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6.2. Da sucessão dos descendentes e a concorrência do cônjuge ou companheiro (art. 1.

829,
I, do CC)
➢ Análise do inciso I do art. 1.829 do Código Civil:
CC, art. 1.829, I: “A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em
concorrência com o cônjuge [OU COMPANHEIRO] sobrevivente, salvo se casado [OU SE VIVER
EM UNIÃO ESTÁVEL] este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da
separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão
parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.”

Regimes em que o cônjuge (ou Regimes de bens em que o cônjuge (ou


companheiro) concorre com os companheiro) não concorre
descendentes:

• Regime da participação final nos • Regime da separação obrigatória (art.


aquestos; 1.641, CC);
• Regime da separação convencional de • Regime da comunhão parcial de bens,
bens (decorrente de pacto não havendo bens particulares.
antenupcial); • Regime da Comunhão Universal de
• Regime da comunhão parcial de bens, bens.
havendo bens particulares.
Observações Gerais Importantes:
Obs.1: “Quando o cônjuge (ou companheiro) é meeiro, não é herdeiro; quando é
herdeiro, não é meeiro” (Cláudio Godoy).
Não confundir meação com herança (sucessão). Meação é instituto de Direito de
Família (vida); herança é instituto do Direito das Sucessões (morte).
Obs.2: Zeno Veloso afirma que é praticamente impossível que alguém casado ou
que viva em união estável pelo regime de comunhão parcial morra sem deixar
bens particulares (exemplos: roupas, celular, relógio).
Obs.3: No regime da comunhão parcial, havendo bens particulares, a
concorrência sucessória se dá em relação a quais bens?
Resposta: Na doutrina, existem três correntes:
1ª - Bens particulares, conforme Enunciado n. 270 da III JDC, em posição apoiada
por Zeno Veloso, Giselda Hironaka, José Fernando Simão, Mário Delgado, Rolf
Madaleno e Flávio Tartuce (posição majoritária).
2ª - Todos os bens (bens particulares e bens comuns): posição adotada por
Francisco Cahali, Maria Helena Diniz e Guilherme Calmon Nogueira da Gama.
3ª - Bens comuns: Maria Berenice Dias.
Enunciado n. 270 da III Jornada de Direito Civil: “O art. 1.829, inc. I, só assegura ao
cônjuge sobrevivente o direito de concorrência com os descendentes do autor da
herança quando casados no regime da separação convencional de bens ou, se
casados nos regimes da comunhão parcial ou participação final nos aquestos, o
falecido possuísse bens particulares, hipóteses em que a concorrência se restringe
a tais bens, devendo os bens comuns (meação) ser partilhados exclusivamente
entre os descendentes.”
CC, art. 1.641: “É obrigatório o regime da separação de bens no casamento: I - das
pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração
do casamento; II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos; III - de todos os que
dependerem, para casar, de suprimento judicial.”

• Qual é a posição do STJ?


➢ O STJ adotou, inicialmente, a 3ª corrente (REsp 1.117.563/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, em
2009):
“Direito das sucessões. Recurso especial. Inventário. De cujus que, após o falecimento de sua
esposa, com quem tivera uma filha, vivia, em união estável, há mais de trinta anos, com sua
companheira, sem contrair matrimônio. Incidência, quanto à vocação hereditária, da regra do art.
1.790 do CC/02. Alegação, pela filha, de que a regra é mais favorável para a convivente que a
norma do art. 1829, I, do CC/02, que incidiria caso o falecido e sua companheira tivessem se casado
pelo regime da comunhão parcial. Afirmação de que a Lei não pode privilegiar a união estável, em
detrimento do casamento. - O art. 1.790 do CC/02, que regula a sucessão do 'de cujus' que vivia em
comunhão parcial com sua companheira, estabelece que esta concorre com os filhos daquele na
herança, calculada sobre todo o patrimônio adquirido pelo falecido durante a convivência. - A regra
do art. 1.829, I, do CC/02, que seria aplicável caso a companheira tivesse se casado com o 'de
cujus' pelo regime da comunhão parcial de bens, tem interpretação muito controvertida na
doutrina, identificando-se três correntes de pensamento sobre a matéria: (i) a primeira, baseada
no Enunciado 270 das Jornadas de Direito Civil, estabelece que a sucessão do cônjuge, pela
comunhão parcial, somente se dá na hipótese em que o falecido tenha deixado bens particulares,
incidindo apenas sobre esses bens; (ii) a segunda, capitaneada por parte da doutrina, defende
que a sucessão na comunhão parcial também ocorre apenas se o 'de cujus' tiver deixado bens
particulares, mas incide sobre todo o patrimônio, sem distinção; (iii) a terceira defende que a
sucessão do cônjuge, na comunhão parcial, só ocorre se o falecido não tiver deixado bens
particulares.
Não é possível dizer, aprioristicamente e com as vistas voltadas apenas para as regras de
sucessão, que a união estável possa ser mais vantajosa em algumas hipóteses, porquanto o
casamento comporta inúmeros outros benefícios cuja mensuração é difícil. - É possível
encontrar, paralelamente às três linhas de interpretação do art. 1.829, I, do CC/02
defendidas pela doutrina, uma quarta linha de interpretação, que toma em consideração a
vontade manifestada no momento da celebração do casamento, como norte para a
interpretação das regras sucessórias. - Impositiva a análise do art. 1.829, I, do CC/02, dentro
do contexto do sistema jurídico, interpretando o dispositivo em harmonia com os demais
que enfeixam a temática, em atenta observância dos princípios e diretrizes teóricas que lhe
dão forma, marcadamente, a dignidade da pessoa humana, que se espraia, no plano da
livre manifestação da vontade humana, por meio da autonomia privada e da consequente
autor responsabilidade, bem como da confiança legítima, da qual brota a boa-fé; a
eticidade, por fim, vem complementar o sustentáculo principiológico que deve delinear os
contornos da norma jurídica. - Até o advento da Lei n.º 6.515/77 (Lei do Divórcio), vigeu no
Direito brasileiro, como regime legal de bens, o da comunhão universal, no qual o cônjuge
sobrevivente não concorre à herança, por já lhe ser conferida a meação sobre a totalidade
do patrimônio do casal; a partir da vigência da Lei do Divórcio, contudo, o regime legal de
bens no casamento passou a ser o da comunhão parcial, o que foi referendado pelo art.
1.640 do CC/02.
Preserva-se o regime da comunhão parcial de bens, de acordo com o postulado
da autodeterminação, ao contemplar o cônjuge sobrevivente com o direito à
meação, além da concorrência hereditária sobre os bens comuns, mesmo que
haja bens particulares, os quais, em qualquer hipótese, são partilhados apenas
entre os descendentes. Recurso especial improvido.” (STJ - REsp: 1.117.563/SP,
2009/0009726-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento:
17/12/2009, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/04/2010).

