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A empresa do novo milênio

1 - O mundo instável: como isso afeta a vida das corporações

MUNDO INSTÁVEL - Como isso afeta a vida das corporações

A nova ordem
A instabilidade vai ser a regra do próximo milênio. Como as empresas vão lidar com isso?

Por David Cohen (EXAME 22/Março/2.000)

Estes são os dias de milagres e maravilhas,e não chore, meu bem, não chore, não chore...
(Paul Simon, The Boy in the Bubble)

As revoluções de maior impacto para a humanidade acontecem, num primeiro momento, sem
que as pessoas se dêem conta de sua profundidade. Foi provavelmente assim com a
descoberta do fogo, com a domesticação dos animais e com a entrada na era da agricultura.
Foi assim na época das grandes navegações e nas duas fases da revolução industrial (primeiro
com a máquina a vapor e depois com a eletricidade). Está sendo assim, novamente, com o
que vários estudiosos denominam de revolução da informação, um termo que abrange o uso
de computadores, a globalização, a desregulamentação e mesmo uma esperada segunda fase
revolucionária, a era da biotecnologia.
Já se tornou uma espécie de lugar-comum dizer que o mundo em que vivemos hoje é caótico,
mas é da própria natureza das revoluções reordenar o funcionamento das coisas - e nessa
reorganização criar um período de instabilidade. Este é certamente um mundo menos estável
do que no passado, menos rígido, menos seguro, menos previsível, e essa instabilidade já
permeia toda a sociedade:
• Na maior economia do planeta, os Estados Unidos (com 250 milhões de habitantes), cerca
de 26 milhões de pessoas mudam de emprego a cada ano e 42 milhões de pessoas mudam de
casa, um terço delas saindo da cidade.
• Na Inglaterra e nos EUA, um em cada dois casamentos termina em divórcio. No Brasil, um
em cada quatro.
• Filhos fora do casamento representam cerca de 25% de todos os nascimentos na Suécia e
cerca de 50% entre os negros americanos.
• A lista dos 400 americanos mais ricos, feita pela revista Forbes, costuma ter 10% de novos
integrantes anualmente. Este ano, teve 20%.
• No ano passado, leitores da revista VIP elegeram as 100 mulheres mais desejadas do
mundo. Na edição deste ano, um terço delas saiu da lista.

Nada parece sobreviver muito tempo, e as empresas não são exceção. O consultor Richard
Foster, da McKinsey, estudou 208 empresas durante 18 anos para identificar as que eram
consistentemente bem-sucedidas. Só três funcionaram durante os 18 anos. Metade não
conseguiu manter o ritmo por mais de dois anos. Um famoso estudo da Shell verificou que
um terço das companhias listadas entre as 500 maiores da revista Fortune em 1970 tinha
desaparecido em 1983. Uma pesquisa recente de Ellen de Rooij, do Stratix Group, de
Amsterdã, indica que a expectativa de vida média de uma empresa, de qualquer tamanho,
medida no Japão e na maior parte da Europa, é de 12,5 anos. Na Internet, que prenuncia o
futuro, o ciclo de vida das empresas é ainda menor. Só uma minúscula parte dos sites
lançados em 1993 ainda existe, segundo uma pesquisa do presidente do Net Future Institute,
Chuck Martin (autor do livro O Futuro da Internet, editora Makron Books), nos arquivos do
National Center for Supercomputing Applications, da Universidade de Illinois.
Já não é nem absolutamente certo que uma empresa deva almejar a sobrevivência - pelo
menos nos moldes em que foi criada. Nos projetos para obtenção de capital de investidores
nos Estados Unidos, é necessário que conste o caminho de saída (way out) da empresa - que
pode ser o aporte de mais investimentos ou a abertura de capital na bolsa, mas também pode
ser a incorporação da companhia por outra, ou mesmo seu desmembramento. (É comum a
trajetória de empreendedores como o bioquímico Howard Birndorf, já na sua oitava
companhia de biotecnologia, e o engenheiro Gururaj Deshpande, descrito como
"conservador" pela revista de negócios em tecnologia Red Herring, que está na sua terceira
empresa, a Sycamore, de fibras ópticas.) No dia-a-dia das empresas, o horizonte estratégico
típico de executivos, consultores e acadêmicos passou a ser de um a dois anos, segundo uma
pesquisa da consultoria americana Real World Strategist, em vez dos quatro a dez anos da
década passada. Da instabilidade na relação entre empresas e empregados, então, nem se fala.
Segundo Marcelo Mariaca, da Mariaca & Associates, 95% das companhias americanas já dão
opção de outplacement na hora da contratação. (Isso é mais ou menos como determinar, no
dia do casamento, o cartório em que será feito o divórcio.) Na década de 70, 52,5% das
empresas ofereciam outplacement. Nos anos 80, eram 80%.
Num mundo assim instável, "há um conforto perverso em olhar as organizações como
sujeitas às correntes do caos", dizem os consultores americanos Quinn Spitzer e Ron Evans,
autores do livro Heads, You Win (Cara ou Coroa), da editora Fireside, sobre as estratégias de
algumas das melhores companhias do mundo. Já que o futuro é caótico, os líderes se sentem
absolvidos da responsabilidade de planejar. Esse "conforto perverso" é a pior atitude para
uma organização adotar. A proposta desta reportagem, que inaugura uma série de sete artigos
sobre a Empresa do Novo Milênio, é arrancar a sua empresa - e a sua carreira - dessa zona de
conforto.
Quando se abandonam algumas rotinas, o mundo pode parecer ameaçador. E as rotinas estão
definitivamente mudando. Em artigo no livro A Organização do Futuro, da Fundação
Drucker (editora Futura), o guru C.K. Prahalad, professor de administração da Universidade
de Michigan, enumera oito grandes mudanças no ambiente corporativo:

1 Ele passou de aconchegante a competitivo;


2 era local, virou global;
3 as empresas não competem mais com empresas similares a elas, mas com empresas
totalmente diferentes;
4 as fronteiras industriais, que eram claras, são incertas;
5 no lugar da estabilidade, entrou a volatilidade;
6 em vez de intermediários, importa o acesso direto: a logística tem um papel cada vez maior;

7 em vez da integração vertical, os especialistas; e


8 no lugar da herança simples, a múltipla: a integração da tecnologia química com eletrônica,
mecânica com eletrônica, farmacêutica com moda.

Tudo isso é muito ameaçador, mas é na mesma medida muito promissor. (Se uma empresa de
um ramo diferente da sua vai lançar um produto concorrente, por exemplo, também nada
impede que a sua empresa invada o terreno dos outros.) Estes são dias de milagres e
maravilhas, e não adianta chorar.
TUDO IGUAL, MAS DIFERENTE
Há quem diga, e não é pouca gente, que não existe revolução nenhuma, que o mundo está
como sempre esteve. Jeffrey Pfeffer, professor de comportamento organizacional da Escola
de Negócios de Stanford, diz que "há evidências de que o ambiente competitivo e a marcha
da tecnologia foram ainda mais dinâmicos e estressantes em alguns períodos do passado".
Segundo Paulo Ferraz, presidente do banco Bozano, Simonsen, "o ritmo das mudanças não se
alterou. Todos os anos houve fatos que mudaram o curso do mundo". Eis alguns exemplos
que reforçam essa opinião:
• O número de fusões de empresas bate recorde sobre recorde, e a competição é tão ferrenha,
mas tão ferrenha, que a média de falências nos Estados Unidos chegou a 15 000 por ano.
(Não, isso não ocorreu na semana passada. Ocorreu no final do século 19.)
• Já não existe lealdade dos empregados, a tal ponto que uma fábrica de automóveis,
querendo dar um bônus de Natal aos trabalhadores com mais de três anos de casa, só achou
640 funcionários qualificados para o prêmio, de um total de 15 000. (Essa fábrica é da Ford,
em Highland Park, Michigan, e esse episódio ocorreu no ano de 1913.)
• Em cada vez mais empresas os trabalhadores são independentes e fazem acordos para
entregar parte do produto final e receber por unidade completada, em vez de vender seu
tempo aos patrões. (Esse sistema espalhou-se pela indústria têxtil no final do século 18.)
• Para melhorar a produtividade, empresas estão partindo para a distribuição de lucros com os
empregados. (A Procter & Gamble fez isso em 1887, e a estratégia da Levi's, do final dos
anos 1980, foi reconhecidamente inspirada num modelo da década de 1940.)
• Um médico experiente envia os dados de uma consulta a um computador, e este lhe
responde que a dose de medicamento receitada à paciente pode ser letal. Furioso, o médico
exige explicações e, após três detalhamentos sucessivos, fica sabendo que um antigo
problema nos rins dela pode impedir a absorção normal da droga. A consulta ao computador
salva a vida da paciente. (Mesmo esse exemplo aparentemente futurista é um caso da década
de 70, resultado de um programa de um grupo de pesquisa do MIT.)
Mais: segundo Robert Eccles e Nitin Nohria, no livro Beyond the Hype (Além do Modismo),
o número de patentes por milhão de habitantes nos EUA foi maior no começo do século do
que nos anos 70 e 80.
É certo. Mas também é certo que no começo do século, entusiasmados com a descoberta da
eletricidade, vários inventores tentaram patentear máquinas de moto-perpétuo movidas a
energia elétrica. Eram tantos pedidos absurdos que em 1911 o escritório de patentes dos EUA
passou a requerer que as inscrições viessem acompanhadas de modelos do aparelho. O
aumento do número de invenções dos últimos anos é bem mais sustentado. De 1963 a 1975,
o escritório de patentes americano emitiu em média 48 571 patentes anualmente. Na década
de 90, a média anual está por volta de 60 000, um aumento de 23% (sem contar as cerca de
40 000 patentes estrangeiras anuais). Segundo Michael Cox e Richard Alm, em artigo na
Consumers' Research Magazine, o número de cientistas e engenheiros trabalhando em
pesquisa e desenvolvimento nos EUA dobrou desde os anos 70 e o número de produtos novos
por ano no mercado americano triplicou desde 1980.
Várias das mudanças de hoje são similares às de períodos do passado, e isso não é de
estranhar. "O Mercado da Informação vai transformar nossa sociedade no século 21 tão
significativamente quanto as duas revoluções industriais, estabelecendo-se como a terceira
revolução da história moderna. Não devemos temê-la mais nem menos que as outras foram
temidas, porque ela carrega promessas e ameaças similares", diz Michael Dertouzos, chefe do
Laboratório de Ciência da Computação do MIT, em seu livro O Que Será (Companhia das
Letras).
Mesmo assim, algo mudou, e mudou muito. Não importa tanto saber se as inovações são
construídas a partir de avanços do passado. O que interessa é que estamos vivendo hoje uma
nova lógica, e as empresas bem-sucedidas do próximo milênio vão ter que lidar
obrigatoriamente com essa lógica. (As mudanças podem parecer com as do passado, mas sua
natureza é diferente. A distribuição de lucros, por exemplo, era e ainda é em parte um prêmio
pela produtividade, mas torna-se a passos largos uma forma de sociedade, um novo tipo de
relação entre patrões e empregados.)
MAIS MUDANÇAS: 20 ANOS EM 5

Afinal, estamos no meio de uma revolução ou isso é apenas o progresso cumulativo da


tecnologia e das formas de organização? Para o paleontólogo Stephen J. Gould, autor de
vários livros sobre evolução, "a história da vida é uma série de situações estáveis, pontuadas
em intervalos raros por eventos importantes que ocorrem com grande rapidez e ajudam a
estabelecer a próxima era estável". Gould acredita que o final do século 20 é um desses raros
períodos. "Nós da Andersen Consulting acreditamos que haverá mais mudanças nos próximos
cinco anos do que houve nos últimos 20", diz o consultor Robert Baldock, autor do livro
Destination Z, que traça panoramas para o futuro das empresas.
O que normalmente se chama de revolução industrial é um período que se estende por 100
anos. É claro que há uma boa dose de invenção dos historiadores na delimitação das
"revoluções", mas as transformações em progresso material e deslocamento social foram tão
grandes, como justifica o historiador R.J. Forbes, num ensaio de 1958, que, no conjunto,
podem ser descritas como revolucionárias.
O mesmo se espera da época da informação. Na revolução industrial, a produtividade
triplicou entre 1890 e 1960 nos EUA. "Suspeito que podemos ver resultados similares agora",
diz Dertouzos, do MIT. "Em apenas três anos, entre 1959 e 1962, os preços dos
semicondutores caíram 85%, e nos dez anos seguintes a produção aumentou em 20 vezes. A
título de comparação, foram necessários 70 anos (de 1780 a 1850) para que o preço do tecido
de algodão caísse 85% na Inglaterra durante a revolução industrial", diz. Em algumas
atividades, como desenho mecânico, já se podem medir ganhos de produtividade de 200%.
Um prédio moderno, projetado com o auxílio de programas de computação, pode passar do
planejamento às obras em dois ou três meses, um terço do tempo do começo da década. O
aumento de produtividade geral das empresas americanas, que andou por volta de 1,1% ao
ano durante 20 anos, praticamente dobrou a partir de 1995, para 2,1% ao ano. Ainda é muito
pouco, especialmente porque esse índice é a média entre um aumento de produtividade de
40% em setores da informática e o mesmo 1,1% de antes em amplos setores ainda intocados
pela era da informação. (No Brasil, a produtividade cresceu em média 7,5% ao ano nesta
década, com apoio da estabilização e da abertura, mas há que levar em conta a base da
"década perdida" dos anos 80). "Para saber o impacto geral do Mercado da Informação na
economia, vamos ter que esperar até que uma parte maior do Mercado esteja atuando e
mostrando seus resultados em cada área econômica", afirma Dertouzos.
É difícil avaliar a revolução que estamos vivendo porque é difícil precisar a sua origem. Há
pelo menos três grandes vertentes que vêm se desenvolvendo há décadas e que se
realimentam, tornando o mundo muito diferente do que era. A primeira é o computador, que
chegou às corporações em 1954 e virou febre depois da invenção do microprocessador, em
1970. Desde então, as empresas americanas já gastaram 2 trilhões de dólares em
informatização. No auge do encantamento tecnológico, nos anos 80, supunha-se que a
informatização fosse revolucionar sozinha todo o mundo corporativo, mas o que se viu foi
que, sem transformações organizacionais, a tecnologia agravou os problemas de burocracia e
rigidez das empresas, em vez de solucioná-los. Uma pesquisa de Paul Strassman, ex-chefe de
informação do Pentágono, concluiu que o computador tornava melhores as empresas bem
administradas, e piores as mal administradas. "Em retrospecto, parece óbvio", diz Dertouzos.
"A tecnologia da informação age como uma lente amplificadora dos pontos fortes e também
dos pontos fracos de uma gestão."
A segunda e a terceira vertentes são a globalização e a desregulamentação (em alguns países,
como o Brasil, caracterizada pela privatização e pela descentralização). De acordo com o
Centro de Estudos Prospectivos e de Informações Internacionais, ligado ao governo francês, a
proporção da produção industrial sob controle estrangeiro no mundo todo pulou de 13,2% em
1973 para 14,7% em 1980, 16,5% em 1988 e deve chegar a 24,8% no ano 2000. Um estudo
do McKinsey Global Institute feito em 1993 descobriu uma alta correlação entre um índice de
globalização (exposição à concorrência internacional) e a produtividade de nove setores
analisados nos EUA, Japão e Alemanha. Isso significa que o mundo está ficando menor, mais
misturado e mais eficiente.
Essas três vertentes, combinadas ao longo do tempo, são responsáveis por uma evolução
atroz em toda a economia, desde o setor automobilístico até a criação de galinhas. (Em 1979,
um operário da Fiat produzia nove carros no mesmo tempo em que hoje são produzidos 69.
Em 1988, a Perdigão demorava 50 dias para fazer um frango chegar a 2,3 quilos. Hoje, a
engorda leva 44 dias, com um consumo de ração 15% menor.)
O lugar em que esses avanços socioeconômicos estão atingindo seu ápice é a Internet. É aí
que a tecnologia se encontra com a globalização e os progressos organizacionais de uma
forma jamais vista. Esse encontro permite vários tipos de revolução: nas comunicações
internas, no modo de se relacionar com os clientes e fornecedores, na própria natureza dos
produtos da empresa, na aplicação da tecnologia. A Internet não é só um Eldorado para as
empresas arrojadas, ou um novo continente aberto para as grandes navegações. Ela é o mais
acabado símbolo de uma nova era, a concretização de uma nova lógica de fazer negócios, de
encarar a riqueza, de pensar o mundo. Quem se recusar a enxergar essa nova lógica não estará
perdendo o bonde da história - estará amarrado nos trilhos à sua espera.

CAPITAL E TRABALHO: MAIS SEMELHANTES

Não há como prever as transformações que nos aguardam, mas uma coisa é certa: nesta
entrada do novo milênio, uma outra forma de riqueza está se impondo - o conhecimento e seu
instrumento, a inteligência. "Se tivéssemos sabido onde olhar, mesmo nos anos 50
poderíamos ter visto a mudança de valor do capital para o conhecimento", diz o ex-executivo
da Shell Arie de Geus, em seu livro A Empresa Viva (Editora Campus)."Isso ficou visível no
aumento de valor das companhias pobres de bens e ricas de cérebros e sociedades: firmas de
auditoria internacionais, consultorias, propaganda e mídia." Essa mudança hoje se percebe na
cotação em bolsa de companhias como Microsoft, Yahoo! ou Amazon.com, na rapidez com
que alguns empresários digitais se tornam milionários e na valorização da criatividade em
indústrias antes caracterizadas pela rotina da linha de produção.
Pensando bem, essa nova percepção do conhecimento não provoca assim taaantas mudanças
na economia. Só duas: muda o capital e muda o trabalho. No mundo do conhecimento, eles
estão ficando menos antagônicos e muito mais parecidos em seu funcionamento. Capital é
cada vez mais o capital intelectual, capital de relacionamentos, capital de marca, capital da
informação. E trabalho é cada vez mais a capacidade de gerar e gerir idéias, de conectar-se a
outros trabalhadores e a clientes.
Isso altera tudo. Não apenas vão surgir novas empresas, mais digitais, não apenas vão surgir
novos trabalhadores, mais intelectualizados. Todo o mundo corporativo terá de ser repensado,
reestruturado, reinventado, desde as relações com empregados e fornecedores até o uso da
tecnologia, o marketing e as práticas de contabilidade. O que você faz agora, qualquer que
seja o seu cargo, qualquer que seja a sua empresa, vai sofrer mudanças profundas. Na nova
economia, funciona uma nova lógica - que produz algumas histórias pitorescas, mas
impactantes e reveladoras:
• O indiano Kartik Ramakrishnan, de 28 anos, estudante de negócios da Universidade de
Stanford, alojou-se em julho no apartamento de um amigo que estava se mudando, na
Califórnia. Em janeiro, ele tinha montado uma empresa digital junto com o irmão, a Quiq,
para fornecer mecanismos de interação entre sites na Internet. Seu escritório consistia no
quarto sem mobília nenhuma, a não ser um colchão de 75 dólares, uma cadeira quebrada e
uma mesinha de cabeceira, onde ficava o computador. (O teclado tinha que ficar no colo
dele.) Nesse "escritório", Kartik recebeu, entrevistou e contratou um consultor da Booz Allen
& Hamilton, que, para trabalhar para Kartik, largou seu escritório no centro de São Francisco,
com vista para a ponte Golden Gate e um tipo diferente de mármore em cada elevador. Kartik
entrevistou ainda outra consultora da Booz Allen, a mesma que tentava contratar o amigo que
lhe emprestou o apartamento. (Nenhum dos dois conseguiu contratar seu alvo.)
• Outro aluno de Stanford, Rodrigo Sales, criou uma companhia chamada AuctionWatch.com,
um fórum de discussão para leilões, ao mesmo tempo que seguia o curso como estudante de
tempo integral. Há algumas semanas, conseguiu financiamento que avaliou sua empresa em
10 milhões de dólares.
• Oki Matsumoto, sócio do grupo de investimentos Goldman Sachs no Japão, decidiu largar o
emprego no fim do ano passado, a poucos meses da abertura de capital da firma, que lhe
prometia uma participação avaliada em 20 milhões de dólares. Matsumoto disse que não
podia ficar na empresa - mesmo embolsando 20 milhões de dólares - porque tinha que
aproveitar a "oportunidade histórica" da desregulamentação do setor financeiro japonês, e
abriu uma corretora on-line, a Monex.
• Bill Burnham empregou-se na Booz Allen em 1993 e, para um de seus primeiros projetos,
fez uma pesquisa sobre as práticas bancárias on-line. Esse estudo acabou sendo publicado, e
Burnham tornou-se da noite para o dia um especialista em financiamento e comércio
eletrônicos. Logo foi contratado como analista por um banco, depois por outro, de mais
prestígio, depois por um terceiro, o CS First Boston, como analista-chefe de comércio
eletrônico. Em agosto, segundo o Wall Street Journal, deixou esse emprego, de 4 milhões de
dólares anuais, para tornar-se sócio de um fundo de capital de risco formado pelo Softbank.
• Nesse mundo novo, pelo menos enquanto ele é assim tão novo, uma empresa ter lucro pode
ser um dado irrelevante. O que importa é a "conquista de espaço" e o otimismo que isso gera
entre investidores para a possibilidade de lucros futuros, muitas vezes em outros negócios
relacionados à empresa. (Essa febre teve uma correção: a cotação das empresas digitais na
bolsa de Nova York caiu de 30% a 50%, do ano passado para este, e a "conquista de espaço"
já é hoje muito mais bem avaliada.)
Ainda há apego ao velho modo de pensar os negócios, é claro. Laércio Cosentino, presidente
da empresa de software de gestão Microsiga, diz que há companhias voltadas para a produção
e companhias voltadas para ter ganhos na bolsa. "Os critérios para valorização nem sempre
são lastreados na realidade", afirma. Mesmo assim, não sendo bobo nem nada, Cosentino já
tratou de arranjar um sócio internacional, para abrir capital em 2001. Empresas alemãs
costumavam recusar-se a vender ações na Bolsa de Nova York, alegando que a exigência de
publicar relatórios trimestrais distorcia as prioridades do negócio e afastava a gerência dos
interesses adequados a longo prazo. Toda essa argumentação foi por água abaixo quando a
necessidade de capital para financiar sua reestruturação e expansão obrigou a Daimler Benz a
mudar de idéia. Por bem ou por mal, todas as companhias terão que se render às mudanças
que a nova economia está trazendo.

UMA SOCIEDADE PÓS-INDUSTRIAL?

Espera-se que essas mudanças sejam tão profundas, tão radicais, que vários autores se
referem a esse novo mundo como a sociedade pós-industrial. Para o sociólogo Manuel
Castells, é bobagem. "Enquanto teorizamos sobre o pós-industrialismo, percebemos que
estamos vivendo uma das maiores ondas de industrialização da história, se utilizarmos um
indicador simples como o número absoluto de trabalhadores do setor industrial", afirmou em
seu livro A Sociedade em Rede (editora Paz e Terra).
Uma mesma idéia alimenta tanto os cenários otimistas quanto os pessimistas sobre o pós-
industrialismo: a idéia da automação, do progresso tecnológico, junto com a concentração de
produção nas mãos dos grandes conglomerados e o fim das barreiras de proteção a indústrias
locais. No cenário pessimista, os ricos ficam muito mais ricos e os pobres ficam na miséria,
as cidades voltam a ser muradas como na Itália medieval, as elites contratam exércitos
particulares, os Estados nacionais perdem poder e sentido, na medida em que já não
conseguem arrecadar impostos nem impor a lei. Um dos campeões dessa visão pessimista é
Jeremy Rifkin, autor do livro O Fim do Trabalho (Makron Books), de 1995, que prevê uma
era de desemprego.
"A característica mais marcante de todos esses trabalhos prenunciadores de uma sociedade
sem emprego é que eles não oferecem dados rigorosos e coerentes para suas afirmações,
contando com recortes soltos de jornais, exemplos aleatórios de empresas de alguns países e
setores e argumentos do senso comum sobre o impacto 'óbvio' dos computadores no
emprego", afirma Castells, um intelectual respeitado que se esmerou em 12 anos de pesquisa
para escrever seu trabalho sobre a era da informação. (Conte-se a favor dos pesquisadores de
recortes de jornais que, nos 12 anos de estudos de Castells, o mundo mudou muito.)
"É no mínimo surpreendente ver o crédito que a mídia dá a livros como o de Rifkin,
anunciando o 'fim do emprego', publicado em um país (os EUA) onde, entre 1993 e 1996,
foram criados mais de 8 milhões de empregos", diz Castells. "De fato, o trabalho e o emprego
passam por transformações, mas o número de empregos remunerados no mundo, apesar da
situação difícil da Europa Ocidental, está em seu pico histórico mais alto e em expansão. As
taxas de participação da força de trabalho da população adulta estão se elevando em todos os
lugares em virtude da incorporação sem precedentes das mulheres no mercado de trabalho.
Ignorar esses dados elementares é ignorar nossa sociedade."
Ora, então não existe razão para essa angústia com o desemprego? Os pessimistas estão
totalmente errados? Não é bem assim. Uma das profissões que mais crescem nos EUA é a de
guarda de segurança. As previsões são entre 24% e 40% de crescimento de 1990 até 2005.
Em São Paulo, já se instalou até para a classe média o negócio de blindagem de carros.
Quanto aos empregos, há um dado mais preocupante: uma característica da economia de hoje
é que, quando a produção cai, o nível de emprego também cai, como sempre foi, mas, quando
a produção volta a subir, já não é mais automática a volta dos empregos, graças aos ganhos de
produtividade. Segundo um estudo da Comissão da União Européia, entre 1970 e 1992 a
economia dos EUA cresceu 70% e o nível de emprego, 49%. A economia japonesa cresceu
173% e o emprego, apenas 25%. A da União Européia cresceu 81% e seus empregos, só 9%.
Como aponta Castells, a questão não é que o emprego esteja acabando, mas sim que ele está
mudando. Primeiro, está mudando geograficamente, para onde é mais barato, por efeito da
globalização e da desregulamentação. Em segundo lugar, o emprego está mudando de
natureza. Há um trabalho mais inteligente em campo, e a mão-de-obra tradicional está
ficando sem opção. São Paulo, cujos índices de desemprego estão perto dos 20% (pelo
método do Dieese), também viu crescer a remuneração nesta década, e os salários na capital
corporativa do país são hoje 40% maiores do que a média nacional.
É aí que entra a visão dos otimistas. "A sociedade pós-industrial produz bens imateriais:
informação, serviços, ética, estética", disse Domenico De Masi, em palestra em São Paulo.
"Isso não significa menos bens materiais, significa menos gente envolvida com isso, mas com
até mais produtos." Curiosamente, é um argumento parecido com o que Karl Marx escreveu
em 1857: "É chegado o tempo em que os homens não mais farão o que as máquinas podem
fazer". Por esse raciocínio, a atual ansiedade pela perda de empregos é similar à do final do
século 19, quando a agricultura foi sendo mecanizada. Nos EUA, 4,4 milhões de
trabalhadores rurais perderam o emprego, mas nos 100 anos seguintes foram criados 100
milhões de postos no país.
"Em linhas gerais, cada vez que a inovação tecnológica e estrutural permite transferir o
esforço humano para as máquinas, surgem duas análises diferentes: num primeiro momento,
o fenômeno é percebido como desemprego e como ameaça ao equilíbrio social; apenas num
segundo tempo é percebido como libertação da escravidão do trabalho, da carestia e da
tradição", afirma De Masi, no livro Desenvolvimento sem Trabalho, da editora Esfera. Numa
perspectiva histórica, a luta pela manutenção dos empregos em fábricas é ilógica. Como
dizem James Dale Davidson e William Rees-Mogg, em The Sovereign Individual (O
Indivíduo Soberano): "Se ouvirmos os críticos da época, o advento dos empregos nas fábricas
era um mal sem precedentes e uma exploração da classe trabalhadora. Mas agora parece que
a única coisa pior do que o advento dos empregos em fábricas é o seu desaparecimento. Os
bisnetos daqueles que reclamavam da introdução dos empregos em fábricas estão agora
reclamando da diminuição desses empregos, que oferecem altos salários para trabalhadores
pouco habilitados". Mal comparando, seria como se os escravos libertados em 1888 no Brasil
se ressentissem da sua expulsão da senzala - o que de fato aconteceu, especialmente entre os
escravos velhos, que, tendo de enfrentar o racismo, não tinham para onde ir nem como
trabalhar.

