Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 9

Prof. Me.

Rosangela Cunha de
Menezes
Material Constitucional I

1- CONCEITO DE CONSTITUIÇÃO E SUPREMACIA CONSTITUCIONAL

Basicamente pode-se dizer que Constituição é a norma suprema que rege a organização de
um Estado Nacional. LEMBRE –SE A CONSTITUIÇÃO É O FUNDAMENTO DE VALIDADE DE
TODAS AS NORMAS

Nesse sentido, todas as concepções que traduzem diferentes conceitos de Constituição


devem ser estudadas:

1.1 CONSTITUIÇÃO SOCIOLÓGICA

Idealizada por Ferdinand Lassale, em 1862, é aquela que deve traduzir a soma dos
fatores reais de poder que rege determinada nação, sob pena de se tornar mera folha
de papel escrita, que não corresponde à Constituição. Só é legítima se representar o efetivo
poder social.

1.2 CONSTITUIÇÃO POLÍTICA

Desenvolvida por Carl Schmitt em 1928, a Constituição Política é aquela que decorre
de uma decisão política fundamental e se traduz na estrutura do Estado e dos Poderes
e na presença de um rol de direitos fundamentais. As normas que não traduzirem a decisão
política fundamental não serão Constituição propriamente dita, mas meras leis
constitucionais.

Ligado à concepção política de Constituição de Carl Schmitt está o conceito de


Constituição material, que e traduz no arcabouço de normas que tratam:

1) da organização do poder; da forma de governo,


2) da distribuição da competência,
3) dos direitos da pessoa humana (considerados os sociais e individuais) e
4) do exercício da autoridade, ou seja, refere-se à composição e ao funcionamento da
ordem política.

1.3 CONSTITUIÇÃO JURÍDICA

Fundada nas lições de Hans Kelsen, a Constituição ocupa o ápice da pirâmide


normativa, seguindo como paradigma máximo de validade para todas as demais
normas do ordenamento jurídico. Em outras palavras: as leis e os atos infralegais são
hierarquicamente inferiores à Constituição e, por isso, somente serão válidos se não
contrariarem as normas da Constituição.

PIRÂMIDE NORMATIVA

CONSTITUIÇÃO

LEIS
Prof. Me. Rosangela Cunha de
Menezes

Atos Infralegais

1.4 CONSTITUIÇÃO CULTURALISTA

Identificada por Michele Ainis, em 1986, Constituição culturalista é aquela que representa
o fato cultural, ou seja, que disciplina as
relações e direitos fundamentais pertinentes à cultura, tais como a educação, o desporto e
a cultura em sentido estrito.

1.5 CONSTITUIÇÃO ABERTA

Idealizada por Peter Haberle, em 1975, é aquela interpretada por todo o povo e em
qualquer espaço, e não apenas pelos juristas nos bojos dos processos.

2. PODER CONSTITUINTE

2.1 Ideia ou teoria Clássica do poder constituinte

A mais famosa obra sobre o poder constituinte se intitula “Que é o terceiro Estado”? e foi
escrita por Emmanuel Joseph Sieyés à época da Revolução Francesa. Nesse escrito
defende-se a ideia que o povo é o verdadeiro titular e detentor do poder na
sociedade.

A Organização pessoal e social do povo titularizando o poder político também pode ser
chamada de nação. O fato é que, apesar de titular do poder político, o povo nem sempre
consegue exercê-lo de forma direta. Nesse sentido, a força geral da nação fundamenta o
povo, no exercício do poder constituinte, criar uma Constituição, documento que organiza o
modo como o poder do povo deve ser exercido em uma determinada sociedade,
notadamente por meio de instituições, órgãos e representantes políticos.

Em resumo, pode-se afirmar que o poder constituinte é uma energia ou forma política
que se funda em si mesma, expressando a sublime vontade de um povo quanto à
organização de um Estado1. Por essa razão é que cabe ao poder constituinte criar a
Constituição de um determinado Estado e zelar por ela, o que eventualmente significa até
mesmo alterá-la, emendá-la.

Ao legitimar e participar da criação de uma Constituição, o povo atribui parcelas de poder a


órgãos estatais especializados, que passam a ser denominados de Poderes (Executivo,
Legislativo e Judiciário).

Portanto, o poder constituinte é de titularidade do povo, mas é o Estado, por meio de seus
órgãos especializados, que o exerce.