➢ Porém, o STJ pacificou o tema na Segunda Seção, adotando a 1ª corrente –


“Bens particulares” (REsp 1.368.123/SP, Rel. Min. Raul Araújo, 2015):
EMENTA: “RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. CÔNJUGE
SOBREVIVENTE. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. HERDEIRO
NECESSÁRIO. EXISTÊNCIA DE DESCENDENTES DO CÔNJUGE FALECIDO.
CONCORRÊNCIA. ACERVO HEREDITÁRIO. EXISTÊNCIA DE BENS PARTICULARES DO
DE CUJUS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.829, I, DO CÓDIGO CIVIL. VIOLAÇÃO AO
ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA.
Não se constata violação ao art. 535 do Código de Processo Civil quando a Corte
de origem dirime, fundamentadamente, todas as questões que lhe foram
submetidas. Havendo manifestação expressa acerca dos temas necessários à
integral solução da lide, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte, fica
afastada qualquer omissão, contradição ou obscuridade. 2. Nos termos do art.
1.829, I, do Código Civil de 2002, o cônjuge sobrevivente, casado no regime de
comunhão parcial de bens, concorrerá com os descendentes do cônjuge falecido
somente quando este tiver deixado bens particulares. 3. A referida concorrência
dar-se-á exclusivamente quanto aos bens particulares constantes do acervo
hereditário do de cujus. 4. Recurso especial provido.” (STJ - REsp: 1.368.123/SP,
2012/0103103-3, Relator: Ministro SIDNEI BENETI, Relator(a) p/ Acórdão Ministro
RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 22/04/2015, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de
Publicação: DJe 08/06/2015).
Obs.4: No regime da separação convencional de bens, há concorrência sucessória
do cônjuge (ou companheiro) em relação aos descendentes?
➢ Em um primeiro momento, o STJ entendeu que não. A separação obrigatória é gênero, que engloba
duas espécies:
• Separação legal;
• Separação convencional.
EMENTA: “Direito civil. Família e Sucessões. Recurso especial. Inventário e partilha. Cônjuge
sobrevivente casado pelo regime de separação convencional de bens, celebrado por meio de pacto
antenupcial por escritura pública. Interpretação do art. 1.829, I, do CC/02. Direito de concorrência
hereditária com descendentes do falecido. Não ocorrência. - Impositiva a análise do art. 1.829, I, do
CC/02, dentro do contexto do sistema jurídico, interpretando o dispositivo em harmonia com os
demais que enfeixam a temática, em atenta observância dos princípios e diretrizes teóricas que lhe dão
forma, marcadamente, a dignidade da pessoa humana, que se espraia, no plano da livre manifestação
da vontade humana, por meio da autonomia da vontade, da autonomia privada e da consequente
autoresponsabilidade, bem como da confiança legítima, da qual brota a boa-fé; a eticidade, por fim,
vem complementar o sustentáculo principiológico que deve delinear os contornos da norma jurídica. -
Até o advento da Lei n.º 6.515/77 (Lei do Divórcio), vigeu no Direito brasileiro, como regime legal de
bens, o da comunhão universal, no qual o cônjuge sobrevivente não concorre à herança, por já lhe ser
conferida a meação sobre a totalidade do patrimônio do casal; a partir da vigência da Lei do Divórcio,
contudo, o regime legal de bens no casamento passou a ser o da comunhão parcial, o que foi
referendado pelo art. 1.640 do CC/02. - Preserva-se o regime da comunhão parcial de bens, de acordo
com o postulado da autodeterminação, ao contemplar o cônjuge sobrevivente com o direito à meação,
além da concorrência hereditária sobre os bens comuns, mesmo que haja bens particulares, os quais,
- O regime de separação obrigatória de bens, previsto no art. 1.829, inc. I, do CC/02, é
gênero que congrega duas espécies: separação legal; separação convencional. Uma
decorre da lei e a outra da vontade das partes, e ambas obrigam os cônjuges, uma vez
estipulado o regime de separação de bens, à sua observância. - Não remanesce, para o
cônjuge casado mediante separação de bens, direito à meação, tampouco à concorrência
sucessória, respeitando-se o regime de bens estipulado, que obriga as partes na vida e na
morte. Nos dois casos, portanto, o cônjuge sobrevivente não é herdeiro necessário. -
Entendimento em sentido diverso, suscitaria clara antinomia entre os arts. 1.829, inc. I, e
1.687, do CC/02, o que geraria uma quebra da unidade sistemática da lei codificada, e
provocaria a morte do regime de separação de bens. Por isso, deve prevalecer a
interpretação que conjuga e torna complementares os citados dispositivos. - No processo
analisado, a situação fática vivenciada pelo casal - declarada desde já a insuscetibilidade de
seu reexame nesta via recursal - é a seguinte: (i) não houve longa convivência, mas um
casamento que durou meses, mais especificamente, 10 meses; (ii) quando desse segundo
casamento, o autor da herança já havia formado todo seu patrimônio e padecia de doença
incapacitante; (iii) os nubentes escolheram voluntariamente casar pelo regime da
separação convencional, optando, por meio de pacto antenupcial lavrado em escritura
pública, pela incomunicabilidade de todos os bens adquiridos antes e depois do casamento,
inclusive frutos e rendimentos
A ampla liberdade advinda da possibilidade de pactuação quanto ao regime matrimonial de bens, prevista pelo
Direito Patrimonial de Família, não pode ser toldada pela imposição fleumática do Direito das Sucessões, porque o
fenômeno sucessório traduz a continuação da personalidade do morto pela projeção jurídica dos arranjos
patrimoniais feitos em vida. - Trata-se, pois, de um ato de liberdade conjuntamente exercido, ao qual o fenômeno
sucessório não pode estabelecer limitações. - Se o casal firmou pacto no sentido de não ter patrimônio comum e, se
não requereu a alteração do regime estipulado, não houve doação de um cônjuge ao outro durante o casamento,
tampouco foi deixado testamento ou legado para o cônjuge sobrevivente, quando seria livre e lícita qualquer dessas
providências, não deve o intérprete da lei alçar o cônjuge sobrevivente à condição de herdeiro necessário,
concorrendo com os descendentes, sob pena de clara violação ao regime de bens pactuado. - Haveria,
induvidosamente, em tais situações, a alteração do regime matrimonial de bens post mortem, ou seja, com o fim do
casamento pela morte de um dos cônjuges, seria alterado o regime de separação convencional de bens pactuado
em vida, permitindo ao cônjuge sobrevivente o recebimento de bens de exclusiva propriedade do autor da herança,
patrimônio ao qual recusou, quando do pacto antenupcial, por vontade própria. - Por fim, cumpre invocar a boa-fé
objetiva, como exigência de lealdade e honestidade na conduta das partes, no sentido de que o cônjuge
sobrevivente, após manifestar de forma livre e lícita a sua vontade, não pode dela se esquivar e, por conseguinte,
