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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2021.0000565932

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


1030225-79.2020.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante/apelado
AIRBNB SERVICOS DIGITAIS LTDA, NOME FANTASIA ‘’AIRBNB
BRASIL’', é apelada/apelante BETTY MIROCZNIK.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 12ª Câmara de Direito


Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram
provimento em parte ao recurso da ré e deram provimento em parte ao recurso
adesivo da autora. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este
acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JACOB VALENTE


(Presidente sem voto), TASSO DUARTE DE MELO E SANDRA GALHARDO
ESTEVES.

São Paulo, 19 de julho de 2021.

ALEXANDRE DAVID MALFATTI


Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Apelação Cível nº 1030225-79.2020.8.26.0100


13ª Vara Cível do Foro Central Cível
Apelante: AIRBNB SERVIÇOS DIGITAIS LTDA
Apelada: BETTY MIROCZNIK
Voto nº 801
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO.

NULIDADE DA SENTENÇA. FUNDAMENTAÇÃO


ADEQUADA. A fundamentação sucinta, concisa e objetiva não
traduz ausência de fundamentação. Oportuno registrar que a
decisão de primeiro grau apresenta razão suficiente para
conclusão adotada, a partir da interpretação do contrato e da lei.
As razões do recurso apontam, na verdade, insatisfação com o
conteúdo da r. sentença. Alegação rejeitada.

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. RESERVA DE


HOSPEDAGEM NA PLATAFORMA DO AIRBNB.
RELAÇÃO JURÍDICA DE CONSUMO.
RESPONSABILIDADE PELO INADIMPLEMENTO
CONTRATUAL. OFERTA DESCUMPRIDA PELO
ANFITRIÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA E
RESPONSABILIDADE DA EMPRESA RÉ. Na petição inicial,
a autora descreveu fundamentação que estabeleceu uma relação
de responsabilidade da ré por falhas na prestação de serviços no
anúncio e intermediação de hospedagem. Identificou uma relação
jurídica controvertida com formulação de pedido (lógico e
adequado) de indenização. Era o bastante para aplicação da
teoria da asserção e reconhecimento da presença daquela
condição da ação (legitimidade passiva). A autora alugou na
plataforma ré um imóvel localizado na cidade de Londres, para o
período de 08/12/2019 a 21/12/2019. No local, verificou que as
informações do anúncio não condiziam com a realidade. O
banheiro estava em condições inadequadas de higiene e limpeza,
inviabilizando-se a hospedagem no local. Inexistência de wifi.
Circunstâncias que não foram resolvidas pela ré, apesar do
contato da autora. Atendimento que se limitou a afirmar que o
imóvel, segundo versão do anfitrião (sem qualquer prova nos
autos) estava de acordo com a oferta. Fotografia que revelou
estado do banheiro e que demonstrou alegação da autora.
Relação de consumo estabelecida entre as partes e baseada na
prestação de serviços da ré, muito além da mera intermediação
(aproximação) entre consumidor final e anfitrião (denominação
cunhada pela ré para o titular do imóvel). Uso de marketing
agressivo e que propaga pilares de segurança e confiança.
Legítima expectativa do consumidor de que, ao contratar via
AIRBNB, estará diante de hospedagem segura e de acordo com
promessas de limpeza e higiene. Responsabilidade da ré advinda
também da violação do dever de assistência prometido ao
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consumidor final (atendimento 24 horas). Autora que não recebeu


solução para o problema enfrentado. Danos materiais. Diante da
falha na prestação de serviço, não usufruiu do imóvel nos termos
e datas contratados. Devolução do preço (R$ 7.418,51).
Reembolso das despesas com o serviço de tradução juramentada
de documentos (R$ 530,00). Danos morais. A consumidora
experimentou dissabores, transtornos e aborrecimentos advindos
não somente da complicação causada à hospedagem durante
sua viagem ao exterior, mas também do atendimento inadequado
recebido para sua reclamação durante a estadia. Valor fixado na
decisão de primeiro grau em R$ 10.000,00. Modificação do termo
inicial dos juros de mora de 1% ao mês (fixados a partir da
citação), nas indenizações dos danos materiais e dos danos
morais. Modificação do termo inicial da correção monetária, nas
indenizações dos danos materiais (data de cada desembolso) e
dos danos morais (data da fixação - sentença). Ação parcialmente
procedente.

SENTENÇA REFORMADA. RECURSO DA RÉ


PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO ADESIVO DA
AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos.