2.2 Espécies de poder Constituinte:

1
MASSON, Nathalia. Manual de direito Constitucional. 4 ed.Salvador:Juspodivm, 2015,p.101
Prof. Me. Rosangela Cunha de
Menezes
Três são as espécies de poder constituinte: originário, derivado reformador e derivado
decorrente.

2.2.1 PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO (também denominado como genuíno,


primário ou de primeiro grau)

É aquele que cria a primeira ou a nova Constituição de um Estado.

Para atingir eu objetivo, ele é:

- inicial (não existe outro poder anterior ou superior a ele);

- autônomo (o poder constituinte determina a estrutura da nova constituição);

- ilimitado (tem autonomia para escolher o Direito que irá viger, ou seja, não se subordina
a nenhuma ideia jurídica preexistente);

- incondicionado (é dotado de liberdade quanto aos procedimentos adotados para a


criação da Constituição, ou seja, não precisa seguir nenhuma formalidade preestabelecida);

- permanente (“[...] já que o poder constituinte originário não se esgota com a edição da
nova Constituição, sobrevivendo a ela e fora dela como forma de expressão da liberdade
humana, em verdadeira ideia de subsistência.” 2

2.2.2 PODER CONSTITUINTE DERIVADO REFORMADOR (também denominado de


reforma, secundário, de segundo grau, instituído ou constituído)

É o responsável pela reforma da Constituição, que no Brasil se dá via emenda


constitucional (art. 60 da CF) ou por meio da incorporação de tratados internacionais
de direitos humanos (art. 5º, §3º, da CF)

Vale notar que a CF de 1988 não prevê expressamente o poder constituinte derivado, mas
este se encontra implícito e se extrai, por exemplo, da norma constitucional que prevê a
edição de emendas à Constituição (art. 60 da CF).

2.2.3 PODER CONSTITUINTE DERIVADO DECORRENTE

É aquele exercido pelos Estados-membros na construção das Constituições Estaduais,


consoante o artigo 25 da CF.

Tal prerrogativa decorre da capacidade de auto-organização que têm os Estados, mas que
sempre está limitada pelo dever de respeito às normas contidas na Constituição Federal.

Encerrando a disciplina das espécies de poder constituinte, destaque-se que não há


manifestação de poder constituinte (originário, derivado ou decorrente) nos
municípios, pois estes têm sua estruturação jurídica dada por meio de Lei
orgânica, não de Constituição (art. 29 da CF).

2.3 Limitações ao poder constituinte derivado reformador:


Segundo doutrina dominante, as limitações se subdividem em:

1- Temporais: são as que impedem a alteração da Constituição por um determinado


período de tempo. A CF/88 não prevê nenhuma limitação temporal.
2
LENZA, Pedro. Direito Constitucional esquematizado.16.ed.São Paulo:Saraiva,2022.
Prof. Me. Rosangela Cunha de
Menezes
2 – Circunstanciais: são aquelas que impedem a alteração da Constituição em momentos
de extrema gravidade, nos quais a livre manifestação do poder reformador possa estar
ameaçada, o que se dá, por exemplo, na intervenção federal, no estado de defesa e no
estado de sítio (CF art. 60§1º da CF).

3- As cláusulas pétreas (de pedra, duras) estão dispostas no artigo 60, §4º da CF.

ATENÇÃO:

DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS:

Acerca deste tema, vale ressaltar que os direitos e garantias individuais considerados
cláusulas pétreas não se restringem àqueles expressos no rol do artigo 5º, da CF,
ou seja, estão presentes também em outros dispositivos constitucionais ao longo da
Constituição.

Isso porque o STF admitiu interpretação extensiva para a definição de direitos análogos,
que são aqueles que tem a natureza de direitos e garantias individuais mesmo estando fora
do artigo 5º, o que restou claro na Ação Direta de Inconstitucionalidade 939, julgada em
1993 e relatada pelo Ministro Sidney Sanches, que considerou também, como cláusulas
pétreas, a anterioridade tributária, consoante o artigo 5º, §2º, artigo 60, §4º, IV, e artigo
150, III, todos da CF.

3. CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES:

Para fins didáticos, iniciarei por apresentar um cenário geral da


classificação, ressaltando que a classificação da CF88 será estudada
separadamente:

3.1 Quanto à origem:

a) Democrática ou promulgada ou popular: elaborada por legítimos


representantes do povo, normalmente organizada em torno de uma
Assembleia Constituinte.