arvorar-se em direito do qual solenemente declinou, ao estipular, no processo de habilitação para o casamento,
conjuntamente com o autor da herança, o regime de separação convencional de bens, em pacto antenupcial por
escritura pública. - O princípio da exclusividade, que rege a vida do casal e veda a interferência de terceiros ou do
próprio Estado nas opções feitas licitamente quanto aos aspectos patrimoniais e extrapatrimoniais da vida familiar,
robustece a única interpretação viável do art. 1.829, inc. I, do CC/02, em consonância com o art. 1.687 do mesmo
código, que assegura os efeitos práticos do regime de bens licitamente escolhido, bem como preserva a autonomia
privada guindada pela eticidade. Recurso especial provido. Pedido cautelar incidental julgado prejudicado.” (STJ -
REsp: 992.749 - MS 2007/0229597-9, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 01/12/2009, T3 -
TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/02/2010 RSTJ, vol. 217, p. 820)
EMENTA: “CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. CÔNJUGE. HERDEIRO NECESSÁRIO.
ART. 1.845 DO CC. REGIME DE SEPARAÇÃO CONVENCIONAL DE BENS.
CONCORRÊNCIA COM DESCENDENTE. POSSIBILIDADE. ART. 1.829, I, DO CC. 1. O
cônjuge, qualquer que seja o regime de bens adotado pelo casal, é herdeiro
necessário (art. 1.845 do Código Civil). 2. No regime de separação convencional
de bens, o cônjuge sobrevivente concorre com os descendentes do falecido. A lei
afasta a concorrência apenas quanto ao regime da separação legal de bens
prevista no art. 1.641 do Código Civil. Interpretação do art. 1.829, I, do Código
Civil. 3. Recurso especial desprovido.” (STJ - REsp: 1.382.170 SP 2013/0131197-
7, Relator: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 22/04/2015, S2 -
SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 26/05/2015).
Decisão Importante do STF:
Se a pessoa maior de 70 anos se casar ou iniciar união estável, em princípio, o
regime de bens será o regime da separação obrigatória, nos termos do art.
1.641, II, do CC; se as partes quiserem, poderão fazer uma escritura pública
afastando essa regra e escolhendo outro regime
O julgado trata sobre o regime obrigatório de separação de bens para pessoas
maiores de 70 anos.
• NOÇÕES GERAIS SOBRE O ART. 1.641, II, DO CC (REGIME OBRIGATÓRIO DE
SEPARAÇÃO DE BENS PARA MAIORES DE 70 ANOS)
Imagine a seguinte situação hipotética:
João, 71 anos de idade, decidiu se casar com Andressa.
Dez anos depois, Andressa pediu o divórcio.
Andressa requereu a partilha dos bens que foram adquiridos onerosamente
durante o casamento (o apartamento e o carro que foram comprados durante o
casamento e que foram adquiridos unicamente em nome de João).
João contestou alegando que não tinha que dividir o patrimônio considerando que,
quando o casamento foi contraído, ele possuía mais de 70 anos de idade, de forma
que o regime patrimonial que regulou a relação dos dois foi o regime legal da
separação obrigatória de bens, previsto no art. 1.641, II, do Código Civil de 2002:
Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:
I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da
celebração do casamento;
II - da pessoa maior de 70 (setenta) anos;
III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.
• Pessoa maior de 70 anos
Ao maior de 70 anos é imposto o regime de separação obrigatória de bens. O objetivo
do legislador foi o de proteger o idoso e seus herdeiros de casamentos realizados por
interesse estritamente econômico.
Trata-se de “prudência legislativa em favor das pessoas e de suas famílias,
considerando a idade dos nubentes. É de lembrar que, conforme os anos passam, a
idade avançada acarreta maiores carências afetivas e, portanto, maiores riscos corre
aquele que tem mais de setenta anos de sujeitar-se a um casamento em que o outro
nubente tenha em vista somente vantagens financeiras, ou seja, em que os atrativos
matrimoniais sejam pautados em fortuna e não no afeto” (MONTEIRO, Washington
de Barros. Curso de direito civil: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 295).
• Nomenclatura
O art. 1.641 trata sobre a separação obrigatória de bens (também chamada de
separação legal de bens).
• Pergunta: Havendo dissolução de casamento que era regulado pelo regime da
separação obrigatória de bens (art. 1.641, II, do CC), como deve ser feita a
partilha dos bens?
Deverão ser partilhados apenas os bens adquiridos onerosamente na constância da
união estável ou casamento, e desde que comprovado o esforço comum na sua
aquisição.
Desse modo, em nosso exemplo, Andressa terá direito à meação dos bens adquiridos
durante o casamento, desde que comprovado o esforço comum. Esse é o
entendimento pacificado do STJ:
No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância
do casamento, desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição.
STJ. 2ª Seção. EREsp 1.623.858-MG, Rel. Min. Lázaro Guimarães (Desembargador
Convocado do TRF 5ª Região), julgado em 23/05/2018 (Info 628).
Assim, se Andressa comprovasse que pagou parcelas do apartamento com seu dinheiro, ela
poderia argumentar que esse bem foi adquirido com esforço comum e que, portanto, ela tem
direito à metade do imóvel (meação).
Obs: esse esforço comum não é necessariamente financeiro. Ela poderia demonstrar, por
exemplo, que auxiliou na empresa do ex-marido.
Pergunta: Esse “esforço comum” pode ser presumido?
Quando o STJ fala “desde que comprovado o esforço comum”, ele está dizendo que não se pode
presumir. Deve ser provado pelo cônjuge supostamente prejudicado.
Se fosse adotada a ideia de que o esforço comum deve ser presumido isso levaria à ineficácia do
regime da separação obrigatória (ou legal) de bens, pois, para afastar a presunção, o interessado
teria que fazer prova negativa, comprovar que o ex-cônjuge ou ex-companheiro em nada
contribuiu para a aquisição onerosa de determinado bem. Isso faria com que fosse praticamente
impossível a separação dos aquestos*.
Para o STJ, o entendimento de que a comunhão dos bens adquiridos pode ocorrer, desde que
comprovado o esforço comum, é mais consentânea com o sistema legal de regime de bens do
casamento, pois prestigia a eficácia do regime de separação legal de bens.
Assim, caberá ao interessado (em nosso exemplo, Andressa) comprovar que teve efetiva e
relevante (ainda que não financeira!) participação no esforço para aquisição onerosa de
• Aquestos é uma palavra utilizada no Direito Civil que significa os bens
onerosamente adquiridos na constância do casamento ou da união estável e que
se comunicam, ou seja, tornam-se copropriedade dos cônjuges/companheiros.
Importante: Súmula 377-STF: No regime de separação legal de bens, comunicam-
se os adquiridos na constância do casamento.
O entendimento manifestado na Súmula 377 do STF permanece válido?
SIM. No entanto, ela deve ser interpretada da seguinte forma:

“No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância


do casamento”, desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição.
Nesse sentido: STJ. 4ª Turma. REsp 1.689.152/SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
julgado em 24/10/2017.
Pergunta: Essa regra do art. 1.641, II, do CC fala em “casamento”. É possível
estendê-la também para a união estável?

SIM. Foi editado, inclusive, um enunciado explicitando essa conclusão:

Súmula 655-STJ: Aplica-se à união estável contraída por septuagenário o regime


da separação obrigatória de bens, comunicando-se os adquiridos na constância,
quando comprovado o esforço comum.
Veja como o tema foi cobrado em prova:

(DPE/MG Fundep 2019) Na união estável de pessoa maior de 70 anos de idade,


impõe-se o regime da separação obrigatória de bens. (certo)
Separação LEGAL (obrigatória) ≠ Separação ABSOLUTA

Separação LEGAL (OBRIGATÓRIA) Separação ABSOLUTA

Separação LEGAL (obrigatória) é aquela prevista nas Separação ABSOLUTA é a separação convencional, ou seja,
hipóteses do art. 1.641 do Código Civil. estipulada voluntariamente pelas partes (art. 1.687 do CC).

No regime de separação legal de bens, comunicam-se os Na separação absoluta (convencional), não há comunicação
adquiridos na constância do casamento, desde que dos bens adquiridos na constância do casamento.
comprovado o esforço comum para sua aquisição. Assim, somente haverá separação absoluta (incomunicável)
na separação convencional.

Aplica-se a Súmula 377 do STF. Não se aplica a Súmula 377 do STF.


Entendimento do STJ:
(...) 3. Inaplicabilidade, in casu, da Súmula 377 do STF, pois esta se refere à
comunicabilidade dos bens no regime de separação legal de bens (prevista no art. 1.641,
CC), que não é caso dos autos.
3.1. O aludido verbete sumular não tem aplicação quando as partes livremente
convencionam a separação absoluta dos bens, por meio de contrato antenupcial. (...)
STJ. 4ª Turma. REsp 1481888/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 10/04/2018.
Veja como o tema foi cobrado em prova:

(Juiz TJDFT 2015 CESPE) No regime de separação obrigatória de bens, é vedada a


comunicação de bens adquiridos na constância do casamento. (errado)

(Defensor DPE-RN 2015 CESPE) O pacto antenupcial é indispensável na celebração do


casamento pelo regime da separação obrigatória de bens. (errado).
Obs: a separação obrigatória ocorre por força de lei (e não por causa de pacto
antenupcial).
ENTENDENDO O QUE O STF DECIDIU SOBRE O ART. 1.641, II, DO CC
magine a seguinte situação hipotética:

Pedro, 71 anos, possui dois filhos: Carlos e Ricardo.

