma comu-
nidade específica de sua área, que termos científicos poderão ser utilizados, pois o
público que fará a leitura será de especialistas. Entretanto, também deve levar em
consideração que leigos poderão fazer a leitura de seu trabalho, e portanto, este
deve ser claro, com justificativa evidente, direto e sem prolixidade.
Segundo Cervo e Bervian (2002), existem alguns pontos fundamentais que
devem ser cuidadosamente respeitados, sendo eles:
a) Impessoalidade: na escrita, devemos utilizar o tempo verbal impessoal, sem
nos referir a “eu” ou “nós”. Por exemplo, veja a diferença entre os trechos a seguir:
Exemplo 1: entendemos que o transtorno obsessivo-compulsivo seja um tipo
de transtorno de ansiedade, conforme a Classificação Internacional de Doenças
(CID).
Exemplo 2: penso que este seja um assunto de grande relevância, pois nos
últimos anos foi bastante abordado pelas revistas científicas.
Veja que em ambos os exemplos temos o uso de “nós” e “eu”, respectivamente.
Entretanto, de modo geral, não devemos utilizar esses tempos verbais. Devemos
escrever na forma impessoal, que seria:
Possível correção para o exemplo 1: compreende-se que o transtorno obses-
sivo-compulsivo seja um tipo de transtorno de ansiedade, conforme a Classificação
Internacional de Doenças (CID).
Possível correção para o exemplo 2: considera-se que este seja um assunto
de grande relevância, pois nos últimos anos foi bastante abordado pelas revis-
tas científicas.
Nas correções, percebemos que não há uma pessoa que faz as afirmações, a
escrita é feita na forma impessoal.
Em alguns tipos de linhas dentro da Psicologia, é possível escrever em primei-
ra pessoa. Quando usamos abordagem fenomenológica, por exemplo, é possível
que o autor escreva em primeira pessoa, pois estará relatando seu ponto de vista
sobre determinado problema de pesquisa investigado. Porém, se trata de situações
específicas, nas quais é importante que um orientador, isto é, um pesquisador mais
experiente, faça a devida orientação de como fazer isso. De modo geral, pede-se a
escrita na forma impessoal.

capítulo 5 • 85
b) Objetividade: a linguagem deve ser objetiva, o que é resultado do próprio
campo da ciência. A linguagem impessoal e objetiva deve afastar o ponto de vista
científico do ponto de vista do senso comum e subjetivo. Expressões como “pare-
ce-me”, “penso que”, fazem o trabalho perder seu caráter científico, sendo muito
importante para a escrita do projeto de pesquisa ou do relatório final. A linguagem
científica necessita ser objetiva, direta, sem ambiguidades. Veja exemplos da lin-
guagem objetiva e subjetiva:
Linguagem subjetiva: “O local estava sujo”.
Linguagem objetiva: “O entrevistando, enquanto falava, deixou cair restos
de pão na mesma. Havia fragmentos de papel no chão e migalhas de pão”.
c) Modéstia e cortesia: os resultados de um estudo ou pesquisa, quando cientifi-
camente alcançados, impõem-se por si mesmos. Segundo Cervo e Bervian (2002),
o pesquisador não deve insinuar que os resultados anteriores ao seu trabalho es-
tejam cobertos de erros, atando outro colega. A cortesia e a modéstia são traços
importantes, sendo importante utilizá-las ao discordar de outros resultados.
Veja na tabela 5.1 as principais exigências e deformações da lingua-
gem científica.

EXIGÊNCIAS DEFORMAÇÕES
Impessoal Pessoal
Objetiva Subjetiva e ambígua
Modesta e cortês Arrogante
Informativa Persuasiva
Clara e distinta Confusa
Própria ou concreta Figurada
Técnica Comum
Frases bem construídas e diretas Frases longas e prolixas

Tabela 5.1 – A linguagem científica. Certo e Bervian (p.133, 2002).

Outro ponto muito importante é o embasamento teórico do que se afirma


em uma pesquisa científica. Você deve se lembrar do que aprendemos no primeiro
capítulo, certo? A escrita deve ser feita com base em obras científicas concretas e
confiáveis, não sendo possível fazermos afirmações conforme nossa experiência ou
conforme o que achamos. Ou ainda, com base em artigos comerciais ou fontes de
senso comum.

capítulo 5 • 86
Para isso, devemos fazer devidamente o embasamento teórico de nosso traba-
lho e nossa escrita. Mas como fazemos isso? É importante que você compreenda o
que são citações e como utilizá-las na escrita científica. De modo geral, podemos
fazer citações diretas, citações indiretas e citação de citação. Há outros tipos, po-
rém, neste momento, estas são as principais e mais comuns, por isso as abordare-
mos para que você compreenda como fazer o embasamento teórico.
Uma citação direta é a reprodução integral ou transcrição de uma parte de
obra consultada, seja livro, artigo, teses, dissertação, conservando-se sua grafia e
escrita. Neste tipo de citação, é necessário escrevê-la de que forma que o leitor
compreenda que se trata de um trecho retirado diretamente da obra embasadora
daquele dizer, definição ou trecho. Trata-se, portanto, de uma transcrição literal.
Esse tipo de citação deve ser utilizado em menor escala, sendo apenas recomenda
para trechos de extrema importância ou definição de conceitos.
Já uma citação indireta é o texto criado com base nas ideias de uma determi-
nada obra consultada. Trata-se de trechos reescritos, parafraseados, refeitos. É uma
forma de o autor mostrar sua interpretação em relação a outras obras, ou ainda, de
evidenciar o embasamento de ideias e argumentos para justificar sua investigação,
por exemplo. Esse tipo de citação deve ser utilizado em maior escala, enriquecen-
do o trabalho científico.
Por fim, temos a citação da citação, que se trata de uma obra citada por outra
obra que estamos consultando. É comum não conseguirmos acesso a determinadas
referências, como as muito antigas ou raras e especiais. Quando isso ocorre, pode-
mos utilizar uma obra que citou aquela outra obra original. A isso denominamos
citação da citação. Trata-se da citação, seja direta ou indireta, de um texto que se
refere a um original que não tivemos acesso direto. Esta deve ser utilizada em último
caso, visto que procurar a obra original, ler, interpretar e escrever nosso próprio tex-
to, fazendo a devida referência a ela, pode enriquecer muito mais o trabalho.