Trata-se de recurso de apelação interposto por AIRBNB


SERVIÇOS DIGITAIS LTDA, no âmbito da ação de reparação de danos
morais e materiais promovida por BETTY MIROCZNIK. A demanda foi
processada e julgada pela 13ª Vara do Foro Central Cível.
A r. sentença (fls. 219/222) julgou parcialmente
procedente a presente ação com destaque à seguinte fundamentação
acompanhada do dispositivo: “Ainda que o réu não seja o efetivo "anfitrião" dos
imóveis, como bem alega em sua contestação, é dele que o consumidor busca a prestação
de serviço, inclusive para que se evite fraudes e transtornos comuns ao se contratar
diretamente qualquer locação de curto prazo. Há, portanto, evidente relação de consumo
entre as partes, como aduzido no início, onde tanto os próprios anfitriões quanto a ré
respondem solidariamente por danos causados aos consumidores, nos termos do art. 18 do
Código de Defesa do Consumidor. A vista da prova produzida nos autos, patente a falha na
prestação do serviço, como a própria ré reconhece em sua conversa mantida com a parte
autora. Logo, os danos decorrentes da falha na prestação do serviço devem ser
indenizados. Com razão a autora no que tange ao pleito de reembolso do valor total da
locação, porquanto, afigurando-se inequívoca a falha na prestação do serviço, a
consumidora não usufruiu do imóvel nos termos contratados nos dias em que nele
permaneceu, não remanescendo dúvida de que durante este período o local estava em más
condições e tentou ela solucionar o problema, mas sem obter êxito, sendo obrigada a habitar

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local insalubre em país estrangeiro, causando-lhe sérios desconfortos físicos e frustações.


Entretanto, reputo que descabe o ressarcimento das diárias de hotéis, tendo em vista que,
constituiria bis in idem frente à determinação de reembolso do valor integral da locação. O
dano moral no caso em exame é presumido, pois decorre das próprias circunstâncias em
que os fatos ocorrem, ou seja, os fatos por si só são suficientes para demonstrara lesão aos
atributos inerentes aos direitos de personalidade. Os autores foram surpreendidos de
madrugada com o imóvel sem os itens de acomodação necessários e que motivaram a
própria escolha da residência. Sem contar o descaso com a limpeza do local e a falta de
dedetização. Basta, no caso, a demonstração do estado, não absolutamente corriqueiro, de
aborrecimento, desassossego, frustração ou desconforto, gerador de transtornos em
decorrência de ato ilícito ou de conduta reveladora de nexo causal com o resultado lesivo
para que nasça o direito a indenização pelo dano extrapatrimonial. (...) Posto isso, JULGO
PARCIALMENTE PROCEDENTE para condenar a requerida a: 1) indenização material de
R$ 7.418,51, que deverá ser atualizado monetariamente e acrescido de juros a contar do
evento danoso; 2) indenização moral de R$ 10.000,00, com incidência de correção
monetária desde o ajuizamento e de juros de mora de 1% ao mês desde a data da sentença.
Condeno, ainda, a ré ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, os
quais arbitro em 20% sobre o valor atualizado da condenação.”

A ré ofertou apelação (fls. 231/262). Em resumo, sustentou:


(a) nulidade da sentença por ausência de congruência entre a
fundamentação e os fatos, (b) ilegitimidade passiva da ré AIRBNB, que não
adotou nenhuma conduta lesiva (essa dizia respeito a terceiro), (c) ausência
de responsabilidade pelas condições da acomodação, uma vez que não era
proprietária de nenhuma das acomodações anunciadas, mas somente
disponibilizava a plataforma digital para realização dos contratos entre as
pessoas (físicas) interessadas, (d) ausência de conduta irregular da
apelante ou falha na prestação de serviços, até porque não possuía
qualquer relação com o sucesso ou insucesso do quanto ajustado entre
hóspede a anfitrião, (e) os problemas relatados não eram graves e
deveriam ser de conhecimento da autora, uma vez que o anúncio
disponibilizado foi claro e didático, além do que poderiam ser facilmente
resolvidos pela simples limpeza na acomodação, (f) considerando-se que o
cancelamento se deu no dia do "check in", as noites restantes não eram
reembolsáveis, porém ainda assim a ré fez a devolução das taxas de
serviço, (g) inexistência de danos materiais, (h) inexistência de danos morais
e excesso do valor da indenização e (i) exagero no arbitramento dos
honorários advocatícios. Ao final, o apelante deduziu pedidos de anulação
da r. sentença ou de sua reforma com sua improcedência e,
sucessivamente, redução dos valores da condenação.
A autora ofertou recurso adesivo (fls. 269/291). Em síntese,
articulou os seguintes fundamentos: (i) pertinência da majoração do valor da
indenização dos danos morais em patamar de vinte salários mínimos (R$
20.900,00), diante da humilhação experimentada e (ii) necessidade do
reembolso dos valores da tradução juramenta acostada aos autos (fl.45) no
valor de R$ 530,00. Ao final, o apelante deduziu pedido de reforma da r.
sentença para sua total procedência.

