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Capítulo 8

Memória do dia a dia e erros de memória


Algumas perguntas que vamos considerar

• Que tipo de eventos de nossas vidas temos mais probabilidade de lembrar?


• Existe algo especial sobre a memória para eventos extraordinários como os
ataques terroristas de 11 de setembro?
• Quais propriedades do sistema de memória a tornam altamente funcional e
também sujeita a erros?
• Por que o testemunho ocular é frequentemente citado como a causa de
convicções errôneas?
• Por que alguém confessaria um crime que não cometeu?
Memória autobiográfica
• Memória para experiências específicas de nossa vida, que podem incluir
componentes episódicos e semânticos
• Viagem mental no tempo
• Multidimensional
– Componentes espaciais, emocionais e que envolvem pensamentos
Memória autobiográfica (1 de 4)

• Componentes sensoriais
• Greenberg e Rubin (2003)
– Pacientes que perderam a capacidade de reconhecer ou visualizar
objetos, devido a lesões na área visual do córtex, podem experimentar
perda de memória autobiográfica
– A experiência visual desempenha um papel importante na memória
autobiográfica
Memória autobiográfica (2 de 4)

• Cabeza e colaboradores (2004)


– Estudo de varredura cerebral que ilustra a
diferença entre a memória autobiográfica e a
memória de laboratório
– Participantes observados
 Fotos tiradas pelo participante (fotos próprias)
 Fotos tiradas por outra pessoa (fotos de
laboratório)
Figura 8.1 Fotografias do experimento feito por
Cabeza e colaboradores (2004). As fotos próprias
foram tiradas pelo participante; as fotos de laboratório
foram feitas por outra pessoa.
Memória autobiográfica (3 de 4)

• Ambos os tipos de fotos ativaram muitas das mesmas estruturas no


cérebro
– Lobo temporal medial (LTM) (memória episódica)
– Córtex parietal (processamento de cenas)
• As fotos próprias provocaram mais ativação no
– Córtex pré-frontal (informações sobre o eu)
– Hipocampo (recordações)
• Reflete a riqueza de vivenciar memórias autobiográficas
Memória autobiográfica (4 de 4)
Figura 8.2 (a) resposta de fMRI de uma área no
córtex parietal mostrando o curso do tempo e a
amplitude da resposta causada por fotos próprias
(em amarelo) e fotos de laboratório (em azul) no
teste de memória. O gráfico à direita indica que a
ativação é a mesma para as fotos próprias e fotos
de laboratório. A resposta às fotos próprias é maior
no (b) córtex pré-frontal e (c) no hipocampo.
Memória ao longo da vida

• Quais eventos específicos da vida lembraremos anos mais tarde?


– Marcos pessoais
– Eventos altamente emocionais
Saliência da reminiscência (1 de 5)

• Participantes com mais de 40 anos são solicitados a lembrar eventos em


suas vidas
• A memória é melhor para eventos recentes e para eventos que ocorrem
entre as idades de cerca de 10 e 30
Saliência da reminiscência (2 de 5)

Figura 8.3 Porcentagem das memórias de diferentes idades relembradas por


uma pessoa de 55 anos, mostrando a saliência da reminiscência, que ocorre para
eventos experimentados entre cerca de 10 e 30 anos de idade (linhas tracejadas).
Explicações para a saliência da reminiscência

EXPLICAÇÃO CARACTERÍSTICA BÁSICA


Autoimagem Período ao assumir a autoimagem da pessoa
Cognitiva A codificação é melhor durante períodos de
mudança rápida
Roteiro de vida cultural Recordação da estrutura das expectativas
culturalmente compartilhadas
Saliência da reminiscência (3 de 5)

• Hipótese da autoimagem
– A memória é aprimorada para eventos que ocorrem quando a autoimagem
de uma pessoa ou identidade de vida está sendo formada
– As pessoas trazem consigo inúmeros eventos memoráveis, a maioria dos
quais acontece durante a adolescência ou início da idade adulta
 Muitas afirmações ocorreram entre 10 e 30 anos
• Hipótese cognitiva
– Períodos de mudança rápida que são seguidos por estabilidade causam
codificação mais forte das memórias
– Pessoas que emigraram para os Estados Unidos aproximadamente aos
20 ou 30 anos de idade evidenciam que a saliência da reminiscência deve
ocorrer mais tarde
Saliência da reminiscência (4 de 5)