PERGUNTA
O que é uma citação?
Conforme descrito no manual de Diretrizes para Apresentação de Dissertações e Teses
da Universidade de São Paulo (2016), uma citação é a menção no texto de informações
extraídas de uma fonte científica para esclarecer ou fundamentar as ideias de um autor.
Devem-se respeitar os direitos autorais, seguindo obrigatoriamente em todo o trabalho as
normas exigidas para sua escrita.

capítulo 5 • 87
Essa parte é muito importante para fazemos a nossa revisão da literatura, ge-
ralmente constituinte da introdução de nosso trabalho científico. Mais adiante,
vamos abordar os principais tópicos de um projeto de pesquisa e de um relatório
final de pesquisa, e você compreenderá melhor do que estamos falando quando
dizemos introdução do trabalho.
©© VIACHESLAV NIKOLAENKO | SHUTTERSTOCK.COM

Você também deve ter ciência de que as normas sobre como essas citações se-
rão feitas vão depender das exigências de cada tipo de obra científica que você vai
escrever. As normas vão indicar pontos importantes sobre tamanho das margens
das páginas; tipo e tamanho de letras; formatação de quadros, tabelas, figuras;
indicação das referências e citações, entre outras questões relevantes.
Para escrever um artigo científico, por exemplo, você deve verificar as normas
exigidas pela revista ou periódico onde ele será publicado. O mesmo vale para um
Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), sendo que as normas mais comuns no cam-
po da Psicologia, Ciências Sociais Aplicadas, Ciências Humanas e Ciências Biológicas
e da Saúde são as da Associação Brasileiras de Normas Técnicas (ABNT), American
Psychological Association (APA) Style e Vancouver Style. Assim, toda a formatação e nor-
mas deverão ser respeitadas do início ao fim do trabalho, podendo ter pequenas nuan-
ces conforme a Universidade, o periódico científico ou exigências específicas de um
determinado departamento da faculdade onde a obra será desenvolvida.

capítulo 5 • 88
SAIBA MAIS
Veja um manual sobre as normas da Associação Brasileiras de Normas Técnicas (ABNT)
apresentado pela equipe de bibliotecários da Universidade de São Paulo no link:
<http://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portaldelivrosUSP/cata-
log/view/111/95/491-1>.

Após abordarmos a importância da escrita científica, vamos agora abordar as


partes essenciais de um projeto de pesquisa e de um relatório final de pesquisa.

Tópicos essenciais do projeto de pesquisa

Antes de elaborarmos o relatório da pesquisa concluída em si, é fundamen-


tal escrevermos o projeto de nossa investigação, contendo os primeiros passos,
planejamento e cronograma do que pretendemos realizar. Tudo isso nos auxilia a
seguir metodicamente um passo a passo bem delineado, bem como possibilita a
comunicação do que aspiramos enquanto pesquisadores.
Por exemplo, em pesquisas realizadas com seres humanos ou cobaias, é neces-
sário submetermos o projeto de pesquisa ao Comitê de Ética em Pesquisa para sua
devida avaliação. Ou ainda, para solicitamos financiamento de uma agência de
fomento, isto é, instituições que possibilitam bolsas para realização de pesquisas,
temos que enviar o projeto a uma comissão específica para análise e considerações.
O projeto de pesquisa é um documento fundamental para planejamento e avalia-
ção de nossa investigação, a fim de que a mesma seja concretizada dentro de um
cronograma preestabelecido e de um caminho descrito de forma detalhada.
As partes principais de um projeto de pesquisa, de modo geral, são a intro-
dução, com toda a revisão da literatura realizada, os objetivos, o método de pes-
quisa a ser empregado, o cronograma para execução da pesquisa (planejamento
passo a passo), e as referências utilizadas.
O projeto de pesquisa deve ser apresentado de forma clara e resumida. No site
da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), por exemplo,
a exigência é que o projeto apresente, no máximo, 20 páginas, contendo resumo,
introdução e justificativa (síntese da bibliografia fundamental), objetivos, plano
de trabalho e execução (cronograma), materiais e métodos, e forma de análise

capítulo 5 • 89
dos resultados. Caso você não tenha um modelo, pode utilizar este para escrever seu
projeto de pesquisa, pois contém todas as partes fundamentais exigidas.
Vamos abordar cada uma das partes para que fique ainda mais claro para você,
sendo que a primeira parte a ser escrita se trata da introdução.
©© BLEND IMAGES | SHUTTERSTOCK.COM

Na introdução é necessário que todo o embasamento teórico inicial seja


apresentado, explicitando o tema para o leitor. Cervo, Bervian e Silva (2007) se
referem a esta parte como aquela que abre o trabalho propriamente dito, anun-
ciando o assunto e delimitando o problema de pesquisa que será explorado na
investigação. Aqui devem ser descritos os principais conceitos que fazem parte do
problema, a justificativa da pesquisa, isto é, sua relevância, com o apontamento
de lacunas no conhecimento que se pretende suprir e de que formas a exploração
do tema proposto e alcance dos objetivos irão trazer contribuições importantes.
Você deve apresentar os motivos pelos quais sua pesquisa deve ser concretizada,
argumentando com embasamento e referências a investigações recentes.
É importante que o texto siga um raciocínio lógico na introdução e que o leitor
não apresente dúvidas em relação às pretensões do pesquisador. Em geral, parti-
mos de um parágrafo introdutório, com ideias mais gerais e iniciais, para irmos,
ao longo dessa parte do texto, apresentando os conceitos específicos relacionados a
tema central, sua importância, relevância, e estado da arte, isto é, quais as principais
pesquisas relacionadas ao tema propostos nos últimos anos (em geral, nos últimos
cinco anos). A organização textual é fundamental para a qualidade da escrita. Nessa
parte, o autor pode escrever um texto contínuo, sem subseções, mas pode também

capítulo 5 • 90
utilizar subtítulos para dividir os principais conceitos relacionados ao tema, o que
pode ajudar o leitor a compreender a construção do problema de pesquisa.
De modo geral, a escrita apresenta verbos no futuro, pois estamos falando de
um projeto e o que se pretende com ele. A investigação ainda não foi iniciada, de-
senvolvida e concretizada, assim escrevemos o que é almejado com sua conclusão.
Veja um possível esquema para a Introdução do projeto de pesquisa.

REQUISITOS PASSOS
1. Ideia geral
2. Delimitar problemas
3. Situar
Anunciar o assunto 4. Definir conceitos
5. Mostrar relevância
6. Justificar
7. Apresentar principais objetivos

Tabela 5.2 – Esquema para a Introdução. Cervo e Bervian (p.136, 2002).

