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A VARIAÇÃO

LINGUÍSTICA E O
ENSINO DE LÍNGUA
MATERNA
Sírio Possenti
João Wanderley Geraldi
AS ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS
• Existem línguas simples ou complexas, primitivas e
desenvolvidas?
• Existem dialetos simples ou complexos, primitivos
e desenvolvidos?
 Todas as línguas são estruturas de igual
complexidade.
 O mesmo vale para a comparação entre dialetos
de uma mesma língua.
 As diferenças mais importantes entre dialetos
populares e dialetos padrões estão ligadas à
avaliação social que deles se faz,
 Esse valor passa, em geral, pelo valor atribuído
pela sociedade aos usuários típicos de cada
dialeto.
• Portanto, se as línguas e os dialetos são
complexos, e se os falantes os conhecem
(porque os falam), os falantes têm
conhecimento de uma estrutura complexa.
• Qualquer avaliação da inteligência do falante
com base na desvalorização de seu dialeto é
cientificamente falha.
• Consequentemente: os indivíduos que falam
dialetos desvalorizados são tão capazes quanto
os que falam dialetos valorizados.
AS VARIAÇÕES LINGUÍSTICAS
• Há variação linguística em outra língua?
 Todas as línguas variam.
• Por quê?
 A variedade linguística é o reflexo da variedade
social.
 Um reflexo da diversidade na experiência social
e histórica das comunidades humanas é o modo
como estas falam sua língua.
• A transformação de uma variedade linguística
em variedade “culta” ou “padrão” está associada
a fatores, como:
 A associação dessa variedade à modalidade
escrita;
 A associação dessa variedade à tradição
gramatical;
 A dicionarização dos signos dessa variedade;
 A consideração dessa variedade como
portadora legítima de uma tradição cultural e de
uma identidade nacional.
O QUE PRECISA SER ENSINADO?
• Os programas anuais poderiam basear-se mais
num levantamento do que falta ser atingido,
• Verificar o que eles ainda não sabem, ou ainda
erram, em relação ao padrão.
• Ex.:
 Se os alunos nunca dizem “vaca preto”, não
precisa insistir em estudar o gênero de “vaca”.
• Para que, então, estudar a língua?
 Para tentar detectar os compromissos que se
criam por meio da fala e
 As condições que devem ser preenchidas por
um falante para falar de certa forma em
determinada situação concreta de interação.
 Numa concepção interacional de língua, é mais
importante estudar as relações que se
constituem entre os sujeitos no momento em
que falam (do que simplesmente estabelecer
classificações e denominar os tipos de
sentenças).
• No entanto, é necessário que todas as classes
sociais aprendam a usar a variedade linguística
socialmente privilegiada,
• Para que aprendam a manter, com a linguagem, a
relação que as classes dominantes com ela
mantêm.
• Por quê?
 Porque a posse dessa variedade e dessa forma
específica de relação com a linguagem é
instrumento fundamental e indispensável na luta
pela superação das desigualdades sociais.
 Além disso, as atividades de ensino deveriam fazer
isso sem depreciar a forma de falar predominante
na família, no grupo social do aluno.
A VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E O ENSINO DE
LÍNGUA MATERNA
• A variação linguística é um fato,
• Mas a nossa sociedade tem uma longa tradição
em considerar a variação numa escala
valorativa, às vezes até moral.
• O aluno sempre tem muito o que aprender de
diversas variedades, inclusive das que domina.
• Alguns tipos de variedades linguísticas:
A variação geográfica
• Primeira grande divisão: os diferentes países em
que a língua portuguesa é falada.
• Ex.: vogais átonas e [-l], em Portugal e no Brasil:
 m[u]rar, [i]xp[]rança (Portugal) / m[o]rar, [e]sperança
(Brasil).
 anima[l], ma[l]dade (Portugal) / anima[u],
ma[u]dade (Brasil).
• Diferenças sintáticas:
 estou cantando / estou a cantar.
• Diferenças lexicais:
 comboio = trem / autocarro = ônibus.
• Diferenças nas formas de tratamento:
 tu / você.
• Mas dentro de Portugal também encontraremos um
leque de variedades regionais. Ex.: divisão entre os
falares do norte e os do sul.
• No Brasil, acontece o mesmo. Ex.:
 /o/ em posição átona e pretônica: aberta ou
fechada. Ex.: novela, corrente, nojento.
 /s/ em final de sílaba: [] ou [s]. Ex.: pasta, lista,
gosta.
 [t] e [d] quando seguidos de [i]. Ex.: [t]ia, [d]ia /
[t]ia, [d]ia.
 [r] em várias posições.

Ler “Unidos por uma mesma língua”, p. 43-5


(Travaglia).
A variação social
 Há diferença na fala dos idosos em relação à dos
adolescentes? Ex.: p. 46 (Travaglia), “ficar” (Verissimo).
 Entre uma pessoa do campo e uma da cidade?
 Entre mulheres e homens? Ex.: p. 48 (Travaglia)
 E entre pessoas com maior ou menor escolaridade?
• Idade, gênero, classe social são fatores que participam
dos processos de diferenciação linguística.
• O PB se divide em dois grandes grupos de falares:
 1º: inclui aqueles que são usados pelos grupos sociais
que estão em melhor posição socioeconômica – “culto”;
 2º: inclui aqueles que são usados pelos grupos sociais
que têm pouco acesso à riqueza nacional, aos bens da
cultura escrita e aos outros bens da cidadania –
popular.
• Entre os falantes do português “culto”:
Obs.:
 Esse conceito pode sugerir que uma outra norma
pertencesse a um povo sem cultura;
 Mas, de acordo com o que demonstram estudos
antropológicos, não há grupo humano sem cultura;
 Então, “culto” ficaria limitado à dimensão da cultura
escrita.
 Escala de valores que coloca o seu próprio modo de
falar como “superior”, “melhor”, “certo”
 E estigmatiza o português popular como “inferior” e
“errado”.
• Esse estigma alcança os seus falantes que são
tratados como “ignorantes” e “incultos”;
• Esse julgamento contribui para reforçar a situação de
discriminação e exclusão que os atinge historicamente.
• Falar é da essência de todo ser humano. Ninguém fala
sem gramática, sem ter um conhecimento linguístico
registrado no cérebro.
• As pesquisas recentes apontam para dois fatos
simultâneos:
 O português popular indo em direção ao português
culto, absorvendo algumas de suas características –
provavelmente pelo aumento da escolaridade e como
resultado de pressões das próprias relações sociais no
contexto urbano, como no trabalho;
 O português culto, especialmente na fala, incorporando
certas características do português popular. Por
exemplo, é muito comum que apareçam sentenças,
como Saiu as notas, sem a concordância, quando o
sujeito é posposto ao verbo.
A variação contextual
 Vocês falam da mesma forma quando estão entre
amigos e quando estão com pessoas desconhecidas?
 Em uma situação familiar ou para um grande público?
 Numa entrevista de emprego ou numa conversa com
um vizinho?

• Costumamos adaptar nosso modo de falar ao ambiente


em que estamos:
 Informalidade: fala mais coloquial, menos policiada;
 Formalidade: fala mais cuidada, mais tensa, mais
policiada.
 Ex.: [-r] final do infinitivo; [s] no final das formas verbais
de nós; gíria.
Questões:

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