Figura 8.4 A saliência da reminiscência para pessoas que emigraram aos


34 ou 35 anos mudou para idades mais avançadas, em comparação com a
saliência para pessoas que emigraram entre 20 e 24 anos de idade.
Saliência da reminiscência (5 de 5)

• Hipótese do roteiro da vida cultural


• Cada pessoa tem
– História de vida pessoal
– Eventos culturalmente esperados que ocorrem em um determinado
momento da vida
• Os eventos na história de vida de uma pessoa se tornam mais fáceis de
lembrar quando se encaixam no roteiro da vida cultural para a cultura
dessa pessoa
Memória para eventos “excepcionais”
• As emoções são frequentemente associadas a
eventos “especiais” ou eventos vividos por muitas
pessoas simultaneamente
• As emoções estão associadas a melhor memória
• Atividade cerebral na amígdala
• Tendência de direcionar a atenção para uma
arma durante um crime
Figura 8.7 (a) A recordação para imagens emocionais é
melhor do que para imagens neutras quando os participantes
são expostos a estresse. (b) Não há diferença significativa
entre a recordação emocional e neutra na situação sem
estresse. Esse resultado foi relacionado à consolidação
aprimorada da memória para as imagens emocionais.
Memórias em flash (1 de 5)

• Memória de uma pessoa para as circunstâncias que envolvem eventos


chocantes e altamente carregados
– Ataques terroristas de 11 de setembro
– Assassinato de Kennedy
– Explosão do ônibus espacial Challenger
• Onde você estava e o que estava fazendo
• Elas ocorrem em circunstâncias altamente emocionais, mas são
lembradas por longos períodos de tempo e são especialmente vívidas e
detalhadas
Memórias em flash (2 de 5)

• Memórias em flash não são


como fotografias
• As memórias das pessoas
sobre como ouviram sobre
eventos em flash mudam com o
tempo
Figure 8.8 Neisser e Harsch
(1992) estudaram as memórias
das pessoas no dia em que
ouviram sobre a explosão do
ônibus espacial Challenger.
Memórias em flash (3 de 5)

• Neisser e Harsch (1992); Talarico e Rubin (2003)


• Recordação repetida
– Descrição inicial: parâmetro
– Memórias posteriores comparadas com o parâmetro
• Uma das principais descobertas das pesquisas sobre memórias em flash
é que, muitas vezes, elas são imprecisas ou necessitam de detalhes
– Embora as pessoas relatem que as memórias em torno dos eventos em
flash são especialmente vívidas
Memórias em flash (4 de 5)

Figura 8.9 Resultados do experimento de memória em flash feito por Talarico e


Rubin (2003): (a) detalhes lembrados; (b) classificações de vivacidade; e (c)
crença na exatidão. Os detalhes lembrados diminuíram tanto para memórias em
flash como do dia a dia. A crença na precisão e vivacidade também diminuiu para
as memórias do dia a dia, mas permaneceu alta para as memórias em flash.
Memórias em flash (5 de 5)

• Hipótese do ensaio narrativo


– Ver/ouvir repetidas vezes obre o evento
 TV, jornal, rádio, conversar com outras pessoas
 Pode introduzir erros na própria memória
A natureza construtiva da memória (1 de 2)

• Memória = construída com base no que realmente aconteceu, além de


fatores adicionais, como conhecimento, experiências e expectativas da
pessoa
A natureza construtiva da memória (2 de 2)

• Experimento “Guerra dos Fantasmas” de Bartlett


– Os participantes tentaram lembrar de um conto de uma cultura diferente
da sua
– Reprodução repetida
• Resultados
– Mais tarde, após a leitura do conto, as reproduções da maioria dos
participantes eram mais curtas do que a inicial e continham muitas
omissões e imprecisões
– No entanto, o que foi mais significativo sobre os contos lembrados é que
eles tendiam a refletir a própria cultura do participante
Monitoramento da fonte (1 de 3)