Em seguida, você deve deixar bem claro qual será o objetivo de sua investigação.
Geralmente definimos um objetivo geral, isto é, o principal que se deseja alcançar na
pesquisa proposta, e os objetivos específicos, que correspondem a um passo a passo
que deverá ser seguido e concluído para que o objetivo geral seja alcançado.
A escrita dos objetivos é feita com verbos no infinitivo como “compreender”,
“levantar”, “descrever”, por exemplo. Este deve ser sucinto, objetivo, delimitado,
bem definido, para não haver ambiguidade. O pesquisador deve tomar cuidado
para não perder o foco, visando alcançar objetivos diversos. Ele deve se ater a uma
meta muito bem estabelecida e definida para sua investigação.
No plano de trabalho e execução, o pesquisador deverá apresentar um cro-
nograma sobre todos os passos que deverá seguir para concretizar sua pesquisa.
Deverá descrever a atividade a ser realizada e o tempo estimado para sua execução.
Você pode utilizar um quadro, por exemplo, para descrever a etapa da pesquisa
em si, de forma bem resumida e colocar os meses em que a pesquisa será realizada.
Veja um exemplo a seguir:

capítulo 5 • 91
TRIMESTRE
1 2 3 4 5 6 7 8
Revisão bibliográfica detalhada

Seleção de amostra de pesquisa

Preparação do roteiro de entrevista

Realização das entrevistas

Observação direta do ambiente

Análise de documentos

Análise de dados

Elaboração de relatório final de


pesquisa

Tabela 5.3 – Exemplo de cronograma de pesquisa. Desenvolvido pelo autor.

No método de pesquisa (materiais e métodos), o pesquisador deverá descrever


todos os detalhes sobre como a pesquisa será realizada. Assim, deve descrever quais
são as características dos prováveis participantes da pesquisa (ou quais tipos de parti-
cipantes se quer convidar para a investigação) ou sujeitos de pesquisa, se for o caso.
Devem estar descritos possíveis instrumentos que se quer utilizar para a coleta de
dados. E também, de forma detalhada, porém objetiva e direta, as principais técnicas
de coleta e análise de dados devem ser informadas no projeto de pesquisa. O leitor
deve ter ciência de que forma o pesquisador pretende alcançar os objetivos que pro-
põe em sua investigação, sem ter dúvidas dos passos que serão seguidos.
Além desta parte, também devem estar bem descritos como serão analisados
os dados em si, as técnicas estatísticas pretendidas, se for o caso, ou técnicas para
a pesquisa qualitativa, como a análise de conteúdo, abordada no capítulo anterior.
O resumo, embora seja a primeira parte apresentada no projeto, deve ser a
última a ser escrita, visto que deverá conter de forma bastante resumida tudo o que
é abordado no documento. Ou seja, deverá apresentar uma pequena introdução, o
objetivo da pesquisa e o método a ser utilizado para sua execução.
Ao final de todo projeto, devem estar devidamente descritas as referências
utilizadas e citadas ao longo do texto. Todas as obras consultadas para a escrita do
trabalho devem ser referenciadas como citação ao longo do trabalho e devem estar
descritas ao final, seguindo-se as normas preestabelecidas.

capítulo 5 • 92
Com essas informações, o leitor ou possível avaliador do projeto poderá dar
seu parecer em relação à viabilidade para concretização da pesquisa pretendida,
sua análise quanto à relevância e justificativa para concessão de uma bolsa para
financiamento, se esse for o caso. Os avaliadores de um projeto de pesquisa são,
em geral, pesquisadores experientes, com titulação e conhecimento para análises
detalhadas e apuradas. São pessoas que trabalham e pesquisam dentro das áreas
de conhecimento nas quais o projeto pertence, chamados de consultores ad hoc.
Entretanto, mesmo que seu objetivo não seja pleitear uma bolsa de pesquisa,
a confecção do projeto é importante para sua análise pelo Comitê de Ética em
Pesquisa, e de todo modo, para o próprio pesquisador, que deve ter uma base e um
planejamento para início, execução e concretização de sua investigação.

Tópicos essenciais de um relatório final de pesquisa

Quando uma pesquisa é desenvolvida e chega ao fim, é necessário que o pes-


quisador agora elabore um relatório final de pesquisa. Em geral, a realização de uma
investigação tem o objetivo da escrita de um artigo científico a ser publicado em
periódico ou como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), monografia, tese, dis-
sertação, ou ainda, outros tipos de comunicação científica a ser realizada em con-
gressos e demais eventos científicos. Vamos aqui apresentar a seguir um modelo para
monografias, que é mais usual para alunos de graduação e exigência comum para
TCC. No entanto, você poderá desenvolver outros trabalhos e deverá se atentar aos
modelos e às normas do que é solicitado para a comunicação da pesquisa realizada.
De modo geral, um relatório final de pesquisa contém três partes principais:
1. A introdução do trabalho, com toda a fundamentação da pesquisa, justifica-
tiva e apresentação dos objetivos;
2. O desenvolvimento da pesquisa, com a descrição de seu passo a passo, isto é,
do que foi realizado (isso inclui o método e os resultados e discussão), e por fim;
3. A conclusão, estando expostos todos os objetivos alcançados e hipóteses pos-
síveis refutadas ou confirmadas, quando for o caso.

No manual de Diretrizes para Apresentação de Dissertações e Teses da USP,


há uma estrutura proposta para trabalhos acadêmicos (no caso, dissertações de
mestrado e teses de doutorado), que pode ser seguida de modo geral para mono-
grafias e até mesmo artigos científicos. Estes últimos, no entanto, são muito mais
resumidos, objetivos e sucintos e devem seguir a estrutura proposta no edital do
periódico científico a ser submetido. Você deve verificar qual o modelo proposto

capítulo 5 • 93
para a escrita específica do trabalho científico que você desenvolveu. Abordaremos
aqui uma estrutura com base na proposta pelo manual citado. Veja a seguir:

Parte externa:
Capa (elemento obrigatório);
Lombada (elemento opcional).

Elementos pré-textuais:
Folha de rosto (obrigatório);
Dedicatória (opcional);
Agradecimentos (opcional);
Epígrafe (opcional);
Resumo na língua vernácula (obrigatório);
Resumo em língua estrangeira (obrigatório);
Lista de ilustrações (opcional);
Lista de tabelas (opcional);
Lista de abreviaturas e siglas (opcional);
Lista de símbolos (opcional);
Sumário (obrigatório).

Parte interna

Elementos textuais:
Introdução;
Desenvolvimento;
Conclusão.