EMPREGOS DO FUTURO

De acordo com os jornalistas do Wall Street Journal Bob Davis e David Wessel, autores de
um livro com o sugestivo título de Prosperity, não há motivo para se preocupar: "Assim
como a riqueza de hoje permite que se empreguem pessoas em serviços que ninguém
imaginava no passado, novos empregos de serviços vão substituir os empregos de fábrica nos
próximos anos". As pessoas ficam angustiadas porque não vêem esses empregos substitutos,
mas elas só não os vêem porque eles ainda vão ser criados.
Não são todos que concordam com essa visão cor-de-rosa. Dizem os críticos que, embora isso
sempre tenha sido verdade, desta vez não vai ser. Desta vez, dizem os pessimistas, não haverá
nova indústria para absorver os desempregados. A argumentação é que, se menos gente faz
mais coisas, as pessoas que sobraram ficam sem ter o que fazer. Essa lógica, embora
poderosa, nunca se comprovou na história da humanidade. Ela só faz sentido quando aplicada
a universos finitos, em que os recursos podem ser exauridos. Por exemplo, o uso vai fazer o
petróleo acabar, o desmatamento maior do que o plantio elimina as florestas. Essa lógica faz
menos sentido quando se trata de produtos, porque há uma capacidade humana ilimitada de
criar novas necessidades e novas formas de satisfazê-las. (Toda a expansão do setor industrial
é uma prova disso.) Por isso, mesmo que se faça muito mais com muito menos, sempre há
mais a fazer. Num mundo dominado pela produção de conhecimento, essa lógica faz ainda
menos sentido, porque já não há sequer dependência de produtos. (Aí entra como exemplo a
expansão do setor de serviços.) Mais: no mundo em que o conhecimento é um produto, a
relação produção-consumo é totalmente alterada - consumir deixa de ser sinônimo de fazer
desaparecer. Quanto mais houver conhecimento, mais se criará; quanto mais se gasta, mais se
tem.
A imaterialidade (com a rapidez e a flexibilidade vinculadas a ela) é um dos motivos da
desenfreada expansão da Internet, uma das maiores esperanças de criação de empregos do
futuro. Segundo o Global Internet Project, um grupo de comércio de computadores, a Internet
criou 760 000 empregos nos EUA em 1996, quando começou a ser levada a sério pelo mundo
corporativo. No ano passado, a rede já tinha 1,2 milhão de empregos nos EUA. É mais ou
menos assim que acontece: ao fazer entrevista para contratação na empresa de software
Siebel Systems, um jovem estava sendo convidado para unir-se a uma companhia de 1 300
funcionários. Quando começou a trabalhar, três meses depois, a empresa tinha 2 500
empregados.
Embora seja praticamente inquestionável que a nova economia representa um progresso, há
um problema sério: a falta de sincronia (o que alguns antropólogos apelidam de abismo
cultural), que acontece principalmente no mercado de trabalho. Quando uma indústria é
substituída por outra, em geral essa nova indústria gera mais riqueza. Se não fosse assim, a
nova indústria não suplantaria a primeira - e a história humana, desde a revolução da
agricultura, comprova esse raciocínio quase tautológico. O problema é que o trabalho nessa
nova indústria é de natureza diferente do anterior. Há mais oportunidades, mas, para os
indivíduos moldados pela realidade antiga, a adequação é, na maioria dos casos, difícil e
dolorosa. Várias vezes, impossível. (É o que o economista John Maynard Keynes definia
como desemprego tecnológico: quando a eficiência técnica se desenvolve num ritmo mais
rápido que a capacidade da economia de encontrar novos usos para o trabalho.) Surge daí o
paradoxo do progresso. Ele é intrinsecamente bom, senão não seria progresso, mas não
necessariamente bom para os seus contemporâneos. Há toda uma indústria da nostalgia que
se baseia nessa falta de sincronia.
O melhor exemplo de abismo cultural vem da Bíblia. Quando Moisés liderou o povo hebreu
na fuga do Egito, segundo o relato bíblico, ficou vagando 40 anos no deserto. Não que
Moisés fosse um dos líderes mais indecisos da história da humanidade. (Era, sim, e isso
talvez seja um excelente exemplo para os que só acreditam nos homens de ação, mas não foi
esse o motivo da demora.) A justificativa para não levar seu povo à terra prometida era que
uma geração de escravos não seria capaz de criar uma nação livre. Era preciso esperar o
nascimento de outra geração. O próprio Moisés (mais uma lição para os líderes) nunca pisou
na terra prometida.
QUEM É O DONO DA INTELIGÊNCIA?

Em tempos de grandes mudanças, a falta de sincronia produz um dramático desencontro entre


milhares de pessoas procurando empregos melhores e várias empresas com vagas que não
conseguem preencher. Não há solução mágica para esse problema: só uma mudança de
mentalidade, tanto das pessoas quanto das empresas, pode atenuá-lo. A chave é a educação
continuada, que exige, da parte das pessoas, desprendimento, humildade e disposição e, da
parte das empresas, uma nova percepção do que é investimento.
Não que as empresas devam sacrificar-se para arcar com o ônus social do progresso, não é
isso. Para qualquer corpo, biológico ou social, é apenas natural que a questão da
sobrevivência venha em primeiro lugar. Para prosperar no novo milênio, uma empresa terá
que fazer o que sempre teve que fazer: cuidar dos seus ativos. Acontece que os ativos
mudaram. O bem mais valioso da nova economia é a inteligência. Não que inteligência não
fosse importante antes, ela sempre foi o fator que determinou a vida ou a morte das empresas.
O que mudou agora é que, pela primeira vez na história, a mente humana é uma força direta
de produção, não apenas um elemento decisivo no sistema produtivo. Hoje não se criam
apenas informações que agem sobre a tecnologia, criam-se tecnologias para agir sobre a
informação.
Mudar de mentalidade é uma questão crucial para as empresas, porque a maior parte de seus
bens é levada embora, todos os dias, no fim do expediente, para as casas dos seus
funcionários. Como diz o ex-executivo tornado filósofo Charles Handy, em A Era do
Paradoxo (Makron Books): "A inteligência é uma forma instável de propriedade". Esses bens
- a própria sobrevivência da empresa - dependem agora de um novo tipo de investimento. "O
modelo real da organização líder do século 21 não existe. Ela deverá ser em parte baseada em
tecnologia, em parte em serviços para o cliente e em parte numa escola para adultos", diz o
consultor Glenn R. Jones, presidente da Jones Education Networks.
No caminho para essa nova mentalidade, não há modelos do passado que possam ser
copiados. Na busca por inspiração, valem até comparações com o mercado amoroso - que
sofreu transformações radicais nas últimas décadas, de natureza semelhante à do ambiente
corporativo. (As mulheres passaram a ter voz ativa nesse mercado; os relacionamentos são
mais flexíveis, menos duradouros; a tradição e a rotina predeterminada foram substituídas
pela busca da emoção e do crescimento pessoal.) Um grande empresário, em conversa com
jornalistas da EXAME no ano passado, explicou assim a sua política de alianças e fusões:
"Nós fazemos como os adolescentes, primeiro 'ficamos' com alguém que nos atraia. Se for
bom, começamos um namoro, que pode acabar em casório ou ser apenas um caso".
Quase nenhuma empresa deixou de notar a nova importância do relacionamento com seus
funcionários. Não é à toa que já não se fala em departamento de recursos humanos. As
empresas andaram trocando esse nome por Gestão de Talentos, Departamento de Gente,
Núcleo de Pessoas, e por aí vai. É uma demonstração de boas intenções (ou um belo esforço
de maquiagem), mas ainda há muito caminho pela frente. Alguns dos mais fervorosos
discursos sobre a importância do capital humano foram proferidos pelo camarada Joseph
Stalin - que, como se sabe, não era assim tão camarada e costumava desenvolver seu precioso
capital humano em gulags na Sibéria.
Charles Handy afirma: "Quando a inteligência é o principal ativo, a empresa torna-se mais
parecida com uma reunião de grupos de projetos, alguns bastante permanentes, outros
temporários, alguns, ainda, em aliança com outros grupos". Segundo ele, a empresa do futuro
"será mais parecida com um condomínio ou uma associação de moradores temporários
reunidos para sua conveniência mútua". Para o consultor de gestão Gifford Pinchot, a
evolução das empresas tem três fases: primeiro, a organização hierárquica, em que a
ferramenta primordial é a delegação. Depois, a organização como comunidade, em que as
ferramentas-chave são visão e valores compartilhados. E, finalmente, a organização como
uma economia, quando as ferramentas são o empreendimento interno livre, educação e
liderança efetiva nos negócios centrais. Não é preciso acreditar integralmente nessas utopias,
mas que há uma clara tendência nessa direção, lá isso há. Motivação virou palavra-chave na
gestão de empresas. A professora de gestão da Harvard Business School Rosabeth Moss
Kanter enumera algumas ferramentas motivacionais:
Missão : A empresa deve ajudar as pessoas a crer na importância do trabalho;
Controle da agenda : Os subordinados devem ter tempo para trabalhar em projetos queridos; os resultados, e
não os procedimentos, devem ser enfatizados; trabalho e decisões devem ser delegados;
Aprendizado : Um empregado deve sentir que o trabalho está fazendo sua capacidade aumentar;
Reputação : A chance de aumentá-la é um grande motivador; e
Divisão da criação de valor : A recompensa pelos resultados deve ser justa.

Na nova economia, jogar a favor dos funcionários é o melhor meio de obter retornos.
"Quando as pessoas estão engajadas em projetos criativos ou de solução de problemas,
tendem a aparecer todas as horas, pensar no projeto em suas horas de folga, investir vastas
somas de energia física e mental nele", diz Rosabeth.

DEU A LOUCA NO MUNDO? ASSUMA O CAOS

Se estamos num mundo imaterial, liberto de grande parte das amarras físicas, em que as
possibilidades crescem em progressão exponencial e a maior riqueza das empresas é a
contribuição das pessoas em conhecimento, riqueza essa que é ilimitada, deveríamos estar
todos esfuziantes de entusiasmo, não é? Mas nós somos uns idiotas, mesmo. Não é que
conseguimos transformar todas essas promessas maravilhosas do mundo moderno em uma
fonte inesgotável de estresse?
Parece que os executivos estão liderando o campeonato da tensão. Basicamente, porque não
sabem como atender a todas as expectativas criadas pelo novo mundo dos negócios: as
empresas precisam ser globais e locais, pequenas e grandes, centralizadas em alguns
momentos e descentralizadas em outros. Os funcionários têm que ser ao mesmo tempo
autônomos e integrantes de equipe, e os gerentes devem delegar mais, mas também controlar
mais. Fácil, não?
Uma pesquisa da consultoria Arthur D. Little, feita com 2 800 executivos de várias empresas,
identificou as principais tensões a que eles se sentem submetidos:

• têm que pensar a longo prazo, mas devem mostrar resultados imediatos;
• são cobrados por inovação, mas não podem perder eficiência;
• devem pensar em escala global, mas não podem perder de vista as
responsabilidades locais;
• têm que colaborar, mas também competir;
• têm que fazer os negócios crescerem, mas sem perda de desempenho;
• devem trabalhar em equipe, mas são cobrados por sua responsabilidade
individual;
• têm que ser flexíveis, mas não podem deixar de seguir os padrões.

São os tais dos paradoxos da vida moderna. Como lidar com eles? José Elías Alvarez, diretor
de estratégia e prática organizacional da Arthur D. Little nos EUA, tem uma sugestão: assuma
o caos. "Quando chegar a uma encruzilhada, conquiste-a", afirma.
Para fazer isso, é preciso entender a natureza dos paradoxos. Segundo o dicionário de
filosofia da Universidade de Oxford, resolver um paradoxo envolve ou mostrar que há uma
falha nas premissas, ou que o raciocínio está errado, ou que a aparentemente inaceitável
conclusão pode, na verdade, ser tolerada. "Paradoxos são, portanto, importantes na filosofia,
porque até que um deles seja resolvido ele mostra que há algo no nosso raciocínio e nos
nossos conceitos que nós não estamos entendendo." Como diz o colunista do Wall Street
Journal Thomas Petzinger, Jr., no seu livro The New Pioneers (Os Novos Pioneiros): "Um
paradoxo não é igual a uma contradição. Embora pareçam incongruentes, ambos os termos de
um paradoxo são verdadeiros em um nível superior".
É esse nível superior de entendimento que você e a sua empresa precisam buscar. Porque, não
se iluda, paradoxos e contradições fazem parte da natureza humana, e agora, mais do que
nunca, estão no cerne do mundo dos negócios.

2 - As qualidades que vão determinar o sucesso ou o fracasso das empresas

VIDA OU MORTE - As qualidades que vão determinar o sucesso ou o fracasso


das empresas

As 7 virtudes capitas
Um guia de sobrevivência para as empresas na nova economia

Por David Cohen

Acho graça quando dizem que meu samba é quadrado, que está fora de moda, que é coisa do
passado. Querem apanhar café numa roça de arroz... O samba que eu faço agora viverá amanhã e
depois (Ataulfo Alves, Gente de Bem Também Samba)

A simples existência de uma empresa pressupõe que ela tenha um mercado, um produto ou
serviço a oferecer e, claro, meios de produzir e transformar sua atividade em lucros e novos
investimentos. Em qualquer instante, são essas as características que definem a empresa: o
que ela faz, para quem faz, quanto faz. Mas as empresas também mudam, algumas vezes
radicalmente. A Nokia, que há duas décadas produzia papel, é agora líder do mercado de
telefones celulares na Europa. A Mitsui, que fabricava cortinas no século 17, foi cambista
oficial do governo japonês no século 18 e hoje está metida em quase todos os ramos de
atividade empresarial (comércio, finanças e manufatura). Ao longo do tempo, sobreviver e
prosperar significa adaptar-se e mudar. Isso sempre foi verdade. O que há de diferente nesta
entrada do novo milênio é que o tempo encurtou. Mudanças que apareciam em gerações
agora surgem de um ano para outro.
Se lidamos com essa nova realidade - a inconstância da realidade -, uma outra dimensão das
empresas começa a ganhar importância: como elas fazem o que fazem, e por que fazem.
Ganha importância um outro tipo de características, qualidades intangíveis, incapazes de
definir as empresas em qualquer dado momento, mas que permitem que elas sobrevivam às
mudanças. Ou, mais que isso: que provoquem as mudanças e se alimentem delas. As
qualidades mais importantes para prosperar num mundo instável são virtualidade,
conectividade, capacidade de adaptação, rapidez, consciência, emoção e inovação.

• O mercado na contramão : A conexão permite um caminho de duas vias. O tradicional, do fornecedor


para a empresa e dela para o consumidor. E o inverso, do consumidor para a empresa e desta para o fornecedor.
Há dois fenômenos que reforçam esse caminho inverso. Primeiro, a possibilidade tecnológica de unir a produção
em massa ao mercado por encomenda. Segundo, a concorrência pela atenção dos consumidores.
• A Chrysler está colocando todo o seu inventário de carros usados na rede. A Toyota quer que seus clientes
possam pedir o carro da fábrica com as especificações que quiserem, para ser entregue duas semanas depois em
uma concessionária.
• O serviço de notícias brasileiro NewsMiner permite que os assinantes escolham que tipo de notícias querem
receber.
• Algumas companhias da Internet nos EUA estão dando um PC para que o consumidor veja anúncios.
Um dos cenários possíveis para o futuro é que consumidores participem do projeto dos produtos que querem
comprar e intermediários contatem as fábricas para montar os artigos ao gosto do freguês. Você está preparado
para passar o comando da sua empresa para os consumidores?

• Conexão pela Internet : Acessar a Internet não é sinônimo de conectar-se, mas é cada vez mais uma
condição necessária. A Internet acelera o processo. (Literalmente: multas por alta velocidade já podem ser pagas
em alta velocidade, em vários sites de departamentos de trânsito.) Algumas estimativas sugerem que a
quantidade de conteúdo da Web dobra a cada nove meses. A cada segundo, sete pessoas se conectam à Internet
pela primeira vez. Segundo a Forrester Research, os negócios de empresa com empresa nos EUA atingiram 48
bilhões de dólares em 1998 e estão crescendo ao ritmo de 99% ao ano. O guru do marketing Philip Kotler diz
que há sete modos de uma empresa usar a Internet:
1 - Fazer pesquisa
2 - Dar informações: propaganda no site, apoio ao consumidor (ex.: PalmPilot), conselhos (ex.:
Natura), distribuição de música ou textos, gerenciamento de recursos humanos (intranets), sistema
de apoio a revendedores (ex.: Ford)
3 - Promover fóruns (como faz a Harley-Davidson, que incentiva a criação da comunidade de
consumidores de suas motos)
4 - Fazer treinamento
5 - Comprar e vender (Dell, Amazon, GE)
6 - Fazer leilão (eBay, GE)
7 - Entrega de bits (música, livros, pareceres técnicos)

O REAL É VIRTUAL

No segundo andar do prédio da Xerox, na Avenida Rodrigues Alves, no centro do Rio de


Janeiro, trabalham funcionários de 18 empresas. Não é um andar sublocado. Todos esses
funcionários prestam serviço para a Xerox, obedecem aos horários da Xerox, respondem a
chefes da Xerox. Mas são pagos por outras firmas. O contrário também é verdadeiro. A Xerox
"invisível" (um termo usado pela direção da companhia) já é maior do que a Xerox visível:
dos seus 11 000 funcionários, 6 000 trabalham em outras companhias. Segundo o diretor
superintendente Guilherme Bettencourt, a tendência da Xerox é funcionar como um
departamento dentro da empresa cliente.
Assim como a queda do Muro de Berlim, em 1989, representou a falência dos regimes
totalitários do Leste Europeu, um dos principais símbolos da revolução corporativa do novo
milênio é a demolição das fronteiras nas empresas. "Em vez das fronteiras rígidas das
organizações de hoje, entre departamentos, processos, produção, a organização do futuro terá
fronteiras permeáveis, como as membranas flexíveis e móveis de organismos vivos", diz o
consultor Ron Ashkenas, da Robert H. Shaffer & Associates.
A permeabilidade das fronteiras é a primeira característica de uma empresa virtual. Será cada
vez mais difícil dizer onde termina uma empresa e onde começa outra, se você trabalha em
desenvolvimento de produtos ou marketing, em vendas ou contabilidade. Essa empresa
virtual, que pode erguer e destruir paredes ao seu bel-prazer, tem a enorme vantagem de ser
grande e pequena ao mesmo tempo. É o caminho que estão seguindo várias grandes
empresas, como Alcan e Rhodia, separando seus centros corporativos das unidades
operacionais - aqueles, preocupados com a identidade da empresa, políticas gerais e busca de
novas oportunidades; estas, com a produção e inovação de serviços. É uma forma de atingir o
tamanho ideal: grande para ganhar escala, pequena para ter motivação de artesão.
No limite, a empresa pode se tornar efetivamente virtual, ou seja, imaterial. O exemplo mais
citado é a Cisco, empresa de equipamentos de telecomunicações. A Cisco praticamente não
tem fábricas, e 85% de suas vendas são feitas pela Internet. O que a Cisco faz é coordenar
tecnologia, produção terceirizada e marketing. Ou a Dell Computers, que vende quase 20
milhões de dólares em computadores por dia, de seu site na rede. Os fornecedores da Dell
têm acesso em tempo real às informações sobre vendas, o que lhes permite organizar a
produção de acordo com elas, e os clientes podem se conectar à cadeia pela Internet, o que
lhes permite acompanhar seu pedido desde a fábrica até a entrega. Afinal, onde começa e
onde termina a Dell?
Certo, você pode achar que esses são exemplos do particularíssimo mundo da informática.
Vamos a um caso mais pé-no-chão: a Nike não tem nenhuma fábrica. A Nike não faz tênis. O
que a Nike faz é construir sua marca, coordenar a produção em fábricas associadas, escalonar
a distribuição. Ah, sim, e recolher os lucros. Há outros casos:
• A empresa de biotecnologia Monsanto tem uma extensão nos Estados Unidos: a Federal
Express. É a FedEx que transporta e estoca os contêineres da Monsanto. Ela tem até um
serviço de atendimento a clientes (e seus empregados atendem respondendo "Monsanto"). A
FedEx recolhe as dúvidas e as passa para uma equipe de especialistas, depois responde, fecha
a venda, faz a entrega dos produtos, cobra e manda a fatura.
• A Visa faz mais de 7 bilhões de transações por ano, um faturamento de 650 bilhões de
dólares, mas "pertence", se é que se pode usar esse termo, às mais de 20 000 instituições
financeiras que são suas clientes.
• A Aprilia, produtora italiana de motos, não fabrica uma única peça de motocicleta. Assim
como com a Benetton e a Gucci, quem fornece o produto que leva seu nome é uma rede de
pequenas empresas familiares, solução típica da Itália.
Nesse caminho para a virtualidade, não estamos falando apenas de terceirização. Às vezes o
trabalho é passado para o próprio cliente - como fazem as caixas automáticas dos bancos;
como a Tok Stok, cujos móveis são montados pelo próprio comprador; como o Shouldice
Hospital, de Toronto, faz com a preparação de pacientes para cirurgia de hérnia.
Também não é apenas desagregação da empresa em pedaços menores. Pensar virtualmente é,
em vez de ficar realocando seus bens, partir do princípio de não ter nenhum bem e buscar
justificativas para tudo o que tiver que possuir. O que importa na virtualidade não é a sua
oposição ao mundo físico. Até porque é no mundo físico que nós vivemos. O que importa é
que ela permite a exploração de um universo ilimitado, além de economias brutais em infra-
estrutura e aumento de eficiência.
No mundo com fronteiras mais permeáveis, também estão sendo demolidas as paredes entre
os setores industriais. A empresa americana Circuit City, que vendia rádios e amplificadores,
passou a vender carros usados. Nos países escandinavos, a Shell (aquela mesma, a companhia
de petróleo) é a maior vendedora de lingüiça embalada. Até os serviços e produtos estão
sendo invadidos por essa nova lógica da virtualidade. "Produto é só um meio de tirar nota
fiscal. O que importa é o conteúdo", diz o consultor José Carlos Teixeira Moreira, da JCTM
Marketing Industrial. A livraria virtual Borders e outras já estão investindo em máquinas que
permitam imprimir na hora o livro pedido pelo cliente, o que acabaria com a necessidade de
estoques. A editora americana Matthew Bender, que vendia por milhares de dólares
enciclopédias ou CD-ROMs de referência para advogados, agora usa a Internet para vender
apenas as partes relevantes de informação, cobrando de 6 a 35 dólares. Isso sem falar no
padrão MP3, que possibilita a distribuição de música pela Internet. É claro que não são todos
os artigos que permitem essa desmaterialização, mas há uma migração geral do produto para
o relacionamento, e não é de hoje. Há muito a Gillette subsidia os barbeadores, para vender
lâminas. A Kodak praticamente deu a câmera Instamatic aos consumidores, para vender
filmes. E os filmes são baratos, para poder vender a revelação. No mundo virtual, essa
tendência se intensifica: menos importância do produto, mais do conteúdo e do
relacionamento.
Outra característica da virtualidade é a transparência. "Tudo o que você faz, numa sociedade
em que não há mais distinção entre o tempo de ação e de informação, deve ser publicável.
Transparência passou a ser precondição de sobrevivência", afirma o consultor Ricardo
Guimarães, da Guimarães Profissionais. Isso não é uma preocupação, é uma vantagem. Como
diz Chuck Martin, no livro O Futuro da Internet (Makron), "quando o cliente se acostuma
com o seu método, ele dificilmente vai procurar outro". O mesmo vale para as parcerias.
Uma conseqüência da virtualidade, da falta de fronteiras seguras, é que a companhia não
promete mais tomar conta do empregado - o que é muito justo, porque essa promessa seria
falsa e vazia no mundo de hoje. Talvez até no mundo de ontem. Nos EUA e na Grã-Bretanha,
a duração média de um emprego continua a mesma desde a década passada, por volta de seis
anos. Até o tão decantado emprego vitalício no Japão só se aplicava a um terço dos
trabalhadores do país, incluindo o setor público. É bom que o novo discurso reconheça a
realidade que de uma forma ou de outra sempre esteve presente no mercado de trabalho, mas
era camuflada por uma retórica paternalista: cada um é livre e responsável pelos rumos de sua
carreira. Não é um mundo perfeito, mas é um mundo menos hipócrita.
Segundo Charles Handy, ex-professor de negócios da London Business School, a organização
de hoje é um lugar 20 por 80, em que apenas 20% das pessoas envolvidas são empregados de
horário integral. Os outros são fornecedores, contratantes, empregados de tempo parcial ou
profissionais auto-empregados. "Mais e mais, a organização é uma caixa de contratos, em vez
de uma casa para a vida toda para todas as pessoas." Talvez seja exagero, mas a Organização
para Cooperação e Desenvolvimento da Europa, OCDE, e a Organização Internacional do
Trabalho, OIT, relatam que o trabalho de meio expediente aumentou durante a década de 80
em praticamente todos os países desenvolvidos, subindo cerca de 30% e alcançando 50
milhões de pessoas. Em compensação, a taxa de auto-emprego nos EUA tem-se mantido
estável em 8,5% nos últimos 40 anos, o que parece desmontar a difundida tese de uma futura
sociedade de agentes livres. A maioria de nós quer liberdade, mas quer também uma
estrutura. Essa estrutura é a empresa. Não a velha empresa compacta, mas a empresa virtual,
que funciona cada vez mais na lógica da rede.
A LIBERDADE É CONECTADA

Por volta de 2003, daqui a pouco mais de três anos, pelo menos 40% das grandes
organizações vão adotar o sistema de empresa virtual, conectando não apenas sua cadeia de
fornecimento, mas toda a cadeia de valores. A previsão é do americano David Whitten, vice-
presidente de pesquisas do Gartner Group. "Isso traz desafios: modelos de negócios
emergentes, interdependências externas, redefinição de papéis e funções, invenção de novos
processos", afirma Whitten. "As empresas vão ter que migrar da infra-estrutura para a extra-
estrutura." Em outras palavras, vão ter que se conectar.
Alguns teóricos, como Allan Cohen, reitor da escola de negócios americana Babson College,
chamam isso de empresa estendida. É como funciona, em certa medida, a Wal-Mart. Quando
os fornecedores lhe enviam produtos, eles nem entram na empresa - são passados direto do
caminhão em que chegaram para o caminhão que os enviará a alguma loja. Um indício de
que as empresas caminham para a conectividade é a sua crescente integração. "Até o começo
da década, não havia pesquisa da indústria para medir a satisfação do distribuidor", diz
Nelsom Marangoni, presidente da Research International do Brasil. "Hoje, já nos
encomendam pesquisas sobre satisfação do cliente intermediário." Outra área em expansão
são pesquisas encomendadas pela indústria para ajudar o varejo a vender seus produtos.
Integração dificilmente pode ser um termo definido como novidade. O que é novo é que a
lógica das redes cruzou o ponto em que podia apenas ser citada como exemplo e tornou-se a
própria essência do mundo dos negócios. Segundo o sociólogo Manuel Castells, já não se
pode dizer que a economia mundial seja centrada nas empresas multinacionais. Mesmo que
elas continuem a exercer controle oligopolista conjunto sobre a maioria dos mercados, diz
Castells, a maior parte das multinacionais participa e depende de diferentes redes, sejam de
produtos, processos ou países. Castells nota que a produção e as vendas na economia mundial
mais do que triplicaram nos últimos 30 anos, mas desde meados dos anos 60 a maioria das
grandes empresas americanas, européias e japonesas perdeu participação de mercado. O que
vale, portanto, não é o tamanho, mas a posição. O que define a importância de uma empresa é
qual nó da rede ela ocupa, que processos passam por ela, a quantos mercados, empresas ou
clientes ela se conecta.
Há uma palavra japonesa que define bem essa conexão de empresas: keiretsu, que significa
literalmente "união sem cabeça". Este é o nome dado às redes de companhias japonesas
independentes que possuem parcelas umas das outras e trabalham juntas de vários modos.
Isso não é exclusividade dos orientais. A americana Pinnacle Alliance, por exemplo, uma
empresa de gestão de tecnologia da informação, é uma parceria entre Computer Sciences,
Andersen Consulting, AT&T Solutions e Bell Atlantic Network Integration. Os dois primeiros
são inimigos ferozes no campo da tecnologia da informação, os dois últimos são adversários
inconciliáveis em telecomunicações. Outra forma de integração é a da Chrysler. Ela reduziu
seus fornecedores nos EUA, dos 2 500 da década passada para 1 140, e passou a se envolver
diretamente no desenvolvimento das peças. Também a Coca-Cola está trocando o processo de
engarrafamento no mundo todo. Saem as pequenas empresas familiares e entram as
multinacionais, das quais a Coca adquire participação acionária.
Alguns outros exemplos de integração:
• Há seis anos, a Fiat pegou as prensas e funcionários de sua fábrica de Betim e levou tudo para Ipatinga, a mais
de 350 quilômetros de distância, para fazer suas chapas para carros dentro da sede da Usiminas. O acordo
agregou valor para o aço vendido pela Usiminas e economizou espaço na fábrica da Fiat.
• Empresas farmacêuticas como Amgen, Novartis, Rhône-Poulenc e Roche têm participação nos departamentos
de pesquisa de pequenas empresas de biotecnologia. "Levando em conta que, para uma nova molécula virar
uma droga comercial, se passam em média 12 anos com gastos de 600 milhões de dólares, as companhias têm
que estabelecer redes num mar de inovações", diz Georges Haour, especialista em gestão tecnológica do
Instituto Internacional de Desenvolvimento de Gestão (IMD, com sede na Suíça).
• A Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, que há quatro anos tinha 15 alunos fazendo intercâmbio, hoje tem 75
(60% na Europa, 40% nos EUA). Segundo o diretor da escola, Alain Stempfer, a GV tem parcerias com 43
universidades estrangeiras.

Criar essa integração é mais ou menos como estender a filosofia de trabalho em equipe para
fora da empresa. Para isso, é necessária outra mentalidade. Na empresa de equipamentos de
informática Bull do Brasil, o profissional de finanças requerido deixou de ser o especialista
em contabilidade e passou a ser um gestor de relacionamento administrativo-financeiro com o
cliente.
Ninguém disse que integrar-se é fácil. Como afirma o ex-executivo da Shell Arie de Geus, no
livro A Empresa Viva (Campus), comportar-se com preocupações de ecossistema requer um
salto de fé: acreditar que você vai estar mais protegido pela harmonia e pelo companheirismo
do que pela territorialidade e pela força de vontade. Por mais que possa ser complicado esse
salto de fé, não há escolha. O mundo caminha para o outro lado do abismo. O exemplo mais
claro, de novo, vem da Internet. Um dos critérios que começam a se impor nos programas
que listam páginas da Web é ordená-las de acordo com o número de conexões que tenham.
Quanto mais ligações com outras páginas - de parceiros, de sites complementares, até de
concorrentes -, mais bem colocada estará a empresa na lista.
Este é o paradoxo da coopetição (cooperação + competição), um termo inventado pelo
consultor americano James Moore em O Fim da Concorrência (Futura). "A forma tradicional
de pensar em concorrência é em termos de ofertas e mercados. Seu produto ou serviço é
confrontado com o do concorrente, e um deles vence. Mas o novo paradigma refere-se à
criação de mercados. Trata-se de definir e ajudar a modelar redes de contribuições e
processos com a finalidade de tecer novas e ricas tapeçarias econômicas", diz Moore. Alguns
exemplos de coopetição:
• Cirurgiões de cinco hospitais da Nova Inglaterra (EUA) passaram todo o ano de 1996 observando uns aos
outros e conversando sobre o seu trabalho. O resultado foi uma queda de 24% de mortes nas cirurgias de ponte
de safena, o equivalente a 74 vidas salvas.
• Philips, Sony e outros competidores estão unidos desenvolvendo padrões tecnológicos para discos ópticos. Em
setembro, a IBM decidiu que vai passar a vender tecnologia para empresas rivais.
• A United Airlines lançou um serviço para facilitar as combinações de vôos de seus passageiros - e o serviço
permite comprar a passagem e escolher uma poltrona também nas linhas aéreas concorrentes.