Exemplos: Constituições de 1891, 1934, 1946 e 1988.

b) Outorgada: é aquela elaborada sem a presença de legítimos


representantes do povo, imposta pela vontade do governante, que
titulariza o poder constituinte originário.

Exemplos: Constituições de 1824, 1937 e 1967.

c) Cesarista, bonapartista, plebiscitária ou referendaria: é


aquela criada por um ditador ou imperador e posteriormente submetida
à aprovação popular por plebiscito ou referendo.
Prof. Me. Rosangela Cunha de
Menezes
Exemplos: Constituições Bonapartistas( submetidas a plebiscitos
elaborados por Napoleão I e Cartas Plebiscitárias do Chile (com
plebiscito capitaneados por Pinochet).

d) Pactuada ou dualista: formada a partir de um acordo de vontades


entre o Soberano e alguns grupos sociais. Trata-se da espécie que
remonta a algumas constituições na Idade Média, em que, diante de
disputas de poder envolvendo as classes mais favorecidas, optava-se
por combinar, pactuar um texto constitucional, de modo a restarem
atendidos os interesses de todos os grupos socialmente privilegiados,
com a vantagem de se manter uma aparente estabilidade política.
Exemplo: Magna Carta de 1215 (Pactuada entre os barões ingleses e o
Monarca João Sem Terra).

3.2 Quanto ao conteúdo:

a) Formal/procedimental: compõem-se do que consta em


documento solene, independentemente do conteúdo. Ex: Todas as
constituições brasileiras.

b) Material/substancial: composta apenas por regras que


exteriorizam a forma de Estado, organização dos Poderes e direitos
fundamentais. Portanto, suas normas são aquelas essencialmente
constitucionais, mas que podem ser escritas ou costumeiras, pois a
forma tem importância secundária. Ex: a Constituição brasileira de
1824 considerava materialmente constitucional apenas o que dissesse
respeito aos limites e atribuições dos poderes e direitos políticos,
inclusive os individuais dos cidadãos.

ATENÇÃO:
As constituições formais normalmente estão repletas de norma
materialmente constitucionais, o que torna possível afirmar-se que, em
regra, as Constituições formais trazem conteúdo de constituição
material. É o caso da constituição brasileira de 1988, em que os títulos I
(princípios fundamentais), II (direitos e garantias fundamentais), III
(organizações do Estado) e IV (organização dos Poderes) revelam
normas materialmente constitucionais.

3.3 Quanto à forma:


Prof. Me. Rosangela Cunha de
Menezes
a) Escrita/instrumental: formada por um texto.

a.i Escrita legal: formada por texto oriundo de documentos esparsos


ou fragmentados.

Exemplo: Constituições belga de 1830 e francesa de 1875.

a.ii Escrita codificada: formada por texto inscrito em documento


único. Ex: Todas as constituições brasileiras.

b) Não Escrita/costumeira/consuetudinária: formada pela reunião


dos costumes da jurisprudência predominante e até mesmo por
documentos escritos (por mais contraditório que possa parecer). Mas,
como esclarece Dirley da Cunha Júnior, “[...] não existe Constituição
inteiramente não escrita ou costumeira, pois sempre haverá normas
escritas compondo o seu conteúdo. A constituição inglesa, por exemplo,
compreende importantes textos escritos, mas esparsos no tempo e no
espaço, como a Magna Carta (1251), o Petition of Rights (1628), o
Habeas Corpus Act (1679), o Bill of Rights (1689), entre outros.”3

3.4 Quanto à estabilidade/mutabilidade/alterabilidade:

a) imutável: não prevê nenhum processo para sua alteração. Ex: A


Constituição brasileira de 1824 foi provisoriamente imutável por um
período de 4 anos após sua outorga, “tendo em vista o que previa o seu
artigo 174: ‘Se passados 4 anos, depois de jurada a Constituição do Brasil, se
conhecer, que algum dos seus artigos merece reforma, se fará a proposição por
escrito, o qual deve ter origem na Câmara dos Deputados, e ser apoiada pela terça
parte deles.”

b) fixa: só pode ser alterada pelo poder constituinte originário, “[...]


