Você está na página 1de 20

SENTIDOS NA FORMAÇÃO DO CURSO DE LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO

ANGÉLICA DE SOUZA LIMA


JULIANA DA SILVA NÓBREGA

PORTO VELHO-RO
2022
Introdução
OBJETIVOS
Geral
 Conhecer o cotidiano e os sentidos das trajetórias de estudantes do curso de Licenciatura em Educação do
Campo da Universidade Federal de Rondônia campus de Rolim de Moura.

Específicos
 Identificar as trajetórias de estudantes do curso de Licenciatura em Educação do Campo;
 conhecer o cotidiano de estudantes do curso de licenciatura;
 compreender os sentidos da entrada na universidade;
 conhecer sentidos da formação acadêmica em Educação do Campo.
 Universidade/PROCAD

 Construcionismo Social
EDUCAÇÃO DO CAMPO: DAS LUTAS ÀS POLÍTICAS
PÚBLICAS

 Educação do Campo;
 Processo histórico de desvalorização e inferiorização do campo;
 Campo, lugar de saberes, trocas e formação;
 Distanciamento das políticas públicas;
 Política Educacional;
 EFAS;
 Formação docente;
 Licenciatura em Educação do Campo.
A PESQUISA QUE RESISTE: RUMOS TEÓRICO-
METODOLÓGICOS EM TEMPOS DE PANDEMIA E
CORTES DE BOLSA
 As práticas discursivas e a produção de sentidos no cotidiano;
 Tempos Longo, Tempo Curto, Tempo Vivido;
 Campo-Tema
 Como aconteceu......
Diários de campo
Grupo Focal/ 15 estudantes
Entrevistas Narrativas/ 2 estudantes .
SAÍDAS, ACESSOS E PERMANÊNCIAS: ENTENDENDO
AS TRAJETÓRIAS DE VIDA E A PRODUÇÃO DE SI

 As duas mulheres camponesas;


 Acampamento;
 Histórias marcadas na luta pela permanência na terra;
 Trajetórias de vida e educacionais;
 Dandara (28 anos)
 Marielle (20 anos)
 Escola como possibilidade de alcançar algo que sempre fora negado aos trabalhadores do campo;

 Escola como espaço de participação e de organização da comunidade em relação a vida cotidiana e aos
enfrentamentos necessários;

 Escola como gramática para resistir aos despejos, a violência policial na luta por terra;

 Educação, Terra e Trabalho: relação necessária

 Escola lugar de afeto e posicionamento identitário

 Escola multisseriada.
Dandara: os primeiros anos escolares...
 Relação escola Comunidade  A mudança de escola
[...] eu lembro até hoje que a professora se ela “A escolinha em si era algo que a gente não queria que acabasse,
falasse com a turma inteira, ela não conseguiria, inclusive até hoje a gente ainda luta pra não acabar as escolas rurais
não tinha como falar né, que aí o outro ia escutar né, ultimamente nos governos tem tido muitos projetos pra acabar
e não ia entender, então era mais assim escrito lá com as escolas rurais e só terem escolas no urbano, mas assim,
e vinha já de aluno em aluno explicando coisas quando eu passei pra quinta série acho que eu não tinha muita noção,
muito, assim bem mãezona mesmo nossa eu levei um susto mesmo quando eu passei pra ter que estudar na rua
professora era. Tinha uma horta e a gente tinha e a noite ainda né, mas quando eu era pequena eu acho que eu não
horário pra ir, eram os alunos que cuidavam, tinha muita noção, foi tipo um susto por ter mudado os professores
aquela horta era pra alimentação da escola mesmo, né, porque você que estudou quatro anos com uma professora só ali,
era meio que um incentivo e tinha uma horinha quando você passa a ter mais professores acho que é sempre um
assim no terreno e a gente tinha que ir lá, plantar e susto, mas a gente nunca queria sair dali. Eu morava na sete a escola polo
aguar. Lá em volta da escolinha funcionava um foi construída na gleba quatro e aí todos os alunos daquelas 13 glebas se
bosquezinho porque a área social, da igreja essas
concentraram naquela escola polo, e aí ali na escola polo a gente fazia, aí
coisas eles reservaram um espaço que eles não
começou, acabou as escolinhas né, foram acabando as escolinhas de gleba
derrubaram e naquele espaço eles fizeram um
bosque por baixo e a gente, o que tinha de diferente
que a gente ia a pé, começa a passar o ônibus e a gente passou pra aquela
era que o recreio nosso era naquele bosque, pular escola polo” ( Dandara, 28 anos).
tábua essas coisas (Dandara, 28 anos).
Marielle: os primeiros anos escolares...