Alianças serão o principal negócio de todas as companhias do novo milênio, em qualquer


ramo. (A IBM fez mais de 800 alianças nesta década. Metade do calhamaço de papéis sobre a
mesa do escritório de António Firmin, presidente do grupo de hotelaria e serviços Accor, é de
projetos de parcerias.) Ao comentar o trabalho que espera os executivos na nova economia, o
guru da administração C. K. Prahalad põe no alto da lista "conceber e executar estratégias
complexas, não só para ganhar lucro ou participação de mercado, mas para influenciar a
evolução de padrões da indústria e entrar em novos mercados". Essas estratégias podem ser
seguidas pela empresa sozinha, mas no mais das vezes terão de incorporar fornecedores,
clientes, colaboradores e concorrentes.

A FORÇA É ADAPTÁVEL

• A companhia sueca Stora tem sete séculos de existência. Já foi mina de cobre, já teve uma
organização militar que lutou contra o rei da Suécia, já explorou florestas, produziu aço,
energia hidrelétrica, e agora faz papel, polpa e produtos químicos. Suas tecnologias também
mudaram, do vapor para a combustão interna, para a eletricidade e agora para o microchip.
• Após 111 anos funcionando como companhia elétrica, a Westinghouse foi dissolvida em
1997 para se concentrar no grupo de mídia CBS.
• Supermercados britânicos começaram a vender gasolina, e agora detêm 25% das vendas do
produto no país. Em resposta, os postos estão abrindo lojinhas que vendem comida e outros
produtos. Na Escandinávia, a tendência foi tão longe que a Texaco abriu um posto de
gasolina que não vende gasolina.
• Quando fracassou no mercado o seu primeiro projeto, um hidroavião, a Boeing se sustentou
fabricando móveis.
• Para ser mais eficiente, a empresa de caminhões Schneider National inventou um sistema de
logística para economizar combustível e horas de trabalho. Mudou de ramo. Hoje vende o
sistema de logística, e entre seus clientes está a General Motors.

A idéia de adaptação de uma empresa se espelha no conceito darwiniano de evolução das


espécies - só sobrevivem aquelas que conseguem se adequar às mudanças do meio ambiente.
Ser adaptável é estar preparado para as mudanças. Mas como saber que mudanças virão?
Segundo David Ingvar, ex-chefe do Departamento de Neurobiologia da Universidade de
Lund, na Suécia, a solução é criar "memórias do futuro". Ingvar diz que as pessoas estão
constantemente fazendo planos, fantasias, cenários, e as lembranças desses planos e conceitos
têm para o cérebro a mesma natureza das memórias de acontecimentos passados.
A forma mais efetiva de criar essas memórias do futuro é o planejamento de cenários.
"Aprender a focar cenários para o objetivo de um negócio foi a contribuição da Shell, no final
dos anos 60", afirma o ex-executivo da empresa Arie de Geus. "Os planejadores de cenário da
Shell se gabam, corretamente, de ter se preparado para as crises de 1973 e de 1979: o
crescimento de conservação de energia e a redução da demanda por petróleo, a evolução do
movimento ambiental global e até o colapso da União Soviética."
Para planejar bem, é preciso ter o máximo de visões discordantes, com o máximo de opiniões
heterodoxas - vindas de brincadeiras de crianças, visitas a museus, livros de história, mas sem
descuidar dos livros e revistas de negócios, das opiniões de especialistas e do pessoal interno.
Uma vez escritos, os cenários devem ser testados e quantificados com a ajuda de modelos de
simulação e bancos de dados, para restringir a atenção aos que são mais prováveis,
consistentes e lógicos.
Houve um tempo em que se acreditava que preparar-se para o futuro era simplesmente
extrapolar as linhas dos gráficos para os anos seguintes. Chamava-se a isso de planejamento.
No mundo instável, esse futuro linear não chega nunca. Preparar-se para o futuro, hoje, é
preparar-se para o máximo de possibilidades.

A PERFEIÇÃO É RÁPIDA

Uma lenda chinesa conta a história de Chuang-tzu, um homem multitalentoso a quem o rei
pediu que fizesse o desenho de um caranguejo. Chuang-tzu respondeu que precisaria de cinco
anos, uma casa de campo e 12 servos. O rei concordou. Cinco anos mais tarde, o desenho não
estava nem começado. "Eu preciso de mais cinco anos", disse Chuang-tzu, e o novo prazo foi
concedido. Ao final desses dez anos, o rei voltou para cobrar a promessa. Chuang-tzu então
pegou seu pincel e, num instante, com uma simples riscadela, desenhou o caranguejo. O mais
perfeito caranguejo jamais visto.
Essa história é contada pelo escritor Italo Calvino no livro Seis Propostas para o Novo
Milênio (Companhia das Letras), representando o tipo de rapidez que ele recomendava para o
século 21. É claro que isso é uma lenda, e ainda por cima oriental, com sua tradicional ênfase
na paciência. Mas há um caso parecido, na vida real e no Ocidente.
Em 1877, o pintor americano James Whistler fez o quadro Noturno em Preto e Dourado: a
Queda do Foguete, para uma exposição britânica em Detroit. Sobre ele, o respeitado crítico
John Ruskin escreveu: "Já vi muita baboseira, mas nunca pensei que veria um artista
pretensioso pedir 200 guinéus por jogar na cara do público um rastro de tinta". Whistler
processou Ruskin por danos morais. Durante o julgamento, ocorreu a seguinte altercação:
"Você pede 200 guinéus pelo trabalho de dois dias?", disse Ruskin. "Não. É pelo
conhecimento que adquiri no trabalho de uma vida inteira", respondeu Whistler, que acabou
ganhando o processo. Mas, como isso era na vida real, a indenização foi estipulada em meio
centavo. As despesas do artista com a ação judicial ajudaram a levá-lo à falência.
De qualquer forma, o conceito sobreviveu. E essa é a rapidez necessária para a sua empresa.
Como tê-la? Se você entrar na Honda ou em alguma outra empresa asiática durante uma
sessão Nimawashi, verá uma discussão acalorada de executivos exaltados. Pensará que está
acontecendo algo crucial e urgente. Mas a reunião se encerra sem nenhuma conclusão. Não
há ações a serem tomadas, nem recomendações. No dia seguinte, os executivos vão discutir
novamente, e novamente não chegarão a nenhuma conclusão. É o que eles chamam de
levantamento da situação. Discutem por que estão fazendo o que fazem, quais são as ameaças
e oportunidades que os rodeiam, como tornar a vida mais simples. Quando uma situação de
emergência surgir, estarão preparados para ser rápidos.
Como disse Sam Walton, no livro Made in America, ao explicar o sucesso da Wal-Mart:
"Como a maioria dos sucessos da noite para o dia, este levou cerca de 20 anos para ser feito."
Só que 20 anos é um tempo de que ninguém mais dispõe. "Experiências recentes sugerem
que novas empresas levam pouco mais de dois anos para formular uma idéia de negócios
inovadora, estabelecer uma presença na Web e dominar o setor escolhido. Nessa hora, pode
ser tarde demais para negócios tradicionalmente lentos reagirem", escreveu a revista The
Economist, em reportagem sobre o modo como a Internet está mudando o mundo dos
negócios.
Por que a rapidez é hoje uma característica tão essencial? Segundo Castells, a economia em
rede tem um novo fundamento ético, um novo espírito: "É a cultura do efêmero, uma cultura
de cada decisão estratégica, uma colcha de retalhos de experiências e interesses, em vez de
uma carta de direitos e obrigações".
Para Allan Cohen, do Babson College, as empresas vão ter que mudar estratégias mais
rápido, acelerar o ciclo de desenvolvimento dos produtos, ser muito mais próximas das
necessidades dos clientes. "Por causa da tecnologia, da globalização, da privatização e da
desregulamentação, as mudanças de expectativa dos consumidores são muito maiores." Uma
conseqüência prática é que os ciclos de desenvolvimento de produtos têm de ser feitos em
equipe. "Não dá mais para cada grupo cumprir a sua função e passar o resultado para outro
departamento, depois outro", diz Cohen.
Outra forma de ser rápido é estar conectado, como no exemplo da Wal-Mart, em que as
mercadorias vão direto do fornecedor para a loja de destino. Um terceiro modo é fazer
protótipos para testar logo com os consumidores. A Sony é famosa por isso. "Eles não ficam
projetando aparelhos perfeitos, colocam centenas de modelos no mercado e vêem quais os
que vendem", diz Cohen. Lew Platt, presidente da Hewlett-Packard, diz que a principal
competência de sua empresa é "pegar uma idéia, transformá-la num produto e levá-la ao
mercado rapidamente".
Em um mundo em que o bem mais importante é o conhecimento, rapidez adquire valor de
mercado. Um dos mais importantes componentes do preço de uma empresa da Internet é
quantos dias podem ser economizados comprando a tecnologia da empresa, em vez de
desenvolvê-la por conta própria.
O IMPULSO É CONSCIENTE

Se a empresa está ficando virtual, conectada, adaptável e rápida, o que lhe garante
identidade? Como não se perder nos meandros da rede, como não se transformar
simplesmente num conjunto de pessoas fazendo um determinado trabalho durante algum
tempo, à espera de um projeto novo que pode surgir de qualquer ponto? É aí que entra o
caráter. "Caráter é destino", dizia o filósofo grego Heráclito de Éfeso. Segundo o consultor de
estratégia Michael Porter, fazer algo que é comprovadamente bom para qualquer empresa, em
qualquer situação, não é estratégia. É obrigação. Ter uma estratégia é escolher algo que você
sabe - e quer - fazer. É seguir o seu caráter.
Empresa nenhuma pode ser otimista quanto ao seu futuro se não prestar contas com o
passado. Como diz o consultor de marketing industrial José Carlos Teixeira Moreira,
modernizar é resgatar o sujeito, analisar e avaliar a história da companhia, para descobrir os
pontos em que houve criação de valor. "É como na astronomia. Quanto mais se olha para
longe, mais se olha para o passado."
O próprio aproveitamento de oportunidades depende da cultura da empresa. Segundo o sueco
Johan Roos, professor do IMD, o que você vê depende de quem você é. "A gestão tem que
entender as normas, crenças, valores e visão de mundo dos empregados, grupos, unidades e
da companhia como um todo. Isso forma a base a partir da qual se pode ver o futuro, e decidir
que novos conhecimentos são legítimos e quais não são." A forma que ele sugere para criar
laços entre as pessoas é contar histórias. Conclusões e instruções não dão espaço para o
pensamento, diz Roos. As histórias, sim, permitem que as pessoas tragam suas próprias
interpretações. Segundo o sociólogo Richard Sennett, professor da London School of
Economics e da New York University, narrativas são mais do que simples crônicas de
eventos. "Elas dão forma ao movimento do tempo, sugerindo razões por que as coisas
acontecem, mostrando suas conseqüências."
As histórias que as companhias contam sobre si mesmas afetam seu comportamento. Quando
a Boeing estava desenvolvendo o avião 747, o diretor Crawford Greenwalt perguntou a um
membro da alta gerência qual seria a projeção de retorno dos investimentos. O gerente falou
que eles tinham feito alguns estudos, mas não chegaram a nenhuma conclusão sobre a
estimativa de retorno. Por que então decidiram fazer o novo avião? "Ora, porque nós somos a
Boeing!" Perseguir o lucro é importante, claro, mas a auto-expressão de uma companhia é o
que a mantém viva.
A Mitsui, por exemplo, era uma corporação gigante com mais de 100 subsidiárias em 1945,
quando a ocupação americana ordenou o fim dos conglomerados que dominavam a economia
japonesa. As holdings foram liquidadas. A Mitsui Bussan se dissolveu em 170 companhias
separadas. Em 1952, com o fim da ocupação, líderes das pequenas empresas passaram a se
reunir regularmente. Pouco a pouco, várias delas voltaram a se unir adotando o antigo nome.
Embora a Mitsui tenha morrido, sua identidade permaneceu viva nas companhias do grupo.
Isso depende da cultura da empresa. Na Alemanha, em condições semelhantes no pós-guerra,
o Deutsche Bank foi dissolvido e retornou à força total, com o antigo nome. Já a empresa
química I.G. Farben foi desmembrada em duas, Basf e Hoechst, que nunca mais se uniram e
hoje competem ferozmente entre si.
Outro elemento formador do caráter é o propósito. Ele pode criar um ponto de estabilidade e
um contexto motivacional para os empregados. Em chinês, os caracteres antigos para a
palavra "negócio", de mais de 3 000 anos de idade, significam "sobrevivência de propósito".
O estudo da Shell sobre companhias duradouras mostrou uma ligação entre as companhias de
longa vida e um forte senso de valores, diz o ex-executivo Arie de Geus.
Quando uma empresa tem consciência do seu propósito, o controle muda de natureza. "Se
você cria um ambiente em que as pessoas participam de verdade, não precisa de controle.
Elas sabem o que precisa ser feito e fazem", diz Herb Kelleher, presidente da Southwest
Airlines, a empresa aérea mais bem-sucedida financeiramente dos EUA. Destruído o mito da
empresa-mãe, que recompensa o bom comportamento, a única forma de motivar os
funcionários é fazê-los acreditar que as metas da companhia vão ajudá-los a atingir suas
metas individuais.
No livro Making Democracy Work (Fazendo a Democracia Funcionar), Robert Putnam diz
que não há poder e disciplina hierárquica que substituam a ausência de comportamento cívico
e confiança mútua na comunidade. Mas comportamento cívico não deve ser confundido com
consenso passivo. Segundo o presidente da Pfizer, William Steere, é preciso que haja uma
tensão criativa. Senão a discórdia vai ocorrer fora das reuniões, não dentro; haverá resistência
passiva na implementação de decisões; e, não havendo conflito direto, as pessoas serão
estimuladas a "ler nas entrelinhas" e agir politicamente.
Como reconhecer o caráter de uma empresa? Segundo o psicólogo americano Nathaniel
Branden, consultor de auto-estima, um modo prático é perguntar, sobre cada comportamento
desejável, se ele é recompensado, punido ou ignorado pela empresa. A resposta indica as
características com que uma companhia realmente se importa, não aquelas com as quais ela
diz que se importa. Outra fórmula é dada por James Collins e Jerry Porras, em Feitas para
Durar (Rocco). Quando você tiver esboçado uma lista de valores centrais da empresa, faça a
seguinte pergunta com relação a cada um deles: "Se as circunstâncias mudassem e nós
fôssemos punidos por ter este valor, em vez de recompensados, nós ainda o seguiríamos?"

O RACIOCÍNIO É EMOTIVO

• A cadeia de lojas de roupas americana Nordstrom tem um manual de regras implacável. A


regra número um diz: "Use o bom senso em todas as situações. Não haverá outras regras".
• O escritório em que o consultor José Carlos Teixeira Moreira recebe os industriais que o
contratam tem um único diploma pendurado na parede. É o diploma da escola de
datilografia da Remington, que ele cursou em 1959 em São José do Rio Preto. Quando o
visitante pergunta o que aquilo significa, Teixeira Moreira explica que, de todos os cursos
que fez, inclusive a faculdade de marketing de Perkings, nos EUA, é daquele que sua mãe
sente mais orgulho, e é por isso que o diploma está lá - com um efeito de marketing muito
maior do que teria o da faculdade de marketing.

Num mundo em que o relacionamento é mais importante do que o produto, ou melhor, em


que o relacionamento faz parte do produto, não há como deixar a emoção de fora. Num
mundo dominado pelo conhecimento, ao contrário do que diz a tradição cartesiana, não pode
haver oposição entre razão e emoção. É isso o que explica o neuropsiquiatra António
Damasio no livro O Erro de Descartes (Companhia das Letras). "Não vejo as emoções e os
sentimentos como entidades impalpáveis e diáfanas, como tantos insistem em classificá-los.
O cerne do cérebro e o córtex cerebral trabalham em conjunto, criando a emoção e o
sentimento, da mesma forma que o fazem para a visão." Damasio não apenas eleva o status
das emoções. Sua teoria do marcador somático mostra como os sentimentos são
imprescindíveis para o bom funcionamento da razão. (Os exemplos são dramáticos: pacientes
com lesões cerebrais na região associada à emoção, que têm ótima pontuação em testes de
inteligência, não conseguem trabalhar porque perderam a capacidade de tomar decisões.)
Pela teoria de Damasio, a emoção confere valor às situações, e sem esse valor não há como
diferenciá-las. Mais: quando o corpo tem uma sensação desagradável, esse sinal faz com que
a pessoa rejeite imediatamente um rumo de ação, levando-a a escolher entre outras opções. A
emoção serve, portanto, como um orientador da razão. (É por isso que pacientes com
deficiência emotiva não conseguem decidir: as opções ficam infinitas.) Algumas vezes, esses
processos não constituem o centro de nossas atenções, passando-se fora do campo da
consciência. "Esse mecanismo oculto seria a fonte daquilo que chamamos intuição", diz
Damasio.
Os matemáticos Henri Poincaré e Jacques Hadamard concordam: "Uma prova matemática
pode ser descoberta por tentativas inconscientes, guiadas por uma inspiração de caráter
decididamente estético, e não pelo pensamento racional", dizem. (É claro que esse resultado
deve ser testado depois, pelos critérios racionais.) O Prêmio Nobel de Física George
Thomson escreveu um livro chamado A Inspiração da Ciência, e o texto na capa começa com
as palavras "a ciência é uma arte".
Há quem veja o crescente uso da tecnologia como um obstáculo às relações pessoais. O
"homem digital" seria alguém preso em casa, cujo contato com o mundo se dá através de
máquinas. Não é bem assim. O Minitel, um sistema de comunicação por videotexto criado na
França, era usado por estudantes na década passada para organizar manifestações de rua
contra o governo. William Steere, da Pfizer, diz que está ficando mais fácil não viajar. Por
isso, fazer o esforço é uma afirmação da importância das pessoas. Charles Handy afirma que,
quanto mais virtual uma empresa se torna, mais seus funcionários precisam se encontrar em
pessoa. Os encontros, porém, são diferentes: não para entregar coisas, mas para que as
pessoas se conheçam.
Handy provavelmente não conhece David Whitten, vice-presidente do Gartner Group. No ano
passado, Whitten contratou um consultor. O contato foi feito por e-mail e todo o trabalho era
passado pela Internet e por telefone. Nove meses depois, ambos tinham de estar numa
conferência. Cada um sabia que o outro estaria lá, mas nem lhes ocorreu marcar um encontro.
Acabaram se esbarrando num corredor, reconheceram-se pelos crachás e caíram na
gargalhada. A tecnologia não é necessariamente um obstáculo ao encontro à moda antiga.
Mas ela suscita, sim, novos tipos de contato, e devem ser explorados novos meios de criar
emotividade.
O guru do marketing Philip Kotler cita uma companhia de seguros americana que atende
principalmente militares, a USAA. "Não conheço nenhum cliente que não adore a
companhia, e não há nenhum contato físico. Mas quando alguém telefona o atendente aciona
um banco de dados, pergunta se a filha passou no vestibular, sabe que a mulher dá aula na
universidade..." Kotler chama essa combinação de high-touch (alto toque), a conexão pessoal
feita com alta tecnologia (high-tech). Alguns exemplos:
• A cadeia de lojas de produtos para animais Mars Petfood, da Alemanha, tem um banco de
dados com os nomes de todos os donos de gato no país e manda cartões de aniversário para
os gatos.
• Uma loja da Sony em Manhattan tem uma cabine interativa. Você pode digitar três nomes, e
o computador informa suas raízes musicais, as músicas em comum e as influências mútuas.
Ninguém paga pelo serviço, mas as pessoas costumam deixar a loja com uma compra na
mão, embora a Sony não dê nenhum desconto.

A PERENIDADE É INOVADORA

De todas as qualidades que uma empresa deve ter, é esta a mais importante: a capacidade de
inovar. É isso, em última análise, que faz uma empresa merecer o nome de empresa. No
momento de sua criação, há uma proposta. Inovar é recriar essa proposta, de acordo com as
novas condições do mercado. Quanto mais mudanças há no mercado - e é disso que é feita a
realidade do novo milênio --, maior a exigência de inovação. Todas as outras qualidades são
essenciais, mas para acompanhar, aproveitar, reagir às mudanças. Com o perdão do truísmo,
inovar é estar um passo à frente.
Por que deixamos esta mais importante das qualidades por último? Porque ela é, de certa
forma, uma combinação das outras. E porque está intimamente ligada ao assunto do próximo
capítulo - a gestão do conhecimento.
Parece óbvio que a capacidade de inovar seja uma característica positiva, mas a realidade não
é tão simples. Como diz Michael Dertouzos, em O Que Será: "Quase nenhuma grande
inovação foi bem-vinda quando apareceu. Mas depois de um tempo, como notou o filósofo
Arthur Schopenhauer, todo mundo concorda que 'aquela sempre foi obviamente uma
excelente idéia'".
A maior parte dos estudos que prezam a inovação como qualidade-chave das empresas de
sucesso deixa de lado os exemplos de companhias extremamente inovadoras que
sucumbiram. "Eu lembro quantas indústrias de pratos prontos congelados já quebraram. Elas
erraram? Não. Só estavam fora do tempo!", diz Nildemar Secches, da Perdigão. Sua empresa
está lançando uma média de 30 produtos novos por ano, vários deles no ramo de congelados.
A Nottingham Building Society, uma instituição financeira britânica, lançou há uns 15 anos
um serviço de home banking, com videotexto. Era um serviço muito além do seu tempo, e
nunca decolou.
Mas o número de produtos à frente do seu tempo está caindo rapidamente, porque o ritmo das
mudanças está se acelerando. Ser inovador está deixando de ser um risco e passando a ser
uma obrigação. Não, vamos reformular isso: inovar não está deixando de ser um risco. Está é
se tornando um risco menor do que não inovar.
É essa pesagem de riscos que se deve ter em mente para mudar a cultura da empresa. A nova
cultura deve aceitar os erros. "Não há chance de ter uma boa tecnologia sem uma enorme
quantidade de fracassos. É uma regra universal", diz o físico Freeman Dyson. "O fracasso é o
nosso produto mais importante", diz R. W. Johnson Jr., da Johnson & Johnson, uma empresa
acostumada a inovar, manter o que dá certo e rapidamente descartar o que não funciona.
Inovação também tem seus custos, e não só os de investimento em criatividade. Segundo o
brasileiro Ophir Toledo, presidente da Philips dos Estados Unidos, na nova economia as
companhias não podem ter medo de canibalizar seus próprios produtos. Um exemplo? "Nós
investimos no desenvolvimento e produção de telas planas com tecnologia de cristal líquido
(LCD). Quanto mais o LCD se desenvolver, mais obsoleto ficará o tubo de raios catódicos,
uma de nossas áreas mais prósperas." A 3M leva essa noção a ferro e fogo. Todo ano, há uma
meta de porcentagem de venda de produtos que não existiam há cinco anos.
A lógica é que os custos da inovação vão ser compensados. No ano passado, os funcionários
da Mercedes-Benz Credit Corporation em Norwalk, Connecticut, investigavam
freneticamente meios de acabar com seus próprios empregos. Por quê? Porque os que eram
bem-sucedidos ganhavam novos empregos que ajudavam a empresa a crescer. A Sony tem
um ciclo de invenção em eletrônica que agora excede o ciclo de estoques das lojas de
produtos eletrônicos. Por depender de varejistas, não consegue levar seus produtos às
prateleiras com rapidez suficiente para alimentar os consumidores mais ávidos por novidades.
Na batalha pelo mercado de malhas nos Estados Unidos, a campeã da economia em rede,
Benetton, foi superada em 1995 pela Gap, cuja arma mais efetiva foi a inovação: a cadeia
americana passou a apresentar novos modelos a cada dois meses, em comparação com as
duas vezes por ano da Benetton.
A busca da inovação - sua constante recriação - deve ser a principal preocupação da empresa
do novo milênio, e deve ser feita com uma política consciente, rápida, virtual, conectada,
emotiva e adaptável. A inovação não pode ser deixada ao acaso. Como já frisava Richard
Carlton, presidente da 3M na década de 50: "É verdade que a nossa empresa já encontrou por
acaso alguns de seus novos produtos. Mas nunca se esqueçam de que só se pode encontrar
algo por acaso se você estiver em movimento".

3 - Como administrar a maior riqueza do futuro - a inteligência

GESTÃO DA INTELIGÊNCIA - Como administrar a maior riqueza do futuro

O fim do segredo
O melhor jeito de multiplicar o conhecimento é dividi-lo

Por David Cohen

Aprendi a dizer não, ver a morte sem chorar,


e a morte, o destino, tudo, a morte, o destino,
tudo estava fora de lugar. Eu vivo pra consertar.
(Geraldo Vandré, Disparada)
Há um segredo para administrar o conhecimento, essa nova riqueza do mundo dos negócios.
É um segredo muito bem guardado, mas consiste, basicamente, de apenas quatro palavrinhas:
não há mais segredo. (Se você acha que isso é um paradoxo, então veja este: as próximas 5
994 palavras são para explicar essas 4.)
No mundo de negócios tradicional, conhecimento é poder. Só a Coca-Cola detém a fórmula
da coca-cola. O protótipo de um carro novo é mantido em sigilo até a data do lançamento. O
método de produção é defendido como segredo de Estado por se tratar de um diferencial
competitivo.
Guardar o conhecimento para si faz sentido quando ele é a matriz de um produto ou serviço
que, este sim, se quer difundir. (E o preço do produto será tanto maior quanto menos gente
souber como fazê-lo.) Há outro caso em que se justifica a economia do segredo: o reforço da
hierarquia. O diretor financeiro escolhe quem pode e quem não pode saber qual é o lucro da
empresa. Só o chefe sabe quais os critérios para contratar, promover ou demitir alguém.
Esse tipo de gestão do conhecimento não está condenado à morte. Ele vai continuar a existir,
vai se desenvolver e vai trazer seus benefícios e prejuízos usuais. Mas há hoje uma nova
prática no mundo dos negócios. Segundo ela, o poder não está em deter conhecimento, mas
em disseminá-lo. Quanto mais informação você divide com os outros, maior o seu retorno. É
assim que novas tecnologias podem se tornar padrão mundial, é assim que uma empresa pode
arregimentar uma rede de fornecedores, é assim que você pode atrair clientes que ajudem a
planejar o produto que eles querem.
Dentro dessa nova prática, gestão do conhecimento não é mais o incentivo a um
departamento de gênios e a proteção dos direitos intelectuais. Gestão do conhecimento é
orientar a empresa inteira para produzir este que é o bem mais valioso da nova economia,
descobrir formas de aproveitá-lo, difundi-lo, combiná-lo. E de lucrar com ele. Em cada caso
particular, as empresas vão ter de escolher qual o tipo de gestão do conhecimento que usarão:
o segredo ou a cooperação, a evolução ditada pelas leis de mercado ou pela revisão dos pares.
Na maioria das vezes, será necessário um misto dessas duas formas de gestão.