circunstância que implica, não em alteração, mas em elaboração,
propriamente de uma nova ordem constitucional [...]”. 4

c) Rígida (Super-rígida segundo Alexandre de Moraes): aquela


que conta com uma parte imutável e outra parte rígida. Em outras
palavras, é a Constituição que contem trechos que não podem ser
alterados e outros trechos que só podem ser alterados por um processo
mais difícil do que o utilizado para alterar leis. Aquela em que o
processo para alteração de qualquer de suas normas é mais difícil do

3
CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 6.ed.Salvador:Juspodivm, 2022.
4
Op.Cit.p.122
Prof. Me. Rosangela Cunha de
Menezes
que o utilizado para alterar leis. Exemplos: Constituições brasileiras de
1891, 1934, 1937, 1946, 1967 e 1988.

c) Flexível: aquela em que o processo para sua alteração é igual ao


utilizado para criar leis. Ex: Constituições da Inglaterra, da Finlândia e
da Nova Zelândia.

d) semirrígida/semiflexível/mista: é aquela dotada de parte rígida


(em que somente pode ser alterada por processo mais difícil do que o
utilizado para criar leis), e parte flexível (em que pode ser alterada pelo
mesmo processo utilizado para criar leis).

Ex: Constituições brasileiras de 1824 e irlandesa de 1922.

3.5 Quanto à extensão:

a) sintética/concisa/sumária/reduzida: é a Constituição que


regulamenta a penas os princípios básicos de um Estado, organizando-o
e limitando seu poder por meio da estipulação de direitos e garantias
fundamentais.

Ex. Constituição dos Estados Unidos da América de 1787 (com apenas 7


artigos).

b) analítica/prolixa/longa: é a Constituição que vai além dos


princípios básicos e dos direitos fundamentais, detalhando também
outros assuntos, como ordem econômica e social. Ex. CF/88

3.6 Quanto à finalidade:

a) Garantia/liberal/defensiva/negativa: contém proteção especial


às liberdades públicas.

b) Dirigente: confere atenção especial à implementação de programas


pelo Estado.

ATENÇÃO: A CF/88 é, ao mesmo tempo,


garantia/liberal/defensiva/negativa e dirigente.

c)Balanço: apenas descreve e registra a organização política


estabelecida, fazendo um balanço da situação vivenciada em dado
momento histórico. Ex; Constituições soviéticas de 1924, 1936 e 1977.

3.7 Quanto ao modo de elaboração:


Prof. Me. Rosangela Cunha de
Menezes
a) Dogmática: sistematizada a partir de ideias fundamentais,
liberdade, igualdade, pluralismo. Ex. CF/88

b) Histórica: de elaboração lenta, pois se materializa a partir dos


costumes, que se modificam ao longo do tempo. Ex: Constituição
Inglesa.

3.8 Quanto à ideologia:

a) Ortodoxa: forjada sob a ótica de somente uma ideologia. Ex.


Constituições soviéticas de 1923, 1936 e 1977.

b) Eclética: fundada em valores plurais. Ex. CF/88 e portuguesa de


1976.

MÁXIMAS QUANTO ÀS CLASSIFICAÇÕES DAS CONSTITUIÇÕES:

a) Toda Constituição rígida é escrita, pois não há rigidez em


uma Constituição não escrita ou costumeira.
b) Nem toda Constituição escrita é rígida, pois a Constituição
formada por um texto pode ser imutável, fixa, rígida, flexível ou
semiflexível.
c) Toda Constituição costumeira é, ao menos conceitualmente,
flexível, pois seu processo de alteração não se diferencia do
que se utiliza para a alteração de qualquer outra norma que
discipline o convívio social.

ATENÇÃO: Em se tratando de constituição flexível, não existe hierarquia entre Constituição


e lei infraconstitucional, ou seja, uma lei infraconstitucional posterior altera texto
constitucional se assim expressamente o declarar, quando for com ele incompatível, ou
quando regular inteiramente a matéria de que tratava a Constituição.

REPRESENTANDO-SE GRAFICAMENTE:

CONSTITUIÇÃO RÍGIDA CONSTITUIÇÃO FLEXÍVEL


Constituição

____________________________
CONSTITUIÇÃO NORMA
INFRACONST
Prof. Me. Rosangela Cunha de
Menezes
Art. 59 (leis infraconstitucionais)

Você também pode gostar