 Eu vou falar da minha trajetória da escola: eu  Aí depois, a gente mudou pra uma outra estrutura
comecei a estudar com seis anos em uma dentro do alojamento depois de um despejo, e
escolinha aqui dentro do acampamento onde após isso, a prefeitura fechou essa escola e os
eu morava. Era uma professora do alunos foram remanejados para a cidade, aí a
acampamento, que dava aula contratada pelo gente foi todo mundo pra cidade, e o município
município pros alunos dali de dentro mesmo. levava a gente pra lá eles vinham buscar e depois
Era multisseriada. Tinha duas, três turmas por traziam e estudava meio período, aí chegou nessa
sala. Ela dava aula pra duas séries ao mesmo escola eles mandaram a gente, porque foi no
meio do ano que isso aconteceu né, então a gente
tempo. Só que na época a gente era acampado
estudou o resto do ano nessa escola e depois a
né, então era tudo pertinho. Aí a escola era
gente foi, as mães foram escolher que escola a
dentro do acampamento mesmo que a gente
gente ia dentro do município, eu sei que eram três
estudava, aí nessa mesma escola tinha ciranda escolas, aí eu fui, saí dessa daí eu fui estudar
infantil que eram para os menores. E pra nós, a numa outra que era mais perto porque essa ficava
maioria estudava normal dentro das séries mais longe da onde a gente morava praticamente.
regulares (Marielle, 20 anos). (Marielle, 20 anos).

Dandara: Ensino Médio...
Eu levei um susto mesmo no ensino médio
quando eu passei pra ter que estudar na rua e a
noite ainda né? Mas eu lembro que eu não  Eu tive um período, no terceiro ano,
tinha outra opção, depois quando passou a ter que eu cuidava de dois filhos de uma
opção para o dia, eu já tinha pego o ritmo e a professora. Que eu era babá deles, mas
minha mãe até perguntou se eu queria e eu quando chegou mês de, nas férias, eu
disse ‘não, vou continuar a noite’ e continuei fiquei com muito medo de perder... já
estudando a noite., a gente já passava pro estava perdendo, minhas notas estavam
primeiro - aí tinha que ser na rua, e aí é o caindo e então eu parei (Dandara, 28
mesmo processo: o ônibus passava, deixava os anos).
alunos que estudavam... ali não tinha, tinha só
do pré ao oitavo ano. E aí acabou o oitavo,
tinha muita gente que os pais não deixavam  Trabalhava em casa mesmo com a
estudar na rua e não estudavam. O primeiro minha mãe. Na roça a gente colhe café,
ano, inclusive - que o primeiro ano que essas coisas de quem mora no sítio.
começava a passar o ônibus pra levar o [...]Nasci naquele mutirão vendo a
pessoal pra rua só tinha a noite - então tem minha mãe, os que estudavam cedo iam
colegas que estudaram comigo, ficou um ano (para roça). Os que estudavam à tarde,
parado porque os pais não deixavam estudar a às vezes iam pra roça ou então ficavam
noite. Ficaram parados até o município liberar em casa, e aí eu cresci nesse ritmo.
as aulas pra estudarem de dia porque lá Quando criei idade que já conseguia
também só era a noite, primeiro, segundo e fazer alguma coisa eu ia também
terceiro ano a noite (Dandara, 28 anos). (Dandara, 28 anos).
Mariele: Ensino Médio
 No ensino médio eu fui pra Escola Família Agrícola (EFA) no município de Novo Horizonte que forma pra
ser técnico em Agropecuária, era um internato, semi-internato, a gente ficava 15 dias lá e 15 dias em casa e
ao final de quatro anos de curso né que era o ensino médio os três anos e mais um ano que a gente estudou
que formava em técnico de agropecuária, aí o município levava a gente de van aí a gente ficava 15 dias lá e
depois eles iam e buscavam a gente depois de 15 dias. Assim, na EFA algumas pessoas aqui dentro do
acampamento já estudaram né na EFA, aí meus pais tiveram o interesse de me mandar pra lá. (Marielle, 20
anos).
A relação com os movimentos...