Elementos pós-textuais:
Referências (obrigatório);
Apêndice (opcional);
Anexo (opcional).

Estrutura de trabalho científico. Funaro et al. (2016).

A capa do trabalho costuma ser um elemento obrigatório que serve, além


de proteção da própria obra, como local onde está descrito o título do trabalho

capítulo 5 • 94
e identificação de autor, programa e instituição onde foi desenvolvido. O título
deve ser sucinto e objetivo, bem representativo do trabalho. Veja um exemplo de
capa a seguir:

Universidade Estácio de Sá
Departamento de Psicologia

José da Silva

Transtorno Obsessivo-Compulsivo: um estudo de caso sob a


abordagem da análise do comportamento

Rio de Janeiro
2017

Figura 5.1 – Modelo de capa para trabalho científico. Desenvolvido pelo autor.

A lombada é um elemento de identificação opcional e impresso de forma lon-


gitudinal. Trata-se de uma parte que vai ao lado da capa, onde fica a dobra com as

capítulo 5 • 95
folhas do trabalho. Já a folha de rosto, que deve vir em folha a seguir, é bastante
parecida com a capa, porém deve conter informações adicionais como:
a) Nome completo do autor;
b) Título: em letras minúsculas, com exceção da primeira letra, nomes próprios
e/ou científicos;
c) Subtítulo, se houver, deve ser precedido de dois pontos;
d) Número de volume: se houver mais de um, identificar em cada capa o respec-
tivo volume;
e) Natureza: tipo do trabalho (monografia, dissertação ou tese) e objetivo (apro-
vação em disciplina, grau pretendido e outros); nome da instituição a que é sub-
metido; área de concentração;
f ) Nome do orientador e, se houver, co-orientador
g) Local (cidade) e ano de entrega.

No verso da folha de rosto, colocamos a ficha catalográfica do trabalho. Esta


geralmente é feita pelo sistema de bibliotecas da instituição de ensino na qual o
trabalho foi realizado. Deve conter autorização da reprodução da obra (desde que
citada a fonte) e os elementos essenciais para sua identificação, a ser colocada pela
biblioteca da unidade.
Na dedicatória, você pode escrever a quem ou o que dedica seu trabalho. É
um elemento opcional, isto é, você não é obrigado a escrevê-lo. Em geral, vem
em uma página separada, seguinte à folha de rosto. Embora não haja modelos, é
comum escrever ao final da página, alinhado à parte direita.
Você também pode escrever seus agradecimentos em relação ao trabalho rea-
lizado. Se o mesmo foi financiado por alguma agência de fomento, é importante
explicitar. Geralmente, o pesquisador faz um agradecimento à instituição de en-
sino onde desenvolveu o trabalho e à agência financiadora da pesquisa, se este for
o caso.
A epígrafe é a escrita de algum trecho, frase, pensamento que o autor remete
ao trabalho. De modo geral, é uma citação direta, isto é, trecho ou frase de algum
autor. Trata-se também de um elemento opcional, escrito ao final da folha.
Os resumos do trabalho (em língua portuguesa e estrangeira, geralmente in-
glês) são elementos obrigatórios. O resumo deve ser uma última parte a ser escrita,
pois toda a pesquisa deve ter sido concluída para que ele possa ser confeccionado.
Escrevemos o resumo de forma a convidar o leitor a ler o trabalho como um todo,
apresentando uma breve introdução, objetivo principal, método empregado, prin-
cipais resultados, e conclusões. O texto deve ser escrito sem parágrafos, de forma

capítulo 5 • 96
contínua e conter entre 150 a 500 palavras. Junto ao resumo, logo a seguir, co-
locamos também as palavras-chave do trabalho (ou descritores) que descrevem o
assunto abordado no trabalho em si. Utilizamos, em geral, de 3 a 5 palavras-chave
nos trabalhos científicos.
As listas de figuras, tabelas, quadros, entre outros elementos são opcionais.
Devem vir com a numeração a que se referente, título e página onde pode ser
encontrados.

EXEMPLO
4.1 Principais comportamentos ansiosos.................................................... p. 56

O sumário é um elemento obrigatório e deve conter as partes do trabalho, con-


siderando seus títulos e subtítulos e referidas páginas. O leitor pode utilizá-lo para
se direcionar e ter uma ideia inicial do conteúdo da obra. Veja um exemplo a seguir:

Sumário

1. Introdução..................................................................................5
1.1 Definição de transtorno obsessivo-compulsivo....................8
1.2 Principais formas de tratamento.........................................10
1.3 Técnicas da análise do comportamento.............................12

2. Objetivos..................................................................................15
2.1 Objetivo geral......................................................................15
2.2 Objetivos específicos..........................................................15

3. Método de pesquisa..................................................................16
3.1 Participante..........................................................................17
3.2 Instrumentos........................................................................17
3.3 Técnicas de coleta e análise de dados...............................18

4. Resultados e discussão..........................................................19

5. Considerações finais................................................................28

Referências...............................................................................32

Figura 5.2 – Modelo de sumário para trabalho científico. Desenvolvido pelo autor.

capítulo 5 • 97
Assim como no projeto de pesquisa, o relatório final deve conter uma intro-
dução, na qual o pesquisador apresenta a delimitação do tema da investigação,
relevância, objetivos e a revisão da literatura em si. O que difere a introdução do
projeto e do relatório final é sua profundidade e atualização, sendo que a mesma
deve estar sempre de acordo com o ano em que o trabalho foi concluído. No
caso de uma tese de doutorado, por exemplo, que costuma ter a duração de três a
quatro anos, em média, é importante fazer uma atualização da introdução e apro-
fundamento da mesma.
A seguir você pode verificar um pequeno trecho para exemplo de escrita de
introdução de monografia.

INTRODUÇÃO

O Transtorno Obsessivo-compulsivo (TOC), inicialmente classificado pela


psicanálise e por alguns segmentos da psiquiatria como um tipo de neurose, é
atualmente considerado, de forma mais exata, como um transtorno ou distúrbio.
A Associação Psiquiátrica Americana considera o TOC como um transtorno
mental incluído entre os chamados transtornos de ansiedade. É uma desordem
crônica que causa prejuízo da qualidade de vida de seu portador. Tanto a CID-10
quanto o DSMIII-R, o colocam entre os Transtornos Ansiosos ao lado do Transtorno
do Pânico, Agorafobia, Fobia Específica, Fobia Social e Transtorno de Estresse
Pós-Traumático. De acordo com o DSM-IV de 1994, este transtorno caracteriza-se
por pensamentos, cenas, palavras, frases ou impulsos que invadem a consciência,
de forma involuntária ou imprópria e são sempre persistentes e recorrentes – as
obsessões, geralmente acompanhadas de aflição ou medo e tentativas de ignorar,
suprimir ou neutralizar esses pensamentos, por meio da realização de atos
repetitivos e estereotipados – as compulsões ou rituais. Pelo tempo que tomam,
pelo desconforto que provocam ou pelo que levam a pessoa a executar ou a evitar,
comprometem as rotinas diárias, o desempenho profissional e as relações
interpessoais (WIELENSKA; ARAÚJO; BERNIK, 1995).