ACABOU A DISTRAÇÃO

O reinado do conhecimento como o principal produto da sociedade é descrito pelo sociólogo


Manuel Castells como uma evolução histórica. O primeiro modelo de relação natureza-
cultura foi o de primazia da natureza. O segundo, estabelecido nas origens da Era Moderna e
associado à Revolução Industrial e ao triunfo da Razão, foi a dominação da natureza pela
cultura. Estamos agora entrando em um terceiro estágio, em que a cultura se refere a si
mesma, tendo suplantado a natureza a ponto de esta ser renovada (ou "preservada")
artificialmente como uma forma cultural. "É o começo de uma nova existência e, sem dúvida,
o início de uma nova era, a era da informação, marcada pela autonomia da cultura ante as
bases materiais de nossa existência", afirma Castells, em A Sociedade em Rede (editora Paz e
Terra).
O mundo do trabalho passa por transformação semelhante. Um dos patriarcas do
industrialismo, o engenheiro americano Frederick Taylor, acreditava que as máquinas e os
projetos industriais ficariam imensamente complicados, mas não seria necessário que os
trabalhadores os entendessem. Quanto menos "distraídos" pela compreensão, mais eficientes
seriam em seus trabalhos. Isso não se aplicava somente aos operários. Uma das primeiras
empresas do mundo, a britânica Companhia das Índias Orientais, foi chefiada durante 35
anos, a partir de 1823, pelo economista John Stuart Mill, que cumpria expediente das 10 da
manhã até as 4 da tarde e aproveitava boa parte dessas horas para escrever suas obras. Ele
considerava o trabalho de executivo apenas "suficientemente intelectual para não se tornar
enfadonho, sem causar nenhuma pressão" sobre seus poderes mentais, como escreveu em sua
biografia.
Isso é passado. A indústria hoje exige, tanto de executivos como de operários, que agreguem
valor a processos e produtos. Esse valor - a essência da inovação - é obtido com
conhecimento. Estamos, de certa forma, caminhando ainda mais para o passado. Segundo
Aristóteles e Platão, toda execução de objetos materiais, até mesmo de obras de arte,
representa uma atividade de segunda ordem, se comparada com a produção de idéias.
Euclides se gabava que seu estudo de números primos não tinha nenhuma utilidade para a
vida grega. O matemático inglês G.H. Hardy se orgulhava de que nenhuma descoberta sua,
no campo da teoria dos números, faria a menor diferença para o mundo prático. Estavam
errados: números primos, um conhecimento sem aplicação por 2 300 anos, são a base dos
códigos de segurança de informação para computadores. Dois mil anos depois que os gregos
decidiram estudar uma curva chamada elipse, astrônomos descobriram que ela descreve as
órbitas dos planetas. Em 1854, o matemático alemão Bernhard Riemann resolveu brincar com
os postulados de Euclides e construiu uma geometria ridícula baseada numa abstração
chamada espaço curvo, e 60 anos depois Albert Einstein anunciou que esse era o formato do
universo.
Nem todos concordam que estejamos na era da informação. O intelectual italiano Umberto
Eco, por exemplo, diz que no mundo de hoje não temos mais informação, temos menos.
"Quando peço uma bibliografia na Internet e recebo uma lista com 10 000 títulos, não tenho
nenhum ganho de informação com isso. Com a Internet, corremos o risco de nos tornar
autodidatas. O autodidata é aquele que absorve uma enorme quantidade de informações,
muito mais do que um professor universitário, mas não sabe filtrá-las", disse em entrevista ao
jornal O Estado de S. Paulo, em maio. O risco é verdadeiro, mas o avanço é inegável, e uma
medida do avanço é justamente o teor das críticas que recebem as novas tecnologias, vindas
de gente que domina as antigas.
A situação é semelhante à de uma lenda egípcia. Quando o deus Thoth revelou ao rei Thamos
a sua descoberta da arte da escrita, o bom rei a denunciou como inimiga da civilização.
Thamos reclamava que as crianças e os jovens, que sempre tinham sido forçados a memorizar
tudo o que lhes era ensinado, dali em diante deixariam de exercitar sua memória.

O QUE É COMUM VALE MAIS

O que há de diferente num mercado em que a cultura se relaciona com a cultura e em que o
conhecimento é não apenas uma forma de modificar produtos, mas um produto em si
mesmo? Eis algumas das diferenças:
• os recursos são infinitos;
• quanto mais se dá, mais se tem;
• e quanto mais se tem, mais se precisa;
• a flexibilidade é quase absoluta (a matéria-prima, o pensamento, é maleável);
• não há depreciação do produto (que vem a ser uma idéia), há relação com a idéia sucessora.
O que funciona segundo essa nova lógica? Toda a área de saúde, ciências, entretenimento,
comunicação, educação. Na indústria tradicional, os conceitos que dão origem aos produtos.
Por isso, num desfile de modas, não importa se aquelas roupas nunca vão ser usadas na rua;
não é o produto que está à venda, é o conceito que vai influenciar um mercado têxtil de
milhões de dólares.
Nessa lógica, a concorrência não se dá mais no espaço, e sim no tempo. Um exemplo: a
descoberta do vírus da Aids é disputada pelo cientista americano Robert Gallo e pelo
pesquisador francês Luc Montagnier. As duas equipes e todos os pesquisadores que trabalham
nisso têm o mesmo interesse, curar a doença, e cooperam uns com os outros. A disputa é para
determinar quem faz as descobertas primeiro. Não é só uma questão de glória, é uma questão
de garantir investimentos para continuar as pesquisas. (Por isso, rapidez é uma das
características essenciais da empresa do futuro.)
Há uma outra peculiaridade no mundo do conhecimento: o comum vale mais que o raro. A lei
de diminuição de retornos diz que o valor de um item cai quando sua oferta aumenta, mas o
segundo telefone faz o primeiro valer mais. O valor do programa Windows, da Microsoft,
cresceu por causa da sua adoção por milhões de usuários.
A inversão não se dá apenas na ponta da receita, com a valorização do produto, mas também
na ponta da despesa. Depois dos milhões de dólares investidos no desenvolvimento de um
software, o custo do segundo programa é praticamente zero. (O custo do segundo carro, não,
porque há gastos com matéria-prima e trabalho.) Quando o produto pertence ao reino do
conhecimento, portanto, há um prêmio maior para a inovação: ela é a única área em que há
concentração de valor. A regra é: inovar ou tornar-se commodity.
Essa concentração de valor é claramente percebida pelo mercado financeiro, como mostra
uma pesquisa feita pela consultoria Arthur D. Little. A pesquisa examinou as cotações em
bolsa de companhias que a revista Fortune listou, durante 15 anos, de acordo com seu grau de
inovação. Os 20% de companhias mais inovadoras deram a seus acionistas o dobro dos
retornos médios em sua indústria. Os 20% de companhias menos inovadoras tiveram retornos
de menos de um terço da média das outras empresas. "Mais de 90% dos analistas de Wall
Street afirmam que a importância da inovação aumentou significativamente nos últimos dez
anos", dizem os consultores Ronald Jonash e Tom Sommerlatte.
A inovação não se restringe ao produto. As parcerias e alianças da fabricante de chips Intel
com os fabricantes de computador estenderam sua cadeia de valor. Sua inovação na estratégia
de marketing, criando uma identidade para o chip, transformou uma commodity em marca,
afirmam Jonash e Sommerlatte. Levando tudo em conta, a capacidade de inovação da Intel
lhe rendeu um crescimento anual composto de 42% no valor de suas ações nos últimos dez
anos.

Inovação sem propriedade

• A Web, a rede mundial de computadores, que tanto aumenta a produtividade das empresas, teve seu início com
o intuito de aumentar a cooperação científica, utilizando a prática acadêmica da revisão pelos pares. Essa
prática se baseia na idéia de que a cooperação de gente capacitada promove o desenvolvimento de forma mais
rápida que a defesa acirrada da propriedade intelectual.
• O modem, aparelho que permite troca de dados por computador, foi inventado por dois estudantes de Chicago,
Ward Christensen e Randy Suess, em 1978. Eles difundiram a tecnologia sem nenhum custo porque o objetivo
era espalhar as capacidades de comunicação o máximo possível.

Até aí, apesar de as duas inovações serem cruciais para o mundo moderno, estávamos no
terreno do altruísmo, pouco levado a sério como modelo de negócios. O sistema operacional
Linux, desenvolvido a partir de uma idéia do finlandês Linus Torvalds, mudou esse
panorama. (Sistema operacional é o programa-base, que permite que o computador funcione.)
O Linux é um sistema aberto. Qualquer um pode usá-lo e modificá-lo sem pagar direitos
autorais, mas toda modificação deve ser também oferecida gratuitamente pela Internet.
Parece coisa de sonhadores, mas o estágio de desenvolvimento chegou a tal ponto que
grandes empresas (IBM, Oracle, Intel) estão aderindo ao sistema. A distribuição do Linux
cresceu mais de 190% no ano passado e continua aumentando.
Se é tudo de graça, quem ganha dinheiro com isso? Há todo um mercado baseado nesse
sistema operacional. José Carlos Benfatti, da consultoria ZZP, faz parte dele. Sua empresa
presta serviços de informática a grandes firmas. "Meu negócio é viável porque há gente
desinteressada desenvolvendo o Linux", diz. Em contrapartida, cada problema solucionado
por ele é meticulosamente explicado no site do desenvolvimento do sistema.
O Linux é o melhor exemplo até hoje de uma alternativa à política de propriedade do
conhecimento. O sistema é considerado muito seguro. Não trava, é elegante. Por quê?
• Em primeiro lugar, por causa da revisão pelos pares. Cada passo é testado por gente
competente, não há "caixa-preta".
• Em segundo lugar, há seleção natural. Só os melhores conseguem resolver problemas e
imprimir sua marca no sistema. Por outro lado, o trabalho é feito com prazer, e sem a
pressão de prazos industriais.
• Em terceiro lugar, não há os limites impostos pela produção empresarial. "Se alguém
descobre um jeito de melhorar o programa, mas a aplicação exige a mudança de todas as
linhas do programa, a resposta de uma empresa seria 'você está louco?'. No Linux, dá para
fazer", diz Benfatti. Mas um sistema de cooperação assim não pode ser aplicado em
qualquer situação. Eis os requisitos para um desenvolvimento do tipo do Linux, de acordo
com Benfatti:

1. Os problemas têm que ser interessantes. Só assim vão despertar a ajuda de gente capaz;
2. A natureza do trabalho tem que permitir a distribuição de responsabilidades. Avanços são
feitos por gente que nem se conhece. É um trabalho individual ao extremo, e ao mesmo
tempo totalmente de equipe;
3. O capital tem que ser requerido na maior parte para recursos humanos. "Se for necessário
um acelerador de partículas, não vai dar para um sujeito do Bornéu colaborar com
alguém de Johannesburgo", diz Benfatti;
4. Tem que haver possibilidade de desenvolvimento com pequenas alterações. Assim,
pequenos passos permitem avanços visíveis - e glórias visíveis para quem os deu.

A GESTÃO DA IGNORÂNCIA

Para atingir esse grau de inovação, as empresas precisam deixar um pouco de lado a gestão
do conhecimento e investir na gestão da ignorância, afirma outro consultor da Arthur D.
Little, Robert Shelton. "Gestão da ignorância é o processo de identificar as coisas mais
importantes que a equipe não sabe e projetar uma política que ajude a reduzir essa ignorância
a um nível que permita avanços. Experiências são grandes ferramentas na gestão da
ignorância."
De certa forma, a busca incessante da inovação exige que se jogue fora um conselho muito
em voga, o do foco da empresa. "Manter a empresa ao lado e junto do cliente e ater-se ao
conhecido são dois conselhos do livro Vencendo a Crise, de Tom Peters e Robert Waterman,
que não foram corroborados por nossa pesquisa", afirmam James Collins e Jerry Porras,
autores de Feitas para Durar (editora Rocco).
É claro que as inovações não adiantam nada se não forem aplicadas, e nesse ponto os
defensores do foco têm razão. Nenhuma organização vai para a frente se não tiver
prioridades. O consultor e gestor de empresas Edson Vaz Musa conta que, quando ainda era
presidente da Rhodia do Brasil, viajou aos Estados Unidos para dar apoio a uma reunião da
Rhône-Poulenc americana. Lá, ouviu os executivos falarem das 12 prioridades da empresa.
No intervalo, em volta da máquina de café, perguntou ao presidente quais eram as
prioridades. Ele só se lembrou de cinco. O chefe de operações se lembrava de seis, apenas
três delas iguais às do presidente. "Assim a empresa não podia ir para lugar nenhum", diz
Musa.
Foco deve existir, desde que não imobilize a empresa. Até porque uma inovação que não
tenha a ver com o caráter da empresa sempre pode ser abandonada. A Philips recentemente
vendeu um projeto cujo objetivo era desenvolver um laser, pois foi considerado distante dos
objetivos da companhia. O preço da venda foi muitas vezes maior do que o orçamento para o
projeto - um retorno excelente para o investimento em pesquisa e desenvolvimento.
Focar e alinhar a empresa é tornar-se vulnerável, diz Jay Galbraith, pesquisador do Centro
para Organizações Eficientes, da Universidade do Sul da Califórnia (USC). "Fórmulas de
sucesso não duram muito. As vantagens são facilmente copiadas ou ultrapassadas por
competidores", afirma. Por outro lado, o desalinhamento de estratégia, estrutura e processos
faz a organização perder energia com fricções. "Nós precisamos de um novo projeto
organizacional em que estruturas e processos possam ser realinhados com uma constante
mudança de estratégia." Galbraith recomenda três procedimentos: times interdepartamentais;
utilização de preços e mercado internos, para coordenar a complexidade do relacionamento
dos times; e alianças para adquirir as competências que a empresa não tem.

SOMOS COMO AS BALEIAS?

Não adianta nada falar de gestão da ignorância e política de inovação constante, se não
houver também uma capacidade de aceitação dos erros. Não há escalada sem tombos, não há
corrida sem tropeços, não existe progresso sem erros. Como administrá-los?
Charles Coonradt, presidente da consultoria americana The Game of Work (O Jogo do
Trabalho), usa uma parábola: para treinar uma orca a saltar sobre uma corda a sete metros de
altura, o pessoal do Sea World prepara o ambiente de forma a reforçar o princípio de que ela
não tem como falhar. Começam colocando a corda abaixo do nível da superfície. Quando a
orca passa por baixo da corda, nada acontece - nem castigo, nem crítica, nada. Mas toda vez
que ela passa por cima da corda recebe peixes e agrados. À medida que a orca vai passando
por cima da corda mais vezes do que por baixo, a equipe vai levantando a corda. "Precisamos
criar as circunstâncias para que as pessoas não falhem", diz Coonradt. "Elogie muito, critique
o menos possível... e saiba a que altura colocar a corda."
O ex-professor de negócios Charles Handy dá um exemplo mais... humano: o sistema de
exames de música britânico tem altíssimo nível internacional e um índice de aprovação quase
universal. É um sistema pelo qual os pupilos só fazem o teste quando seus professores
consideram que eles têm boa chance de ser aprovados. O teste não depende de idade. Uma
pessoa só o faz quando está pronta.
Infelizmente, o mundo não é assim tão cor-de-rosa. No mercado competitivo, ninguém vai
ficar esperando até que você esteja preparado para assumir riscos. O que, aliás, deixado por si
só, pode não acontecer nunca. Estudos psicológicos mostram que as pessoas se preocupam
mais com as perdas do que com os ganhos, tanto nas carreiras quanto no casamento ou em
jogos. "É por isso que a tomada de riscos é algo diferente de uma alegre revisão de
possibilidades contidas no presente. A matemática do risco não oferece segurança, e a
psicologia da tomada de riscos foca bastante racionalmente no que pode ser perdido", diz o
sociólogo Richard Sennett.
Ou, como explica o neurologista português-americano António Damasio, da Faculdade de
Medicina da Universidade de Iowa: "É difícil imaginar que os indivíduos e as sociedades que
se regem pela busca do prazer, tanto ou ainda mais do que pela fuga à dor, consigam
sobreviver. Há mais variedades de emoção negativa que de emoção positiva, e é claro que o
cérebro trata de forma diferente esses dois tipos de emoção".
Por isso é importante deixar claro o que a empresa e as pessoas perdem quando não assumem
riscos - é preciso criar a imagem do risco de não aceitar riscos. Por isso também o ambiente
da empresa conta tanto. Não basta não punir os erros. É preciso criar formas de celebrar as
pessoas que tomam iniciativas, torná-las visíveis e invejáveis na empresa. Quando ocorre um
fracasso, a diretoria deve promover algum ato simbólico, como por exemplo um post-mortem
de projetos, para saber o que pode ser aprendido.
Já que os erros são inevitáveis, Robert Shelton, da Arthur D. Little, recomenda errar de forma
rápida e barata: "Defina testes práticos, construa protótipos e lance-os rapidamente.
Geralmente é melhor trabalhar em parceria com um grande cliente ou fornecedor, para dividir
os custos, os riscos e o aprendizado. Analise os resultados e modifique o protótipo". O grupo
britânico Virgin dá metas de três meses às pessoas encarregadas de trazer novas idéias para
negócios. Se as metas não são cumpridas, a idéia é abandonada e ninguém fala de fracasso.
Dois consultores do Instituto Internacional de Gestão do Desenvolvimento (IMD, com sede
em Genebra), o sueco Johan Roos e o americano Bart Victor, têm uma sugestão para lidar
com os erros: brincar. "A brincadeira é um contexto no qual os riscos podem ser tomados sem
risco, no qual o inimaginável pode ser imaginado sem medo, no qual o inesperado pode ser
realizado sem hesitação", dizem.
A brincadeira "séria", definida por Roos e Victor, começa com a fase da construção. Os
executivos transportam para o mundo real aquilo que está na imaginação, usando bloquinhos
de plástico, massinha, desenhos, o que for. A segunda fase é contar histórias. Isso faz as
pessoas desenvolverem uma visão comum. A terceira fase é transformacional. Aí entram o
conflito, a argumentação, a cooperação. Segundo os estudiosos, essa brincadeira permite
chegar a novas conclusões sobre o significado da estratégia da empresa, o papel de cada um,
as verdadeiras ameaças e oportunidades.

PODER PARA QUEM PODE

Inovação pressupõe mudanças, e a gestão do conhecimento, que se justifica na empresa pela


necessidade de inovar, deve levar em conta o gerenciamento das mudanças. Segundo o
professor de estratégia do IMD J.B. Kassarjian, liderar mudanças é um paradoxo. "O líder
concebe a necessidade, dá a direção e dirige a mudança: isso pode soar óbvio, mas é também
errado. Os dados necessários para mudanças são mais fáceis de ser encontrados na periferia
do poder, nos canais de vendas, nos engenheiros que visitaram a última feira, no pessoal de
pós-venda. O primeiro paradoxo é que os presidentes que tomam para si o papel de grandes
agentes de mudança em geral reduzem sua capacidade de observar à distância e tomar ações
corretivas", afirma Kassarjian.
Há um mito persistente de que o poder pertence à pessoa no topo da pirâmide de decisão.
Mas, como notam os consultores americanos Jim Taylor e Watts Wacker, em Delta 500 Anos,
"no mundo de caos, o poder é da pessoa que controla a variável mais instável". Na
organização de conhecimento, o poder está por definição investido em cada nível da empresa
(porque são todos trabalhadores de conhecimento). É isso que faz a empresa ser enxuta e
flexível, diz a americana Sally Helgesen, escritora especializada em futuro das organizações.
Além disso, levar a cabo um grande projeto de mudança não pode ter passos determinados.
Um projeto dessa natureza exige improvisação por muitas pessoas, em vários pontos.
Chegamos, então, ao segundo paradoxo: a necessidade de dar autonomia aos funcionários. É
o conceito do empowerment. O problema é muito sucintamente definido por Richard
Teerlink, presidente da Harley-Davidson: "Se você der autonomia a idiotas, terá decisões
idiotas".
O paradoxo, de acordo com Kassarjian, é que "as pessoas têm esperanças, medos, aspirações,
potencial para engajamento e resistência obstinada, mas nenhum líder pode lhes dar um senso
de autonomia - para ser real, essa sensação tem que ser ganha, não pode ser doada. Não
existem atalhos para desenvolver o talento humano".
É o que diz também o consultor americano Richard Leider, fundador do Inventure Group,
líder no setor de desenvolvimento de carreiras. "Os indivíduos têm que dar poder a si
mesmos. Só as pessoas podem escolher tomar uma nova direção ou arriscar a reputação em
suas carreiras para chegar a uma nova visão, porque toda mudança é uma mudança pessoal.
Toda mudança é escolha, e envolve perdas. Não há como mudar de forma bela, limpinha."
DENTRO OU FORA DA EMPRESA?

Se não é possível liderar sozinho, nem contar com toda a organização, uma primeira solução
é identificar e incentivar os líderes do conhecimento. Mas, como a empresa não pode mais ser
uma organização vertical, sob pena de perder oportunidades, tolher a inovação e brecar a
rapidez, não se trata mais de colocar os jovens talentos em postos cada vez mais importantes,
e sim de lhes dar responsabilidade sobre unidades de negócios, por pequenas que sejam. A
Canon indicou um de seus gerentes técnicos para liderar sua área de negócios multimídia. A
HP é organizada em relativamente pequenas divisões autônomas, cumprindo o desejo de
William Hewlett e David Packard de manter seu espírito empreendedor.
Essa política não é uma invenção de empresários ou consultores. Ela é uma solução de
compromisso surgida quase naturalmente para acomodar os interesses de jovens talentosos e
de empresas num mundo com muito mais oportunidades do que no passado. O consultor
americano Marshall Goldsmith aponta algumas tendências no mundo do trabalho:
a) O status reduzido do trabalho em grandes empresas. Uma pesquisa mostrou que formandos
da Harvard Business School que trabalhavam para empresas menores tendiam a ganhar
mais e ter mais satisfação do que os funcionários de grandes empresas. Professores notam
que mais da metade dos estudantes de administração de hoje pretendem ter seu próprio
negócio.
b)A freqüente falta de conexão entre pagamento e contribuição. Gerentes consideram que a
diferença de retorno entre um empregado de alto desempenho e um mediano é de mais de
100%, enquanto a diferença de salário fica entre 5% e 10%.
c)O declínio de oportunidades de promoção. Sem chance de pular degraus, jovens talentos se
sentem mais inclinados a procurar outras oportunidades.
d)O aumento da carga de trabalho, com os cortes de pessoal de apoio.
e)O aumento da influência do trabalhador de conhecimento.

É com todas essas tendências que a empresa tem que lidar, se não quiser perder seus ativos
mais importantes - gente que pensa. Para manter os funcionários de alto desempenho,
Goldsmith aconselha:
• identifique claramente quem você quer manter. Em várias empresas que fizeram ajustes, o
pessoal que saiu foi aquele que podia encontrar outro trabalho mais facilmente;
• faça com que eles saibam que você quer mantê-los;
• dê reconhecimento;
• dê oportunidades de desenvolvimento e envolvimento;
• adote um plano de compensações ousado;
• relaxe a cultura da empresa; menos regras dão noção de liberdade;
• crie oportunidades de torná-los empreendedores internos - uma espécie de donos de um
negócio dentro do negócio.

Peter Lorange, presidente do IMD, sugere que a melhor forma de tratar empreendedores
internos é com uma espécie de controle não-autocrático. "É um modo de dar ao
empreendedor acesso direto à direção da empresa. Estar perto, para que o apoio possa ser
dado quando pedido, e ao mesmo tempo dar-lhe distanciamento, permitindo a separação dos
negócios. Assim ele tem o espaço para ser independente e a força de pertencer a uma
corporação." A companhia lucra porque esses empreendedores não têm as amarras da
empresa, não acreditam nos limites impostos pelo foco do negócio.
A política de empreendedores internos pode evoluir para divisões autônomas, como as da HP.
O exemplo mais conhecido são os laboratórios secretos da Lockheed Aircraft - espaços
separados para inovadores trabalharem sem a interferência do resto da organização. Foi assim
que a Lockheed fez avanços radicais em projetos de aviões de espionagem, na década de
1940. Hoje, a 3M e a Motorola têm políticas de "atividades extras", e a DaimlerChrysler, a
Matsushita e a Microsoft mantêm equipes isoladas do restante da empresa no Vale do Silício.
Esse isolamento permite que as equipes sejam mais ousadas ao quebrar regras e, talvez mais
importante, as mantém a salvo dos preconceitos vigentes nas organizações, que podem ser
muito rápidos em matar idéias novas.
Esse isolamento não significa formar uma empresa separada. Na Sharp, as Equipes de
Projetos Urgentes (EPU) recebem prioridade de acesso a recursos na companhia toda. Na
prática, isso quer dizer que qualquer divisão pode perder seus funcionários mais capazes por
mais de um ano para uma EPU. Na Toshiba, o caminho é de ida e volta: o grupo de estratégia
avançada tem a missão de transferir tecnologias para novos negócios, bem como reintroduzir
inovação, desafios e velocidade na estrutura de gestão da Toshiba.

A MULTIPLICAÇÃO DO CONHECIMENTO

No ponto em que estamos, a empresa consegue identificar os elementos que geram


conhecimento e incentivá-los a criar valor para a companhia. Isso ainda não é tudo. É preciso
multiplicar essa prática. Há várias estratégias para fazê-lo. Uma delas é a da General Electric,
que trabalha sistematicamente para reduzir fronteiras. A empresa encoraja encontros nos
quais os empregados trocam idéias com seus gerentes, e estes são obrigados a tomar decisões
imediatas sobre as propostas, na frente do grupo todo.
Se uma empresa é voltada para o conhecimento, isso deve estar claro na própria distribuição
de tarefas dos funcionários. Dos 34 000 empregados da empresa de telecomunicações
finlandesa Nokia, 8 000 trabalham com pesquisa e desenvolvimento. O número é
impressionante, mas não quer dizer que os outros 26 000 estejam isentos da responsabilidade
de inovar - todos eles são envolvidos no processo de desenvolvimento de idéias. A gestão do
conhecimento também pode ultrapassar os limites da empresa. Na Chrysler, fornecedores são
trazidos à fábrica para opinar no desenvolvimento de novos veículos, junto com engenheiros,
projetistas e executivos. A GE também envolve clientes e fornecedores nos programas de
treinamento, e divide informações, autoridade, competência e recompensas pela organização.
A empresa de equipamentos de informática Bull se associou ao Instituto de Tecnologia de
Massachusetts (MIT) e à Universidade Harvard, com direito a cursos e participação em
projetos que eles desenvolvam. Assim a empresa pode pensar com antecedência em como
utilizar as novas descobertas.
Um jogo ainda mais complexo é a gestão do conhecimento dos outros, uma prática que a
Lucent Technologies domina como poucas companhias. "A empresa gasta 12% de sua receita
anual em pesquisa e desenvolvimento, uma quantia importante, mas nem de longe a maior da
indústria", diz Robert Shelton, da Arthur D. Little. "O que faz a diferença é como a Lucent
gerencia esses investimentos de 3 bilhões de dólares por ano. Por exemplo, ela tem seu
próprio fundo de capitais de risco, para buscar companhias com tecnologias inovadoras que
complementem sua linha de produtos." Na gestão de seus recursos, a empresa - responsável
por um dos laboratórios mais produtivos do mundo, o Bell Labs - decide se vai produzir,
comprar ou colaborar na produção das inovações de que precisa. Parece ser uma política
vitoriosa: o preço de suas ações subiu mais de 160% no ano passado.

VER A MORTE SEM CHORAR

Um dos aspectos da gestão do conhecimento é a aceitação da morte. Segundo Charles Handy,


a história da vida de qualquer projeto obedece a uma curva sigmóide (em forma de S).
"Começamos lentos, experimentais e vacilantes, crescemos e depois declinamos." Por isso,
ele defende que a hora certa para iniciar um segundo projeto não é quando o primeiro
apresenta sinais de declínio, mas quando ele está chegando perto do ápice.
Sua proposta é que as empresas (e também as pessoas) comecem a traçar uma segunda curva
durante o bom período da primeira. Se esta segunda curva se revelar um engano, nada se
perde, pois só a fase exploratória terá sido posta em prática. Manter as duas curvas
funcionando vai se tornar um hábito. O modo de iniciar a segunda curva, segundo Handy, é
fazer perguntas, desafiar as hipóteses subjacentes aos projetos da empresa para conceber
alternativas, espalhar idéias e possibilidades. As melhores hipóteses devem ser testadas, na
teoria e na prática. Por fim, os resultados das experiências são revistos.
É algo parecido com o que diz o guru da administração, Peter Drucker. Ele define inovação
como uma "mudança que cria uma nova dimensão de desempenho". Inovação deve se tornar
parte da cultura da empresa, diz Drucker. Ao mesmo tempo, deve-se praticar um "abandono
planejado" e descartar programas que dão certo hoje mas não darão no futuro.
A "morte" revigora as empresas. Na década de 1950, a empresa farmacêutica Merck adotou a
estratégia de abrir mão conscientemente de participação de mercado quando os produtos iam
se tornando mercadorias de baixa margem de lucro, forçando-se a produzir inovações a fim
de crescer e prosperar. A Motorola usou um mecanismo semelhante de "inovar ou morrer",
com sua prática de cortar linhas de produtos consolidados com um grande volume de vendas,
obrigando-se a preencher o vazio com novos produtos. (A empresa fez isso com aparelhos de
TV e rádios para carros.) A Boeing criou um programa chamado "Olhos do inimigo", que
atribui aos gerentes a tarefa de desenvolver estratégias como se trabalhassem para uma
empresa concorrente com o objetivo de acabar com a Boeing.

VOCÊ QUER FICAR MAIS RICO?