Pedro conheceu Regina, de 65 anos. Eles se apaixonaram e decidiram, já no mês seguinte,


morar juntos.
Apesar de não serem casados formalmente, mantinham uma relação pública, contínua e
duradoura como casal. Viviam, portanto, em indiscutível união estável.
Dez anos depois, Pedro faleceu deixando, como herança, cinco imóveis, sendo que dois
deles foram adquiridos depois de iniciada a união estável.
O inventário foi aberto por Carlos e Regina se habilitou pedindo para ter participação nos
dois imóveis adquiridos durante a união estável.
Carlos se opôs alegando que ela não teria direito a nada considerando que, quando a união
estável foi iniciada, o falecido possuía mais de 70 anos de idade, de forma que o regime
patrimonial que regulou a relação dos dois foi o regime legal da separação obrigatória de
Argumentou também que Regina não demonstrou esforço comum para a
aquisição dos imóveis.
O juiz declarou inconstitucional o art. 1.641, II, do CC e, em consequência, decidiu
que a herança deveria ser dividida entre Regina e os filhos do falecido.
Inconformados, os filhos interpuseram recurso.
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo excluiu a companheira da divisão da
herança, aplicando o art. 1.641, II, do CC, que, na visão do Tribunal, é
constitucional.
Regina interpôs recurso extraordinário pedindo para participar da divisão da
herança sob o argumento de que o art. 1.641, II, do CC é inconstitucional.
• O STF deu provimento ao recurso de Regina? O art. 1.641, II, do CC foi declarado
inconstitucional?

NÃO. O STF deu apenas interpretação conforme a Constituição ao art. 1.641, II, do
CC.
O STF disse o seguinte:

• Se uma pessoa maior de 70 anos se casar ou iniciar uma união estável, em


princípio, o regime de bens que regerá essa relação será o regime da separação
obrigatória, nos termos do art. 1.641, II, do CC.
• Vale ressaltar, contudo, que o art. 1.641, II, do CC é uma norma natureza
dispositiva/supletiva* (não é imperativa; não é cogente*). Isso significa que é
uma regra que admitida que as partes, no caso concreto, estabeleçam
tratamento diverso, no exercício de sua autonomia.
• Assim, se quiserem, a pessoa maior de 70 anos e seu(sua) parceiro(a) poderão ir
até o cartório do tabelionato de notas e fazer uma escritura pública escolhendo um
novo regime de bens que seja da separação obrigatória (art. 1.641, II, do CC).
• Caso não façam essa escritura pública, prevalece a regra geral do art. 1.641, II,
do CC, que é a separação obrigatória.
Podemos sintetizar dessa maneira:
O regime obrigatório de separação de bens nos casamentos e nas uniões estáveis
que envolvam pessoas maiores de 70 anos pode ser alterado pela vontade das
partes, mediante escritura pública, firmada em cartório. Caso não se escolha
outro regime, prevalecerá a regra disposta em lei (art. 1.641, II, CC/2002).
STF. Plenário. ARE 1.309.642/SP, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, julgado em
02/02/2024 (Repercussão Geral – Tema 1236) (Info 1122).
• Efeitos prospectivos da escritura pública

Vale ressaltar que a escritura pública que estipule ou modifique o regime de bens
tem efeitos somente a partir da lavratura do ato, não retroagindo para alcançar
patrimônio anterior à sua elaboração.
Interpretação conforme à Constituição

O que o STF fez, portanto, foi conferir interpretação conforme à Constituição ao


art. 1.641, II, do CC, dando-lhe o sentido de norma dispositiva. Isso significa que
essa regra pode ser afastada por meio de escritura pública. No entanto, prevalece o
art. 1.641, II, do CC se não houve convenção das partes em sentido diverso.

Assim, trata-se de regime legal facultativo, que pode ser afastado pela
manifestação de vontade dos envolvidos e cuja alteração, quando houver,
produzirá efeitos patrimoniais apenas para o futuro.

O art. 1.641, II, do CC, se fosse interpretado de maneira absoluta, como norma
cogente, violaria os princípio da dignidade da pessoa humana e da igualdade,
sendo, portanto, inconstitucional.
Violação ao princípio da dignidade da pessoa humana
• O princípio da dignidade da pessoa humana se dá em três vertentes:

• 1. O valor intrínseco da pessoa humana: ninguém nessa vida existe como um


meio para fins alheios;

• 2. Autonomia da vontade: pessoas têm o direito de fazer as escolhas;

• 3. É limitada por valores comunitários: a sociedade pode impor alguns limites à


autonomia em nome de alguns valores que deseja preservar.
A proibição de que as partes escolham outro regime diferente do art. 1.641, II, do CC
viola o princípio da dignidade da pessoa humana em duas vertentes:

• a autonomia individual, porque impede que pessoas capazes para praticar atos da
vida civil façam livremente as suas escolhas existenciais;
• o valor intrínseco de toda pessoa por tratar idosos como instrumentos para a
satisfação do interesse patrimonial de seus herdeiros.

• Princípio da igualdade
A interpretação absoluta do art. 1.641, II, do CC também viola o princípio da igualdade
por utilizar a idade como um elemento de desequiparação entre as pessoas, o que é
vedado pelo art. 3º, IV, da CF/88:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
(...)
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
• OBS: Modulação dos efeitos:
Tendo em vista a segurança jurídica, o STF determinou que a decisão produza
efeitos prospectivos.
Vale também para o casamento e para as uniões estáveis?

O art. 1.641, II, do CC e a possibilidade de escolha do regime de bens diverso do


que está ali previsto se aplica tanto para o casamento como para as uniões estáveis
em razão da equiparação constitucional das diversas formas de família (art. 226,
caput e § 3º, da CF/88).
Veja a tese fixada pelo STF:
Nos casamentos e uniões estáveis envolvendo pessoa maior de 70 anos, o regime
de separação de bens previsto no artigo 1.641, II, do Código Civil, pode ser
afastado por expressa manifestação de vontade das partes mediante escritura
pública.
STF. Plenário. ARE 1.309.642/SP, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, julgado em
• Outros aspectos sobre a sucessão dos descendentes e a concorrência sucessória
do cônjuge ou companheiro:
➢ CC, art. 1.832 : Reserva da quarta parte da herança.
CC, art. 1.832: “Em concorrência com os descendentes (art. 1.829, inciso I) caberá
ao cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua
quota ser inferior à quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com
que concorrer.”
Em concorrência com os descendentes, o cônjuge (ou companheiro) receberá a
mesma quota desses. Além disso, terá direito a 1/4 da herança se for ascendente
dos herdeiros com quem concorrer (filhos comuns). Se o cônjuge concorre com
filhos só do autor da herança (filhos exclusivos), não terá a reserva de 1/4.