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As partes apresentaram contrarrazões (fls. 294/324 e


329/345) reiterando os pedidos dos recursos.
Não houve oposição ao julgamento em sessão virtual.

É O RELATÓRIO.

Recurso formalmente em ordem, devidamente processado,


tempestivo e com análise do preparo (fls. 292/293).

PASSO A EXAMINAR OS RECURSOS.

1. Nulidade da sentença
A r. sentença de primeiro grau apresentou
fundamentação suficiente.
O equívoco apontado nas razões recursais não
comprometeu a validade da decisão de primeiro grau. Evidentemente,
houve rejeição da matéria relativa à condição da ação (legitimidade da
parte), mesmo que tenha incidido no equívoco da descrição fática.
Isto é, quando a decisão de primeiro grau ingressou na
análise do mérito, o fez por entender presentes os pressupostos
processuais e as condições da ação.
E fundamentação sucinta, por si só, não traduzia ausência
de motivação da r. sentença. Reconheceu-se a possibilidade da discussão
da responsabilidade civil da ré, a partir da aplicação do Código de Defesa do
Consumidor. Era o bastante.
A fundamentação sucinta, concisa e objetiva não traduz
ausência de fundamentação. Oportuno registrar que a decisão de primeiro
grau apresenta razão suficiente para conclusão adotada, a partir da
interpretação do contrato e da lei. As razões do recurso apontam, na
verdade, insatisfação com o conteúdo da r. Sentença.

E, como já decidiu esta Turma julgadora, a "fundamentação


concisa que não implica em vulneração ao preceito do artigo 93, inciso IX, da CF e
do artigo 11 do Novo C.P.C." (Apelação Cível nº 0003682-03.2013.8.26.0100,
relator o Desembargador JACOB VALENTE, julgado em 07/02/2018).

Concluindo-se, rejeita-se a alegação de nulidade da r.


sentença.
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2. Legitimidade passiva
Na petição inicial, a autora descreveu fundamentação que
estabeleceu uma relação de responsabilidade da ré por falhas na prestação
de serviços no anúncio e intermediação de hospedagem. Identificou uma
relação jurídica controvertida com formulação de pedido (lógico e adequado)
de indenização.
Era o bastante para aplicação da teoria da asserção e
reconhecimento da presença daquela condição da ação. Neste sentido,
confira-se precedente desta Turma julgadora: Apelação Cível nº
1003506-88.2018.8.26.0663, relator Desembargador TASSO DUARTE DE
MELO, julgado em 04/11/2020. Evidente a discussão sobre a
responsabilidade da ré diz respeito ao próprio mérito da ação.
E sobre o tema discutido no processo e envolvendo , confira-
se precedente deste Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação Cível nº
1002296-11.2019.8.26.0196, 34ª Câmara de Direito Privado, relator o
Desembargador TÉRCIO PIRES, julgado em 28/06/2021.
Igualmente, rejeita-se alegação de inépcia da petição inicial.
A autora trouxe para os autos documentos pertinentes à fundamentação
articulada. A força probatória deles também diz respeito à própria análise do
mérito.
Concluindo-se, reconheço a legitimidade passiva da ré e
a aptidão da petição inicial.

3. Responsabilidade da ré
Na petição inicial, a autora afirmou que reservou pela
plataforma ré um imóvel localizado na cidade de Londres, para o período de
08/12/2019 a 21/12/2019, no valor de U$ 1.993,89 (mil, novecentos e
noventa e três dólares e oitenta e nove cents). Entretanto, ao chegar no
referido local, enfrentou os seguintes problemas: (a) dificuldade para
encontrar a chave e adentrar no imóvel, (b) indicações do anúncio
absolutamente inverídicas, (c) no interior do banheiro, as toalhas estavam
apodrecendo (com odor insuportável), (d) inexistência de "wifi", o que
dificultou inclusive seu acesso à plataforma e buscar uma solução, (e) por
não conseguir ficar na acomodação contratada, foi recebida na casa de
estranhos (donos de um café), (f) logo no primeiro contato com o anfitrião,
ele bloqueou seu contato, o que inviabilizou a sua tentativa de devolução
dos valores, (g) foi induzida em erro por um preposto da ré que, entre as
ligações e mensagens, orientou a autora a cancelar a reserva e ter o
reembolso da quantia, mas que terminou por ser efetivado apenas
parcialmente (11% do total).

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Em sua defesa (fls. 63/95), a ré ocupou-se mais da


qualificação jurídica do contrato estabelecido entre as partes. Sobre os fatos
mencionados pela autora, destacou-se o seguinte (fl. 75): "58. Ora, veja que os
problemas narrados pela parte autora seriam FACILMENTE resolvidos com uma limpeza na
acomodação. 59. Contudo, a parte autora entendeu por bem simplesmente deixar a
acomodação. Em razão disso, a ré enviou diversas opções de acomodações, além de um
cupom de desconto: (...) 62. Dessa forma, tendo em vista que o cancelamento fora feito no
dia do check in, as noites restantes NÃO SÃO REEMBOLSÁVEIS!! 63. Ora, veja que tal
medida é necessária, posto que o Anfitrião teria problemas em encontrar um hóspede para
sua acomodação em tão pouco tempo, de forma que este não poderia ter prejuízos por um
cancelamento de seu hóspede."