• Monitoramento da fonte: processo de determinar as origens das nossas


memórias
• Erro de monitoramento da fonte: identificação incorreta da fonte de uma
memória
– Também chamado de “atribuição incorreta de fontes”
• Criptomnésia: plágio inconsciente do trabalho de outros
Monitoramento da fonte (2 de 3)

• Jacoby e colaboradores (1989)


• Após 24 horas, alguns nomes não famosos foram erroneamente
identificados como famosos
• Explicação: alguns nomes não famosos eram familiares, e os
participantes atribuíram erroneamente a fonte de familiaridade
– Falha ao identificar a fonte de uma lista lida no dia anterior
Monitoramento da fonte (3 de 3)

Figura 8.10 Projeto do experimento “Becoming Famous Overnight” de


Jacoby et al. (1989).
O efeito da verdade ilusória

• Maior probabilidade de avaliar uma afirmação como verdadeira após


apresentação repetida
• Ocorre devido à fluência ou familiaridade com as informações
• Relacionado ao efeito da publicidade
– Ambos são causados pela repetição
Fazendo inferências

• Os relatos sobre a memória podem ser influenciados por inferências que


as pessoas fazem com base em suas experiências e conhecimento
• Inferências pragmáticas: baseadas no conhecimento obtido por meio da
experiência
– Ocorre quando a leitura de uma frase leva uma pessoa a esperar algo que
não está explicitamente declarado ou implícito pela frase
Esquemas e roteiros (1 de 2)

• Esquema: conhecimento de uma pessoa sobre algum aspecto do


ambiente
– Por exemplo, fazer um depósito no banco, ir a um jogo de futebol ou ouvir
palestras em uma sala de aula aula
• Roteiro: concepção da sequência de ações que geralmente ocorre
durante uma experiência particular
– Ir a um restaurant, jogar tênis
Esquemas e roteiros (2 de 2)

• Esquemas e roteiros influenciam a memória


– A memória pode incluir informações que não foram experenciadas, mas
que foram inferidas, que se encaixam em um esquema
– No teste de memória, embora não houvesse livros no escritório, 30% dos
participantes relataram ter visto livros
– A natureza construtiva da memória pode levar a erros ou “falsas
memórias”
Construção de memórias (1 de 2)

• Vantagens
– Ajuda a “preencher os espaços em branco”
– A cognição é criativa
 Entender a linguagem
 Resolver problemas
 Tomar decisões
Construção de memórias (2 de 2)

• Desvantagens
– Às vezes, cometemos erros
– À s vezes, atribuímos erroneamente a fonte da informação
 Isso foi apresentado ou nós o inferimos?
Efeito da desinformação (1 de 5)

• Efeito da desinformação: informações enganosas apresentadas após


uma pessoa testemunhar um evento podem mudar como ela descreve o
evento mais tarde
– Informações Enganosas Pós-Eventos (IEP)
Efeito da desinformação (2 de 5)
• Loftus e colaboradores (1978)
– Os participantes viam uma série de slides em que um carro para em um sinal para parar e
então vira a esquina e atropela um pedestre
– Grupo IEP: sinal de preferência
– Os participantes viam as fotos da apresentação de slides e algumas fotos que eles nunca
tinham visto. Aqueles no grupo IEP tinham mais probabilidade de afirmar que tinham visto a
foto do carro parado no sinal dê preferência (que, na verdade, eles nunca tinham visto) do que
os participantes que não haviam sido expostos a IEP
• Loftus e Palmer (1974)
– Participantes ouviram a palavra “colidiram” ou “bateram” na descrição de um acidente de carro
– Mesmo que os dois grupos tenham visto o mesmo evento, a velocidade média estimada pelos
participantes que ouviram a palavra “colidiram” era de 10 quilômetros por hora, enquanto as
estimativas dos participantes que ouviram “bateram” eram em média 54 quilômetros por hora
Efeito da desinformação (3 de 5)

Figura 8.12 Os participantes do experimento de Loftus e Palmer (1974) viram um


filme de um acidente de carro, com cenas semelhantes à imagem mostrada aqui,
e foram então perguntados sobre o acidente.
Efeito da desinformação (4 de 5)

