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FICHA

INFORMATIVA
N. 6
o
Ficha informativa n.o 6
Cantigas de escárnio e maldizer
 
1. Dimensão satírica – paródia do amor cortês
 
De facto, a convocação modalizada de um universo feminino numa
composição satírica implica quase sempre o que alguns autores denominam por
escárnios de amor. […] Como o indica a designação, trata-se de composições em
que se procede a uma inversão dos códigos de amor cortês herdados da fin’amors
provençal, parodiando ironicamente a cantiga de amor e ridicularizando os
principais tópicos deste género da lírica trovadoresca: a superioridade da senhor; o
respeito que por ela sente o trovador; o elogio da sua beleza, do seu prez ou da sua
dignidade moral, com particular destaque para as suas qualidades intelectuais
(bem falar), e o comprazimento do amor como meio de ascese […]. Desta forma, a
cantiga de escárnio e maldizer surge-nos aqui como um contratexto ou
contragénero da cantiga de amor, o que é bem visível em cantigas como […] a
famosa de João Garcia de Guilhade «Ai, dona fea, fostes-vos queixar».
João Pedro da Costa, «O desejo tornado poema», in Revista da Faculdade de Letras,
Porto XIX, 2002, pp. 605-606
Ficha informativa n.o 6
2. Dimensão satírica – crítica de costumes
 
As cantigas de escárnio e maldizer […] têm por assunto, na sua grande maioria,
certos aspetos particulares da vida de corte e especialmente da boémia jogralesca.
A sua leitura revela-nos, além do resto, uma sociedade boémia em que entravam
jograis de corte, cantadeiras, soldadeiras (bailarinas), fidalgos. […]
Raro se encontram nas cantigas de escárnio temas de alcance geral. Mas, nos
muitos casos anedóticos a que se referem, distinguem-se certos costumes
frequentes, condicionados pelo ambiente. Toda uma massa de composições espelha
os problemas típicos da vida jogralesca. Numerosas cantigas, por exemplo, ocupam-
se da sovinice dos ricos-homens, da miséria envergonhada dos «infanções»: à
escassez das classes nobres são, naturalmente, muito sensíveis os jograis que, em
paga do seu trabalho artístico, pedem roupas ou alimento. […]
Ficha informativa n.o 6

2. Dimensão satírica – crítica de costumes

Em muitos casos o gosto, por assim dizer naturalista, da anedota vivida ou


testemunhada prevalece mesmo sobre a intenção trocista. E assim perpassam,
já só por si interessantes, o velho que desesperadamente se pinta e enroupa
muito caro; a rapariga que a mãe antes ensina a sarcotear-se do que a coser e
fiar; um cavalo faminto abandonado […], mas que se refaz com erva fresca
depois das chuvas.

António José Saraiva e Óscar Lopes, op. cit., pp. 65-66

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