E, na análise dos fatos controvertidos, tem-se que a ré não


impugnou a alegação de que a autora encontrou o imóvel com um banheiro
em estado inadequado de uso.
E chamou atenção a fotografia trazida pela autora (fl. 05):

Essa prova documental diz muito sobre as condições


encontradas pela autora. Ora, quando se faz uma reserva de hospedagem,
o mínimo que se espera para utilização do imóvel é que tenha as condições
de higiene ofertadas.
A imagem anterior não se aproximava àquilo que constava
do anúncio veiculado no AIRBNB (fl. 03):

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Para além desse fato grave, a autora ainda encontrou


dificuldades para: (1) encontrar a chave do imóvel e (2) entrar em contato
com o anfitrião. Esses fatos não restaram impugnados de forma convincente
e também reforçavam inadequação no cumprimento da oferta e da
desconformidade da intermediação da hospedagem.
Mas não é só.
Algumas colocações da defesa e do recurso chamam
atenção, porque não condizentes com a maciça publicidade do AIRBNB e
às informações inseridas no próprio site da plataforma.
O AIRBNB busca atrair o público consumidor com duas
palavras: SEGURANÇA e CONFIANÇA.
É isso que consta na internet:

As imagens dizem muito!


A segurança deve propiciar o contato fácil, dinâmico e fluído
entre consumidor, anfitrião e AIRBNB. A segurança deve ainda viabilizar
inexistência de risco à saúde, notadamente nas condições de higiene e
limpeza do local da hospedagem.

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É justamente a confiança que desperta no consumidor a


legítima expectativa de ver atendidas todas circunstâncias do anúncio.
Isto é, de que aquilo que se apresenta como realidade no interior de um
imóvel não seja diferente da oferta.
Se o AIRBNB tem como pilares a segurança e a confiança,
não pode, quando acionado judicialmente por violação das ofertas, dizer
que "toda relação é construída diretamente entre os membros da
comunidade" (item "38" da contestação, fl. 70).
No caso concreto, na qualidade de prestadora do serviço –
como ela fez questão de frisar no recurso (de aproximação) – caberia-lhe
resolver os problemas surgidos. Fez muito pouco para isso, apesar de uma
promessa (no site) de 24 horas de atendimento. Limitou-se a acolher a
palavra do anfitrião de que o imóvel não apresentava aquela grave condição
de saúde (odor insuportável a partir das toalhas usadas e úmidas jogadas
no banheiro) com inadequação para uso. Não trouxe para os autos qualquer
fotografia capaz de desmentir a versão da autora.
A empresa ré fomenta no mercado de consumo uma rede
extensa e mundial de hospedagem. Uma atividade empresarial baseada
numa estratégia de marketing agressiva e que busca propagar a ideia de
que a reserva de um imóvel pelo AIRBNB é confiável.
Ora, ao estabelecer a confiança como fundamento da
relação – consumidor x AIRBNB x anfitrião – deve-se ter em conta uma
verdadeira parceria entre os dois últimos elementos.
Tanto assim que busca orientar os anfitriões sobre
procedimentos de limpeza (https://www.airbnb.com.br/resources/hosting-
homes/t/cleanliness-16):

O panorama apresentado não deixa dúvidas sobre a


existência da relação de consumo.

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A ré AIRBNB oferta, via plataforma, o serviço de


hospedagem por meio de uma triangulação entre o consumidor e aquilo que
denomina "anfitrião". Não se trata de simples atividade de intermediação,
porque se busca construir um atrativo ao consumidor para confiar e
acreditar que a hospedagem se efetiva conforme prometido e de acordo
com padrões de segurança, conforto e qualidade.
Sendo assim, quando o anfitrião descumpre sua oferta, tem-
se a responsabilidade solidária do AIRBNB, até como forma de fazê-lo
cumprir a informação por ele veiculada (confiança), na forma dos artigos 6º,
inciso II e 30, ambos do CDC.
A atividade do AIRBNB vai muito além de uma
"corretagem" ou "intermediação" de hospedagem. De um lado, ao
anfitrião afirma: "AJUDAREMOS VOCÊ A DESCOBRIR A ARTE DE
HOSPEDAR" (https://www.airbnb.com.br/host/homes). E de outro lado, ao
consumidor afirma: "AONDE QUER QUE VOCÊ VÁ, ESTAMOS AQUI
PARA AJUDAR" (https://www.airbnb.com.br/d/howairbnbworks) e "O QUE
TORNA TUDO ISSO POSSÍVEL: CONFIANÇA"
(https://www.airbnb.com.br/trust).
E o AIRBNB cria uma verdadeira parceria (união de
esforços) com o anfitrião em que os dois funcionam como fornecedores, no
mercado de consumo. Essa cadeia de consumo tem como finalidade a
disponibilização de hospedagem.
Sobre o tema, elucida CLÁUDIA LIMA MARQUES (in
"Contratos no Código de Defesa do Consumidor", 5ª edição, São Paulo,
editora Revista dos Tribunais, 2002, página 401), in verbis:
“Nas relações de consumo respondem solidariamente todos os
fornecedores de produtos e serviços vinculados por meio de uma
cadeia dirigida exatamente ao fornecimento de um bem ou
serviço: 'A cadeia de fornecimento' um fenômeno econômico de
organização do modo de produção e distribuição, do modo de
fornecimento de serviços complexos, envolvendo grande número
de atores que unem esforços e atividades para uma finalidade
comum, qual seja, a de poder oferecer no mercado produtos e
serviços para os consumidores”.

E, no caso concreto, o serviço foi prestado de maneira


inadequada. Não houve cumprimento da oferta, pois o local estava muito
diferente do anúncio na questão da limpeza do banheiro e, logicamente, não
resolvida com uma "simples limpeza" (deveria ser anterior à chegada da
autora). Também não possuía wifi. E, além disso, a ré prestou um ineficiente
serviço de atendimento, ao deixar de oferecer para autora uma solução ao
problema encontrado.
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Diversamente do que afirmado na defesa e no recurso,


não permanecer no local da hospedagem não foi uma opção, mas uma
imposição. Se ela não logrou contato com o anfitrião, não podia apenas
tolerar o odor e a impossibilidade de não usar o banheiro. Restou a ela
(autora) buscar uma alternativa e sem contar com apoio do serviço (24
horas).
A respeito do tema, já se posicionou este Egrégio Tribunal
de Justiça, Apelação Cível 1009888-93.2017.8.26.0320, 30ª Câmara de
Direito Privado, Relator o Desembargador LINO MACHADO, julgado em
25/07/2018, destacando-se da fundamentação:
“Não há dúvida de que o nome Airbnb é conhecido mundialmente
e que, em geral, os usuários relatam que o serviço prestado é de
qualidade. Sua marca não seria tão buscada pelos consumidores
se, de fato, o serviço não fosse de grande confiança. Todavia,
isso, por si só, não garante que o serviço será sempre cem por
cento perfeito. Não é crível que uma empresa desse porte
acredite prestar um serviço infalível, uma vez que em seu próprio
sítio na internet afirma que "2 milhões de pessoas se hospedam
em acomodações no Airbnb em 65.000 cidades do mundo inteiro.
Você pode escolher dentre mais de 4 milhões de anúncios em
191 países - isso é mais do que as cinco principais redes de
hotéis juntas" (Disponível em https://www.airbnb.com.br/trust.
Acesso em: 12.06.2018, 15h16min).
Ainda que o Airbnb não seja o efetivo anfitrião ou locador dos
imóveis oferecidos, é dessa empresa que o consumidor busca a
prestação do serviço que lhe garanta uma hospedagem tranquila,
no local ali divulgado, pelo preço previamente ajustado, e com a
garantia da empresa de que o consumidor não está sendo vítima
de uma fraude ao aceitar se hospedar em um imóvel indicado na
plataforma. Logo, a Airbnb responde, sim, por eventuais danos
causados aos consumidores, incumbindo a ela, querendo, e se for
o caso, buscar eventual reparação de danos causados por atos
praticados por terceiros. O serviço é cobrado, uma vez que a ré
fica com parte do valor pago. É ela quem intermédia todo o
pagamento e faz o repasse ao anfitrião.”

Na mesma direção, confiram-se precedentes deste Tribunal


de Justiça de São Paulo, destacando-se as partes pertinentes das ementas:
"Apelação cível turismo ação indenizatória por danos morais
check-in inviabilizado noite de réveillon em dependências de
delegacia de polícia reserva em palco outro via manejo do site da
demandada, o que permeado por utilização de cartão de crédito
hospedagem da mesma sorte frustrada - indisponibilidade para a
data desordem administrativa - resultado, na origem, de
procedência inconformismo da requerida fundado em ilegitimidade
passiva e culpa exclusiva das hospedagens inconsistência estadia
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contratada através do site AIRBNB assunção, pela


intermediadora, de responsabilidade pela viabilização do cômodo,
e, consequentemente, em caso de defeito, pela reparação dos
danos experimentados cadeia de fornecedores exegese dos
artigos 7º, parágrafo único, e 25, §1º, ambos do Código de Defesa
do Consumidor – (...)." (Apelação Cível nº
1002296-11.2019.8.26.0196, 34ª Câmara de Direito
Privado, relator o Desembargador TÉRCIO PIRES,
julgado em 28/06/2021)
"Ação indenizatória. Prestação de serviços de hospedagem.
Viagem para o exterior. Confirmação da reserva pela plataforma
eletrônica AIRBNB. Autora que ao chegar no local da
hospedagem toma conhecimento da existência de terceiros no
imóvel. Cancelamento da reserva, com oferecimento de voucher
de R$160,22 pelo Requerido. Dano moral configurado em razão
dos transtornos experimentados pela Autora com a busca de nova
acomodação em país estrangeiro. (...)" (Apelação Cível nº
1030614-64.2020.8.26.0100, 36ª Câmara de Direito
Privado, relator o Desembargador PEDRO BACCARAT,
julgado em 18/02/2021)
"Consumidor e processual. Turismo. Ação de indenização por
danos materiais e morais julgada procedente. Pretensão à
reforma integral ou parcial da sentença manifestada pela ré. A
plataforma digital responsável pela locação do imóvel (AIRBNB)
deve responder pelos prejuízos decorrentes do cancelamento da
hospedagem pelo anfitrião, não podendo transferir a este a
responsabilidade indenizatória. Danos materiais comprovados,
oriundos da locação de outros imóveis, do cancelamento de
passagens de avião e de trem (não reembolsáveis) e da compra
de novas passagens aéreas e ferroviárias. Situação vivenciada
pelos demandantes que não pode ser classificada como mero
aborrecimento do cotidiano, gerando, sim, danos morais. (...)."
(Apelação Cível nº 1034070-36.2018.8.26.0506, 19ª
Câmara de Direito Privado, relator o Desembargador
MOURÃO NETO, julgado em 31/03/2020)
"Apelação Prestação de serviços Airbnb Hospedagem em Nova
Iorque contratada com seis meses de antecedência
Cancelamento noticiado poucos dias antes da data programada
para a viagem, por desistência do anfitrião Ação indenizatória
Sentença de rejeição dos pedidos Irresignação parcialmente
procedente - Decisão de primeiro grau reformada, para
acolhimento parcial de ambos os pedidos Responsabilidades
pelas verbas da sucumbência distribuídas em proporção. Relação
de consumo Independentemente da polêmica doutrinária e
jurisprudencial em torno da natureza jurídica da relação travada
entre o contratante dos serviços (hóspede) e o designado
Apelação Cível nº 1030225-79.2020.8.26.0100 -Voto nº 801 12
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anfitrião, se de hospedagem ou de locação por temporada, é


indubitável que o vínculo disso oriundo para com a plataforma de
serviços, seja frente ao hóspede, seja em face do anfitrião,
caracteriza típica relação de consumo, à luz do que dispõem os
arts. 2º e 3º do CDC. Responsabilidade civil da plataforma de
serviços Mercado de compartilhamento. Atividade empresarial em
exame para cujo êxito é indispensável que plataformas de serviço
como a ré construam e preservem a respectiva reputação nesse
mercado, já que a confiança no serviço é algo de fundamental
importância para que o indivíduo se disponha a compartilhar o
que é seu com estranhos ou a compartilhar o uso de bem ou
serviço pertencente a desconhecido. Ré que, nessas condições,
não atua como mera intermediadora entre o interessado na
hospedagem e o anfitrião, tanto porque não se limita a aproximar
os interessados, mas, muito além disso, estabelece as regras
contratuais que disciplinarão a relação entre aqueles
personagens, recebe os pagamentos e os retém até que tenha
efetivo início a hospedagem, anuncia previamente e impõe
penalidades aos contratantes faltosos etc. Por onde se conclui
que a plataforma de serviços ré se apresenta e é vista pela massa
consumidora como garante das relações travadas em função da
correspondente intermediação. Atividade empresarial essa que,
ao mesmo tempo que lhe gera polpuda remuneração, também
impõe riscos ao fornecedor, entre os quais, justamente, o que é
tratado nestes autos, oriundo do cancelamento unilateral da
hospedagem por parte do anfitrião. Donde a plena incidência da
chamada teoria da responsabilidade pelo risco da atividade,
expressa no art. 927, parágrafo único, do CC. Plataforma de
serviços ré que, de toda sorte, responderia por promessa de fato
de terceiro não realizado, nos exatos termos do art. 439 do CC,
sem que se pudesse cogitar da escusa prevista no art. 440 do
mesmo estatuto, quer por não demonstrada a ratificação da
obrigação pelo terceiro, quer porque a eventual desistência do
negócio, pelo terceiro, se inseriria no risco da atividade
empresarial da demandada. Consequente responsabilidade civil
da ré pelo ocorrido, pouco importando os motivos invocados pelos
participantes da relação para o respectivo inadimplemento.
Conforme ainda o microssistema consumerista, é inválida e de
nenhum efeito a cláusula que intente atenuar a responsabilidade
do fornecedor de serviços em situações tais (CDC, art. 51, I).
Danos materiais Diferença entre o que os autores pagaram pela
hospedagem contratada (que lhes foi restituído) e o que gastaram
com hospedagem em hotel. Verba sem sombra de dúvida devida,
como indenização por danos materiais. Danos materiais Diferença
entre o valor pago pelos autores, em dólares americanos, e o que
lhes foi restituído pela ré, em moeda nacional, em função do
cancelamento unilateral da hospedagem, mediante aplicação da
variação cambial verificada entre a data do pagamento e da data
da restituição. Pretensão não comportando acolhida, por infringir
Apelação Cível nº 1030225-79.2020.8.26.0100 -Voto nº 801 13
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o chamado princípio nominalista, expresso no art. 315 do CC, não


encontrar respaldo no contrato celebrado entre os litigantes, e
extrapolar o dano experimentado pelos autores. Hipótese em que,
a partir do princípio da “restitutio in integrum”, adequado teria sido
pleitear que a restituição tomasse por base o que os autores
pagaram para saldar a fatura do cartão de crédito, em que, aí sim,
estava embutida a variação cambial verificada desde o momento
da operação até a data da emissão da fatura. Danos morais
Episódio em questão do qual adveio aos autores sofrimento
significativo, em medida que extrapola os aborrecimentos do
cotidiano e que, assim, merece proteção jurídica. Com efeito,
afora a indiscutível frustração, os apelantes certamente
enfrentaram enorme estresse para, às pressas, pesquisar e obter
nova hospedagem, além do desconforto da hospedagem de
quatro pessoas num quarto de hotel, de tamanho bastante inferior
ao do imóvel antes contratado, por quinze dias. Dano moral que
se reconhece, arbitrada a correspondente indenização em R$
10.000,00, para cada um dos quatro autores, sobretudo à luz da
técnica do desestímulo. Deram parcial provimento à apelação."
(Apelação Cível nº 1101154-11.2018.8.26.0100 , 19ª
Câmara de Direito Privado, relator o Desembargador
RICARDO PESSOA DE MELLO BELLI, julgado em
09/09/2019)

Concluindo-se, reconhece-se a responsabilidade da


empresa apelante pelo inadimplemento do contrato e pelo evento
danoso.

3. Extensão das perdas e danos


3.1. Danos materiais
Conforme bem elucidado pelo douto Juízo de primeiro
grau, era devido o reembolso no que tange o valor total da locação. A
autora, diante da falha na prestação de serviço, não usufruiu do imóvel nos
termos e datas contratados. Durante o período em que permaneceu na
cidade, a autora viu-se compelida a reservar quarto em hotel para se
hospedar, conforme recibo acostado aos autos (fl. 42).
Também deverá a ré arcar com o valor desembolsado pela
autora no serviço de tradução juramentada de documentos, no importe de
R$ 530,00 (fls. 27, 43 e 45). As despesas foram efetuadas visando a
efetivação do exercício do direito de ação e assumiram natureza de
despesas processuais. Na mesma linha, confiram-se: (i) Apelação Cível nº
1012185-94.2015.8.26.0562, 38ª Câmara de Direito Privado, Relator

Apelação Cível nº 1030225-79.2020.8.26.0100 -Voto nº 801 14


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o Desembargador FERNANDO SASTRE REDONDO, julgado em


27/01/2016 e (ii) Apelação Cível nº 0027187-68.2008.8.26.0562, 14ª
Câmara de Direito Privado, Relator o Desembargador MAURÍCIO PESSOA,
julgado em 23/09/2015.
Assim, mantenho a condenação de indenização material
no valor de R$ 7.418,51. E, determino o ressarcimento do valor
desembolsado com a tradução juramentada dos documentos no valor
de R$ 530,00 (fl. 45). A correção monetária será calculada pelos índices
adotados no TJSP, a partir de cada desembolso). Diversamente do que
sustentado pela autora, a r. sentença determinou incorretamente a
incidência dos juros de mora a partir do evento danoso. Isso porque havia
uma relação contratual entre as partes (Apelação nº 1029218-
94.2016.8.26.0002, 14ª Câmara de Direito Privado, relatora a
Desembargadora LÍGIA ARAÚJO BISOGNI, julgado em 21/10/2016).
Sendo assim, acolhe-se, neste ponto, o recurso da ré.

3.2. Danos morais


A autora relatou que “ao adentrar ao imóvel, a Autora teve a
desagradável surpresa de se deparar com o carpete absolutamente imundo e
empoeirado e sem condições de permanência, sendo que o odor no imóvel era
insuportável. Frise-se que a Autora tem rinite alérgica severa, e a permanência no
local ocasionaria uma crise aguda de alergia. Não menos importante, ao chegar no
quarto, a Autora se deparou com roupas sujas e fétidas jogadas pelo cômodo. A
Autora, em estado de choque, encontrou as roupas de camas com manchas e
absolutamente inapropriadas para uso. Desesperada, a Autora lançou seu olhar
para o banheiro do imóvel e, qual não foi sua surpresa, toalhas apodrecendo, e
com odor insuportável, estavam abandonadas no banheiro do imóvel” (fl. 05).
Ademais, acostou fotos desde o momento da chegada, na tentativa
embaraçada de encontrar a chave de entrada e dos ambientes da
residência (fls. 04/05 e 30/31).
Restou bem demonstrado que de fato a hospedagem não foi
adequada à expectativa do consumidor e nos termos contratados. O local
estava em más condições e insalubre, o que causaria sério desconforto à
autora (consumidora). A autora enviou para ré a prova documental da
ocorrência relatada (fls. 32/41).
Incumbia a ré verificar o que aconteceu e adotar
prontamente as atitudes cabíveis. Contudo, a autora ficou sem o auxílio
devido por aproximadamente 05 dias e recebeu apenas um pequeno
reembolso equivalente a 11% do valor da hospedagem (fls. 44/48).
Passo a apreciar o valor fixado.

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Nas felizes palavras do saudoso Ministro SÁLVIO DE


FIGUEIREDO TEIXEIRA, Resp. 248764/MG, 4ª Turma do Superior Tribunal
de Justiça, julgado 09/05/2000, DJ 07/8/2000, recomenda-se na fixação da
indenização por dano moral que:
"o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao
grau de culpa, ao nível sócio econômico da parte autor e, a porte
econômico da ré, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos
pela doutrina e pela jurisprudência, atento à realidade da vida e às
peculiaridades de cada caso."

Oportuno registrar que também a fixação da indenização por


danos morais deve guardar relação com a harmonização dos interesses dos
sujeitos da relação de consumo – consumidor e fornecedor – de forma a
concretizar o princípio explicitado no inciso III do artigo 4º do Código de
Defesa do Consumidor. É preciso identificar, dentro da razoabilidade e
proporcionalidade, quantia capaz de gerar equilíbrio entre as partes.
Nessa linha de pensamento, porque adequada aos
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, mantenho o valor
da indenização em R$ 10.000,00 (dez mil reais). A função compensatória
estará bem atendida, porque a autora disporá de quantia capaz de
neutralizar os negativos efeitos da negativa experiência. E não há razão
para elevação da quantia, como solicitado no recurso adesivo da autora. E
servirá de alerta para ré, estimulando-a no investimento de um atendimento
mais eficiente ao consumidor, que vá além de um marketing digital
agressivo. É preciso atentar-se para ofertas descumpridas. E não há razão
para diminuição do valor, como solicitado na apelação da ré.
Todavia, o recurso da ré é parcialmente acolhido para
modificar os termos iniciais da correção monetária e dos juros de
mora. A correção monetária deverá ser computada, a partir da sentença
(data de fixação da indenização), na forma da súmula nº 362 do Superior
Tribunal de Justiça. Os juros de mora de 1% ao mês incidirão a partir da
citação, porque contratual a relação jurídica. Inaplicável a data do evento
danoso, uma vez que não verificada situação extracontratual – logo, não
cabível incidência da súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça.

Concluindo-se, os recursos das partes são parcialmente


acolhidos.

DISPOSITIVO.

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Ante o exposto, pelo meu voto, DOU


PROVIMENTO PARCIAL aos recursos da autora (adesivo) e
da ré e reformo a r. sentença nos seguintes termos:
(a) ampliar a reparação dos danos materiais,
incluindo-se as despesas com tradução juramentada no
importe de R$ 530,00 (quinhentos e trinta reais),
(b) fixar na reparação dos danos materiais a
incidência de juros de mora de 1% ao mês (a partir da
citação) e de correção monetária (calculada pelos índices
adotados pelo TJSP, a partir de cada desembolso) e
(c) fixar na reparação dos danos morais juros
de mora de 1% ao mês (a partir da citação) e de correção
monetária (calculada pelos índices adotados pelo TJSP, a
partir da sentença, 06/07/2020).
Em razão da aplicação da súmula 326 do Superior
Tribunal de Justiça, fica mantida intacta aquela distribuição das
verbas de sucumbência efetivada em primeiro grau. Não há
espaço para modificação, elevação ou redução, mesmo
considerados os resultados dos recurso. A ré sucumbiu na quase
totalidade dos pedidos.

Alexandre David Malfatti


Relator

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