 O MST, assim, a gente entrou, como eu falei  Tipo é um monte de coisas, mas se você for
eu tinha três anos meus pais acamparam, nessa resumir assim não dá, não tem como perceber né,
época eu ainda não estudava mas a minha mãe o movimento em si ele mexe com bastante coisa
ela chegou a dar aula numa escola de você tá inserida nele assim tipo é muito sei lá,
acampamento e daí veio a educação com o emocionante porque o movimento sempre quis né
movimento [...] eu me considero parte, aqui eu a terra pra quem mora nela e trabalha né e
cultiva, então isso sempre ficou bem claro pra
faço parte da coordenação do movimento do
nós, que a terra é pra produzir se a gente
MST, a gente tem um grupo da coordenação e
conquistou alguma coisa, é mais princípios gerais
eu faço parte dele, lá eu lembro que eu ia né, de vida assim que a gente leva o que é certo o
muito com a minha mãe e o meu pai porque que é errado. Assim desde que eu me entendo por
sempre fazem as mobilizações, a gente já ficou gente eu já participei entendeu? Então tá na
concentrado dois meses aí em Porto Velho no minha vida assim enquanto eu vou me formando
Incra eu sempre como a mamãe eu ia [...] foi tendo cada vez mais isso, mas ao mesmo
(Dandara, 28 anos). tempo já participo há muito tempo entendeu?
(Marielle, 20 anos).
Entre a escola e a universidade..

 Eu quanto terminei o ensino médio eu estava com 17, né? Aí


fiz 18 em dezembro e aí, virei 2010 grávida. E aí, caiu por  E aí com o filho pequeno e trabalhando como que estuda
terra todo aquele plano. Mas até então, antes eu não entendia, né? E aí assim, eu trabalhava pra manter minha mãe,
eu pensava assim: ‘nossa caiu por terra agora estudar. Não meu filho e eu. Era esse o ritmo, entendeu? Meu irmão
tem mais como’. Mas, hoje em dia eu enxergo assim que é
também trabalhava e nós dividíamos as despesas. Graças
meio que destino. É Deus, alguma força do além que me
puxou pra um outro caminho e depois eu voltei, porque o
a Deus a gente tinha a casa própria, né, então dividíamos
momento que eu engravido já tinha um namoro de dois anos as despesas. Eu, com filho pra criar, não tinha outra
e aí, esse namorado disse: ‘eu não estou preparado pra ser coisa pra pensar (Dandara, 28 anos).
pai’. E aí, um pouquinho mais pro fundo do poço, porque eu
já estava um pouquinho grávida, um pouquinho mais pro
fundo e aí, a minha mãe resolve assim comigo e meu irmão,  Nesse período, que eu fiquei dois anos e nove meses lá,
meu irmão já com 21 e eu com 18, só nós três no sítio. Como aí consegui fazer algumas coisas, eu fiz a habilitação.
ela separou do meu pai, ele pegou a parte dele e foi embora e Assim, a vida é muito sofrida de quem trabalha no
a gente ficou com a parte da gente. E a minha mãe decide mercado, principalmente no (Supermercado) Irmãos
então, assim: ‘não dá pra nós vivermos aqui’. Eu grávida Gonçalves, mas eu agradeço porque consegui alguma
ainda e ela teve a decisão da gente mudar pra cidade, a gente
coisa: fiz curso de computação, comprei minha moto, fiz
mudou pra Ouro Preto. E aí, nós fomos pra cidade deixamos
a terra lá. Deixamos a terra quietinha e fomos pra cidade, a minha habilitação e aí, chegou um tempo, eu peguei e
ficamos na cidade por cinco anos (Dandara, 28 anos). falei ‘bom eu quero sair’ e dei um tempinho e fui
mandada embora (Dandara, 28 anos).
ALTERNANDO EFEITOS DE PRODUÇÃO DA
COMUNIDADE E DA UNIVERSIDADE

