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b) nos autores cristãos, ao fundamentar que todo poder temporal tem origem em um
mandamento de Deus (Santo Agostinho; Guilherme de Ockham; S. Tomás Aquino):
"Non est enim potestas nisi a Deo” (apud Carl Schmitt, “Teoria da Constituição”, p.
89);
c) na adaptação, pelos absolutistas, das teorias cristãs: “teoria do direito divino dos
reis”;
Martin Kriele: "O poder Constituinte o exerce o povo: a soberania do povo significa,
em primeiro lugar, a soberania para decidir sobre a constituição. Esgota-se no ato de
realizar a constituição e permanece latente na constituição como poder constituído
até um novo ato de ditar a constituição" (p. 317).
"A soberania do povo não significa, pois, que o povo exerce o poder, senão que
o poder está dividido e exercido por diversos órgãos constitucionais, "provém" do
povo. Dentro do Estado Constitucional também o povo tem tão somente certas
competências e direitos, a saber, as eleições e votações (art. 14, CF 1988), a
participação nos partidos políticos (art. 17), associações (art. 5°, XVII a XXI) e
reuniões (art. 5°, XVI), o direito de petição (art. 5°, XXXIV, "a”), a formação da opinião
pública (arts. 220 a 224). Para o Estado Constitucional, a soberania do povo significa,
portanto, que o poder constituinte e a titularidade do poder estatal os têm o povo.
Posto que o conceito de soberania do povo se esgota nestes dois elementos, a
soberania do povo é perfeitamente compatível com a afirmação de que não há
nenhum soberano dentro do Estado Constitucional. A soberania do povo só aparece
no começo ou no fim do Estado Constitucional, quando este é criado e quando ele é
abolido. A soberania do povo pode, por conseguinte, constituir a liberdade e com ela
a democracia. Ali onde como no continente europeu dos sécs. XVII e XVII, se havia
imposto a soberania monárquica, o Estado constitucional só pode ser criado
apelando à soberania do povo e ao seu poder constituinte" (p. 317/318).
Canotilho cita que dados históricos, "realidades culturais", não são limites jurídicos,
mas podem limitar - extra juridicamente - a atıvidade do poder constituinte originário.
Exemplos de Canotilho: a instituição da família poligâmica, a abolição do direito de
propriedade privada ou a negação dos direitos fundamentais em um Estado ocidental
contemporâneo. Em um exemplo mais próximo, pode-se afirmar que seria
inconcebível que o Poder Constituinte brasıleiro de 1986/88 adotasse um sistema de
governo não democrático, face ao momento histórico em que o mesmo manifestou-
se (oposição aos governos militares de 1964/85). Para exemplos desses limites, na
história constitucional do Brasil, o artigo de Raul Machado Horta "Reflexões sobre a
Constituinte" (in RIL 89/10). Assim é que Marcelo Rebelo de Souza, citado por Jorge
Miranda, nota que "Quer o poder constituinte formal, quer o poder constituinte
material são limitados pelas estruturas políticas, sociais, econômicas e culturais
dominantes da sociedade, bem como pelos valores ideológicos de que são
portadores" (op. cit. vol. II, pág. 87).
Carl Schmitt (in “Teoria da Constituição”, 1928) - Sobre o problema das rupturas, a
classificação de Schmitt, citada, ainda, por sua clareza didática:
1) "Destruição" da Constituição - Quando existe a "supressão da Constituição
existente (e não apenas de uma ou várias leis constitucionais), acompanhada da
supressão do Poder constituinte em que se embasava" (op. cit., p. 115). Note-se
como Schmitt funde, num só conceito, a dicotomia "revolução" e "golpe de Estado",
teorizada, em 1922, por Carré de Malberg. Exemplo: a Constituição brasileira de 1937
destrói a Constituição de 34 e o poder constituinte muda de titularıdade (do povo para
Getúlio Vargas).
2) "Supressão" da Constituição - Quando o mesmo poder constituinte "põe de
lado" o texto anterior e o substitui por outro texto constitucional.
3. "Revisão" da Constituição - Modificação do texto constitucional, com ou sem
previsão expressa dessa modificação no texto que está sendo modificado (porque,
repita-se, na teoria schmittiana interessa mais a "decisão" do poder constituinte do
que o "texto" constitucional).
4. "Quebramento" da Constituição - Violação (descumprimento) do texto
constitucional, em casos excepcionais.
5. "Suspensão" da Constituição - Trata-se de, temporariamente, não aplicar
qualquer dispositivo constitucional. Foi utilizada por Hitler, durante o governo nazista,
relativamente à Constituição de Weimar, de 1919.
Bibliografia
BONAVIDES, Paulo (capítulo "O Poder Constituinte", apud “Curso”);
GONÇALVES, Silvia D. S. de Lima ("Poder constituinte: filosofia ou dogmática
jurídica", in CDC 10/68);
WOLKMER. Antônio Carlos ("Legitimidade e legalidade: uma distinção necessária",
in RIL 124/179).
A origem dessa "revisão" está na Constituição portuguesa (1976), no seu art. 284,
parte primeira, ao dizer que "A Assembleia da República pode rever a Constituição
decorridos cinco anos sobre a data da publicação de qualquer lei de revisão". Isso
significa, em regra, que, somente decorridos cinco anos da anterior revisão, pode a
Constituição portuguesa ser novamente modificada. Excepcionalmente, a segunda
parte do mesmo artigo permite revisões em prazo menor, mas, somente, "por maioria
de quatro quintos dos Deputados em efetividade de funções", o que, praticamente,
inviabiliza uma revisão face a tal exigência de quórum.