Figura 5.3 – Exemplo de trecho para Introdução de trabalho científico. Desenvolvido


pelo autor.

capítulo 5 • 98
O objetivo de pesquisa, assim como no projeto, geralmente mantido deste
deve ser escrito de forma sucinta e precisa, conforme já explicitado. Você pode ter
como exemplo o objetivo geral:
Descrever a eficácia de técnicas comportamentais aplicadas em um cliente
com diagnóstico de transtorno obsessivo-compulsivo.

O método de pesquisa, que faz parte do desenvolvimento do trabalho cientí-


fico, também deve estar escrito de forma objetiva, porém com todo o detalhamen-
to necessário. Veja um exemplo a seguir, escrito pela própria autora.

Método

Participante

O participante da pesquisa foi uma pessoa do sexo masculino de 32 anos de


idade nomeado hipoteticamente como Q. C. R. S., diagnosticado com Transtorno
Obsessivo-compulsivo de contaminação e limpeza por um médico psiquiatra da
cidade onde vivia que o encaminhou para tratamento psicoterapêutico. É impor-
tante ressaltar que o participante estava recebendo acompanhamento psiquiátrico
e devidamente medicado (ansiolíticos e antidepressivos, ambos para o TOC).

Instrumentos

A pesquisa foi realizada em uma Unidade Saúde Escola (USE), sendo parte
do Programa de Saúde Mental. As sessões de atendimento ocorreram em uma
sala apropriada.
Na entrevista inicial realizada pela co-terapeuta foi utilizado um roteiro de
entrevista semiestruturada.
Foram utilizados no presente estudo seis instrumentos. Para a definição dos
sintomas obsessivos-compulsivos (sintomas-alvo) e da intensidade destes na linha
de base (pré-atendimento) e após as intervenções, foi utilizada a escala Yale Brown
Obsessive Compulsive Scale (Y-BOCS) de Goodman, Price e Rasmussen (1989,
apud ARAÚJO, 1998). Além disso, também foram utilizados o Inventário Beck
de Ansiedade (BAI), formulado com perguntas fechadas que têm quatro alter-
nativas para resposta cada uma; o Inventário Beck de Depressão (BDI), também
com perguntas fechadas com quatro alternativas para resposta; e o Inventário de

capítulo 5 • 99
sintomas de stress para adultos de LIPP (ISSL), juntamente com a Y-BOCS. Para
complementar as avaliações do tratamento, utilizou-se também a Escala Global
de 15 pontos de Obsessões e Compulsões do Instituto Nacional de Saúde Mental
dos EUA (NIMHOC), que avalia gravidade dos sintomas obsessivos-compulsi-
vos e tem sido utilizada em larga escala em ensaios clínicos com psicofármacos,
principalmente com medida secundária ou complementar na avaliação de trata-
mento (ARAÚJO, 1998). Também foi utilizado o Questionário de Anamnese e
de Histórico de Vida, com questões abertas e fechadas na fase de pré-atendimento
para avaliação do histórico de vida, de saúde e de informações gerais sobre os
participantes.
Para registro, foram utilizadas folhas de papel com as questões dos instrumen-
tos impressas, já com espaços para as respostas, e material para a escrita (lápis,
caneta).
Os materiais utilizados durante as sessões foram: slides feitos em Microsoft
Power Point projetados em Data Show (recursos presentes na sala da USE em que
os atendimentos foram realizados) e folhetos com algumas informações gerais so-
bre os transtornos e literatura de apoio, quando necessária.

Técnicas de coleta e análise de dados

Inicialmente, pesquisou-se nas fichas da lista de espera do Programa de Saúde


Mental da Unidade Saúde Escola (USE) casos diagnosticados como TOC enca-
minhado para tratamento. Após essa busca, foi feito contato com os participantes
e assim, foi realizada entrevista individual em uma sala de atendimento da USE
a fim de se explicar o tratamento e seus objetivos de pesquisa e esclarecer dúvidas
quanto a estes. Devido a algumas particularidades dos casos encaminhados para
a USE, da disponibilidade e aceitação dos próprios clientes por tratar-se de uma
pesquisa, a coleta de informações foi realizada apenas com um participante.
É importante ressaltar que, por ser um atendimento ocorrido na USE, foram
realizadas, como norma da Unidade, uma entrevista inicial do Programa de Saúde
Mental e consultas com outros profissionais (avaliação geral da USE) como enfer-
meiros e farmacêuticos. Estas atividades foram realizadas concomitantemente com
os procedimentos da pesquisa/tratamento em questão, possibilitando ao cliente
um atendimento inter e multidisciplinar, como é proposto pela equipe da USE.
O próximo passo para dar início ao tratamento e à coleta de dados, foi rea-
lizar sessões da fase de pré-tratamento em que se solicitou ao participante que