Todas essas práticas - identificar líderes, separar bolsões de inovação, espalhar, comprar ou
produzir conhecimento - são essenciais, mas não alimentam a si mesmas. A mais importante
de todas as políticas de uma empresa que quer inovar é investir em seu pessoal. "Hoje o
ponto crucial não é criar uma cultura de conhecimento, mas uma cultura de aprendizado, que
vai gerar conhecimento", diz Emerson de Almeida, presidente da Fundação Dom Cabral, um
centro de estudos sobre negócios sediado em Belo Horizonte.
Não se trata apenas de a empresa desenvolver sua principal riqueza (a inteligência). No
mundo do trabalho de hoje, o aprendizado é uma das moedas de remuneração do profissional.
Segundo o guru da reengenharia Michael Hammer, a essência do novo contrato nas empresas
- além do pagamento de salário pelo tempo de trabalho - é uma troca: iniciativa por
oportunidades. A companhia oferece a oportunidade e os meios educacionais para o
funcionário obter sucesso pessoal. Em troca, o empregado promete iniciativa na criação de
valor para clientes e conseqüentemente lucros para a companhia.
O psicólogo alemão William Stern já dizia, em 1919, que, para prosperar, qualquer estrutura
deve deixar claro para os seus componentes que a sobrevivência e a auto-realização deles
serão mais bem realizadas se eles trabalharem em conjunto pela sobrevivência e pelo
desenvolvimento do todo. Com o fim do contrato paternalista, que prometia segurança em
troca do cumprimento de normas, estabelece-se um novo tipo de troca: um empregado, ao
deixar a companhia, deve ser um indivíduo mais capaz e mais conhecedor do que quando
entrou na empresa. Isso, é claro, desde que ele aproveite as oportunidades.
Sim, porque este é um fator não muito bem explicado. "Se a inteligência é a nova base da
propriedade e da riqueza, é estranho que nós nem sempre pareçamos ávidos por obter mais
para nós mesmos", diz Charles Handy, em A Era do Paradoxo. Esse não é um paradoxo novo.
"As pessoas que investem na educação sempre se saem melhor. Sempre foi esse tipo de
pessoa que se destacou", diz Paulo Ferraz, presidente do banco Bozano, Simonsen. E
completa: "Eu adoraria dizer que as pessoas estão percebendo que têm de aprender.
Infelizmente, não posso. Eu vejo por aqui. E olha que a gente vive incentivando estudo,
mandando gente para seminários..."
A BACTÉRIA E A IBM

Aprendizado sempre há, diz o cientista Stuart Kauffman, especialista em teoria da


complexidade. Qualquer mecanismo de feedback que causa mudança de comportamento é
aprendizado. "Podemos descobrir que a bactéria E. coli e a IBM conhecem o mundo a seu
redor de modos muito parecidos", diz Kauffman. A questão é acelerar esse aprendizado,
explicitá-lo, aproveitá-lo da melhor forma possível. Essa forma é a distribuição - e não a
retenção - do conhecimento.
Há hoje um ambiente muito mais propício ao aprendizado - nem que seja apenas pela pressão
de um mercado cada vez mais exigente. Há dez anos, apenas um em cada seis estudantes era
adulto nos EUA. Hoje, quatro em cada seis estudantes de nível universitário estão fazendo
cursos após a formatura ou enquanto estão empregados. Na Fundação Getúlio Vargas de São
Paulo, os cursos de reciclagem entre 1991 e 1995 tiveram um aumento de 600% no número
de alunos, e de 1995 para cá esse número dobrou, com a solicitação de conhecimento por
parte das empresas. A educação continuada rendeu à GV 500 mil reais em 1991. Em 1995,
foram 7 milhões. Este ano, por volta de 13 milhões.
As companhias americanas gastam por volta de 60 bilhões de dólares por ano em
treinamento. A Internet deve ampliar o número de programas de aprendizado e reduzir
drasticamente os custos: cerca de 70% dos custos de treinamento são devidos a transporte,
comida, alojamento e instrutores. Com a revolução da informação, escola vai se tornar algo
que você faz, não um lugar para onde você vai.
O aprendizado também já está sendo percebido como uma forma de pagamento e como
segurança no mercado de trabalho. A Rhodia investe num projeto de empregabilidade para
seus funcionários - um programa de identificação de competências, com um espaço de
treinamento em computação, liderança e cursos técnicos - na fábrica de Santo André, em São
Paulo. Um programa na Perdigão fez 3.000 funcionários voltarem a estudar, do total de
15.000.
Funcionários mais capacitados e treinamento mais rápido significa ciclo de desenvolvimento
de produtos mais curto. No futuro, o aprendizado just-in-time será uma vantagem competitiva
tanto quanto hoje é a produção just-in-time.

REALIDADE FEITA DE IMAGINAÇÃO

Que tipo de aprendizado deve ser enfatizado no mundo dos negócios? Em primeiro lugar, é
óbvio, o treinamento específico requerido pelas funções atuais e do futuro imediato. Mas,
num mundo instável, como saber as necessidades do futuro um pouco além do imediato?
Como manter-se à frente? O ministro da Educação do Brasil, Paulo Renato de Souza, defende
que a ênfase da educação deve ser para criatividade, individualidade, estética, ética,
emotividade, qualidade de vida, a grande cultura. "O que se ensina para a vida nunca fica
obsoleto."
E aqui voltamos, mais uma vez, ao conceito de "empresa humana". Porque o ambiente
favorável ao aprendizado é um ambiente de contato amigável, descontraído, no qual as
informações possam circular sem restrições e as idéias não sejam sufocadas em seu
nascedouro. Um clima de liberdade é essencial porque, como disse o filósofo Ludwig
Wittgenstein, "os problemas são resolvidos não com a aquisição de novas informações, mas
com o rearranjo daquelas que temos há muito tempo".
A integração dentro da empresa é benéfica porque permite o que Johan Roos, do IMD, chama
de auto-similitude: quando os mesmos padrões básicos de interação ocorrem em diferentes
escalas na empresa. "Todo ato de imaginação é a descoberta de semelhanças entre duas coisas
que eram pensadas como sendo distintas", afirmou o matemático Jacob Bronowski, no livro
The Origins of Knowledge and Imagination (As Origens do Conhecimento e da Imaginação).
Ao estudar as formas como cientistas conduzem suas experiências, o canadense Kevin
Dunbar, da McGill University, concluiu que "eles dependem amplamente de analogias - o
processo de aplicar conhecimentos de uma área para resolver problemas em outra". Num
estudo de 630 000 patentes americanas, o Instituto de Tecnologia de Israel afirmou que
"inovação é essencialmente um processo de associação de idéias". Daí toda a importância das
brincadeiras, da descontração, do investimento em cultura: isso aumenta as possibilidades de
associação de idéias.
Uma empresa com clareza de propósitos também tem mais facilidade de aprender. O
neurologista sueco David Ingvar afirma que, se você tem idéias claras sobre o seu futuro (ou
futuros), é muito mais fácil selecionar estímulos significativos do mundo complexo a sua
volta. É uma questão da natureza da percepção: "Você só consegue selecionar os estímulos
pertinentes aos seus planos para o futuro. Os outros são incompreensíveis para o cérebro".
Quanto mais "memórias do futuro" nós desenvolvermos, mais abertos e receptivos seremos
aos sinais do mundo externo. Uma das funções da gerência é desenvolver caminhos e opções
no tempo, diz Ingvar.
Outra característica importante do aprendizado é o trabalho em equipe. "Em ciência, não
existe mais trabalho individual. Quando o sujeito sobressai, tem um trabalho de equipe muito
grande por trás", afirma o filósofo Roberto Romano, da Unicamp. O lado negativo do
trabalho em equipe é que as decisões não usuais costumam ser sacrificadas em prol do
consenso. Ralph Larsen, presidente da Johnson & Johnson, conta que a tecnologia de lentes
descartáveis teria um desenvolvimento caro e demorado, por isso a decisão colegiada foi de
abandonar o projeto. Um diretor que não esteve presente à reunião, e portanto não passou
pelo processo de chegar ao consenso, ao ouvir a decisão desafiou a opinião geral e acabou
convencendo todos a financiar a idéia.
É preciso haver consenso, mas não se deve esquecer jamais que o conhecimento se alimenta
da iconoclastia, do desrespeito às tradições, do humor. Também não existe aprendizado sem
mudança. A essência do aprendizado é a habilidade de gerir a mudança mudando a si mesmo.
O educador francês Jean Piaget, um pioneiro da teoria da educação, chamou isso de
aprendizado pela acomodação. Trata-se de mudar a estrutura interna para continuar em
harmonia com um ambiente que foi modificado. Mudar para manter o equilíbrio.
Num mundo instável, o aprendizado é a essência da sobrevivência.

4 - Um novo ambiente: as transformações nos escritórios

A CARA DOS ESCRITÓRIOS - Como vai ser o novo ambiente de trabalho

Espaço: a fronteira dinal


Como eliminar obstáculos para tornar o ambiente de trabalho mais amigável e produtivo

Por David Cohen


Fotos de Kiko Ferrite e Raul Júnior

Na minha casa todo mundo é bamba, todo mundo bebe, todo mundo samba. (Martinho da Vila, Casa
de Bamba)

Por mais virtual que seja a empresa do futuro, não há existência possível sem espaço. Em
algum momento, a virtualidade e a potencialidade devem dar lugar à ação e à produção. A
escolha do espaço onde isso vai ocorrer será também determinante para a empresa do novo
milênio. O espaço não é apenas o vazio onde se cria alguma coisa. Ele é também o ambiente
que influi, o limite que molda, o contexto que possibilita a produção. O espaço do trabalho -
seja o escritório, a fábrica, a casa ou até mesmo lugar nenhum - pode aumentar ou diminuir a
produtividade, modificar relações, determinar fluxos da produção.
Em muitas companhias, a organização física de um escritório reflete mais ou menos o
organograma da empresa: o presidente no andar mais alto, cadeiras e mesas melhores e salas
maiores para os executivos mais importantes, distribuição espacial das salas parecida com os
quadradinhos do mapa da hierarquia corporativa. Isso está mudando. Desde a década passada,
vêm surgindo os espaços abertos, as salas comuns, os ambientes de equipe. Na maioria das
vezes, o que ditou as mudanças foi a necessidade de economizar metros quadrados nos
prédios caros das metrópoles - a busca da eficiência no aproveitamento do espaço. Junto com
isso, veio ganhando força o conceito de funcionalidade, de adequação do ambiente ao tipo de
trabalho que se espera realizar ali.
Finalmente, ao conceito de funcionalidade deve-se unir o conceito de propósito. O espaço do
trabalho costuma incorporar a essência da empresa, comunicá-la e representá-la. "Quando
você entra numa empresa, já sente qual o tipo de gestão que ela tem. Pela telefonista, pelo
porteiro, pela divisão de salas", afirma Luís Gaj, professor do Programa de Estudos do Futuro
da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo. Charles Handy,
ex-professor da London Business School, conta que uma vez pediu a seus alunos que
entrassem num escritório ou fábrica e, sem conversar com ninguém, adivinhassem que tipo
de ambiente seria aquele e que atitudes e valores a gerência teria. "Eles ficaram surpresos
com a acurácia das previsões, confirmadas quando visitamos as empresas de modo mais
formal e conduzimos experiências com os empregados", diz Handy.
Qual será, então, a arquitetura da empresa do novo milênio? É claro que, se a criação e a
ocupação do espaço têm de ser feitas de acordo com os objetivos da empresa, a primeira
característica dos escritórios e fábricas do futuro deve ser a pluralidade: não há duas empresas
iguais, não deve haver dois espaços iguais. Mas certas peculiaridades da nova economia vão
obrigatoriamente fornecer diretrizes para a utilização desses espaços. Vamos delinear algumas
dessas diretrizes:

O AMBIENTE MUTANTE

Num mundo instável, a estrutura de uma empresa tende a mudar conforme suas necessidades
de produção. Equipes são formadas e dispensadas; funções são alteradas; empregados
terceirizados e consultores vão e vêm. As tarefas são temporárias, o tamanho dos
departamentos é variável, a composição da empresa é mutável. "Nessa situação, projetar um
espaço segundo a estrutura de uma empresa perde o sentido, uma vez que essa estrutura tem
uma imprevisibilidade de configuração", diz André Leirner, mestre em arquitetura e
urbanismo pela Architectural Association de Londres. "A solução é projetar um arcabouço
infra-estrutural em que diversas estruturas possam tomar forma." Há duas alternativas para
isso. A primeira é a maleabilidade do ambiente de trabalho, com a possibilidade de efetuar
mudanças facilmente quando for necessário. Mesas particulares que podem virar mesas de
reunião, paredes móveis, biombos, baias etc.
Algumas empresas, como a Steelcase e a Teknion, são especializadas em móveis de escritório
que podem ser rearranjados para criar diferentes tipos de ambiente. Segundo o arquiteto
alemão Patrik Schumacher, em artigo na revista Daidalos, essa flexibilidade pode fazer parte
da própria arquitetura, não apenas do mobiliário. "A maior parte das superfícies pode ter mais
de uma função: mesas viram pisos, prateleiras viram escadas e assim por diante." O
importante nessas ambigüidades, diz Schumacher, é o estado de latência, que amplia a
flexibilidade do espaço.
A segunda alternativa para mudanças estruturais é o uso maciço de tecnologia da informação,
ou seja, o trabalho num espaço virtual, intrinsecamente flexível. Nesse caso, a comunicação
com alguém da sala vizinha é tão rápida como com alguém do outro lado do mundo, o acesso
ao chefe pode ser tão fácil quanto ao colega ou ao cliente. Na maior parte das vezes, as duas
alternativas devem ser conjugadas. O escritório do futuro deve ter arquitetura flexível e
recorrer à tecnologia da informação.

O SEGUNDO LAR

O economista escocês Adam Smith considerava a separação entre trabalho e casa como a
mais importante de todas as modernas divisões do trabalho. A Revolução Industrial acabou
com as oficinas que os artesãos mantinham em suas próprias casas, porque os meios de
produção passaram a ser ferramentas caras e pesadas demais para que cada trabalhador fosse
dono dos seus. Com o avanço da economia do conhecimento, a separação rígida entre casa e
trabalho começa a ser novamente posta em dúvida.
"As fronteiras entre trabalho e lar estão começando a desaparecer", diz o americano Scott
Dunlap, sócio da empresa de arquitetura Gensler, de São Francisco. A própria natureza do
trabalho intelectual questiona a divisão entre local de trabalho e lar, porque o escritório, nesse
caso, não pode mais ser apenas o espaço da rotina de tarefas, da mecânica, da etiqueta. Ele
deve ser também o espaço da criatividade e da naturalidade. Ele tem que ser invadido pela
noção do lar. Como diz o filósofo francês Gaston Bachelard, em A Poética do Espaço
(editora Martins Fontes): "Todo espaço realmente habitado traz a essência da noção de casa".
Uma das conseqüências disso é que as pessoas querem trabalhar em lugares mais agradáveis.
"Nos Estados Unidos, 41% dos candidatos a emprego dizem que o ambiente de trabalho
influenciaria sua escolha de companhia", afirma Dunlap. Não é à toa que empresas estão
instalando mesas de bilhar, academias de ginástica, cafés e estacionamentos de bicicletas
internos, como meios de atrair jovens profissionais. Também não é à toa que empresas de
tecnologia jovens tenham muitas vezes o aspecto de um quarto de adolescente.

PRAÇA E CAVERNA

Uma outra característica da flexibilidade da fronteira entre casa e trabalho é que, graças à
tecnologia e às novas formas organizacionais, mais pessoas estão trabalhando em casa:

• Eugene Tsiang, um cientista do Centro de Astrofísica do Harvard Smithsonian, é


responsável pelo telescópio do instituto, que fica no Havaí, mas mora a uma distância de um
quarto do planeta dali, em Cambridge, Massachusetts. Com um notebook, ele ajusta o
telescópio, faz observações e coleta informações.
• Everaldo Santos, da companhia de alumínio Alcan, conta que seu diretor jurídico trabalha
em casa nos dias em que tem de obedecer ao rodízio de carros em São Paulo. Vendedores,
que antes precisavam ir à empresa todo dia para fechar pedidos, hoje não têm mais mesa e
trabalham em escritórios virtuais.
• Várias empresas, como a consultoria Andersen Consulting, adotaram o regime de hotelaria,
em que os funcionários não têm mesas próprias e, quando precisam de sala, reservam sua
utilização por um tempo determinado.
• A IBM tem 100 000 trabalhadores móveis. No ano passado, 55% dos funcionários de
colarinho branco da AT&T eram considerados trabalhadores a distância, pela definição da
empresa: pessoas que trabalham fora do escritório regularmente pelo menos duas vezes por
semana.

Será esse o futuro? O fim dos escritórios? Para muita gente, sim. Quando contrata
funcionários, uma companhia espacial americana já exige pessoas que não precisem do
ambiente de escritório, pelo cândido motivo de que essa companhia não tem escritório. David
Whitten, vice-presidente de pesquisas do Gartner Group, está há oito anos na empresa e
nunca trabalhou num escritório do grupo. Mas também não trabalha em casa: ele aluga uma
sala. "O problema de trabalhar em casa é que algumas pessoas não conseguem impor limites
e se estouram de trabalhar", diz Whitten. Em alguns casos desse tipo, o Gartner Group
mandou os funcionários de volta para o escritório. Em outros casos, enviou conselheiros e
terapeutas para ajudar os funcionários a trabalhar em casa. Outros tiveram de ser mandados
embora da empresa.
O americano Frank Becker, chefe de um projeto chamado Workscape 21 (Ambiente de
Trabalho no Século 21) na Cornell University, acredita que cada vez mais trabalhadores
dividirão o tempo entre o escritório central, o escritório doméstico e um escritório em um
parque afastado do centro. Alberto Augusto Perazzo, da companhia de equipamentos de
informática Bull, tem planos parecidos para a empresa no Brasil. "Podemos ter vários
predinhos. Esse é um projeto que já está sendo pensado. As pessoas poderão ir para o local
que escolherem."
Já há até projetos de comunidades de teletrabalho - centros com escritórios que permitem
conexão com as sedes das empresas. Ou seja, as pessoas trabalham para empresas diferentes,
no mesmo escritório, numa cidade afastada. Um desses projetos, em Nevada, nos EUA, é
uma telecomunidade de 8 600 pessoas, construída por uma companhia britânica no lugar
onde - talvez não à toa - funcionou um hospital para loucos, que foi abandonado no começo
da década. Um projeto similar existe na Itália, na cidadezinha de Colletta di Castelbianco,
perto de Gênova. A cidade estava desabitada havia 30 anos e, quando os responsáveis
decidiram restaurá-la, começaram a desenvolver uma telecidade. Os primeiros moradores se
mudaram para lá em março de 1998.
Apesar de todas essas alternativas, a maioria das pessoas vai continuar trabalhando em
escritórios e fábricas das empresas, pelo menos no futuro próximo. Mesmo quem trabalha em
casa deverá ter alguma conexão com a sede. "Em algumas horas, as pessoas vão ter que ficar
juntas. Não para fazer o que poderia ser feito em casa, mas para formalizar os momentos de
convívio real, para ter um espaço de troca de idéias e experiências enriquecedoras", diz
Perazzo, da Bull. "Antigamente, você passeava pelo escritório para ficar por dentro das
coisas, mas agora tem que pensar em como manter seus funcionários informados", diz
Jonathan Judge, responsável pela gestão da IBM na Web. Mais: como fazer a cultura da
empresa chegar aos funcionários virtuais?
Uma solução que parece estar se impondo é a chamada cave and commons (algo como
caverna e praça) - a distribuição do espaço em locais amplos e comunitários (commons), mas
com pequenas ilhas de privacidade. É uma solução de compromisso, porque os espaços
abertos incentivam a eficiência do trabalho de equipe, mas também provocam distração e
estresse, pela falta de privacidade necessária ao trabalho intelectual.

VASTIDÃO E ACONCHEGO

Uma das características do espaço de trabalho do futuro será a sua dualidade: a pretensão de
unir o espaço da rua e o espaço da casa num mesmo ambiente. A amplitude é o espaço
comunitário que favorece a comunicação e o trabalho em equipe. Mas não apenas isso. Ela é
necessária também como inspiração do trabalho intelectual, como conforto para a mente.
"Poderíamos dizer que a imensidão é uma categoria filosófica do devaneio", afirma
Bachelard em seu estudo fenomenológico do espaço. "A contemplação da grandeza
determina uma atitude tão especial, um estado de alma tão particular, que o devaneio coloca o
sonhador fora do mundo próximo, diante de um mundo que traz o signo do infinito."
Essa própria imensidão exige um espaço protegido. Segundo o poeta francês Jules
Supervielle, citado por Bachelard, "o excesso de espaço sufoca-nos muito mais do que a sua
falta". Por isso é tão importante a criação de espaços particulares no trabalho, com objetos
pessoais, decoração escolhida pelo usuário etc. Espaços individualizados não por hierarquia,
mas por necessidades da função ou do indivíduo. A empresa de petróleo Mobil Oil é um
exemplo: percebeu que sua política de dar salas maiores para executivos de maior hierarquia
era obsoleta e até, em alguns casos, contraproducente. Quando geólogos subiam de cargo,
ganhavam salas com janelas - que eles odiavam, porque perdiam o espaço de parede em que
costumavam pendurar seus mapas e suas cartas de sismologia.
Parece óbvio, mas o óbvio costuma demorar muito para ser enxergado: cada pessoa tem
necessidades diferentes e será mais produtiva em diferentes ambientes. A empresa de seguros
americana West Bend começou a usar equipamentos que permitem que cada funcionário
ajuste a temperatura, a ventilação e até o nível de ruído em seu cubículo. Pesquisadores do
Instituto Politécnico Renssealer concluíram que os funcionários que tinham controle sobre
seus ambientes eram pelo menos 3% mais produtivos do que os outros.
O arquiteto Odair Stolagli, da Exacta Saúde Ocupacional, está iniciando no Brasil um
trabalho de pós-avaliação de ambientes. "Quando se projetam os espaços, parte-se do
princípio de que o ser humano é infinitamente adaptável. Mas cada adaptação acarreta um
pouco de estresse", diz Stolagli. Seu trabalho é averiguar como os espaços são ocupados
pelos funcionários que trabalham neles. O mesmo nível de ruído pode ser prejudicial para
alguém que precise se concentrar e positivo para quem tenha uma tarefa rotineira; a
incidência da luz pode incomodar uma pessoa mais alta e assim por diante. "A maior crítica à
arquitetura hoje não vem de arquitetos ou de designers, vem das ciências humanas, da
psicologia, da antropologia", afirma Stolagli.

A ETERNA VIGILANCIA

Toda arquitetura estabelece também um sistema de poder. A estrutura de poder proposta no


século 18 pelo filósofo inglês Jeremy Bentham é o panóptico - basicamente, uma construção
circular, com uma torre no meio, de onde se pode ver tudo o que se passa, através de grandes
janelas. O princípio é de que o poder é visível e inverificável. A pessoa nunca sabe se está
sendo observada, mas tem certeza de que sempre pode sê-lo. Segundo o filósofo francês
Michel Foucault, o panoptismo - cuja essência são justamente os espaços abertos, tão comuns
nos escritórios de hoje - inaugura uma nova concepção da disciplina: "Um mecanismo
funcional que deve melhorar o exercício do poder, tornando-o mais rápido, mais leve, mais
eficaz". Não é uma disciplina apenas da coerção e da negação, mas um poder que instrui,
fabrica, ensina.
A essa arquitetura se une o poder da tecnologia, similar ao da ficção do Grande Irmão,
descrito por George Orwell. Existe a possibilidade de investigação das mensagens do
computador, conversas telefônicas podem ser gravadas. A vigilância não é opressiva, mas é
perene. Novamente, não é apenas um poder coercivo, é principalmente um poder educativo,
que busca alojar-se no indivíduo. É um poder que pode realizar-se a distância. Segundo o
sociólogo Richard Sennett, um bom número de estudos afirma que a vigilância do trabalho é
maior para quem trabalha em casa do que para quem está no escritório. "O poder externo
tende ao incorpóreo. E, quanto mais se aproxima desse limite, mais seus efeitos são
constantes, profundos, adquiridos em caráter definitivo", diz Foucault. Em algumas creches
nos EUA, os pais podem checar a rotina das crianças, saber o menu do dia, ou mesmo
acompanhar o progresso dos pimpolhos por câmeras que transmitem imagens pela Internet. O
mesmo pode ocorrer quando o filho é a empresa: "Eu consigo ver a empresa de casa. Tenho
câmeras em alguns locais e acesso a elas pela Internet", diz Laércio Cosentino, da Microsiga.
Cada empresa deve estabelecer sua arquitetura pensando também nesse equilíbrio: a praça, o
espaço aberto, é o local da disciplina e da produtividade; as cavernas são o local da
criatividade.
A VOZ DO SILÊNCIO
Como forma de organização do poder, não existe arquitetura ingênua. A localização de cada
parede quer dizer algo, assim como a distribuição de salas, o espaço destinado ao cliente, o
grau de dificuldade imposto para o acesso à informação. Até o vazio adquire significado, na
pretensão de uma empresa virtual e flexível. É o que diz o sociólogo Manuel Castells no livro
A Sociedade em Rede (editora Paz e Terra). "A arquitetura que parece mais repleta de
significados nas sociedades moldadas pela lógica do espaço de fluxos é o que eu chamo de
'arquitetura da mudez': a arquitetura cujas formas são tão neutras, tão puras, tão diáfanas, que
não pretendem dizer nada. Sua mensagem é o silêncio."

5 - A pressão social: relações com a comunidade e o meio ambiente

EMPRESA E SOCIEDADE - A pressão social: relações com a comunidade e o meio


ambiente

A lei do mais fraco


A nova ordem na relação das empresas com a sociedade e com o meio ambiente

Por David Cohen

E tudo de lindo que eu faço vem com você, vem feliz. Você me abre seus braços e a gente faz um
país. (Marina Lima e Antonio Cicero, Fullgás)

É um fenômeno mundial que as empresas venham sendo mais cobradas em seu papel de
cidadãs. Esse fenômeno tem a ver com a queda dos regimes socialistas do Leste Europeu e o
fim da Guerra Fria; com a busca de novos mercados pelas empresas transnacionais; com o
avanço do neoliberalismo e a onda de privatizações e desregulamentações que aumentou a
parcela da economia em poder dos grupos privados. Tem a ver, também, com a evolução
normal da conscientização das sociedades.
No Brasil, há outros fatores a considerar. Primeiro, uma ampla gama de novos empresários,
na faixa dos 30, 40 anos, viveu o fim do regime militar, conheceu outros países, está mais
bem preparada e se sente na obrigação de colaborar para tornar o país melhor. Em segundo
lugar, o aumento da violência nas grandes cidades parece ter chegado ao ponto em que é
impossível fechar os olhos para a vergonhosa disparidade social brasileira.
Finalmente, há uma mudança de mentalidade da sociedade brasileira em relação às empresas.
No livro A Empresa Viva, Arie de Geus, diretor da Shell do Brasil na década de 70, comenta
que a opinião pública brasileira era contrária às empresas multinacionais pelo simples fato de
elas estarem no país. Edson Vaz Musa, que foi presidente da Rhodia, diz que as empresas não
deixavam que seus executivos tivessem atividades extras por medo de repercussões políticas.
Hoje, a situação se inverteu. Empresas são paparicadas como a salvação da lavoura (ou
melhor, da indústria) e louvadas pelo número de empregos diretos e indiretos que podem
proporcionar, a ponto de governadores estaduais lançarem guerras fiscais e jogos de pressão
política para tê-las em sua região. Com esse ambiente favorável, as empresas não apenas
permitem como também incentivam seus executivos a assumir responsabilidades sociais.
Certo, o clima parece favorável às ações comunitárias, mas as empresas estão assumindo
mais responsabilidades? Ou seus programas sociais são apenas medidas paliativas,
simplesmente o embrião do que ainda precisa ser feito? Sim e sim. Há indícios fortes de que
as empresas estejam começando a assumir seu lado cidadão, mas em geral sua atuação é
tímida.
A maioria das empresas (56%) apóia programas sociais, segundo a primeira pesquisa
nacional sobre a atuação social e o estímulo ao voluntariado nas empresas, finalizada em
julho pelo programa governamental Comunidade Solidária. Parece bastante, mas esse índice
se refere a qualquer tipo de programa, sem levar em conta a quantidade de recursos aplicada.
Uma grande parcela das empresas (43%) não investe nada. Apenas 17% das empresas
disseram que há voluntariado durante o horário de trabalho, e 16% afirmaram que designam
um responsável por esse voluntariado. A pesquisa* foi realizada pelo Centro de Estudos em
Administração do Terceiro Setor, da Universidade de São Paulo, com 1 200 empresas de nove
estados e do Distrito Federal. Ela mostra que, mesmo que seja tímida em alguns aspectos, a
ação social das empresas está ganhando força.

Alguns dados da pesquisa:

Área de atuação social das empresas:


População - alvo:
40% 26% 23% 19% 16% Crianças e
Adolescentes

Educação saúde arte e meio esporte 47


cultura ambiente

Como as empresas estimulam o voluntário:


21% 17% 17% 12% 10%
Oferecem estimulam formam dão valorizam
recursos atuação grupos dispensa na
em contrataçã
projetos o

OUTRO MODELO DE NEGÓCIOS

Nem todo mundo é tão otimista. Allan Cohen, reitor da escola de negócios americana Babson
College, acredita que a preocupação social tenha um ciclo próprio. Hoje está em alta, amanhã
deverá estar em baixa de novo. Será?
Essa visão dos ciclos funciona sob o pressuposto de que as preocupações sociais e ambientais
representam um custo e, assim que tiverem oportunidade, as empresas deverão cortá-lo. Esse
pressuposto vem sendo questionado. "É custo? O que nossos associados têm aprendido é que
a responsabilidade social é um ótimo negócio", diz Robert Dunn, presidente da Business for
Social Responsability (Negócios pela Responsabilidade Social), um grupo americano de
promoção da ética nas empresas que começou com 40 sócios e hoje congrega 1 500 firmas de
todos os tamanhos, com um faturamento conjunto de 1,5 trilhão de dólares por ano. (É nesse
caminho que se inspira o Instituto Ethos, no Brasil. Em junho, sua conferência sobre
responsabilidade social reuniu mais de 300 líderes empresariais em São Paulo.)
Segundo os professores e consultores americanos Malcolm McIntosh, Deborah Leipziger,
Keith Jones e Gill Coleman, autores do livro Corporate Citizenship, existe hoje uma nova
forma de cidadania corporativa. "Não é filantropia, não é escrever um anexo sobre ações
comunitárias no relatório financeiro anual. A nova cidadania corporativa não é uma idéia
posterior ao negócio, entregue ao departamento de recursos humanos. É a cidadania no
coração do planejamento estratégico."
Guilherme Peirão Leal, um dos sócios da empresa de cosméticos Natura, diz que "ética e
responsabilidade social devem se expressar na prática empresarial, não no pós-expediente,
como expiação de culpas. Só a construção de relações de qualidade pode levar as empresas a
condições de sobrevivência num mundo instável". Em resumo: a cidadania corporativa não
faz parte de um ciclo que dependa do senso de abnegação das empresas. Ela é um novo
modelo de fazer negócios. "A responsabilidade social se liga a todas as decisões de uma
companhia: onde colocar uma fábrica, como contratar, como anunciar, como se relacionar
com as autoridades...", afirma Dunn.
Como diz Arie de Geus, o ex-executivo da Shell: "É perfeitamente válido que uma empresa
tenha o único objetivo de gerar lucro para seus acionistas. Mas isso tem conseqüências. Só
um pequeno grupo de pessoas se identifica com o círculo de poder. Todos os outros serão
adendos à máquina de fazer dinheiro. Serão outsiders, recrutados por suas habilidades. Isso
significa que controles hierárquicos têm de ser aplicados. Esta é a velha empresa econômica".
A alternativa, diz De Geus, é uma empresa organizada em torno do propósito de perpetuar a
si mesma. "O retorno financeiro é importante, mas os gerentes vêem a otimização do capital
como um complemento da otimização das pessoas. Seus objetivos são longevidade e o
desenvolvimento de seu potencial. Lucro é um meio para esse fim."
No livro Feitas para Durar, James Collins e Jerry Porras comparam duas empresas com
estilos bem diferentes: a eficiente Texas Instruments (TI) e a excelente Hewlett Packard (HP).
"Para a TI, quanto maior o lucro, melhor, e ponto final. Para a HP, quanto maior o lucro,
melhor, desde que alguma contribuição seja feita." (David Packard enfatizava aos gerentes da
HP a necessidade de pensar na contribuição, mais do que no lucro ou na participação de
mercado.) "A TI, por exemplo, começou a fabricar calculadoras de bolso baratas e relógios
digitais descartáveis de 10 dólares, na década de 70. Diante das mesmas oportunidades de
mercado, a HP não embarcou nessa onda fácil porque isso não representava nenhuma
contribuição técnica", dizem Porras e Collins.
Não é apenas uma questão de escolher um ou outro modelo. A empresa hierárquica está
condenada ao segundo pelotão na Nova Economia, porque a riqueza mais importante do
futuro, o conhecimento, não pode ser criada com os mesmos métodos com que se extrai ouro
de uma mina ou se produzem bens industriais.