“ Ele é um chaveiro com o símbolo da Unir que pra mim é um orgulho fazer faculdade em uma universidade federal né, nunca
imaginei na minha vida entrar em uma universidade federal, sempre quando a gente termina o terceiro ano sendo pobre, a gente
imagina trabalhar e pagar, quando eu passei nesse vestibular eu entrei no vestibular muito desacreditada e por isso que eu carrego
ele com maior orgulho, então ele significa muito, as amizades  e orgulho de ser Unir, eu gosto de estar, nós temos a camiseta
também eu poderia ter pego uma camiseta e eu fico me achando por fazer faculdade na federal, então significa mais ou menos isso,
as amizades e o orgulho de ser federal”
 Pedagogia da alternância

 Mulheres

 juventude

 questão da diversidade sexual


 Universidade passa a ser habitada por pessoas que nunca puderam estar ali. Produzem-se
socialidades e materialidades que abrem frestas de respiro na racionalidade hegemônica e
colonial da ciência;
 Produção de conhecimento que coloca luz nos processos vividos na marginalidade do
mundo rural camponês: luta social, memória dos povos tradicionais, cultura, história,
linguagem, conhecimento sobre ciclos naturais, sobre plantas e ervas medicinais, formas
de manejo agroecológico, economias populares, gênero e diversidade sexual, racismo e a
questão agrária, entre outros temas (PIBICs, TCCs)
 Conhecimento que, pela alternância, retorna as comunidades de forma incisiva;
 Demanda da universidade o aprofundamento das políticas afirmativas de ingresso e de
permanência de grupos minoritários;
Considerações Finais

 LEDOC.

 Resgate histórico.

 Posicionamento identitário.

 Fortalecimento no sentido das lutas


para inferiorização do campo.

 Importância da universidade – produzir conhecimento.

 A psicologia.
Camponeses e Camponesas na Universidade
“Pelo menos a gente está reconhecendo que a gente é camponês né? Que a partir de quando nós
chegamos aqui as pessoas tinham até vergonha de dizer. Os professores até perguntavam
“porque você tem vergonha de falar que você mora na roça, de falar que você é camponesa?”
Então, muita das vezes, as pessoas escondem sua própria identidade, e nós chegamos aqui e nós
abrimos o horizonte de conhecimento, que você não deve se esconder a sua origem, da onde
você veio. Então, esse curso dar assim bem  aprofundado, a gente está vendo bastante
conhecimento, a gente tem que dar valor aquilo que a gente aprendeu com os pais, com os avós
estão se perdendo e nesse curso a gente tá resgatando essas origens da família dos camponeses,
então assim, está sendo muito maravilhoso” (grupo focal- Lucas 20 aos)
REFERÊNCIAS
 AMBONI, Vanderlei. Educação e Escola no MST. RTPS-Revista Trabalho, Política e Sociedade, v. 5, n. 9, p. 721-742, 2020.
 ANTUNES, Mitsuko Aparecida Makino. Psicologia Escolar e Educacional: história, compromissos e perspectivas. Psicologia
Escolar e Educacional, v. 12, n. 2, p. 469-475, 2008.
 BARCELLOS, Luís Henrique dos Santos. A Ciranda Infantil e as crianças Sem Terrinha: educação e vida em movimento.
2020.
 BEAUVOIR, Simone. O segundo sexo. Nova Fronteira, 2014.
 BORTOLETO, Edivaldo José; DOS SANTOS BERNARDI, Luci Teresinha Marchiori; PELINSON, Nadia Cristina Picinini. A
Educação do Campo enquanto um horizonte para o desenvolvimento de um modelo de economia. Polêm! ca, v. 17, n. 1, p.
054-072, 2017.
 BONI, V.; QUARESMA, S. J. Aprendendo a entrevistar: como fazer entrevistas em Ciências Sociais. Santa Catarina: Em Tese,
2005.
 BRANDÃO, C. R.; BORGES, M.C. A pesquisa participante: um momento da educação popular. Revista Educação Popular,
v. 6, p. 51-62, jan/ dez. 2007.
 BRASIL. Referências para uma Política Nacional de Educação do Campo: caderno de subsídios. Brasília: Ministério da
Educação, 2003.

  
“Que nós todos, tomemos um tal gosto pela liberdade, um tal
gosto pela presença no mundo, pela pergunta, pela criatividade,
pela ação, pela denúncia, pelo anúncio que jamais seja possível
no Brasil a gente voltar aquela experiência do pesar do silêncio
sobre nós (PAULO FREIRE).

Você também pode gostar