capítulo 5 • 100
respondesse às questões de cinco instrumentos já definidos: BAI, BDI, ISSL,
Questionário de anamnese e Histórico de vida, e Y-BOCS. A aplicação destes
questionários foi realizada pela pesquisadora/co-terapeuta. Os dados dessa fase
de pré-tratamento foram utilizados para realizar-se a linha de base para o presen-
te estudo.
Em seguida, foram iniciadas as sessões de psicoterapia em uma sala de aten-
dimento coletivo na Unidade Saúde Escola (USE). As sessões do tratamento fo-
ram divididas em duas etapas para a coleta de dados. Na primeira etapa, após a
aplicação dos instrumentos no pré-tratamento, foram realizados doze encontros
para intervenção do TOC e outras queixas levadas pelo cliente sob a abordagem
da Análise do Comportamento, sendo que as sessões foram realizadas uma vez por
semana com duração de duas horas. Na primeira sessão, a terapeuta e co-terapeuta
acolheram o paciente, ressaltaram os objetivos do tratamento, o sigilo e anonima-
to para a divulgação dos resultados de pesquisa, o que foi concretizado com a assi-
natura do Termo de Comprometimento, Esclarecimento e Consentimento, sendo
que uma cópia ficou com o participante, outra com a co-terapeuta e pesquisadora,
e a terceira na própria Unidade Saúde Escola.
Após essa primeira etapa de tratamento, o participante respondeu novamen-
te aos instrumentos BDI, BAI e Y-BOCS para comparação com as respostas do
pré-tratamento. Por meio disso, verificou-se a modificação das variáveis compor-
tamentais com as intervenções feitas durante esse período. Para complementar a
avaliação, utilizou-se a escala NIMHOC (Escala Global de 15 pontos).
Na segunda etapa, foram realizados mais doze encontros, repetindo-se o pro-
cedimento da primeira etapa. Após esses encontros, aplicou-se novamente os in-
trumentos BAI, BDI, ISSL e Y-BOCS, como no pré-tratamento e na primeira
etapa e complementou-se a avaliação com a escala NIMHOC. Com isso, com-
pararam-se os resultados quantitativos e qualitativos do pré-tratamento, após a
primeira etapa de intervenção (doze sessões) e após a segunda etapa de intervenção
(doze sessões). Além disso, após cada uma das fases do tratamento, também solici-
tou-se que o próprio participante realizasse uma autoavaliação a fim de adicionar
dados à avaliação das técnicas aplicadas para intervenção do TOC.
Alguns relatórios de pesquisa utilizam seções separadas para descrever os re-
sultados encontrados, e posteriormente a discussão dos mesmos. No entanto, é
possível que estejam em uma mesma seção do trabalho. Nesta parte, é importante
que os principais achados estejam descritos para o leitor. É aqui que o pesquisador
“vende seu peixe”, informando os objetivos de pesquisa que conseguiu atingir e
comunica sua contribuição para a área de conhecimento na qual faz investigação.

capítulo 5 • 101
Veja um exemplo de breve trecho com a escrita de resultados e discussão.

Resultados e discussão

Avaliação quantitativa

A tabela 1 mostra os escores das três aplicações do Inventário Beck de Ansiedade


(BAI) ao longo das sessões de intervenção, informando a intensidade da ansiedade
do participante em cada etapa do tratamento. Os escores mostram que houve um
acréscimo de 2 pontos após a primeira etapa do tratamento e um decréscimo de 7
pontos após a segunda etapa, se comparados ao escore da fase de pré-tratamento.
A intensidade de ansiedade passou, portanto, de grave a moderada ao final das
sessões de intervenção.
Os resultados quantitativos e qualitativos mostram a evolução do participante
durante o período de tratamento permitindo uma avaliação das técnicas de mane-
jo de comportamento aplicadas durante as sessões.

APLICAÇÃO ESCORE INTENSIDADE


Primeira aplicação
33 Grave
(pré-tratamento)

Segunda aplicação
(término da primeira 35 Grave
etapa)

Terceira aplicação
(término da segunda 26 Moderada
etapa)

Tabela 5.4 – Escore das aplicações do BAI ao longo do tratamento.

A figura 1 apresenta a variação da intensidade de ansiedade durante o trata-


mento, o que foi medido por meio das três aplicações do BAI.

capítulo 5 • 102
60

50

Pontuação (BAI)
40

30

20

10

0
1 2 3
Aplicações
Figura 5.4 – Variação da intensidade de ansiedade do participante durante o tratamento.

Para finalizar o relatório, você deve apresentar as principais conclusões da


pesquisa, descrevendo suas considerações finais. Nesta parte, é necessário fazer
uma avaliação dos objetivos alcançados, parcialmente alcançados ou não alcan-
çados, descrever as principais limitações do estudo e apontar uma agenda para
pesquisas futuras.
Ao final do trabalho, devem estar descritas todas as referências utilizadas,
conforme as normas empregadas, conforme já descrito.
Caso tenham sido apontados anexos (documento não elaborado pelo autor
utilizado para comprovação, fundamentação ou ilustração) ou apêndices (docu-
mentos elaborados pelo autor utilizados com o intuito de fundamentar, ilustrar ou
comprovar sua argumentação), estes devem ser identificados com letras maiúsculas
consecutivas após as referências, sendo primeiramente apresentados os Apêndices
e depois os Anexos.

PERGUNTA
O que é plágio acadêmico?
O plágio acadêmico se configura quando um autor retira de obras ideias (seja por citação
direta, indireta ou outras) que não são suas e não fazem referência aos devidos autores. O
plágio é considerado crime, justifica a reprova de um trabalho acadêmico, curso e até mesmo
a perda de titulação de um autor.

capítulo 5 • 103
Ressaltamos que aqui foram apresentados alguns exemplos e um modelo de
estrutura para relatório final de pesquisa. No entanto, é importante verificar as
exigências do local onde o trabalho final será realizado e seu destino, seja a apre-
sentação de um artigo científico, monografia, tese, dissertação ou outro trabalho
científico. O que de fato importa é que a escrita do trabalho deve ser original, sem
plágios e comunicar as principais contribuições da pesquisa realizada à comunida-
de, trazendo benefícios para todos os envolvidos.

ATIVIDADES
Reescreva os trechos a seguir considerando as regras para a escrita científica:

01. Penso que os ansiolíticos são poderosos para o tratamento do Transtorno de Ansiedade
Generalizada (TAG).

02. O local estava muito escuro e sem luz.

03. Compreendemos que a escrita científica é importante para a comunicação de


uma pesquisa

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A. Metodologia científica. Pearson: São Paulo, 2002.
CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A.; SILVA, R. Metodologia científica. Pearson: São Paulo, 2007.
FUNARO, V. M. B. O. et al. Diretrizes para Apresentação de Dissertações e Teses da USP.
Disponível em: <http://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portaldelivrosUSP/catalog/view/111/95/491-
1> Acesso em: 22 set. 2017.

GABARITO
Capítulo 1

01. A Psicologia com base no senso comum é advinda do conhecimento popular. Determi-
nadas teorias, princípios e crenças tidas como verdades acabam sendo construídas por meio

capítulo 5 • 104
da experiência do indivíduo ou de um grupo, sendo tais ideias muitas vezes disseminadas
entre as pessoas. Já a Psicologia enquanto ciência é resultado de procedimentos que culmi-
nam no conhecimento científico. Teorias, conceitos e relações entre fatos são investigadas
por meio de técnicas de pesquisa bem delimitadas que nos permitem chegar a conclusões
mais seguras sobre a realidade.