PRESSÃO E RECOMPENSAS

Mais do que simplesmente uma onda politicamente correta, a responsabilidade social está
fincando bases em razões de negócio. Numa sociedade globalizada, ultracompetitiva e mais
bem informada, os consumidores têm amplo poder de escolha e já não basta oferecer um bom
produto. É necessário vender também a imagem da empresa. Uma pesquisa mundial feita
pela Ford concluiu que, em todos os lugares, os consumidores - principalmente os jovens -
preferem companhias que tenham preocupação social.
O incentivo à cidadania corporativa se dá de duas maneiras: pressão e recompensas. Alguns
exemplos de pressão:

• Atos antiéticos ou criminosos praticados por trabalhadores custam em indenizações mais de


400 bilhões de dólares por ano às empresas dos Estados Unidos, segundo o Ethical
Leadership Group (Grupo de Liderança Ética), fundado em 1993 pelo teólogo Steve Priest.
• Na Alemanha, foi aprovada uma lei para impor às empresas automobilísticas uma taxa pelo
ciclo de vida total dos carros, apelidada de take-back (pegar de volta). Ou seja, a empresa
tem de se preocupar com o que vai ser feito do veículo, no final de sua vida útil. (Esse custo
pode acabar se tornando uma oportunidade, como já é comum na indústria eletrônica. A
Digital Equipment lucra uma segunda vez ao vender computadores recauchutados para
países em desenvolvimento; a Xerox vende por preços mais baixos copiadoras
refabricadas.)
• Em maio de 1997, fundos de pensão que controlavam 1% das ações da Shell pediram uma
resolução em assembléia que obrigasse a companhia a ter auditoria independente para suas
políticas de direitos humanos e ambiental. O motivo eram acusações de que a Shell tinha
relações políticas com a repressão militar na Nigéria, além de provocar danos ao meio
ambiente. A moção foi derrotada, mas teve apoio de 10% dos acionistas, com 6% de
abstenções.
• 18 de outubro de 1997 foi o dia mundial de ação contra a Nike, o ápice de uma campanha
de denúncias de utilização de trabalho infantil, salários indecentes e condições insalubres
em algumas fábricas asiáticas que forneciam tênis para a Nike. O escândalo ajudou a
derrubar o valor das ações da empresa e provocou uma reestruturação na sua política de
alianças, incluindo a criação de um departamento para monitorar as fábricas associadas.

Eis agora alguns exemplos de recompensa:

• A empresa sueca Boxman, que vende CDs pela Internet, estreou seu site na Finlândia com
um show do grupo Ace of Base. Unindo tecnologia e causa social, a Boxman comprometeu-
se a doar para a luta contra o câncer 1 marco (cerca de 20 centavos de dólar) por cada disco
vendido. Em apenas uma semana, abocanhou 10% das vendas de CDs da Finlândia.
• Autoridades sanitárias americanas descobriram uma bactéria num dos sucos da fábrica
Odwalla e comunicaram à direção da empresa que os testes definitivos sairiam em uma
semana. A fábrica decidiu não esperar: recolheu todo o seu estoque de suco dos
supermercados. As vendas caíram a zero, e os analistas foram unânimes em considerar que a
empresa estava acabada. Em um ano, beneficiando-se de sua postura ética, a empresa
recuperou 100% das vendas.
• Uma refinaria na Austrália preocupava-se com o alto índice de absenteísmo. Quando
decidiu participar de um fundo comunitário, acrescentou um item: para cada dia de ausência
dos trabalhadores, seria reduzida a porcentagem de doações. Em poucos meses, as faltas
caíram ao menor nível da história da empresa.

O MARKETING SOCIAL

Robert Dunn, presidente da Business for Social Responsability (www.bsr.org), cita três
vantagens competitivas das empresas cidadãs:

1a - acesso a capital : Um décimo dos investimentos nos EUA é feito por fundos que se
preocupam com ética, ambiente, responsabilidade social.
2a - desempenho : "O retorno financeiro das empresas éticas que nós acompanhamos nos
últimos oito anos bate a média das 500 maiores empresas do índice da Standard & Poor's",
afirma Dunn.
3a - motivação : "Os funcionários das empresas socialmente responsáveis trabalham mais
motivados, são mais produtivos e mais leais, segundo estudos de várias faculdades e
instituições americanas", diz Dunn.

A cidadania funciona como qualquer serviço no mercado competitivo: os inovadores são


premiados. "Quem entra nessa área mais cedo ganha vantagem, fica com uma boa imagem.
Em algum ponto, as ações pelo ambiente e pela comunidade deixam de ser vantagem, passam
a ser pré-requisito", afirma Dunn. Esse caminho já está sendo trilhado com mais consistência
nos EUA. "Há 15 anos, nós tínhamos que custear estudos caríssimos sobre o impacto das
indústrias no meio ambiente. Hoje, as companhias pagam por esses estudos para usá-los
como propaganda", diz a futurista, consultora de empresas e ativista social Hazel Henderson.
Nesse mundo novo, em que a batalha pela atenção dos consumidores se acirra, o trabalho
pela comunidade ganha mais importância de marketing. Denis Beausejour, vice-presidente de
propaganda da Procter & Gamble, diz que o patrocínio de uma experiência comunitária na
Internet é mais bem-sucedido, como estratégia de marketing, do que colocar uma bandeira
num site. "Patrocínios ajudam a identificar a companhia com o apoio a uma comunidade."
Um exemplo disso é o The Hunger Site (O Site da Fome, www.thehungersite.com), uma
página na Internet em que aparece um mapa mundial mostrando as estatísticas de morte pela
fome. O visitante é informado de que basta clicar num ícone para que uma das empresas
associadas doe uma porção de comida para salvar uma vida em algum lugar do planeta. Já foi
criada uma versão brasileira desse site, o Clickfome, ligado ao Ibase, do Rio de Janeiro
(www.clickfome.com.br).
Outro exemplo de retorno de marketing é o da cadeia de roupas britânica Marks & Spencer. A
empresa paga 35 empregados para fazer trabalhos comunitários em tempo integral e mais 200
em horário parcial. Ela apóia cerca de 1 200 ações de caridade. É uma companhia tão ligada à
comunidade que a ex-primeira-ministra Margaret Thatcher e o atual primeiro-ministro Tony
Blair afirmaram com orgulho (e talvez um pouco de pendor populista) que costumam fazer
suas compras lá.
O engajamento numa causa também melhora a imagem da empresa em relação a seus
funcionários. Um indício claro de quanto os empregados são favoráveis ao voluntariado é a
pesquisa sobre ação social feita pelo programa Comunidade Solidária: embora apenas 17%
das empresas tenham voluntários durante o horário de trabalho, 48% delas afirmam que têm
funcionários que fazem trabalho voluntário, e outros 30% dizem não saber.
A empresa de autopeças Iochpe Maxion organizou um curso técnico reconhecido pelo MEC
no qual o ensino é dado por voluntários. O curso tem mais candidatos do que vagas para
professor. "Em 1996, quando houve demissões na empresa, alguns professores demitidos
pediram para continuar dando as aulas", afirma Evelyn Berg Iochpe, diretora da Fundação
Iochpe. Quando uma unidade do Rio Grande do Sul foi vendida, funcionários decidiram
manter a escola por si mesmos.
O Instituto Microsiga, da empresa de softwares de gestão Microsiga, nasceu de uma sugestão
de um funcionário, no ano passado. Hoje, 750 crianças estão sendo treinadas em computação.
No ano que vem, serão 1 500. A Microsiga também colabora no patrocínio da escola de
samba paulistana Unidos do Peruche. "A empresa deveria ter papel social importante. Porque
você tem comprometimento do pessoal que trabalha na empresa", afirma Laércio Cosentino,
presidente da Microsiga.
Trabalhos sociais também são um modo de formar ou detectar líderes. Uma das empresas que
mais fazem investimentos sociais no Brasil é a holandesa C&A. "A empresa não faz nenhuma
ligação entre progresso na carreira e trabalho voluntário, mas é claro que o setor terciário é
um local privilegiado para observação de talentos", diz Antônio Carlos Martinelli, presidente
do Instituto C&A. "O papel de cidadão contamina os outros papéis."
Geralmente, empresas que se preocupam com a comunidade também se preocupam com o
ambiente interno. Tratar bem seus funcionários faz parte da cartilha ética - além de ser a
melhor maneira de valorizar a empresa. O americano Robert Levering, presidente do Great
Place to Work Institute (Instituto Ótimo Lugar para Trabalhar), que publica uma lista anual
com as melhores empresas para trabalhar nos Estados Unidos, afirma que as 100 companhias
de sua lista tiveram no ano passado quase o dobro do lucro médio das 500 maiores do índice
Standard & Poor's, e quase o triplo da valorização de ações.
"Os fatos não comprovam o lema de que você tem de ser mau e egoísta para vencer no
mundo dos negócios", diz Levering.
Finalmente, há os ganhos provenientes da preocupação com o meio ambiente. A 3M usa o
esforço de preservação ambiental como um motor do processo de inovação. A NEC
capitalizou sua especialidade em redução de lixo industrial e inovação de produtos abrindo
uma consultoria de gestão do ambiente para a indústria eletrônica japonesa. Sobre esse
tópico, o melhor seria dizer que não existe uma coisa chamada gestão ambiental. O que existe
é simplesmente boa gestão. (Afinal, o que é gestão ambiental senão o combate ao
desperdício, a economia de recursos, o incentivo à inovação para produzir cada vez mais
usando cada vez menos?)

GESTÕES AMBIENTAIS

Um bom exemplo de gestão ambiental é a companhia americana de carpetes Interface.


Durante 21 anos, ela funcionou como uma empresa tradicional. Um dia, seu presidente e
fundador, Ray Anderson, leu um livro sobre ecologia que um funcionário deixara em sua
mesa e imediatamente decidiu transformar a companhia. Mas ele nunca deixou de pensar no
lucro. O princípio básico para tornar a gestão ambiental era simples: eliminar qualquer custo
que não trouxesse valor para o cliente. Não havia nenhuma menção a reduzir emissões
tóxicas nem o lixo - mas foi esse o resultado.
A Interface começou a reutilizar fibras, adotou novos métodos de corte que diminuíram os
resíduos de material na hora de colocar o carpete e passou a usar água em vez de compostos
químicos. Até o modelo de negócio foi repensado: em vez de vender carpetes, a Interface
passou a alugá-los. A idéia é promover o "carpete verde", ou seja, a companhia se
compromete a supervisionar, substituir e reciclar pedaços de carpete gastos, em vez de tentar
vender ao cliente mais do que ele precisa.
O compromisso com o meio ambiente chegou a tal ponto que certa vez seus diretores
marcaram uma convenção em um hotel do Havaí, mas um dos executivos reclamou: "Como
nós podemos fazer a nossa convenção nesse hotel tão ecologicamente irresponsável?" A
semana da convenção acabou sendo inteiramente gasta com discussões sobre maneiras de
aquele hotel economizar dinheiro, adotando uma gestão ambientalista.
A Interface talvez seja um exemplo radical, mas há inúmeras companhias nesse caminho:

• A Electrolux já tem 10% das vendas, e 15% dos lucros, provenientes de produtos
ambientalmente corretos.
• A fabricante de meias alemã Kunert reduziu a poluição em 20% e cortou seus custos totais
em torno de 2%, como resultado do seu programa ambiental.
• Uma fábrica da Lucent Technologies, em Allentown, na Pensilvânia, usava equipes de
operários para limpar resíduos. Os empregados descobriram que, se o processo de produção
fosse um pouquinho modificado, poderiam usar água em vez das substâncias químicas.
• A Companhia Suzano de Papel e Celulose tem uma área de reflorestamento de 50 mil
hectares, com reservas de 17 500 hectares destinadas a manter a diversidade. Essa
preocupação ecológica ajuda a controlar pragas.
• Desde 1993, a Nike estuda a conversão da cola usada nos seus tênis, passando de um
produto feito à base de petróleo para outro à base de água. Foram gastos milhões de dólares
nessa conversão, mas nas fábricas em que ela foi feita observaram-se as seguintes
vantagens: os contêineres podem ser reutilizados, a limpeza é mais barata, a produtividade é
maior (com o menor nível de agressão ambiental aos trabalhadores) e o sistema de
ventilação das fábricas tem um custo menor.
• Na fábrica de Juiz de Fora, a Mercedes-Benz adotou o processo de tintura hidrossolúvel, à
base de água, que diminui o uso de solventes orgânicos de 12 quilos para 3 quilos por carro,
segundo a empresa.

Além dos cortes de custo na produção e da eventual descoberta de novas oportunidades de


negócios, as empresas vêm descobrindo que podem usar seus programas ambientais (e sociais
também) como ferramentas para divulgar uma boa imagem da companhia. A British
Petroleum, por exemplo, usa uma contabilidade ambiental no seu relatório financeiro anual
para demonstrar o compromisso com o meio ambiente. A DuPont ficou em primeiro lugar no
ano passado na lista de empresas mais admiradas dos Estados Unidos, feita pela revista
Fortune, especialmente por causa de sua política de responsabilidade social.
Esse tipo de contabilidade ambiental, que alguns consultores apelidaram de environmetrics, é
a tentativa de transformar a linguagem ecológica naquilo que o mundo dos negócios entende:
números. Ulrich Steger, ex-ministro de economia e tecnologia do estado alemão de Hesse,
explica: "Além do custo do material, o uso de um determinado produto químico pode ter
custos indiretos, como mais recursos exigidos para tratar água contaminada, cuidados extras
na estocagem etc." Quando esse cálculo é feito, com auxílio da contabilidade ambiental,
notam-se os prejuízos causados pela gestão não-ambiental.
A fábrica de Jundiaí (SP) da empresa de balas holandesa Van Melle criou um "barômetro
ecológico" para medir o sucesso de sua política ambiental. O barômetro é uma comparação
da situação de uma série de índices (acidificação, uso de água, resíduos sólidos etc.) com a
situação ideal. Décio Abu Gannam, diretor industrial da Van Melle, diz que a meta é atingir o
equilíbrio com o meio ambiente em 2005.
O barômetro ecológico passou a ser uma das diretrizes da empresa e tem se mostrado um
fator de mobilização dos funcionários. "Quase metade da fábrica está engajada em projetos
de ecologia", diz Abu Gannam. A empresa já progrediu bastante: em 1992, o barômetro teve
10,8 pontos. Em 1997, teve 0,23 ponto. No ano passado, ficou perto de zero. Agora, o
trabalho será definir metas separadas para cada um dos índices que compõem o barômetro.
Segundo o ex-ministro alemão Ulrich Steger, há três razões importantes para que uma
empresa invista no meio ambiente:

a) as pressões sociais vão crescer;


b) esse investimento vai cortar custos fixos da produção; e
c) essa política vai levar a inovações que podem fazer parte de uma estratégia de excelência
da empresa.

Segundo o americano Douglas Maguire, do World Resources Institute (Instituto de Recursos


Mundiais), uma associação ambientalista fundada em 1982, "em 10 ou 15 anos, não vai haver
empresa competitiva que não tenha uma estratégia ambiental".

CONTABILIDADE SOCIAL

A mesma lógica pode se aplicar à gestão social. Empresas que não tenham uma estratégia
definida nesse campo vão perder pontos. Em primeiro lugar, porque estarão deixando de
aproveitar um manancial de riqueza em conhecimento que está latente nos funcionários e na
comunidade. Em segundo lugar, porque perderão pontos na construção de sua imagem
institucional, em relação a concorrentes que se mostrem mais identificados com a sociedade
em que atuam. Em terceiro lugar, porque podem estar pura e simplesmente jogando dinheiro
fora, desperdiçando excelentes negócios em médio e até curto prazo.
Um exemplo: a Hindustan Lever, uma fábrica de laticínios subsidiária da Unilever no estado
indiano de Uttar Pradesh, dava prejuízo. O que se podia fazer? Lamentar e fechar o negócio.
Mas, investigando por que a fábrica dava prejuízo, a companhia concluiu que os fazendeiros
eram tão pobres que não conseguiam alimentar e cuidar direito do gado. Em vez de fechar a
fábrica, a Hindustan Lever investiu no desenvolvimento da comunidade rural. Ela forneceu
empréstimos sem juros para os fazendeiros, ajudou na criação de um plano de cinco anos para
melhorar a saúde humana e animal e serviu como catalisadora para atrair investimentos do
governo em estradas, escolas e clínicas. Hoje, a fábrica dá lucro. Essa iniciativa agora cobre
400 aldeias no estado.
Assim como a contabilidade ambiental, já existem tentativas de criar uma contabilidade
social. Na Holanda, a firma de consultoria e auditoria internacional KPMG presta uma
consultoria de integridade que já tem 25 empresas clientes. A IBM mede agora suas empresas
por sete parâmetros, sendo quatro financeiros e três de novas medidas (satisfação do cliente,
qualidade e moral do empregado). Outras empresas estão procurando meios de medir o
"banco de conhecimentos" da companhia.

DE ADVERSÁRIOS A ALIADOS

Se as empresas estão mudando em relação à responsabilidade social, as organizações de


projetos sociais também estão. Elas são agora mais profissionais, mais sérias. Descobriram
que a melhor forma de lutar por direitos sociais e ambientais não é combater as empresas,
mas atraí-las.
A melhor arma, geralmente, é a informação. Quando fala sobre fundos de investimento
socialmente responsáveis, Eric Leenson, da Progressive Asset Management, cita o caso do
Instituto do Câncer dos EUA. Enquanto fazia campanhas ferrenhas contra o cigarro, o
instituto não sabia que tinha em sua carteira financeira ações de várias empresas de tabaco.
Os fundos socialmente responsáveis estão em alta nos EUA. Um dos primeiros foi o Calvert
Group, criado em 1982. Hoje, até a Merryl Lynch está oferecendo um fundo desse tipo. Mas a
presidente do Calvert, Barbara Krumsiek, adverte: "Não adianta só ser socialmente
responsável. Tem de ser competente. Tem de dar lucro".
O currículo de Barbara já diz algo sobre o quanto evoluiu a questão dos negócios éticos. Ela é
uma das mais valorizadas profissionais do mercado financeiro americano. Há pouco mais de
dois anos dirigia a Alliance, uma empresa com uma carteira de 21 bilhões de dólares. Trocou-
a pelo Calvert, que na época tinha 5 bilhões de dólares em bens (hoje tem 6 bilhões), sendo
2,1 bilhões investidos em fundos socialmente investigados. Dois motivos a fizeram trocar de
emprego: o entusiasmo de trabalhar com uma causa ética e a certeza de que o negócio está
prosperando.
O modo como o Calvert trabalha também demonstra o abandono da política do conflito, em
prol da política da atração. "Nós não temos listas de companhias em que não investimos.
Acreditamos na possibilidade de as empresas mudarem. Nós fazemos publicidade daquelas
com que trabalhamos." Metade das 500 maiores empresas da lista da Stanley & Poor's não
está de acordo com os padrões do Calvert, a maioria por causa de questões ambientais.
"Nossa base de dados tem 1 500 empresas. Nós investimos em 400. Em resumo, só
investimos em companhias que teríamos orgulho de possuir", diz Barbara. Eis alguns dos
itens que os pesquisadores do Calvert analisam para decidir sobre a possibilidade de
investimentos: questões de trabalho (a porcentagem de mulheres no comando, a diversidade
dos funcionários, a taxa de troca de empregados); segurança do produto; respeito a direitos
humanos; se a empresa está envolvida com o comércio de armas. "A falta de dados significa
que não vamos investir. Nós não presumimos que tudo está bem", diz Barbara.
Também está mudando a mentalidade de que o melhor que as empresas podem fazer é doar
alguma verba para instituições de caridade. A melhor contribuição da empresa deve ser com
aquilo que ela e seus funcionários fazem de melhor.
A City Year é uma organização pró-cidadania criada em Boston em 1988 por dois graduados
de Harvard, Alan Khazei e Michael Brown. Eles se aproximam das empresas não para pedir
dinheiro, mas para pedir participação dos empregados. É um modelo para tratar
patrocinadores como associados e envolvê-los no serviço.
Na cidade de Cruzeiro (SP), uma fábrica de chassis e rodas da Iochpe Maxion costumava
doar 6 200 dólares por mês para a Apae (Associação de Pais e Amigos do Excepcional),
segundo a diretora da Fundação Iochpe, Evelyn Berg Iochpe. O dinheiro não dava para nada.
Então a fábrica decidiu mandar um voluntário para trabalhar na administração da entidade.
Com um terço do investimento, eles conseguiram recuperar instalações e melhorar os
serviços, a ponto de a Apae de Cruzeiro ser usada como modelo para as filiais de outros
lugares.

ESQUEÇA TUDO ISSO

Até aqui, apontamos as tendências sociais e econômicas que favorecem a construção de uma
responsabilidade social. Mais do que isso, indicamos as razões de negócio que podem dar
vantagens competitivas a empresas éticas. Se você se convenceu, ótimo. Agora, vamos pedir
que você esqueça tudo isso.
Só há e só pode haver uma razão para uma empresa ser ética, para ter responsabilidade social
e ambiental: ter consciência de si mesma. Ética faz parte do pacote da empresa do novo
milênio. Só sendo ética uma companhia pode ser virtual, inovadora, rápida, conectada.
Afinal, para que serve uma empresa? Não é o lucro que define a organização, é a organização
que proporciona o lucro. Em um mundo em que a realidade de mercado pode mudar a
qualquer momento, a única segurança possível para uma empresa é manter-se em contato
com sua missão, seu caráter, seu credo. Buscar isso é buscar um sentido ético para a
existência, que vá além do mercado, e por isso mesmo sirva para fortalecer sua posição no
mercado.
Antes de escrever A Teoria da Riqueza das Nações, Adam Smith publicou A Teoria dos
Sentimentos Morais, argumentando que uma sociedade estável baseia-se na "simpatia", no
dever moral de ter consideração pelos outros seres humanos. O mercado é um mecanismo
para separar o eficiente do ineficiente, não um substituto para a responsabilidade.
A eficiência de uma companhia pode ser aumentada à custa da sociedade, e freqüentemente o
é. O processo de produção just-in-time faz as empresas economizarem os custos de estoque e
aumentarem a velocidade da manufatura, mas em Tóquio, por exemplo, os carros de entrega
agora lotam todas as rodovias de acesso à cidade. "Os custos dos congestionamentos estão
começando a suplantar os custos dos armazéns originais, sem falar no dano ambiental", diz o
ex-professor de negócios Charles Handy, no livro A Era do Paradoxo. Hospitais também
podem aumentar sua eficiência mandando pacientes embora mais cedo, mas alguém ainda
terá que cuidar deles em casa.
Curiosamente, a contabilidade da riqueza privilegia o desperdício. "Você pode gastar dinheiro
poluindo o ar puro do interior com uma fábrica, contaminando os rios e destruindo a calma
do lugar, pois tudo isso será considerado como aumento da riqueza do país", diz Handy.
Quanto mais se jogam coisas fora e se compram novas em vez de consertá-las, a sociedade
parece ficar mais rica.
A ética sempre será um bom negócio, porque a troca da responsabilidade pelo lucro não passa
de um pacto faustiano. O doutor Fausto, na peça de Christopher Marlowe, condena-se à
danação eterna depois de 24 anos de abastança. No mundo corporativo, a vida média das
empresas fica em torno da metade disso. Com a globalização, com o avanço tecnológico e
com o acirramento da competição, o pacto faustiano torna-se cada vez mais mau negócio.
O plano profissional é similar. No curto prazo, o ambiente instável premia a inconstância.
Segundo o filósofo Zygmunt Bauman, no livro Alone Again: Ethics After Certainty (Sozinho
de Novo: A Ética após a Era de Certezas), ser previdente, hoje, significa freqüentemente
evitar compromisso, ficar livre para se mover quando a oportunidade bate e livre para ir
embora quando ela pára de bater.
O consultor e gestor de empresas Edson Vaz Musa qualifica um certo tipo de executivo de
sucesso como "surfista da lama": ele vai na frente da onda, colhe os louros e vai embora, e
quem fica atrás dele tem de lidar com a sujeira. Se os laços do indivíduo com a empresa são
mais frouxos, a necessidade de uma postura ética é maior, de parte a parte.

NA ESSÊNCIA DA COMPANHIA

O que significa dizer que a postura ética deve ser parte da essência da companhia?

• A British Petroleum faz a operação de prospecção em Wytch Farm, no sul da Inglaterra.


Quase tudo é terceirizado. A empresa diz que seu papel ali é a "administração ambiental", e
não fornecer recepcionistas ou técnicos.
• Nos últimos dez anos, a Coca-Cola doou mais de 100 milhões de dólares para educação só
nos EUA, custeando bolsas para estudantes, programas especiais em faculdades, ou dando
verbas para colégios. Nas Filipinas, a empresa construiu escolas primárias.
• A vinícola Château de Lastours é administrada desde 1978 por uma agência que só emprega
gente com deficiência mental (são 60 empregados na vinícola), dando-lhes cuidados
médicos e ajudando a integrá-los socialmente. Seu vinho tem, entre outros prêmios, as
medalhas de ouro no desafio internacional do vinho, em Londres, no mundial de vinhos, em
Bruxelas, e no concurso de Paris.
• No começo da década, a Merck desenvolveu o Mectizan, um remédio para curar a
oncocercíase, doença que contagiou 1 milhão de pessoas no Terceiro Mundo com vermes
parasitas que podiam causar uma cegueira dolorosa. Nenhum órgão governamental nem
instituição filantrópica comprou o remédio. Então a companhia doou o produto, arcando
também com as despesas da distribuição. Isso não foi uma ação incomum para a Merck. Há
50 anos, foi ela que levou a estreptomicina ao Japão depois da Segunda Guerra, para acabar
com a tuberculose. "Nós não ganhamos dinheiro com isso", diz P. Roy Vagelos, presidente
da empresa. "Mas não é por acaso que a Merck é hoje a maior empresa farmacêutica
americana instalada no Japão. As conseqüências de longo prazo dessas ações não costumam
ser claras, mas de alguma forma acho que elas sempre acabam dando retorno."
• O Boticário é uma empresa de produtos de beleza que vinculou sua imagem à natureza. A
companhia preserva uma região de Mata Atlântica no litoral norte do Paraná (a reserva
natural Salto Morato, de 1 700 hectares) e estimula seus franqueados (são mais de 1 600
lojas no Brasil) a adotar medidas ambientalistas. A companhia troca suas sobras de papel,
plástico e vidro com empresas de reciclagem, que em paga produzem cadernos para
crianças carentes (no ano 2000, está prevista a fabricação de 100 mil kits de seis cadernos
cada).

Nenhuma dessas atitudes visa a ganhar participação de mercado. Essas companhias não agem
eticamente porque vão ser premiadas. Fazem isso porque acham que é sua obrigação - e seu
prazer. Fazem isso porque têm que fazer, porque a atuação social é o desenvolvimento natural
de sua consciência corporativa. Se isso faz bem à empresa - e faz -, tanto melhor.