• Erro de monitoramento de fonte


– Falha ao distinguir a fonte da informação
– MPI é atribuído erroneamente à fonte original
• Lindsay (1990)
– Os participantes ouviram uma história; dois dias depois, voltaram ao laboratório
para um teste de memória na apresentação de slides. Pouco antes do teste, eles
foram informados de que havia erros na história da narrativa que ouviram logo
após a apresentação de slides
– Deveriam ignorar as informações na história
– O mesmo narrador para ambas as histórias criou erros de monitoramento da
fonte
– A mudança de narrador (homem para mulher) não criou muitos erros
Efeito da desinformação (5 de 5)

Figura 8.13 Projeto experimental e resultados para o experimento feito por


Lindsay e colaboradores (1990).
Falsas memórias

• Hyman e colaboradores (1995)


– Os pais dos participantes fornecem informações sobre eventos que
aconteceram em sua infância
– Os participantes conversaram sobre essas experiências com um
pesquisador, que adicionou novos eventos
– Em uma segunda entrevista, o participante lembrou de eventos que
haviam acontecido
Erros de identificação de testemunhas oculares (1 de 8)

• Depoimento de alguém que testemunhou um crime


• O depoimento de testemunhas oculares é, aos olhos dos membros do
júri, uma fonte de evidências extremamente importante
– É fornecido por pessoas que estavam presentes na cena do crime e que
supõe-se que estejam fazendo o melhor possível para relatar com
precisão o que viram
• As descrições feitas por testemunhas muitas vezes não são muito precisas
– Erros de identificação
– Natureza construtiva da memória
Erros de identificação de testemunhas oculares (2 de 8)

• Wells e Bradfield (1998)


– Os participantes assistiam a uma fita de vídeo de segurança em que um
atirador estava visível por 8 segundos
– Eles foram solicitados a escolher o pistoleiro nas fotos
– Cada participante selecionava alguém que achava ser o pistoleiro, mesmo
que a foto dele não estivesse incluída no painel de fotos
Erros de identificação de testemunhas oculares (3 de 8)

• As emoções geralmente ficam intensas durante o cometimento de um


crime, e pode afetar o que a pessoa presta atenção e o que lembra mais
tarde
– Estreitamento da atenção
– Foco em armas
– Stanny e Johnson (2000)
Erros de identificação de testemunhas oculares (4 de 8)

Figura 8.15 Resultados do experimento de foco em armas de Stanny e


Johnson (2000). A presença de uma arma que foi disparada está associada
a uma diminuição da memória sobre o criminoso, a vítima e a arma.
Erros de identificação de testemunhas oculares (5 de 8)

• Erros devido à familiaridade


– Monitoramento da fonte
Figure 8.16 (a) Projeto do experimento de
Ross et al. (1994) sobre o efeito da
familiaridade no depoimento de uma
testemunha ocular. (b) Quando o ladrão real
não estava no painel de fotos, os
participantes no grupo experimental
identificaram erroneamente o professor
como o ladrão 60% das vezes. (c) Quando
o ladrão real estava no painel de fotos, o
professor foi identificado 18% das vezes.
Erros de identificação de testemunhas oculares (6 de 8)

• Erros devido a sugestões


– Sugestionabilidade
 Efeito da desinformação
– Feedback de confirmação
 Efeito de feedback pós-identificação
Erros de identificação de testemunhas oculares (7 de 8)

Figura 8.17 Projeto e resultados do experimento “Good, You Identified the Suspect”
de Wells e Bradfield (1998). O tipo de feedback do pesquisador influenciou a
segurança dos participantes durante a identificação, com o feedback de
confirmação resultando em maior segurança.
Erros de identificação de testemunhas oculares (8 de 8)

• Aumento na confiança devido ao feedback de confirmação após fazer


uma identificação de efeito de feedback pós-identificação
• As memórias se tornam mais suscetíveis a sugestões durante o
questionamento
Estratégias para melhorar a declaração de uma
testemunha ocular
• Informe a testemunha que o criminoso pode não estar na fila específica
que ela está vendo
• Utilize “materiais de reforço” que são semelhantes ao suspeito
• Use um administrador de alinhamento de suspeitos “cego” — alguém que não
sabe quem é o suspeito
• Melhore as técnicas de entrevista
– Entrevista cognitiva

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