02. O conhecimento pode ser dividido em quatro níveis, sendo eles o popular, o científico, o
filosófico e o teológico ou religioso.
a) O conhecimento popular é construído por meio do senso comum. Crenças e ideias
tidas como verdades são advindas da experiência individual ou de grupos de indi-
víduos, muitas vezes passadas entre gerações. O conhecimento popular é passível
de erros e com base muitas vezes em percepções equivocadas e preconceituosas.
b) O conhecimento científico é apoiado em evidências científicas por meio de técnicas
controladas, objetivas, imparciais e que buscam mensurar os resultados encontra-
dos, sendo o interesse intelectual e o espírito crítico características importantes do
conhecimento científico. A ciência não é tida como estática e acabada, ela está em
constante construção, e tem o objetivo de chegar o mais próximo à verdade e à
realidade para compreensão de fatos e fenômenos.
c) O conhecimento filosófico tem base no dia a dia, porém ele difere do conhecimento
popular ou vulgar, pois questiona a natureza das coisas. Sua base é interrogar o
que parece ser verdade, sendo racional. No entanto, ele também não é semelhante
ao conhecimento científico, já que não se fundamenta em experimentos e não se
preocupa se as conclusões às quais se chegam são aceitas cientificamente.
d) Por fim, temos o conhecimento religioso ou teológico que se apoia em doutrinas
sagradas, reveladas pelo sobrenatural sendo falível e exato. O sujeito não pratica
novas formulações, apenas aceita o que já está organizado com regras, hierarquias
e leis. Assim, não se pode contrariar um conhecimento sagrado.

03. O conhecimento científico é fundamental para a construção da Psicologia enquanto


ciência, pois por meio dele busca-se investigar as relações entre fenômenos observados,
conceitos e variáveis. A prática da pesquisa em Psicologia visa produzir conhecimento cien-
tífico e consolidar esse campo do conhecimento como ciência.

04. Um problema de pesquisa envolve o levantamento de lacunas ou gaps encontrados no


estado do conhecimento a respeito de um determinado assunto, cujo objetivo é formular uma
pergunta norteadora a ser respondida por meio de pesquisa. Segundo Cervo et al. (2007), o

capítulo 5 • 105
problema é uma questão que envolve intrinsecamente uma limitação prática ou teórica, para
a qual se quer encontrar uma resposta.

05. Uma pergunta de pesquisa é formulada por meio do levantamento de uma problemática
de investigação. Parte-se das limitações teóricas e práticas encontradas por meio da revisão
da literatura para, assim, elaborar a pergunta a qual se quer responder por meio de uma
pesquisa. É importante que o problema esteja bem delimitado para que a pergunta seja bem
feita e possa nortear os próximos passos da pesquisa.

06. Os objetivos de pesquisa, geralmente definidos como objetivo geral e objetivos específi-
cos são as metas que se pretende atingir com o passo a passo e conclusão da investigação.
Os objetivos norteiam a pesquisa científica e correspondem ao que se quer averiguar, seja
na teoria ou na prática.

07. Pesquisas em Psicologia muitas vezes envolvem humanos e animais, visto que seu ob-
jeto de estudo corresponde a aspectos comportamentais e mentais. Assim, a ética nesse
campo é primordial para que todos os envolvidos na coleta de dados tenham seus direitos
garantidos, sendo seu bem-estar e dignidade os principais pontos a serem assegurados na
investigação científica.

08. As Comissões de Ética no Uso de Animais (CEUAs) e os Comitês de Ética em Pesqui-


sa com Seres Humanos (CEPs) são formados por grupos multi e interprofissionais, cujas
competências estão relacionadas à garantia de bem-estar e dignidade dos participantes das
investigações. Trata-se de comissões e comitês formados para analisar projetos de pesqui-
sa, sendo responsáveis por assegurar o seguimento da legislação e de aspectos éticos em
investigações com animais e seres humanos.

Capítulo 2

01. A metodologia engloba o estudo das técnicas de pesquisa, isto é, o estudo dos pro-
cedimentos de investigação. Já o método de pesquisa consiste no delineamento dos pro-
cedimentos propriamente ditos. A metodologia é muito importante para que o pesquisador
aprenda a definir de forma satisfatória o método de pesquisa que irá seguir.

02. Os quadros apresentados neste capítulo apresentam as principais diferenças entre a


pesquisa quantitativa e qualitativa.

capítulo 5 • 106
MÉTODO QUANTITATIVO MÉTODO QUALITATIVO
Tenta compreender a totalidade do fe-
Focaliza uma quantidade pequena de
nômeno, mais do que focalizar conceitos
conceitos
específicos
Tem poucas ideias preconcebidas e salien-
Inicia com ideias preconcebidas do modo ta a importância das interpretações dos
pelo qual os conceitos estão relacionados eventos mais do que a interpretação do
pesquisador
Utiliza procedimentos estruturados e ins- Coleta dados sem instrumentos formais e
trumentos formais para coleta de dados estruturados
Coleta os dados mediante condições de Não tenta controlar o contexto da pesqui-
controle sa, e sim captar o contexto na totalidade
Enfatiza a objetividade, na coleta e análise Enfatiza o subjetivo como meio de com-
dos dados preender e interpretar as experiências
Analisa os dados numéricos por meio de Analisa as informações narradas de uma
procedimentos estatísticos forma organizada, mas intuitiva

PESQUISA PESQUISA
ASPECTO QUANTITATIVA QUALITATIVA
Enfoque na interpretação
Menor Maior
do objeto
Importância do contexto do
Menor Maior
objeto pesquisado
Proximidade do pesquisa-
dor em relação aos fenô- Menor Maior
menos estudados
Alcance do estudo no
Instantâneo Intervalo maior
tempo
Quantidade de fontes de
Uma Várias
dados
Ponto de vista do
Externo à organização Interno à organização
pesquisador
Quadro teórico e hipóteses Definidas rigorosamente Menos estruturadas

capítulo 5 • 107
03. Não. As pesquisas básicas são fundamentais para a realização das pesquisas aplicadas.
É comum que teorias sejam formuladas e desenvolvidas por meio da pesquisa básica e sejam
comprovadas ou refutadas pela pesquisa aplicada.

04. Segundo Gerhardt (2009), uma pesquisa apresenta sete etapas principais para sua
elaboração, sendo elas: a questão inicial, a exploração do tema, a problemática, a construção
do modelo de análise, a coleta de dados, a análise dos dados, e as conclusões.