6 - A busca do equilíbrio: como lidar com a oposiçãoentre trabalho e vida


pessoal

TRABALHO X FAMÍLIA - Como lidar com a oposição entre carreira e vida pessoal

Equilíbrio distante
Trabalho agora incorpora prazer, busca de significado e ambição. Isso só torna mais difícil
saber onde traçar a linha entre carreira e vida pessoal
Por David Cohen

Quem trabalha é que tem razão,


eu digo e não tenho medo de errar.
O bonde São Januário
leva mais um operário,
sou eu que vou trabalhar.
(Ataulfo Alves, Bonde São Januário)

Ora bolas, não me amole com esse papo de emprego. Não está vendo? Não estou nessa. O que eu
quero é sossego.(Tim Maia, Sossego)

Para que serve o trabalho? Se estamos caminhando para uma economia do conhecimento, se
as empresas estão se tornando virtuais e a sua maior riqueza passou a ser a criatividade e o
trabalho intelectual, por que é tão difícil encontrar equilíbrio entre a vida pessoal e a carreira
profissional?
A grande maioria dos executivos mantém um retrato da mulher (ou marido) e dos filhos sobre
a mesa do escritório. Por quê? A analogia mais próxima é a do soldado agachado na trincheira
que, numa pausa da batalha, observa com saudade um retrato amarfanhado da namorada
distante. Será isso o trabalho: o sacrifício diário em prol do sustento da família distante?
Nesse caso, a raça humana seria na verdade duas: o homo faber, durante 8 a 10 horas por dia,
e o homo ludens, no restante do tempo. Quando nos dirigíssemos ao trabalho,
incorporaríamos uma persona cuja existência só se justifica pela necessidade de sustentar o
nosso eu verdadeiro, aquele que se encontra no aconchego do lar ou nas filas de domingo
para entrar na churrascaria, aquele que joga bola ou se refestela na poltrona do cinema.
Mas essa diferenciação - clara durante boa parte da Revolução Industrial - já não é mais
possível. Quando a natureza do trabalho era eminentemente física, havia uma separação
muito nítida entre o que era trabalho e o que era lazer. Hoje, não. O que a empresa nos pede,
agora, é que empreguemos nossa inteligência no trabalho, e mesmo nos serviços antes tidos
como rotineiros. O novo mantra é: agregar valor. Pelo menos nas empresas de vanguarda, não
é mais possível desligar o cérebro no momento de bater o cartão de ponto. Já nem é preciso
estar no espaço físico do trabalho para trabalhar. No tempo do trabalho flexível, da empresa
inovadora, da participação nos lucros, torna-se fluida a distinção entre trabalho e casa, entre
vida profissional e vida pessoal.
É dessa nova natureza do trabalho que surge o discurso do prazer. As empresas não estão
(nem poderiam, nem deveriam estar) empenhadas em alcançar a felicidade de seus
funcionários. Mas seu interesse é criar um ambiente confortável para os empregados, porque
os ganhos de produtividade, hoje, só podem ser obtidos se o trabalhador empenhar seu
espírito no ofício. É este o grande bem e o grande mal do trabalho na empresa do futuro - ele
tem de se tornar mais parecido com o lazer. Será mais agradável, mais instigante, mais
recompensador, mas ao mesmo tempo mais absorvente, mais presente, mais difícil de ser
desligado.
Esse trabalho não é mais aquele ao qual Adão foi condenado, ao ser expulso do paraíso. Não
é um castigo divino. É um trabalho em que as pessoas querem ver significado. É um trabalho
que constrói a personalidade. Mas mesmo essa troca de mitos não elimina a sensação de que
o trabalho nos aliena. Está aí um primeiro paradoxo do trabalho: ele nos forma, com ele
cumprimos uma vocação, mas não deixamos de sentir que a vida, a "verdadeira" vida, está
fora do trabalho. (Não é à toa que tratamos a vida fora do trabalho como vida pessoal.
Poderia haver outra, uma vida não-pessoal?)
Essa nova natureza do trabalho é cheia de armadilhas. Uma delas: a generalizada pregação de
que precisamos sentir prazer no trabalho. Sim, o raciocínio flui solto quando existe prazer, e
quem gosta do que faz tem muito mais chances no novo mercado. Mas a recomendação de
que as pessoas sintam prazer é, muitas vezes, uma fonte de estresse e frustração. Eis a mágica
decepcionante de transformar prazer em obrigação.
Outra armadilha: a valorização do trabalho, a partir de certo ponto, torna-se
contraproducente. A maior contribuição do trabalho, na nova economia, é em conhecimento,
e o conhecimento deriva, pelo menos em parte, do ócio. (Um pouco de etimologia: em grego,
ócio se diz scholé, que é a origem da palavra escola. Em seu nascedouro, a idéia do
aprendizado está associada à de que só pode progredir intelectualmente quem está livre das
obrigações do trabalho. As noções ligadas ao trabalho são de outra natureza: a palavra vem do
latim tripalium, um instrumento de tortura; labor significa esforço penoso; negócio quer dizer
negação do ócio.) No campo mais prático, além da etimologia: nas legislações iniciais do
capitalismo, mendicância e preguiça eram crimes sujeitos à pena de prisão e, em alguns
casos, à de morte.
Não é estranho que o sucesso no trabalho, hoje, dependa da inclusão do ócio?

SOCIEDADE SEM TRABALHO?

O sociólogo italiano Domenico De Masi é um dos mais ferrenhos adversários da sociedade


baseada no trabalho. Um dos seus argumentos preferidos é um raciocínio algébrico. Com os
ganhos de longevidade, um homem comum trabalha de 70 000 a 100 000 horas durante sua
existência, mas vive algo entre 500 000 e 650 000 horas. "Éramos habituados a viver a
juventude, a maturidade e depois morrer. Hoje, paramos de trabalhar e ficamos 20 ou 30 anos
à espera da morte, em vez de produzir e nos divertir", afirma.
Embora venha fazendo sucesso com palestras no próprio meio empresarial (e, com o sucesso
de seu discurso pelo ócio, acabe trabalhando dobrado), De Masi não é o primeiro a sustentar a
tese de que o trabalho deveria ser abolido, tanto quanto possível. A lista é longa. Assim disse
o engenheiro Frederick Taylor, criador da linha de montagem, citado por De Masi: "Enquanto
o marxismo considerava que o trabalho era a própria essência do homem, enquanto o
catolicismo encarava o trabalho como uma forma de expiar o pecado original, enquanto o
socialismo filantrópico o considerava uma fonte de convívio cooperativo, Taylor o julgava
um mal que podia ser tecnicamente eliminado".
Em 1932, num texto chamado Elogio do Lazer (Zahar Editores), o filósofo galês Bertrand
Russell afirma que "o caminho para a felicidade e para a prosperidade consiste numa
diminuição organizada do trabalho". Tampouco a moral judaico-cristã é tão taxativa em sua
defesa do trabalho. Os judeus foram o primeiro povo a consagrar o dia do descanso. Seu mito
da criação do mundo descreve os seis dias de trabalho de Deus. Nenhum deles é tão
importante quanto o sétimo, destinado ao descanso e à contemplação. Os cristãos
acrescentaram um discurso em prol do ócio, proferido por Jesus, segundo o Novo
Testamento: "Olhai os lírios dos campos. Eles não trabalham nem tecem, e no entanto vos
digo, mesmo Salomão, em toda a sua glória, nunca esteve tão brilhantemente vestido".
Os antigos romanos designavam as profissões como "sórdidas artes". Os gregos
menosprezavam o trabalho. A crer em Heródoto, não estavam sozinhos. Trácios, citas, persas
e lídios nutriam-lhe o mesmo desprezo. "Os que aprendem as artes mecânicas, e mesmo seus
filhos, são olhados como os últimos dos cidadãos", disse o historiador grego.
Por que tanta animosidade contra o trabalho? Não podemos esquecer que, se não fosse por
ele, não teríamos nada daquilo que tanto almejamos quando não estamos trabalhando. Mais
do que eliminar o trabalho, então, trata-se de buscar-lhe uma nova forma, mais bem
distribuída, mais prazerosa, mais leve. Enfim, um trabalho que não ouse dizer o seu nome,
que se mantenha camuflado dentro do espaço do lazer.
Uma transformação assim pode até ser feita em favor da produtividade. No começo da
revolução industrial, alguns empresários descobriram que, numa jornada de 10 horas de
trabalho e meio período aos sábados, seus funcionários produziam tanto quanto na jornada de
12 a 14 horas diárias. Qual seria a jornada ideal na economia moderna? Uma pesquisa feita
na Itália registra que os funcionários públicos trabalham em média uma hora e meia por dia.
Ora, são funcionários públicos... O Fuji Bank japonês encomendou um estudo semelhante:
pelo menos 4% de seus funcionários passam o dia inteiro sem fazer nada. Na França, de
acordo com um estudo oficial, o horário de trabalho em uma jornada média é de 2 horas e 31
minutos.
Para que controlar a jornada de trabalho, se o trabalho intelectual não pode ser controlado? A
empresa de pesquisas americana Nielsen Media Research descobriu que empregados da IBM,
Apple e AT&T entraram no site da Penthouse 12 823 vezes durante um mês de 1996. Com
uma média de 13 minutos por visita, isso equivale a 347 dias de 8 horas de trabalho perdidos.
Há ainda os custos invisíveis da má distribuição do trabalho: o estresse custa à Grã-Bretanha
7 bilhões de libras (cerca de 20 bilhões de reais) em tratamento e 40 milhões de dias de
trabalho por ano. Um estudo do MIT (Massachusetts Institute of Technology) calculou que a
depressão, em grande parte ligada ao trabalho, custa aos Estados Unidos 47 bilhões de
dólares por ano.
Há mais um forte argumento a favor do ócio: a inovação. Bertrand Russell afirma que a
classe ociosa, apesar dos privilégios injustificados, foi a responsável por quase tudo o que
chamamos de civilização: "Ela cultivou as artes e revelou as ciências, escreveu livros,
inventou as filosofias, tornou requintadas as relações sociais. Até mesmo a libertação dos
oprimidos, em geral, foi por iniciativa de cima. Sem a classe ociosa, a humanidade jamais
teria saído da barbárie".
É com base nesse raciocínio que De Masi propõe o que chama de "desenvolvimento sem
trabalho", rumo a uma "sociedade pós-industrial". Seus conselhos são os seguintes:

• investimento na automação
• uso das pessoas em tarefas com flexibilidade e criatividade
• redução drástica do horário de trabalho e melhor distribuição de empregos
• recuperação de valores éticos e estéticos
• uma gestão baseada na motivação, não no controle
• desestruturação do trabalho, permitindo a produção em casa
• substituição da competitividade pela solidariedade

Algumas dessas medidas já estão sendo postas em prática na nova economia. Mesmo assim,
seus efeitos, pelo menos por enquanto, não estão sendo os esperados. Em vez de caminhar
para a sociedade sem trabalho, vemos uma divisão entre desempregados e sobrecarregados.
Essa situação parece a de uma piada sobre irlandeses. Perdido numa estrada, um turista pede
informações para chegar a Limerick. "Se é para Limerick que o senhor quer ir", responde um
irlandês, "eu não começaria a viagem por aqui". Pois a grande questão sobre a sociedade sem
trabalho é justamente esta: como chegar lá partindo daqui.
Como afirma Michael Dertouzos, chefe do Laboratório de Ciência da Computação do MIT:
"A revolução industrial possibilitou um ganho de tempo enorme. Mas todos sabemos que nós
não optamos coletivamente por usar esse tempo livre para lazer. Estudos comprovam que, ao
contrário, o tempo de lazer diminuiu. Como nós preenchemos esse tempo livre extra? Com
mais trabalho! Portanto, se a natureza humana for deixada solta, a tentação de ter mais coisas
e usar mais serviços vai prevalecer, e adeus à sociedade sem trabalho".
Russell propunha uma jornada de 4 horas. Dizia que o trabalho na dose adequada seria
suficiente para tornar o lazer deleitoso, mas não em demasia para ocasionar exaustão. A
lógica é impecável. Mas, mesmo no mundo de hoje, com o dobro dessa jornada, as pessoas
não funcionam assim. Segundo dados de 1997 do IBGE, 3,2 milhões de brasileiros têm dois
empregos, 26,8 milhões têm jornada acima do limite legal, 5,3 milhões de aposentados
continuam a trabalhar, 2,9 milhões de menores de 14 anos trabalham. Fazendo as contas por
alto: se cada um tivesse apenas um emprego, com a jornada regulamentar, e velhos e crianças
parassem de trabalhar, o mercado comportaria mais 22 milhões de pessoas.
O que impede a distribuição do trabalho é que as nossas necessidades aumentam na medida
em que são satisfeitas. Há 2 300 anos, Aristóteles dizia que tudo o que poderia tornar a vida
do homem confortável já tinha sido descoberto e, por isso, poderíamos nos dedicar ao que
realmente importa, a filosofia. Não foi o que aconteceu. Mais do que uma possibilidade no
fim do caminho, o lazer é uma opção, uma escolha. Uma escolha que, ao que parece, não
fizemos. É o que escreveu Bertrand Russell, em 1932: "Em vez do lazer, optamos pelo
trabalho excessivo a cargo de uns e pela miséria e pela fome para outros. Até aqui temos sido
tão enérgicos quanto o éramos antes que houvesse máquinas; temos sido loucos quanto a isso,
mas não há razão para que a loucura continue para sempre".

QUANTO É O BASTANTE?

Talvez esse quadro esteja começando a mudar. O presidente do conselho de administração da


HP, Lewis E. Platt, diz que 60% dos trabalhadores consideram a possibilidade de ter uma vida
mais equilibrada como uma das cinco prioridades na hora de optar por um emprego, de
acordo com estatísticas americanas. Salários e benefícios aparecem bem abaixo na lista de
considerações, em 130 e 140 lugares.
Jay A. Conger, presidente do Instituto de Liderança da USC (University of Southern
California), diz que a geração X - que compreende os nascidos entre 1964 e 1981 - preza o
equilíbrio mais do que as gerações anteriores. "Entrevista após entrevista confirma um
sentido de estar disposto a trabalhar duro, mas não à custa da vida pessoal", diz Conger.
Pode ser. Mas a essas estatísticas de intenções contrapõem-se outras, da vida real. Um
trabalho da pesquisadora Juliet Schor sustenta que o americano trabalha hoje, em média, 164
horas a mais por ano do que há 20 anos - o equivalente a um mês extra. O americano típico
trabalha agora 47 horas por semana. Segundo Juliet, este é um círculo vicioso faustiano,
porque as pessoas procuram mais consumo para dar satisfação e significado às suas vidas.
Outras estatísticas americanas apontam que os pais dedicam 40% menos tempo a seus filhos
do que há 30 anos. Um estudo de 1985 feito na Califórnia apontava que um pai típico passava
37 segundos por dia em "interação significativa" com os filhos. Contando interações de
qualquer natureza, esse tempo de contato passava para 6 minutos diários. Segundo o
sociólogo Manuel Castells, há indícios de que nos Estados Unidos o tempo de lazer tenha
diminuído 37% entre 1973 e 1994. Entre 1985 e 1990, o tempo total gasto com leitura,
televisão e filmes diminuiu 45 horas por ano.
Quanto à disposição de dar mais importância à qualidade de vida, uma pesquisa feita pela
revista Fast Company e pelo instituto Ropert Starch Worldwide com 1 096 trabalhadores de
nível universitário mostra o quanto essa disposição é fluida. A grande maioria dizia que
diminuiria o ritmo de trabalho se tivesse um salário maior, mas aqueles que ganhavam mais
de 100 000 dólares por ano diziam precisar de uma soma muito mais alta para ficar tranqüilos
do que os que ganhavam menos de 40 000 dólares por ano. O que a pesquisa indica é que a
percepção da necessidade cresce à medida que o salário avança, num jogo que provavelmente
nunca chega ao fim.
Ainda assim, ou talvez por isso mesmo, há hoje uma preocupação maior em buscar o
equilíbrio entre trabalho e lazer. Segundo Allan Cohen, reitor da escola de negócios
americana Babson College, existem duas tendências. Uma é a busca do equilíbrio no dia-a-
dia. A outra é se estourar de trabalhar durante alguns anos e depois tirar uma boa folga. "Nos
Estados Unidos, muitas mulheres estão optando por não trabalhar enquanto os filhos são
pequenos - uma tendência contrária à da década passada -, ou preferindo abrir microempresas
e trabalhar em casa", diz Cohen.
E quanto à busca de equilíbrio no dia-a-dia? Quanto tempo deve ser dedicado ao trabalho,
quanto à família, quanto aos projetos particulares? Essa não é a pergunta certa, afirma Dan
Baker, diretor da Canyon Ranch Health Resort, uma espécie de retiro espiritual no Arizona
para executivos repensarem a vida: "Equilíbrio não é uma questão de matemática". Se fosse
assim, qualquer pessoa com uma calculadora e uma agenda eletrônica pareceria tão serena
quanto o dalai lama. Equilíbrio é uma questão de projeto. É uma questão de fazer as pazes
com os seus valores e prioridades e reconhecer os sacrifícios que eles requerem. Numa
palavra, equilíbrio tem a ver com disciplina: decidir o que é importante e a partir daí criar
uma estrutura que defina como você gasta o seu tempo.
Quando se definem as metas que queremos atingir no trabalho, é preciso tomar cuidado para
não transformar o trabalho em fuga, diz Elaine St. James, escritora que se tornou guru da
simplicidade. Enquanto o nosso trabalho é tão vital que não conseguimos diminuir seu ritmo,
nós não olhamos para nossas próprias vidas, diz Elaine. Usamos o trabalho para não notar um
casamento que naufraga, uma carreira que não está lá essas coisas, a perda de contato com os
filhos, as amizades que esfriaram com o tempo ou que perderam o sentido.
Uma pergunta crucial para definir prioridades é: quanto é o bastante? O romano Sêneca
aconselhava as pessoas a passar a pão e água e dormir no chão um dia por mês. Por quê?
Porque fazendo isso perceberiam como precisavam de pouco para sobreviver. Sêneca queria
que elas distinguissem suas necessidades de seus desejos.

EMPRESAS EQUILIBRISTAS

Às vezes, definir prioridades leva a decisões radicais, como a do americano Bill Galston. Em
1993, ele era assistente do presidente Bill Clinton para política doméstica e, como se pode
imaginar, tinha uma rotina de trabalho estafante. Um dia, seu filho de 9 anos, Ezra, escreveu-
lhe uma carta falando sobre seu desempenho no jogo de beisebol, dizendo que sentia falta de
alguém para aplaudi-lo. Galston entrou em crise de consciência. Seis meses depois, pediu
demissão ao presidente.
É claro que as coisas não precisam chegar a esse ponto. Várias empresas já perceberam que
correm o risco de perder talentos e estão adotando medidas para facilitar a busca de equilíbrio
entre carreira e vida pessoal. Algumas até apostam nesse equilíbrio como fator de aumento da
produtividade de seus funcionários. Os melhores exemplos são do setor de informática, que
depende especialmente do trabalho intelectual.
A NIIT, uma consultoria de informática com sede em Nova Délhi, dá dinheiro para que seus 3
700 funcionários no mundo passem mais tempo com a família. Nos Estados Unidos, seus
empregados ganham 100 dólares e uma folga para ficar com a família no dia do aniversário.
Também no aniversário da contratação ganham folga e podem ir jantar com a família, de
limusine, por conta da firma.
Na HP, as principais exigências dos funcionários são horário flexível e licença para cursar
alguns programas educacionais, afirma Lewis Platt. "Se um empregado nos pede tempo, nós
damos. Continuamos a pagar as contribuições de saúde e damos garantia de retorno ao
trabalho. Também tornamos a recontratação mais fácil para aqueles que vão além da licença",
diz. No centro de serviços financeiros da HP, em Colorado Springs, 38 pessoas de uma equipe
de 60 escolheram trabalhar uma semana de 4 dias, 10 horas por dia, em vez do horário
normal. Um estudo da empresa comprovou que foi bom negócio: o número de horas extras
caiu à metade, a produtividade dos funcionários de horário flexível (medida em número de
transações por dia) superou a dos colegas e a satisfação dos clientes aumentou.
A SAS, empresa de software líder em programas de análises estatísticas, tem a maior creche
da Carolina do Norte. Na indústria da informática, tida como a mais estressante do momento,
seus funcionários trabalham sete horas por dia. (A partir das 17 horas, a maioria dos
telefonemas é atendida por secretárias eletrônicas.) O campus recreativo inclui um salão de
ginástica, duas quadras de basquete, uma sala de ioga e duas salas de musculação, fora as
quadras de futebol e de softball. Massagens são disponíveis várias vezes por semana e há
aulas de golfe, dança africana, tênis e tai chi. A empresa ainda lava as roupas suadas do
pessoal que faz ginástica e as devolve no dia seguinte.
Não é à toa que a rotatividade do ano passado foi de apenas 3,7%. Uma companhia de
software típica do tamanho da SAS perde 1 000 empregados por ano. A SAS perde 130. Mais
do que reter talentos, o tratamento que a SAS dá a seus funcionários define um padrão de
desempenho. O respeito que ela demonstra, espera em retorno.
Robert Reich, ex-secretário do Trabalho dos Estados Unidos, afirma que o que distingue as
melhores companhias não é que elas reconheçam o quanto é importante promover o
equilíbrio para atrair talentos - é como elas criam esse equilíbrio em suas organizações. Na
nova economia, diz Reich, o tipo de equilíbrio que atrai as pessoas não é uma série de
programas. É um jeito de fazer negócios.
"Equilíbrio não é deixar as pessoas tirarem folga quando seus filhos ficam doentes. Qualquer
companhia pode dar esse tipo de flexibilidade. Equilíbrio é o que é necessário quando seus
filhos estão disputando um torneio e querem que você esteja lá", diz Doug Burgum,
presidente da Great Plains Software, uma companhia que vende programas de gestão
financeira para empresas de médio porte. Segundo Burgum, tem que haver um nível mais
profundo de satisfação pessoal, uma sensação de que as coisas estão caminhando bem. Se a
empresa conseguir ajudar as pessoas a atingir esse nível, elas tendem a permanecer nela.
Jack Welch, presidente da GE, tem uma ambição maior: "Daqui a dez anos, queremos que
revistas escrevam sobre a GE como um lugar onde as pessoas têm liberdade para ser
criativas, um lugar que traga à tona o melhor delas. Um lugar aberto e justo em que as
pessoas saibam que o que elas fazem importa, e que esse senso de realização seja
recompensado financeira e espiritualmente. Esse será nosso cartão de apresentação".

NÓS, OS PIORES PATRÕES

Também a tecnologia ajuda na busca do equilíbrio. Algumas companhias americanas já estão


até criando serviços com computador para que os pais vejam os filhos nas creches. O site Red
Wagon, por exemplo, oferece aos pais "tempo de qualidade" com os filhos, pela Internet, nas
creches associadas.
Outra solução é o trabalho em casa. "Se você comparar o custo de equipar um funcionário
para trabalhar em casa com o custo de seguro-saúde ou subsídio da lanchonete, a tecnologia
vira uma gota num balde d'água", diz Platt, da HP.
É claro que não pode vir da empresa a resposta a uma questão tão pessoal. Até porque na raiz
da discussão sobre equilíbrio está um conflito - não necessariamente entre você e a empresa,
mas sobretudo entre seus interesses profissionais e privados. "Embora flexíveis, as
organizações continuam estabelecendo metas, na maioria das vezes bem além das
capacidades plausíveis. O quanto e o quê são ditados pelo poder, o que é deixado livre é o
como", afirma o sociólogo Richard Sennett.
Trabalhar em casa pode ser um sinal de libertação, mas pode ser uma fonte de estresse ainda
maior. No mundo da flexibilidade, a tabela de preços segue o produto, não o tempo.
Especialmente quando há metas a atingir e recompensas a ganhar, tendemos a ser nossos
piores patrões, estabelecendo condições de trabalho mais insanas que a de qualquer
empregador decente.
A tecnologia apresenta uma ambigüidade. Segundo a empresa de pesquisas International Data
Service, já neste ano 80% dos trabalhadores americanos devem ter pelo menos um aparelho
de computação móvel, tornando-os localizáveis. O trabalho tem agora a capacidade de
invadir o espaço antes claramente destinado ao lazer. No século 21, a gestão da privacidade
será uma das principais atividades humanas.
A REALIZAÇÃO PELO TRABALHO

A busca de equilíbrio seria mais fácil se o trabalho fosse efetivamente algo alheio à vida
pessoal. Aí, sim, teríamos apenas uma questão algébrica: quanto tempo da vida eu devo
vender por quanto dinheiro. Mas trabalho não é isso. Na imensa maioria dos casos, a
profissão começa como um desejo, um interesse, uma vocação. A não ser pelos ascetas
yoguis, ninguém busca a realização em si mesmo. A realização vem através do mundo, é o
trabalho que nos torna o sujeito da ação.
O problema é que em algum ponto essa mistura desanda. No mundo instável de hoje, a
confusão é ainda mais fácil. Com o enfraquecimento dos laços comunitários, familiares e
religiosos, a vida fora do trabalho torna-se cada vez mais vazia, diz a psicóloga americana
Ilene Philipson. Como resultado, mais pessoas encaram o trabalho como fonte de satisfação
de necessidades emocionais que antes eram preenchidas por outros campos das relações
humanas.
De acordo com o historiador Benjamin Hunnicutt, professor da Universidade de Iowa, o
trabalho transformou-se naquilo que nos define. "Ele agora responde as tradicionais questões
religiosas: 'quem sou eu?' e 'como posso encontrar significado para a vida?' Trabalho não é
mais economia, é uma busca de identidade". (Uma busca válida, mas, se mantida na
dimensão única do trabalho, fadada ao fracasso.)
Trabalho não é apenas algo que nós fazemos, ele é também algo que nos forma. O sujeito se
produz ao mesmo tempo em que produz objetos. Nesse ponto, o contrato de hoje é mais
vantajoso. De um lado, a organização aposta em resultados, mais do que no tempo gasto para
produzi-los. Por outro lado, o indivíduo busca um trabalho com significado e crescimento
pessoal, seja numa única empresa ou numa série de empresas. Trabalhar é também crescer,
adquirir habilidades, aumentar seu valor.
Mas aí também há uma crise contemporânea entre o trabalho e a vida pessoal. Porque a moral
do mundo do trabalho passou por enormes transformações. No livro A Corrosão do Caráter,
Richard Sennett cita o caso do administrador Rico, um profissional bem-sucedido mas infeliz
com os rumos da vida. Sua maior preocupação era que ele não podia oferecer a substância da
sua vida profissional como exemplo ético para seus filhos. As qualidades da boa vida
profissional estão dissociadas das qualidades que reputamos na vida pessoal.
Um exemplo é a moderna cultura do risco. No mundo do trabalho, a estabilidade é quase um
sinônimo de morte, e o destino importa menos que o ato de partir. "O risco é um teste de
caráter: o mais importante é fazer o esforço, arriscar, mesmo se você souber que está
destinado ao fracasso", diz Sennett. É verdade, ficar parado, hoje, tanto para empresas quanto
para indivíduos, é um risco que ninguém pode correr. Mas o mito da necessidade de mover-se
é tão forte que às vezes vai contra os fatos, como mostra um estudo do Congresso dos
Estados Unidos, de 1990. Segundo esse estudo, mais trabalhadores perdem do que ganham
quando trocam de empresa. Na comparação de salários de um a três anos após a troca de
emprego, 34% perderam muito, 28% ganharam muito. (Isso não invalida a hipótese de que
você tem que se mexer, apenas reforça a idéia de que não basta se mover, é preciso saber para
onde ir.)
Também a cultura do trabalho em equipe é oposta à noção de que a recompensa é resultado
da acumulação ao longo do tempo, como imaginou Max Weber. "A ética moderna é uma ética
do grupo, oposta à individual. O trabalho de equipe enfatiza a responsabilidade mútua mais
do que a validação pessoal. O tempo das equipes é flexível e orientado para tarefas a curto
prazo, mais do que a colheita de décadas marcadas pela contenção e espera", diz Sennett.
Dentro das equipes, vive-se uma ficção que nega a luta individual pelo poder ou o conflito
mútuo. A etiqueta da comunicação produz frases como "que interessante", "o que eu entendi
que você me disse foi" ou "como poderíamos fazer isso melhor?" Segundo o sociólogo
Gideon Kunda, essas são as máscaras de ator da cooperação. Essas máscaras são a habilidade
social que o trabalhador leva de emprego a emprego, de time a time, cujo hipertexto é um
sorriso vencedor. Nada disso é considerado positivo na vida pessoal.
Uma questão ainda mais básica é a ojeriza à rotina. O trabalho rotineiro hoje é visto como
degradação do ser humano. Adam Smith disse: "O homem cuja vida é gasta em repetir umas
poucas operações simples torna-se tão estúpido e ignorante quanto é possível uma criatura
humana se tornar". Mas há uma visão discordante. O filósofo iluminista Denis Diderot
procurou explicar como o ator gradativamente se aprofunda no personagem pela ação de
repetir as falas várias vezes. Essa mesma virtude da repetição ele esperava encontrar no
trabalho industrial. Como seu colega Voltaire, acreditava que o domínio da rotina poderia
levar as pessoas a ter controle de suas vidas e a tranqüilizar-se.
O sociólogo britânico Anthony Giddens, diretor da London School of Economics, indica o
valor primário do hábito nas práticas sociais e de auto-entendimento. (Giddens é o
formulador da proposta da "terceira via", apresentada como uma opção tanto ao
neoliberalismo quanto à social-democracia.) Segundo ele, nós testamos as alternativas apenas
em relação aos hábitos que dominamos. Imaginar uma vida de impulsos momentâneos, de
ações a curto prazo, livre de rotinas sustentadoras, uma vida sem hábitos, é imaginar na
verdade uma vida inconsciente.
Esta era também uma das críticas de Platão à democracia ateniense. O homem democrático,
dizia Platão, não aceita nenhuma ordem, nenhuma necessidade. "Ele deixa que se
estabeleçam nele desejos múltiplos. O capricho domina. Ora ele se embriaga, ora toca flauta,
ora faz dieta, ora faz exercícios físicos, ora se ocupa de política ou filosofia. E assim ele
acaba não fazendo nada e não se contentando com nada."
Mais uma vez, estamos às voltas com a questão do equilíbrio. A rotina rígida aprisiona, a
liberdade total leva à inconsciência. Uma outra forma de imaginar esse conflito é: quanto do
trabalho nos é externo, quanto é expressão de nossa identidade?
O filósofo renascentista florentino Pico della Mirandola, em sua Oração sobre a Dignidade do
Homem, declara: "É ignóbil não dar à luz algo que venha de nós". É o contrário do que dizia
Santo Agostinho: "Tira as mãos de ti mesmo; tenta construir a ti mesmo e construirás uma
ruína". Numa entrevista pouco antes de morrer, o filósofo francês Michel Foucault resumiu a
dificuldade da questão: "Como pode alguém governar a si mesmo, tomando ações nas quais
se é o objeto dessas ações, o domínio em que elas são aplicadas, o instrumento aos quais se
tem acesso e o sujeito que age?"
Talvez o problema do equilíbrio entre a vida pessoal e a vida profissional seja tão difícil
porque está intimamente ligado ao problema da identidade. É um conflito do qual ninguém
pode escapar. Não há fórmula para resolvê-lo. Mas uma boa pista é que os dois lados da
equação não são necessariamente antagônicos. Como dizem John Alexander e Meena S.
Wilson, do Centro para Liderança Criativa, nos Estados Unidos, uma das características vitais
para um líder de empresas é conseguir integrar sua vida particular e seu trabalho.
Alinhamento e integração - não divisão dos papéis entre casa e trabalho - geram sentimentos
de autenticidade e confiança que a maioria das pessoas espera de seus líderes, e podem criar
entusiasmo e um senso de propósito nas organizações.