• Polêmica:
Filiação híbrida: ocorre quando o cônjuge/companheiro concorre com filhos
comuns e exclusivos (havendo mais de 3 filhos). Nesse caso, deve ser feita a
reserva da quarta parte?
*Posição majoritária: NAÕ! Corrente adotada por Maria Berenice Dias, Maria
Helena Diniz, Luiz Paulo Vieira de Carvalho, Mario Delgado, Zeno Veloso, Rodrigo
da Cunha Pereira, Euclides de Oliveira, Sebastião Amorim, Flávio Tartuce e
Enunciado 527 da V Jornada de Direito Civil).
Enunciado 527 da V JDC: “Na concorrência entre o cônjuge e os herdeiros do de cujus, não será
reservada a quarta parte da herança para o sobrevivente no caso de filiação híbrida.”
*Posição minoritária: Francisco José Cahali e Silvio Venosa entendem que deve ocorrer a
reserva da quarta parte.
➢ Ver o REsp 1.617.650/RS – Adota a posição majoritária.
EMENTA: “RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. SUCESSÃO. INVENTÁRIO. UNIÃO ESTÁVEL.
CONCORRÊNCIA HÍBRIDA. FILHOS COMUNS E EXCLUSIVOS. ART.1790, INCISOS I E II, DO
CC/2002. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO STF. APLICAÇÃO AO CÔNJUGE OU
CONVIVENTE SUPÉRSTITE DO ART.1829, INCISO I, DO CC/2002. DOAÇÃO. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO.INEXISTÊNCIA DE RECONHECIMENTO DA VIOLAÇÃO DA METADE
DISPONÍVEL.SÚMULAS 282/STF E 7/STJ.1. Controvérsia em torno da fixação do quinhão
hereditário a que faz jus a companheira, quando concorre com um filho comum e, ainda,
outros seis filhos exclusivos do autor da herança.2. O Supremo Tribunal Federal, sob a relatoria
do e. Min. Luís Roberto Barroso, quando do julgamento do RE 878.694/MG, reconheceu a
inconstitucionalidade do art. 1.790 do CCB tendo em vista a marcante e inconstitucional
diferenciação entre os regimes sucessórios do casamento e da união estável.3. Insubsistência
da discussão do quanto disposto nos incisos I e II do art. 1.790, do CCB, acerca do quinhão da
convivente - se o mesmo que o dos filhos (desimportando se comuns ou exclusivos do falecido)
-, pois declarado inconstitucional, reconhecendo-se a incidência do art. 1.829 do CCB.4.
"Nos termos do art. 1.829, I, do Código Civil de 2002, o cônjuge sobrevivente, casado no regime de
comunhão parcial de bens, concorrerá com os descendentes do cônjuge falecido somente quando este
tiver deixado bens particulares. A referida concorrência dar-se-á exclusivamente quanto aos bens
particulares constantes do acervo hereditário do de cujus." (REsp 1368123/SP, Rel. Ministro SIDNEI
BENETI, Rel. p/ Acórdão Ministro RAUL ARAÚJO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/04/2015, DJe
08/06/2015) 5. Necessária aplicação do direito à espécie, pois, reconhecida a incidência do art. 1.829, I,
do CCB e em face da aplicação das normas sucessórias relativas ao casamento, aplicável o art. 1.832 do
CCB, cuja análise deve ser, de pronto, realizada por esta Corte Superior, notadamente em face da quota
mínima estabelecida ao final do referido dispositivo em favor do cônjuge (e agora companheiro), de 1/4
da herança, quando concorre com seus descendentes. 6. A interpretação mais razoável do enunciado
normativo do art. 1.832 do Código Civil é a de que a reserva de 1/4 da herança restringe-se à hipótese
em que o cônjuge ou companheiro concorrem com os descendentes comuns. Enunciado 527 da Jornada
de Direito Civil. 7. A interpretação restritiva dessa disposição legal assegura a igualdade entre os filhos,
que dimana do Código Civil (art. 1.834 do CCB) e da própria Constituição Federal (art. 227, §6º, da CF),
bem como o direito dos descendentes exclusivos não verem seu patrimônio injustificadamente reduzido
mediante interpretação extensiva de norma. 8. Não haverá falar em reserva quando a concorrência se
estabelece entre o cônjuge/companheiro e os descendentes apenas do autor da herança ou, ainda, na
hipótese de concorrência híbrida, ou seja, quando concorrem descendentes comuns e exclusivos do
falecido. 9. Especificamente na hipótese de concorrência híbrida o quinhão hereditário do consorte há
de ser igual ao dos descendentes. 10. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. (REsp 1617650/RS,
Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/06/2019, DJe
01/07/2019).
➢ Sucessão dos descendentes (art. 1.833, CC e art. 1.834, CC)
CC, art. 1.833: “Entre os descendentes, os em grau mais próximo excluem os mais
remotos, salvo o direito de representação.”
CC, art. 1.834: “Os descendentes da mesma classe têm os mesmos direitos à
sucessão de seus ascendentes.”
Na sucessão dos descendentes, o grau mais próximo exclui o mais remoto, salvo o
direito de representação.
✓ Em regra, o filho exclui o neto, que exclui o bisneto...
Os descendentes de mesma classe (grau) têm os mesmos direitos sucessórios,
vedada qualquer discriminação sucessória quanto aos filhos – Princípio da
igualdade entre os filhos (art. 227, §6º da CF/88 ).
CF, art. 227, §6º: “Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por
adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer
designações discriminatórias relativas à filiação.”
OBS - A pessoa pode herdar de duas formas:
• Por direito próprio = por cabeça.
• Por direito de representação = por estirpe (art. 1.851 a 1.856, CC).
• Só ocorre na linha reta descendente ou colateral/transversal.
• Nunca na linha ascendente.
O direito de representação “apenas desce ou vai para o lado”. Nunca sobe (art. 1.852 do CC).
“Art. 1.851. Dá-se o direito de representação, quando a lei chama certos parentes do falecido
a suceder em todos os direitos, em que ele sucederia, se vivo fosse.
Art. 1.852. O direito de representação dá-se na linha reta descendente, mas nunca na
ascendente.
Art. 1.853. Na linha transversal, somente se dá o direito de representação em favor dos filhos
de irmãos do falecido, quando com irmãos deste concorrerem.
Art. 1.854. Os representantes só podem herdar, como tais, o que herdaria o representado, se
vivo fosse.
Art. 1.855. O quinhão do representado partir-se-á por igual entre os representantes.
Art. 1.856. O renunciante à herança de uma pessoa poderá representá-la na sucessão de
Sobre o direito de representação, tem-se os seguintes diagramas explicativos:

A
Autor da Herança +

Pré-Morto
B C D
1/3 1/3 1/3

B e C herdam por Cabeça

E e F Herdam por Estirpe


E F
• Caso de Herança avoenga:
(Direto do avô para os netos) A

B C D

D E
C
6.3. Da sucessão dos ascendentes e a concorrência do cônjuge ou companheiro
(art. 1.829, II, CC)
CC, art. 1.829: “A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: [...] II - aos
ascendentes, em concorrência com o cônjuge;”
Conforme o art. 1.829, II, CC e o art. 1.836,CC, na falta de descendentes, são
chamados a herdar os ascendentes em concorrência com o cônjuge ou
companheiro, sem qualquer influência do regime de bens.
CC, art. 1.836: Na falta de descendentes, são chamados à sucessão os
ascendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente. § 1º Na classe dos
ascendentes, o grau mais próximo exclui o mais remoto, sem distinção de linhas. §
2º Havendo igualdade em grau e diversidade em linha, os ascendentes da linha
paterna herdam a metade, cabendo a outra aos da linha materna.”
Regras:
1ª - 1ª) O grau mais próximo exclui o mais remoto, sem distinção de linhas
(paterna e materna) - art. 1.836, § 1º, CC.
✓ CUIDADO: não há direito de representação.
Exemplos: pais excluem avós, que excluem bisavós (e assim sucessivamente).
2ª - Havendo igualdade de grau e diversidade de linhas, os ascendentes da linha
paterna herdam a metade, cabendo a outra metade aos da linha materna (art.
1.836, § 2º, CC).
✓ Polêmica: Multiparentalidade (STF – Informativo 840) Exemplo: avós paternos
biológicos, avós paternos socioafetivos e avós maternos.

Ver Diagrama PG - 11
• ✓Conforme o art. 1.837 do CC, concorrendo o cônjuge ou companheiro com
dois ascendentes de 1º grau, terá direito a 1/3 da herança.
CC, art. 1.837: “Concorrendo com ascendente em primeiro grau, ao cônjuge
tocará um terço da herança; caber-lhe-á a metade desta se houver um só
ascendente, ou se maior for aquele grau.”
Concorrendo com um ascendente de 1º grau ou com outros ascendentes de graus
diversos, terá direito à metade da herança.
ENUNCIADO 609 – O regime de bens no casamento somente interfere na
concorrência sucessória do cônjuge com descendentes do falecido.

Ver Diagramas da PG 12.


Multiparentalidade: Enunciado 642 da VIII Jornada de Direito Civil (abril de
2018): “Nas hipóteses de multiparentalidade, havendo o falecimento do
descendente com o chamamento de seus ascendentes à sucessão legítima, se
houver igualdade em grau e diversidade em linha entre os ascendentes
convocados a herdar, a herança deverá ser dividida em tantas linhas quantos
sejam os genitores.”
✓ Divisão igualitária de acordo com o número de genitores.

Ver Diagrama da PG 13
• 6.4. Da sucessão do cônjuge ou companheiro isoladamente (sozinho, sem
concorrência).
Art. 1.829, III, CC e art. 1.838, CC - Na falta de descendentes e ascendentes, a
herança será atribuída por inteiro ao cônjuge ou companheiro sobrevivente.
CC, art. 1.829: “A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: (...) III - ao
cônjuge sobrevivente;”
CC, art. 1.838: “Em falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão
por inteiro ao cônjuge sobrevivente.”
O art. 1.830 do CC prevê as condições para o cônjuge herdar em concorrência ou
isoladamente.
CC, art. 1.830: “Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge
sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados
judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste
caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.”
✓ Dúvida: este artigo se aplica à união estável?
✓ O artigo é bastante polêmico, pois faz menção ao prazo de separação de fato e à culpa
mortuária (expressão de Rolf Madaleno).
Cônjuge herda: Cônjuge não herda:

Casado, não separado; Divorciado;


Casado, mas separado de fato há até 2 Separado judicialmente (ou
anos; extrajudicialmente);
Separado de fato há mais de 2 anos e não Separado de fato há mais de 2 anos e o
foi o culpado pelo fim da união. sobrevivente foi culpado pelo fim da
união;

Parte considerável da doutrina propõe uma leitura idealizada da norma, desconsiderando o


prazo, a culpa e a menção à separação judicial (Rolf Madaleno, Maria Berenice Dias, José
Francisco Cahali, Zeno Veloso, Giselda Hironaka, José Fernando Simão, Cristiano Chaves, Nelson
Rosenvald, Pablo Stolze, Rodolfo Pamplona e Flávio Tartuce):
“Somente é reconhecido direito sucessório do cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do
✓ Com essa leitura idealizada, o artigo torna-se aplicável à união estável.
➢ STJ: o REsp 1.513.252/SP analisa toda a crítica doutrinária, mas aplica a norma
na literalidade. EMENTA: “RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. SUCESSÕES.
CÔNJUGE SOBREVIVENTE. SEPARAÇÃO DE FATO HÁ MAIS DE DOIS ANOS. ART.
1.830 DO CC. IMPOSSIBILIDADE DE COMUNHÃO DE VIDA SEM CULPA DO
SOBREVIVENTE. ÔNUS DA PROVA. 1. A sucessão do cônjuge separado de fato há
mais de dois anos é exceção à regra geral, de modo que somente terá direito à
sucessão se comprovar, nos termos do art. 1.830 do Código Civil, que a
convivência se tornara impossível sem sua culpa. 2. Na espécie, consignou o
Tribunal de origem que a prova dos autos é inconclusiva no sentido de
demonstrar que a convivência da ré com o ex-marido tornou-se impossível sem
que culpa sua houvesse. Não tendo o cônjuge sobrevivente se desincumbido de
seu ônus probatório, não ostenta a qualidade de herdeiro. 3. Recurso especial
provido.” (STJ - REsp 1513252 / SP – 4ª Turma – Rel. Min. MARIA ISABEL
GALLOTTI – Julg. 03/11/2015 – DJe 12/11/2015).
Direito real de habitação
O art. 1.831 do CC prevê o direito real de habitação do cônjuge, que se aplica:
• A qualquer regime de bens (inclusive na separação legal ou convencional);
• Em concorrência ou isoladamente;
• Imóvel de residência da família;
• Sendo o único imóvel a inventariar
Em relação ao companheiro, o CC/2002 é omisso. Entretanto, antes da decisão do
STF de equalização sucessória do casamento e da união estável, a posição
majoritária já era de reconhecimento do direito real de habitação do companheiro.
✓ Além do Enunciado 117 da I Jornada de Direito Civil, há julgados do STJ sobre o
tema.
Enunciado 117 da I JDC: “O direito real de habitação deve ser estendido ao
companheiro, seja por não ter sido revogada a previsão da Lei n. 9.278/96, seja em
razão da interpretação analógica do art. 1.831, informado pelo art. 6º, caput, da
CF/88.”
CC, art. 1.831: “Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens,
será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito
real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família,
desde que seja o único daquela natureza a inventariar.”
EMENTA: "AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE
INVENTÁRIO. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. NÃO CONFIGURAÇÃO.
DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO DE LEI
CONFRONTADO. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO DO CONVIVENTE SOBREVIVENTE.
ENTENDIMENTO DO STJ. PRETENSÃO DE REEXAME DE PROVA. ÓBICE DA SÚMULA
7/STJ. DECISÃO MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.AGRAVO NÃO
PROVIDO. 1. Companheira que vindica direito real de habitação de imóvel que
foi local de residência do casal. Direito Real de Habitação garantido. 2. A
ausência de particularização do dispositivo de lei federal a que os acórdãos -
recorrido e paradigma - teriam dado interpretação discrepante consubstancia
deficiência bastante a atrair a incidência do enunciado nº 284/STF. 3. Não cabe
reexame de provas em sede de recurso extremo. óbice da Súmula 7/STJ. 4. A
parte agravante não trouxe, nas razões do agravo regimental, argumentos aptos a modificar a
decisão agravada, que deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos. 5. Agravo
regimental não provido" (STJ, Ag. Rg. no AREsp 671.118/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
QUARTA TURMA, julgado em 03/12/2015, DJe 10/12/2015). EMENTA: "AGRAVO REGIMENTAL NO
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REIVINDICATÓRIA. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA.
JULGAMENTO 'EXTRA PETITA'. NÃO OCORRÊNCIA. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. COMPANHEIRO.
POSSIBILIDADE. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO NÃO RECONHECIDO NO CASO CONCRETO. 1.
Inexistência de ofensa ao art. 535 do CPC, quando o acórdão recorrido, ainda que de forma sucinta,
aprecia com clareza as questões essenciais ao julgamento da lide. 2. Inexiste julgamento 'extra
petita' quando o órgão julgador não violou os limites objetivos da pretensão, tampouco concedeu
providência jurisdicional diversa do pedido formulado na inicial. 3. O Código Civil de 2002 não
revogou as disposições constantes da Lei n.º 9.278/96, subsistindo a norma que confere o direito
real de habitação ao companheiro sobrevivente diante da omissão do Código Civil em disciplinar
tal matéria em relação aos conviventes em união estável, consoante o princípio da especialidade.
4. Peculiaridade do caso, pois a companheira falecida já não era mais proprietária exclusiva do
imóvel residencial em razão da anterior partilha do bem. 5. Correta a decisão concessiva da
reintegração de posse em favor das co-proprietárias. 6. Precedentes específicos do STJ. 7. Não
apresentação pela parte agravante de argumentos novos capazes de infirmar os fundamentos que
alicerçaram a decisão agravada. 8. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO" (STJ, Ag. Rg. no REsp
1436350/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em
12/04/2016, DJe 19/04/2016)
Qual a extensão desse direito? Deve-se adotar a extensão do art. 1.831 do CC ou do
art. 7º, § único da Lei 9.278/1996?
➢ Lei 9.278/1996:
• Enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento;
• Relativamente ao imóvel destinado à residência da família.
➢ Lei 9.278/1996: • Enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento;
• Relativamente ao imóvel destinado à residência da família.
Enunciado 271 da III JDC: “O cônjuge pode renunciar ao direito real de habitação nos
autos do inventário ou por escritura pública, sem prejuízo de sua participação na
herança.”
Lei 9.278/1996, art. 7°: “Dissolvida a união estável por rescisão, a assistência material
prevista nesta Lei será prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar, a
título de alimentos. Parágrafo único. Dissolvida a união estável por morte de um dos
conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não
constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência
da família.

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