Capítulo 3

01. Conceito: podemos dizer se trata da compreensão e definição de um objeto, de um


conjunto de ideias, ou até mesmo de um fenômeno.
Construto: pode ser compreendido como um conceito não observável (exemplo: senti-
mentos, valores, personalidade etc.). Para que um conceito seja de fato um construto cien-
tífico, ele deve ter embasamento teórico consistente e definição apurada e bem delineada.
Teoria: pode ser compreendida como um conjunto de leis ou regras sistematizadas para
explicar um determinado conceito (CERVO; BERVIAN; SILVA, 2007).
Variável: é qualquer situação, comportamento, evento, fato que apresente, ao menos
dois valores, por exemplo, sexo, estado civil, agressão, raiva, idade etc.

02. As variáveis do participante consistem nas características da pessoa ou sujeito que par-
ticipa da pesquisa (por exemplo: sexo, estudo civil, inteligência etc.). São fundamentais para
a definição da amostra em uma pesquisa.

03. De modo geral, em uma investigação em que se almeja averiguar as relações entre
variáveis, considera-se que uma pode ser a “causa” e a outra, o “efeito”. Assim, nos nossos
exemplos apresentados, poderíamos considerar que a idade afeta a independência financei-
ra, ou ainda, que o tempo de empresa afeita a intenção de turnover. Dessa forma, podemos
dizer que as variáveis que são causa podem ser compreendidas como variáveis indepen-
dentes, e as variáveis que são efeito com variáveis dependentes. Como o próprio nome diz,
a variável independente é aquela que, se sofrer qualquer mudança ou variação, afetará a
variável que depende dela, isto é, a variável dependente. Para cada problema de pesquisa, as
variáveis dependentes e independentes devem ser sempre definidas com base na situação
específica pesquisada, pois tais relações podem mudar conforme a pergunta da investigação.

capítulo 5 • 108
04. Um estudo que envolve método em que devemos realizar o controle das variáveis, isto
é, em que vamos analisar os efeitos das variáveis independentes sobre as variáveis depen-
dentes são denominados experimentais. Já os estudos não experimentais se referem a ob-
servações do comportamento diretamente como ocorrem, sem manipulação de variáveis.
Por exemplo, em um estudo em que se deseja compreender quais tipos de comorbidadades
psicológicas uma amostra de pessoas com diagnóstico de transtorno depressivo apresenta,
poderíamos utilizar um método não experimental.

05. Trata-se de um fenômeno em que melhoras de sintomas ou doenças são relatadas por
pacientes que receberam tratamentos aparentemente inespecíficos ou inertes, sendo que
a própria expectativa positiva da pessoa acaba gerando tais resultados (TEIXEIRA, 2009).
O pesquisador deve ser cuidadoso com esse fenômeno, pois o placebo possa gerar efeitos
terapêuticos por conta da expectativa dos participantes, e não pelos seus efeitos em si, o que
traz vieses de interpretação dos resultados e pode invalidar a pesquisa.

06. Uma das ferramentas apontadas para se eliminar o efeito placebo (ou o efeito noce-
bo) é o que denominamos procedimento duplo-cego (ou condição de duplo-cego). Nesse
delineamento, os participantes não têm conhecimento das condições de tratamento a que
estão sendo submetidos e conduzidos pelos pesquisadores, ou pelos que estão avaliando os
resultados da pesquisa. Nesse procedimento, nem as pessoas que estão sendo examinadas
nem aqueles que estão examinando (investigadores) sabem quais são as variáveis em um
determinado momento da pesquisa. Vamos a um exemplo para que fique mais claro.
Exemplo: suponha que o objetivo da pesquisa seja investigar a eficácia de um determina-
do medicamento em comprimidos para melhorar ou suprir tremores de pacientes diagnostica-
dos com Parkinson (doença progressiva do sistema neurológico que tem como um dos sinto-
mas mais marcantes tremores incontroláveis pelos seus portadores). Comprimidos contendo o
medicamento ativo e comprimidos feitos com farinha (placebos) poderiam ser utilizados para a
pesquisa, sendo que nem o participante nem o pesquisador que vai aplicar a intervenção sabe-
riam quais são os que contêm o medicamento em si e quais são os placebos. Tais comprimidos
poderiam ter algum código, apenas para controlar essa questão. Assim, teríamos dois grupos:
um que receberia apenas comprimidos com o princípio farmacológico ativo e outro que recebe-
ria apenas placebos (isso poderia ser controlado por outros pesquisadores, que não aplicariam
as intervenções, e que não analisariam os dados em si). Após a intervenção medicamentosa, os
resultados seriam medidos e interpretados, e nessa fase sim, seria revelado qual grupo tomou
os comprimidos placebos e qual recebeu o medicamento para tratamento real da doença. Com
esse procedimento, o efeito placebo ou o efeito nocebo poderiam ser controlados.

capítulo 5 • 109
Capítulo 4

O aluno deverá descrever como poderia fazer o rapport antes de iniciar efetivamente a
entrevista. No roteiro, deixar espaço para colocar dados sociodemográficos do participan-
te como sexo, idade, estado civil, escolaridade. Em seguida, elaborar de 4 a 5 perguntas
para investigar a eficácia de técnicas de relaxamento autoaplicáveis em momentos de crise
de ansiedade.

Exemplo de roteiro
Iniciais do participante: __________________________
Idade: ___________
Sexo:_____________
Estado civil: _______________
Escolaridade:______________________________________
Data da entrevista:_________________________________

Roteiro de perguntas

01. Em quais momentos você aplicou as técnicas de relaxamento a que foi orientado prati-
car? Explique com detalhes.

02. Como você estava se sentindo quando começou a praticar o relaxamento? Descreva
suas sensações corporais. Descreva os pensamentos que passavam em sua cabeça.

03. Quanto tempo duravam as aplicações das técnicas de relaxamento? Quantas vezes você
as fazia por dia?

04. Quais eram suas sensações após a realização das técnicas? Como estavam
seus pensamentos?

05. Você indicaria para outras pessoas que sofrem com transtornos de ansiedade essas
técnicas? Por quê?

Capítulo 5

01. Segundo autores da área, os ansiolíticos podem apresentar efeitos importantes para o
tratamento do Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG) (WIELENSKA, 2002).

capítulo 5 • 110
02. O local utilizado para a realização da pesquisa apresentava luz insuficiente para a leitura.

03. Compreende-se que a escrita científica é importante para a comunicação de


uma pesquisa.

capítulo 5 • 111
ANOTAÇÕES

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