Diversamente do caso português, a CF de 1988 só previu uma revisão, a qual foi
realizada no transcorrer dos anos de 1993 e 1994, tendo sido feitas, no total, seis
emendas de revisão. Sobre a revisão constitucional brasileira de 1993, indica-se a
leitura da Revista de Informação Legislativa n. 120, que dedicou todo o volume para
esse tema. Esgotada a possibilidade da revisão, por ser dispositivo transitório, resta,
hoje, a segunda forma de modificação da Constituição, prevista esta no texto
principal, que é o procedimento de emendas à Constituição.
Convém observar, ainda, quanto ao procedimento, que, nas emendas, não há lugar
para o veto (ou sanção) da mesma pelo Presidente da República (como acontece
com as leis ordinárias e complementares). A emenda é promulgada "pelas Mesas da
Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem"
(art. 60, § 3).
4) Limites materiais explícitos (ou expressos) - art. 60, § 4°. São as denominadas
"cláusulas pétreas", matérias que não podem ser objeto de modificação, enquanto a
atual Constituição estiver em vigor. A origem de tal tipo de cláusula está na
Constituição francesa de 1884, que vedava, expressamente, a modificação da forma
republicana de governo (impedindo, assim, a restauração da monarquia). A partir da
nossa Constituição de 1891, passamos a conhecer tal tipo de dispositivo (ela
afirmava que a federação era indissolúvel). Já na CF/67 havia uma cláusula pétrea,
que vedava a proposta de emenda "tendente a abolir a Federação e a República"
(art. 47, § 1). Sob a Constituição de 1988, a seguinte jurisprudência:
STF, ADIn n° 939 (RDA 198/123) - "Uma Emenda Constitucional, emanada, portanto,
de Constituinte derivada, incidindo em violação à Constituição originária, pode ser
declarada inconstitucional, pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função precípua é
de guarda da Constituição (art. 102, I, "a", da CF).
A Emenda Constitucional n° 3, de 17-03-1993, que, no art. 2°, autorizou a União
a instituir o I.P.M.F., incidiu em vicio de inconstitucionalidade, ao dispor, no parágrafo
2° desse dispositivo, que, quanto a tal tributo, não se aplica "o art. 150, III "b" e "VI",
da Constituição, porque, desse modo, violou os seguintes princípios e normas
imutáveis (somente eles, não outros):
1- o princípio da anterioridade, que é garantia individual do contribuinte (art. 5°, § 2°,
art. 60, § 4°, inciso IV, e art. 150, III, "b" da Constituição;
2-o princípio da imunidade tributária recíproca (que veda à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios a instituição de impostos sobre o patrimônio,
rendas ou serviços uns dos outros) e que é garantia da Federação (art. 60, § 4°,
inciso I, e art. 150, VI, "a", da CF), (...)".
4.1. Limites materiais e direitos fundamentais (art. 60, § 4°, IV) - quais categorias
de direitos fundamentais podem ser modificadas? A CF só diz serem cláusula pétrea
os "direitos e garantias individuais", a maioria absoluta deles encontrando-se no art.
5°, da CF.
Outra discussão surge a partir do art. 5°, XXXVI. Diz ele que a lei não poderá
prejudicar o "direito adquirido".
A propósito, a seguinte jurisprudência indireta sobre o tema:
STF, RE n° 94.414 (RTJ 114/237), ainda sob a CF 1967/69: "Não há direito adquirido
contra texto constitucional, resulte ele do poder constituinte originário, ou do poder
constituinte derivado".
STF, ADIN n° 493 (RTJ 143/724) - "O disposto no artigo 5º, XXXVI, da Constituição
Federal se aplica a toda e qualquer lei infraconstitucional, sem qualquer distinção
entre lei de direito público e lei de direito privado, ou entre lei de ordem pública e lei
dispositiva.
A partir de tais julgados, não é irrazoável supor que emendas constitucionais
podem alterar ou suprimir certas categorias de direitos fundamentais (desde que não
sejam direitos e garantias "individuais", por força do art. 60, § 4º, CF).
1.2) o costume constitucional, o qual "Deverá ser tido como norma não escrita,
materialmente constitucional porque versando matéria constitucional, porém sem a
eficácia ou o valor jurídico de norma constitucional escrita (...) Consequentemente,
decorre logicamente que o costume não reforma e, portanto, não revoga a
Constituição" (op. cit., págs. 185/186). Mas, segundo a autora, e apoiada em Pontes
de Miranda, o costume constitucional poderia revogar uma lei infraconstitucional
(pág. 186).
Para que haja um costume constitucional, por fim, deve-se formar ele a partir
da prática ("usos e costumes") dos órgãos competentes que aplicam, veiculam as
normas constitucionais (pág. 187).
Função dos costumes - 1) auxiliar a interpretação constitucional; 2) integração das
lacunas constitucionais (desde que se aceite a tese da existência de lacunas no
ordenamento) (Págs. 191 a 196).
Exemplos da autora: o não cumprimento pelo Executivo de lei federal ou
estadual tida como inconstitucional, embora sem a declaração da
inconstitucionalidade pelo Judiciário.
BIBLIOGRAFIA CITADA: