PROFa. INESSA CARRASCO AS ORIGENS DO CONTO Estudar um determinado gênero é também buscar entender suas raízes, como faremos neste item. A origem do conto advém da transmissão oral dos fatos, no ato de contar histórias, que antecede a escrita e nos remete a tempos remotos. O ato de narrar um acontecimento oralmente evoluiu para o registro escrito dessa narrativa. E o narrador também evoluiu de um simples contador de histórias para a figura de um narrador preocupado com aspectos criativos e estéticos. É no início da Idade Moderna que o conto se consolida como literatura. The Secret Gard, finding the door, por Su Blackwell Três livros são considerados os precursores do gênero: As mil e uma noites, Canterbury Tales, de Chaucer, e O Decamerão, de Giovanni Bocaccio. Esses títulos apareceram no Ocidente, no século XIV, e disseminaram-se pelo mundo nos séculos XVI e XVIII. Um momento de grande desenvolvimento do conto foi o século XIX, devido à acentuada expansão da imprensa que facilitou a publicação dos textos. Algumas características comuns acabaram por agrupar as várias formas de narrar e isso aproximou o conto de um gênero literário. Birds of The Open Forest, por Su Blackwell O novo gênero foi identificado pela primeira vez nos EUA, por volta de 1880 ,e designado Short Story. Posteriormente, o conto evoluiu de sua forma tradicional, na qual a ação e o conflito passam pelo desenvolvimento até o desfecho, com crise e resolução final, para as formas modernas de narrar, na qual a estrutura se fragmenta e subverte tal esquema. Edgar Allan Poe, Guy de Maupassant e Anton Tchekóv, são alguns dos contistas clássicos que mais influenciaram as formas modernas do conto. The 12 Dancing Princesses, por Su Blackwell QUANDO O ASSUNTO É CONTO... Como também ocorre com quase todos os gêneros literários, não há consenso absoluto sobre suas características, estrutura, funcionamento, etc. O esquema abaixo, com a ideia central do que importantes escritores e pesquisadores da literatura pensam a respeito do tema, serve apenas como proposta de discussão para as leituras de contos da nossa disciplina. Não há, portanto, a função de “doutriná-los” sobre as concepções de gênero aqui apresentadas. The Lake and the Boat, por Su Blackwell Edgar Allan Poe (1809 – 1849), o primeiro teórico do gênero: “Temos necessidade de uma literatura curta, concentrada, penetrante, concisa, ao invés de extensa, verbosa, pormenorizada... É um sinal dos tempos... A indicação de uma época na qual o homem é forçado a escolher o curto, o condensado, o resumido, em lugar do volumoso”. [...] "No conto breve, o autor é capaz de realizar a plenitude de sua intenção, seja ela qual for. Durante a hora de leitura atenta, a alma do leitor está sob o controle do escritor. Não há nenhuma influência externa ou extrínseca que resulte de cansaço ou interrupção”. Hope, por Su Blackwell Mário de Andrade (1893-1945), em Contos e Contistas (1938): “[...] em verdade, sempre será conto aquilo que seu autor batizou com o nome de conto...". Uma definição, aliás, bastante radical..., concordam? Alfredo Bosi, em História Concisa da Literatura Brasileira: "O conto cumpre a seu modo o destino da ficção contemporânea. Posto entre as exigências da narração realista, os apelos da fantasia e as seduções do jogo verbal, ele tem assumido formas de surpreendente variedade. Ora é quase-documento folclórico, ora quase- crônica da vida urbana, ora quase-drama do cotidiano burguês, ora quase-poema do imaginário às voltas, ora, enfim, grafia brilhante e preciosa voltada às festas da linguagem." Out of Narnia, por Su Blackwell Em seu livro O Conto Brasileiro Contemporâneo , Bosi afirma sobre o caráter múltiplo do conto: "[...] já desnorteou mais de um teórico da literatura ansioso por encaixar a forma no interior de um quadro fixo de gênero. Na verdade, se comparada à novela e ao romance, a narrativa curta condensa e potencia no seu espaço todas as possibilidades da ficção.” Afrânio Coutinho: "O contista oferece uma amostra através de um episódio, um T
The Baron in the Trees, (details) por Su
Blackwell While You Were Sleeping, por Su Blackwell flagrante, ou um instantâneo, um momento singular e representativo.” Ricardo Piglia: o narrador, no conto, deve revelar muito pouco dos fatos, deixando os mais importantes apenas subentendidos. O contista sempre narra duas histórias, uma história visível (a ponta do iceberg) e uma secreta (o imenso corpo submerso do iceberg)*, narrada de forma elíptica e fragmentária.
* A teoria usando um iceberg como metáfora
para explicar o conto foi inicialmente criada por Ernest Hemingway. Edensor, Derbyshire, A Guide to, por Su Blackwell Nelson de Oliveira explica que, segundo Piglia, o “ponto alto” do gênero conto reside em entrelaçar ambas as histórias, de maneira que só no desenlace seja revelada, de modo surpreendente, a história que se construiu abaixo da superfície na qual a primeira veio se desenrolando Machado de Assis: "O tamanho não faz mal a esse gênero de histórias, é naturalmente a sua qualidade”. Júlio Cortázar: "Um conto é significativo quando quebra seus próprios limites com essa explosão de energia espiritual que ilumina bruscamente algo que vai muito além da pequena e às vezes miserável história que conta (...) o tempo e o espaço do conto têm de estar como Sem título, por Su Backwell The book of the lost, por Su Blackwell que condensados, submetidos a uma alta pressão espiritual e formal para provocar essa 'abertura'“. Podemos sintetizar suas características, segundo Cortázar, em três expressões: velocidade, nocaute e concisão ─ termos sempre citados quando o tema é o conto moderno. O autor aponta ainda para uma noção desse gênero, marcada pela precisão e brevidade, estruturada numa linguagem sintética – contida, com muita economia de palavras. Nesse tipo de narrativa, importa mais a profundidade (intensidade) temática do que a quantidade de palavras. Para ele, o conto está para a fotografia como o romance está para o The Castle, por Su Blackwell cinema. Seguindo a linha de raciocínio de Júlio Cortazar, quando ele compara o conto à fotografia, deduzimos que o conto se caracteriza por seu teor fragmentário, uma vez que capta o presente, o momentâneo, o instante temporário, sem antes e sem depois. No conto, o autor vence o leitor por nocaute, enquanto no romance a luta é vencida por pontos. A concisão é fundamental para se conseguir a unidade desse gênero. Em outras palavras, como na fotografia o conto necessita selecionar apenas e necessariamente o significativo. A tensão é uma forma diferente de imprimir intensidade à narrativa. Em vez de os fatos se The princess, por Su Blackwell desenrolarem de forma abrupta, o autor vai desvendando aos poucos o que conta, usa a técnica do suspense, adia a resolução da ação e instiga a curiosidade do leitor. Ítalo Moriconi: (2008), “o fato incontestável é que a partir dos anos 60 o conto passou por verdadeira explosão em nosso país, uma autêntica revolução de qualidade. A velocidade narrativa, a capacidade de nocautear o leitor com seu impacto dramático concentrado, lembrando aqui a definição de conto dada pelo mestre Julio Cortázar, fizeram do gênero o espaço literário mais adequado à tradução dos sentimentos profundos e das contradições que agitaram nossa alma basica- mente urbana no decorrer das últimas quatro décadas. Pelo menos quando o assunto é ficção curta, essas décadas dominam o século, tanto em quantidade quanto em qualidade.” Maria Luiza Abaurre, Maria Bernadete Abaurre e Marcela Pontara (2010): o conto é uma narrativa razoavelmente curta que apresenta os mesmos elementos do romance (narrador, personagem, enredo, espaço e tempo), estruturada em uma história focada num conflito básico e na resolução deste. Com tanta nomenclatura, em tão pouco espaço, há necessidade de um glossário, ainda que este não possa suprimir todas as dúvidas acerca do assunto. Sailing boat, por Su Blackwell GLOSSÁRIO Clímax: momento decisivo do enredo, em que se atinge o ponto máximo da tensão (conflito) e que traz ou anuncia o desfecho ou resolução do conflito. Conflito: relação mais ou menos tensa de luta entre personagens ou entre personagens e outra força, como a social, por exemplo; uma instabilidade entre estas forças, sob a forma de um desequilíbrio, que pode estar, por exemplo, numa situação de não correspondência amorosa ou num ato de injustiça social; o conflito pode ir aumentando até o seu ponto máximo, o clímax; resolve-se – ou se desfaz – no desenlace, e a este último segue-se uma parte final da narrativa, o epílogo. Beauty and the beast, por Su Blackwell Enredo: como a história, é contada; encadeamento dos episódios conforme eles aparecem organizados na narrativa; intriga, trama. Epílogo: parte final da narrativa, o que se narra depois do desfecho ou resolução do conflito. Desfecho: desenlace; resolução do conflito. Pode ser seguido de epílogo. História: o que se conta numa narrativa e que pode ser recontado, recompondo-se os fatos numa sequência cronológica, sem a preocupação de obedecer à ordem que tais acontecimentos ocupam na narrativa. Alice, por Su Blackwell Tensão: intensidade de força entre elementos de uma narrativa, que alimenta o conflito entre elementos, ou seja, que promove a situação de instabilidade numa narrativa, até a resolução do conflito ou o desfecho. Beauty and the Beast, por Su Blackwell Alice, por Su Blackwell BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ABAURRE, Maria Luiza M.; ABAURRE, Maria Bernadete M.; PONTARA, Marcela. Português: contexto, interlocução e sentido. V. 3. 1ª Ed. São Paulo: Ed. Moderna, 2010.
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SPALDING, Marcelo. O hibridismo formal da
micronarrativa, 2007. Disponível em: http://www.entrelinhas.unisinos.br/index.php?e=6 &s=9&a=39 Esculpidas, Cortadas, trituradas, as páginas dos livros ganham vida e configuram cenas de magia, contos de fadas, nos presenteando com sonhos. Conheça um pouco do trabalho da artista plástica Su Blackwell, criadora deas obras de arte, feitas com livros ou caixas de madeira, que ilustram este PPT . No caso dos livros, Su primeiro os lê para se inspirar e, na sequência, usando navalha e cola, produz miniaturas ricas em detalhes relacionadas à história do livro. Site oficial: The Snow Queen, por Su Blackwell http://www.sublackwell.co.uk/