7 - Que tipo de liderança vai criar a empresa do futuro

O NOVO LÍDER - Que tipo de liderança vai criar a empresa do futuro

O líder que serve


Quem vai conseguir comandar a empresa nessa época tão cheia de mudanças?
Por David Cohen

Não sou eu quem me navega,


quem me navega é o mar.
É ele quem me carrega,
como nem fosse levar.
(Paulinho da Viola e Hermínio Bello de Carvalho, Timoneiro)

O mundo dos negócios é instável, a maior riqueza das empresas do futuro é um bem
intangível (o conhecimento), a economia está se globalizando, as relações de negócios e
trabalho são marcadas pela flexibilidade, o ritmo das inovações desafia as mais brilhantes
estratégias e a sociedade exige mais das empresas. Nesse quadro, quem será capaz de dirigir
uma companhia? Que qualidades deverá ter o líder de empresas do século 21? Como
descobri-lo, como formá-lo?
Antes de pensar nessas questões, convém perguntar se devemos mesmo nos preocupar com
elas. Será que o líder do futuro será de alguma forma diferente do líder do passado? Ou mais:
haverá um líder do futuro?
Em 1993, a empresa de poupança e empréstimos Leeds, quinta maior do ramo imobiliário
britânico, ficou sem executivo-chefe. A situação se prolongou por 18 meses. Para tomar as
decisões estratégicas da empresa, os diretores financeiro, comercial e de sistemas passaram a
trabalhar em conjunto com um comitê de dez gerentes e um presidente que só estava
disponível duas vezes por semana. Sem poder central claro, a Leeds aumentou seus lucros em
22% em 1993 e em 37% no primeiro trimestre de 1994.
No livro Feitas para Durar, James Collins e Jerry Porras desfazem o mito de que as empresas
visionárias precisam de grandes líderes carismáticos. "Numa das conclusões mais fascinantes
e importantes das nossas pesquisas, descobrimos que criar e erguer uma empresa visionária
não requer uma grande idéia nem um grande líder carismático", dizem os autores.
Para confirmar sua tese, Porras e Collins citam exemplos de executivos de grande sucesso
com perfis totalmente diferentes do estereótipo do líder visionário. William McKnight, um
quase desconhecido, dirigiu durante 52 anos a 3M, que se tornou famosa e admirada entre
empresários de todo o mundo. Masaru Ibuka, da Sony, tinha a reputação de ser reservado,
solícito e introspectivo. Bill Allen, o diretor executivo mais importante da história da Boeing,
era um advogado pragmático, afável e tímido. Já Harry Cohn, da Columbia Pictures, tinha a
imagem de tirano, mantinha um chicote perto da mesa e às vezes dava uma chicotada na
madeira para enfatizar seu ponto de vista. (Um comentário maldoso sobre ele é que as 1 300
pessoas que compareceram ao seu enterro não foram lá para se despedir, mas sim para se
certificar de que ele estava morto.)
Mesmo o líder empresarial mais celebrado de hoje, Jack Welch, serve de contra-exemplo do
chefe salvador: Welch cresceu na GE, e é um produto dela tanto quanto ela é um produto
dele. O antecessor direto de Welch, Reginald Jones, aposentou-se como o líder de negócios
mais admirado dos Estados Unidos, segundo Robert Slater, no livro The New GE (A Nova
GE). "Ter um executivo do nível de Welch é impressionante", dizem Collins e Porras. "Ter
executivos-chefes do nível de Welch durante um século, todos treinados internamente - bem,
esse é um dos principais motivos pelos quais a GE é uma empresa vitoriosa."
Como se vê, o surgimento de um líder carismático não é uma condição imprescindível para a
construção de uma empresa de sucesso. Mas o questionamento da liderança não pára por aí. A
própria palavra "chefe" mudou completamente de sentido nos últimos tempos. Como afirma
Jay A. Conger, presidente do Instituto de Liderança da Universidade do Sul da Califórnia
(USC), ela não mais significa realização e autoridade. Agora a palavra simboliza distância
dos outros, dureza irracional e outras conotações não muito atraentes. Conger conta um
encontro com um executivo-chefe de uma empresa, da geração do pós-guerra. Depois de
almoçar, o executivo pulou para o banco da frente do carro, para estar "lado a lado" com o
motorista.
Talvez o processo de diluição da imagem da chefia não seja tão explícito para todos, mas é
interessante observar que as organizações estão substituindo o título de gerente pelo de líder
de equipe, coordenador do processo, facilitador etc. Isso significa que não haverá mais
líderes? Não. Significa que o estilo antigo de liderança se desgastou. Atingiu seus sucessos e
esbarrou em seus obstáculos. Pelas peculiaridades da economia moderna e pelas necessidades
da empresa do futuro (a virtualidade, a flexibilidade, a rapidez, a inovação, a consciência, o
funcionamento em rede, a emoção), a liderança salvadora, quase religiosa, tem poucas
chances de sobreviver.
Mas isso não quer dizer que não haverá mais líderes. O consultor americano Glenn Jones,
presidente da Jones Education Networks, afirma que não é preciso liderança para seguir um
plano estratégico aprovado. Basta uma gerência vigorosa e disciplina. "Precisamos de
liderança é para alimentar as tropas e dar esperanças quando o desenvolvimento do produto
fracassa, quando a resposta do mercado é um traço de audiência ou quando um contrato acaba
de ser passado para a concorrência pela terceira vez seguida. Quando a liderança emerge
nessas situações, ela se torna parte do DNA da empresa", diz Jones.
Definida assim, a liderança está longe de não ser mais necessária, pois no mundo de hoje
estão ficando raros os planos estratégicos capazes de sobreviver muito tempo à realidade
instável.

NÃO HÁ LÍDER NO VÁCUO

Liderança parece ser mais necessária quanto mais instável for a situação. De fato, se tudo
permanece do jeito que tem sido sempre, o papel de cada um é determinado pela tradição,
pelo costume. É quase automático associarmos o surgimento de um líder a situações de
emergência ou a momentos de decisão. Mas o líder não pode ser simplesmente alguém que
"dê esperanças à tropa". Líder não é chefe de torcida, nem propagandista de causas inglórias.
Toda empresa precisa de liderança, sim, mas para que serve esse líder?
Segundo Edgar H. Schein, professor de gestão da Sloan School, do Massachusetts Institute of
Technology (MIT), o papel da liderança depende da situação particular, da tarefa e das
características dos subordinados. "Nós tendemos a tratar a liderança como um vácuo, em vez
de especificar a relação do líder com a organização, num dado período", diz Schein. O que
ele quer dizer é que não faz sentido traçar o perfil do líder, se não se levar em conta a
organização que vai ser liderada. Não existe a figura do líder ideal, aplicável a qualquer caso.
É fácil perceber isso: afinal, quantas características em comum tinham Jesus Cristo e Átila, o
Huno? Cristóvão Colombo e Martin Luther King? Albert Einstein e Indira Gandhi? Como diz
o guru da administração Peter Drucker: a única definição de líder é alguém que tem
seguidores.
Ora, se não existe líder ideal, estamos perdendo tempo aqui, não é mesmo? De certo modo,
sim. Cada empresa terá de encontrar sua própria fórmula de liderança, adequada à sua
cultura, ao seu negócio, ao seu mercado. Mas, assim como a nova economia dita algumas
tendências para as organizações - e as que se adaptarem melhor terão mais sucesso -, também
os líderes mais aptos a lidar com essas tendências farão um trabalho melhor. O líder do
futuro, assim como o líder do passado, será simplesmente aquele que tiver seguidores. Mas
algumas linhas gerais podem ser traçadas para indicar os líderes com maiores probabilidades
de tornar suas empresas bem-sucedidas.
Um exemplo: se as empresas precisam incentivar a inovação, crucial na nova economia, o
fato de um líder saber tudo o que está acontecendo na empresa pode ser um mau sinal, em
vez de uma qualidade positiva. "Às vezes damos tanta ênfase ao papel do líder de criar visão
e valores que ignoramos sua função primordial de criar sistemas que apóiem e guiem a
liberdade dentro da organização", diz o consultor de gestão americano Gifford Pinchot.
Outro exemplo: numa empresa conectada, inserida na economia em rede, o papel da liderança
será organizar projetos seqüenciais e sincronizados de vários tamanhos e profundidades, com
várias combinações de pessoas, dependendo das tarefas, desafios e oportunidades da área e
dos parceiros num dado momento.
Um terceiro exemplo: se a empresa do futuro tem de ser adaptável a novas situações, seu
líder deve ser capaz de promover a mudança. Isso é quase como liderar sem liderar, porque
levar a cabo um grande projeto de mudança é uma tarefa que não pode ter passos
determinados. É, num certo sentido, deixar-se levar pelo mar. O processo exige improvisação
por muitas pessoas, em vários pontos. "O paradoxo de liderar a mudança é que a tarefa do
líder pode ser menos dramática, mas é certamente mais difícil em insights e sutileza", diz o
consultor de estratégia J. B. Kassarjian, do Instituto Internacional de Desenvolvimento de
Gestão (IMD, com sede em Lausanne, na Suíça).

Maneiras de servir

Um bom líder deve tirar o melhor proveito de seus funcionários. Eis algumas características de liderança que
ajudam a desenvolver pessoas dentro da empresa, segundo as consultoras de carreiras americanas Caela Farren e
Beverly L. Kaye. Você se encaixa em algum tipo?
• facilitador: ajuda as pessoas a identificar seus valores e interesses, cria um ambiente propício à discussão,
ajuda as pessoas a compreender o que querem de suas carreiras
• avaliador: diz como a pessoa está indo, esclarece os padrões e expectativas pelas quais ela será julgada, sugere
ações específicas para melhorar o desempenho
• vidente: dá informações sobre a organização, a profissão, a indústria, ajuda as pessoas a encontrar fontes
adicionais de informação, aponta tendências, comunica a direção estratégica da companhia
• conselheiro: ajuda as pessoas a identificar metas de carreira, relaciona metas potenciais às exigências do
negócio e aos interesses da empresa, aponta fontes de apoio e obstáculos
• possibilitador: ajuda a desenvolver planos de ação, facilita contatos com gente de outras áreas, conecta pessoas
com os recursos de que precisam para se desenvolver

PUXAR O TAPETE DO CHEFE

O asteca Montezuma, imperador do México no começo do século 16, nunca punha os pés no
chão. Quando ia a algum lugar, nobres o carregavam nos ombros e, quando parava, eles lhe
estendiam tapetes para que não tocasse o solo. Dentro do seu palácio, o rei da antiga Pérsia
também só andava em tapetes, nos quais ninguém mais tinha o direito de pisar. O rei meda
Deioces, que inaugurou o império medo-persa, não admitia súditos na sua presença. Todas as
consultas a ele eram feitas por meio de mensageiros. Segundo o historiador grego Heródoto,
Deioces criou esse cerimonial para dar a impressão de que era de uma natureza diferente da
daqueles que não podiam vê-lo.
É claro que esses são exemplos extremos. Não há líderes assim nas empresas. Mas há muitos
que, guardadas as proporções, seguem esses parâmetros. Gostam de se ver como seres
especiais, de natureza diferente da daqueles a quem lideram. Os tapetes nos quais eles andam
têm de ser puxados.
A lógica de frisar as diferenças entre chefe e subordinados está ultrapassada, diz Rosabeth
Moss Kanter, professora de gestão da Harvard Business School. Segundo ela, líderes do
futuro deverão ter as qualidades dos líderes de sempre: um olho para a mudança e uma mão
firme para dar a visão e a segurança de que a mudança pode ser administrada, uma voz que
articula a vontade do grupo e a molda para fins construtivos e uma habilidade para inspirar
pela força da personalidade. "Mas o líder do passado costumava erguer barreiras. Agora o
líder tem de destruir essas barreiras e construir pontes."
Numa empresa ideal, repleta de gente talentosa, tudo se passa como se as pessoas tivessem
todas as mesmas armas. Com armas, o jogo da dominação fica mais sujeito ao acaso e a
liderança tem que ser exercida mais pela persuasão do que pela coerção. O povo !kung, da
África do Sul, tem um ditado propício para discussões políticas: "Nenhum de nós é maior que
os outros. Somos todos homens e podemos brigar. Eu vou buscar minhas flechas".
É por isso que a Constituição dos Estados Unidos permite a posse de armas. Elas são
consideradas instrumentos de equalização de poder entre os cidadãos. (Ainda que a prática
comprove que uma população armada é um péssimo negócio para a segurança, é a essa
simbologia que se agarra o lobby da indústria de armas de fogo americana.)
Na nossa analogia corporativa, as armas são a inteligência, tornada o principal valor na nova
economia. Todos a têm (embora alguns possam usá-la melhor do que outros), e isso implica
que a dominação seja exercida pela persuasão. Liderança baseada na habilidade nem é
privilégio da raça humana. Entre os chimpanzés, o líder do grupo não é necessariamente o
mais forte, é quase sempre o que melhor sabe manipular as alianças sociais.

DE BOAS INTENÇÕES...

Mas ninguém quer uma empresa de chimpanzés, não é? Um dos maiores perigos de traçar um
perfil do líder corporativo é justamente fixar-se nas habilidades da manipulação. Grande parte
do discurso sobre liderança prioriza a forma sobre o conteúdo e o estilo sobre a substância.
"A maioria dos ensinamentos sobre como liderar enfatiza a manipulação, as táticas de
intimidação, a retórica vazia, a geração de imagens", diz a americana Diana Chapman Walsh,
presidente da escola de artes Wellesley College.
É como se os liderados fossem peças a ser movidas pelo encantamento de frases mágicas,
máquinas a ser postas em funcionamento pelo aperto dos botões certos, animais a realizar
truques com o incentivo de recompensas. Isso dá certo, mas tem limites muito claros. Os
resultados, em geral, são apenas os imaginados pelo chefe. Com esse tipo de liderança,
dificilmente haverá surpresas - e surpresas são uma das matérias-primas da inovação.
Segundo Dave Ulrich, professor de administração da Escola de Negócios da Universidade de
Michigan, apontado pela revista Business Week como o maior educador sobre recursos
humanos nos Estados Unidos, os líderes do futuro serão conhecidos mais pelo que entregam
do que pelo que dizem, mais pelo que moldam do que pelo que controlam, mais pelas
intenções que criam do que pelos resultados.
Um minuto: a medição de intenções vale mais do que a medição de resultados? Não é
exagero? Everaldo Santos, que deixou a presidência da Alcan no ano passado, acha que não.
Medir ações e resultados é medir o passado. As intenções de hoje podem dizer como a
empresa vai estar no futuro. "Quem não começar a avaliar a visão que inspira as ações vai
ficar para trás. O problema é que ainda não temos instrumentos para fazer esse tipo de
avaliação", diz Santos. Segundo ele, o método antigo de premiar produtividade, eficiência,
preço médio, número de clientes, já não basta. "É preciso medir a interação entre visão e
ação, almejando o desenvolvimento sustentado. A Alcan está começando esse processo,
tentando medir os fatores críticos de criação de valor. O maior desafio do gerente é
diagnosticar o que cria valor no longo prazo."
Que tipo de líder é esse cujas preocupações se deslocam dos resultados para as intenções?
Então não é certo que de boas intenções o inferno está cheio? Sim, é certo. Mas esta já não é
a distinção entre ter ou não ter um líder. É a distinção entre ter um bom ou um mau líder.

PRÊMIO PARA A INTELIGÊNCIA

Se há uma característica imprescindível nos líderes, ela é simplesmente essa: a inteligência.


Como diz Rosabeth Moss Kanter, da Harvard Business School: "A função intelectual dos
líderes tem sido freqüentemente negligenciada nas discussões sobre liderança. Carisma, força
de personalidade, habilidades interpessoais têm sido mais faladas que o poder do cérebro
requerido de líderes para pensar nos problemas e achar novas soluções. Tentar liderar um
mundo em mudança põe um prêmio na inteligência: imaginar possibilidades fora das
categorias convencionais, vislumbrar ações que cruzem as fronteiras tradicionais, fazer novas
conexões e inventar novas combinações".
Numa economia em que o principal produto é o conhecimento, o ideal é que a liderança seja
uma espécie de destaque entre pares. Essa situação faz com que o novo executivo - e não
apenas o líder - tenha necessidade de um novo leque de qualidades. Entre essas qualidades, o
guru da administração C. K. Prahalad, professor da Universidade de Michigan, destaca:
• pensamento sistêmico - a capacidade de considerar as várias áreas da empresa e suas
relações umas com as outras
• competência intercultural - a capacidade de compreender diferenças
• treinamento contínuo e extensivo
• padrões pessoais e de comportamento (já vamos chegar a esse ponto)
Há uma corrente forte de estudiosos da liderança que prioriza o aspecto agregador do líder.
John B. McCoy, presidente do Banc One (a quinta maior holding de bancos dos Estados
Unidos, com bens de mais de 250 bilhões de dólares), diz que não tem nenhum conhecimento
sobre como gerir os vários bancos que ele lidera. Seu papel é ver os números de desempenho,
ouvir os pedidos de ajuda dos associados e ter certeza de que aqueles que precisam são postos
em contato com aqueles que podem ajudar. "Meu papel principal é o de chefe de pessoal. Se
eu conseguir ter as pessoas certas nos lugares certos, isso é tudo que eu tenho de fazer."
Não há nada contra a ênfase nesse papel agregador do líder. Esta é mesmo a sua principal
função, dando um sentido para a organização e dirigindo-a para obter resultados. Mas falar
dessa função como se fosse a coisa mais natural do mundo mascara o espetacular trabalho
que está por trás da sua aparente simplicidade. Para conseguir colocar as pessoas certas nos
lugares certos, não dá para contar só com a sorte. É preciso ter competência.
O mito, alimentado até por alguns líderes, de que o papel da chefia é desvinculado do saber
necessário à produção, pode prejudicar a empresa. O especialista em liderança tecnológica
Derek Abell, professor do IMD, afirma que na formação de líderes tem-se assumido o
processo de desespecialização. Ao contrário, afirma Abell, para a liderança de uma empresa
tecnológica deve-se promover a especialização, combinada com as competências mais gerais
de liderança. Em suma: o líder tem de entender do negócio, até mesmo para poder dar
autonomia aos seus subordinados.

UMA ESPÉCIE DE HERÓI

É claro que não é só a inteligência que faz um grande líder. "A verdadeira liderança requer
das pessoas que assumam riscos consideráveis e façam coisas que os outros não estão
dispostos a fazer", afirma o consultor americano John W. Work, diretor da Work Associates.
Para ele, a liderança deve ser analisada em relação à imagem do herói: "Heróis incorporam os
valores mais fundamentais e duradouros de uma sociedade. Quando eles são relegados a
papéis menores, ou desaparecem, substitutos têm de ser criados. Os líderes são esses
substitutos".
Por que heróis? Porque, além da inteligência, do poder e do carisma, o líder deve ter um
desejo e assumir um compromisso maior com a organização. Um líder é aquele que tem garra
para ir mais longe, para fazer o que os outros não estão dispostos a fazer. Em duas palavras, é
aquele que se oferece para um sacrifício maior e para uma responsabilidade maior.
Não se trata de um heroísmo de filmes de caubói. "O que conta não é o valor dos atos
heróicos, mas a coragem de fazer e dizer o que se acredita ser verdadeiro, mais do que
conveniente, familiar ou popular; a coragem de agir sobre a visão que se tem da
organização", afirmam Joseph Badaracco e Richard Ellsworth, autores do livro Leadership
and the Quest for Integrity (Liderança e a Missão da Integridade).
Essa disposição cria a base da liderança, porque é reconhecida pelos outros. Mais do que
qualquer manipulação, é essa força interior que faz o líder. Daí ser tão importante a sua
personalidade. "As menores facetas de comportamento do líder são notadas pelos que estão à
sua volta, mesmo que não conscientemente, e refletidas para toda a organização por aqueles
que influencia", afirma o psicólogo e consultor americano Nathaniel Branden. "Se um líder
trata sócios, subordinados, clientes e fornecedores com respeito, isso tende a se propagar para
a cultura da empresa. Por isso, se um líder quiser criar uma organização com alta auto-estima
e alto desempenho, o primeiro passo é trabalhar a si mesmo." (Daí a necessidade dos padrões
pessoais e de comportamento, destacada mais acima).
Como os heróis de qualquer mitologia, a luta pessoal do líder tem de reverter em resultados
para a sociedade. Se não for assim, o indivíduo não se torna herói, mas apenas um neurótico
preso em seu conflituoso mundo interior. Baseado em sua longa experiência, Peter Drucker
afirma que os líderes eficientes não perguntam "o que eu quero?", mas "o que precisa ser
feito?" Ou, como disse o matemático polonês Jacob Bronowski: "A personalidade criativa é
uma que vê o mundo como apto para mudança e a si mesma como instrumento de mudança...
um divino agente de mudança".

LÍDER SERVE PARA MUDAR

Pelo menos nisso parece que todos os especialistas em liderança concordam: se não for para
promover mudanças, ninguém precisa de líder. A sorte dos candidatos a líder é que o mundo
de hoje é um caldo de mudanças à espera de acontecer. Só há um problema: ninguém
consegue mudar uma organização sozinho. Uma mudança assim dirigida não é mudança, é
cumprimento de ordens. A verdadeira mudança exige participação voluntária, e o papel do
líder é como o de catalisador de uma reação química.
"Líderes hoje têm de começar a pensar como agentes de mudança. Eles não podem mudar a
cultura no sentido de eliminar elementos disfuncionais, mas podem fazê-la evoluir,
construindo sobre seus pontos fortes e deixando os pontos fracos atrofiar", diz Edgar Schein,
da Sloan School. Ele cita as características requeridas para um promotor de mudanças:

• nível de percepção extraordinário, de si e do mundo


• motivação, para passar pelas dificuldades do aprendizado
• habilidade para envolver outros
• disposição para dividir o poder

Dividir o poder?!? Segundo Schein, essas características não precisam estar presentes em
algumas pessoas o tempo todo, mas vão estar presentes em muitas pessoas durante algum
tempo.
J. B. Kassarjian, professor de estratégia no IMD, fala de características similares: coragem
para ter avaliações realistas sobre o seu próprio padrão de liderança; habilidade para
identificar e ouvir rebeldes cultos nas linhas de frente do negócio; talento para combinar esses
dados numa história que possa levar as pessoas a agir.
Sim, porque no fim das contas o que importa é fazer as pessoas agir. Quando se trata de
mudanças, alguns gerentes vão estar prontos para entrar no barco, mas a maioria não vai ser
tão entusiasmada - por discordar do rumo tomado pela empresa ou por puro medo. Isso
significa que uma das tarefas-chave para o gestor é criar um sentido de urgência da mudança,
diz o canadense Peter Killing, professor de estratégia do IMD. "Mas é preciso ter uma
urgência cuidadosa. A última coisa que você quer é implementar às pressas uma mudança
sem sentido."
Killing propõe um método. "Não exija. Crie experiências. Dê liberdade aos gerentes que
quiserem implementar mudanças. Aos poucos, você vai pondo em contato as experiências
que forem dando certo." Só há dois problemas com esse processo, adverte Killing: a) ele é
lento, não serve para emergências; b) não é garantido que os gerentes que mais precisam
mudar sejam aqueles que abracem a mudança.
Se a mudança for urgente, Killing sugere a criação de um ambiente de crise, que force a ação.
Pode ser com um anúncio público de novas diretrizes. "Quem resiste à mudança pode achar
que tem a última chance de dar seus motivos. Convém ouvi-los, eles podem estar certos."
Outra forma de simular uma crise é modificar uma rotina entranhada na organização. Acabar
com um período de férias estabelecido, mudar o modo de fazer reuniões, fazer uma reforma
no escritório. O recado é: as coisas não vão ser como antes. Uma terceira maneira é matar
uma vaca sagrada: vender um negócio que não esteja adequado ao seu projeto de futuro,
mandar embora um alto executivo resistente. Criar um choque.

EMOÇÃO E PROPÓSITO

A mudança não é difícil só para os funcionários ou para a empresa. Toda mudança ameaça o
líder. Segundo a consultora de gestão americana Judith M. Bardwick, as pessoas confiam no
líder quando ele diz que algo vai acontecer e isso acontece. "Basicamente, confiança é uma
questão de previsibilidade. Grandes mudanças, portanto, sempre ameaçam a confiança e,
assim, em última análise, a confiança na liderança." Manter o nível de confiança é uma tarefa
emocional.
A emoção deve estar sempre na pauta de um bom líder, diz Deepak Sethi, responsável pelo
desenvolvimento de jovens talentos na AT&T: "Pessoas de baixa auto-estima acham difícil
elogiar as realizações de outros. Inveja e ressentimento sempre ficam no caminho. Por outro
lado, se um gerente aprende a responder de modo correto - porque a empresa exige e porque
faz parte da cultura -, não só a pessoa talentosa vai se sentir melhor, mas o próprio gerente
pode crescer em auto-estima, pelo exercício de comportamento racional. A organização do
futuro vai ser construída em estima mútua, como pré-condição para a liberação do melhor em
cada pessoa".
Falando de emoções, sempre acaba aparecendo a pergunta: seria o caso de uma liderança
mais feminina? Chris Argyris, professora de educação e comportamento organizacional da
Harvard Business School, responde: "Está na moda para as mulheres esposar a teoria de que
elas são mais sensíveis, mais alertas para as relações interpessoais e menos competitivas que
os homens. Nosso estudo com mais de 7 500 indivíduos mostrou que, para definir suas ações,
as mulheres usam os mesmos tipos de controle unilateral e teorias ganha/perde que os
homens".
Qual é o truque, então, para manter a confiança da tropa, para criar um ambiente propício ao
desenvolvimento de talentos? Não há truque. O grande conselho do americano Richard
Leider, fundador do Inventure Group, líder no setor de desenvolvimento de carreiras nos
Estados Unidos, é ser verdadeiro: "Liderar com um senso de propósito pessoal claro cria
coragem; coragem verdadeira atrai seguidores. A chave para o alto desempenho é a
integridade - fazer pequenas coisas com consistência".

O INFERNO (E O CÉU) SÃO OS OUTROS

Muitas vezes, um chefe tem a clara noção do que precisa ser feito, só não entende por que
ninguém se entusiasma como ele, por que ninguém compartilha sua visão. Quando isso
acontece, em geral quem não está enxergando direito é ele. Basicamente, não está enxergando
que outras pessoas pensam de forma diferente. O ex-executivo da Shell Arie de Geus conta a
lição que recebeu de um diretor, no começo da carreira: "Se você quiser ser um líder, tem de
entender que um gerente não é Deus. Um gerente não cria pessoas - certamente não à sua
própria imagem. Como gerente, você pega as pessoas como elas são e aprende a trabalhar
com elas".
A prática da liderança tem boa parcela de ensino, esclarecimento e tutelagem. Mas não em
mão única. Tanto quanto ensinar, o líder tem de aprender. (No fundo, trata-se do mesmo
processo. Em francês, o verbo apprendre significa tanto ensinar quanto aprender. Em inglês,
learn e teach têm significados diferentes, mas durante um bom período as duas palavras
foram usadas como sinônimos. Shakespeare usou learn no sentido de ensinar, na peça Dois
Cavalheiros de Verona. Em hebraico, aprender e ensinar têm a mesma raiz, lamed,
conhecimento.)
"O líder não só precisa saber aprender, mas também tem de aprender como as outras pessoas
aprendem", dizem John Alexander e Meena S. Wilson, vice-presidente e pesquisadora do
Centro para Liderança Criativa, uma consultoria americana.
Fala-se muito que o líder tem de inspirar as pessoas, mas o contrário é também verdadeiro.
Um líder precisa ser inspirado pelos outros. Ele tem de se realizar por meio dos outros, tirar
satisfação do sucesso de seus subordinados. Só assim poderá deixar de ser concentrador. Num
certo sentido, o líder tem de servir seus subordinados. Edson Vaz Musa, que atua como
consultor, gestor ou sócio em mais de 20 empresas médias e grandes, diz que o dirigente deve
estar sempre disponível para os subordinados. "O executivo-chefe que está sempre ocupado
está fazendo mal à empresa."
Especialmente quando o principal produto das empresas é o conhecimento, é preciso
estimular os funcionários a sair de baixo das asas do chefe. Na empresa do futuro, os gerentes
terão de administrar riscos, não comportamentos. Os funcionários mais valiosos serão os mais
criativamente desobedientes.
Mesmo para executivos "esclarecidos", ceder o poder é difícil. "Não é que eu não sinta falta
do sistema antigo", diz Phil Carroll, executivo-chefe da Shell. "Ser o comandante-em-chefe
era divertido." Pode ser divertido, mas uma empresa no mundo instável não pode mais se dar
ao luxo de não aproveitar o potencial de seus funcionários. E aproveitar o potencial é permitir
que eles se desenvolvam - isso inclui tornar-se líder.
É o que afirmam os americanos Ian Sommerville, da Andersen Consulting, e John Edwin
Mroz, presidente do instituto EastWest Studies (Estudos Oriente/Ocidente), que presta
consultoria a governos europeus: "Se o seu programa de liderança é só para gerentes e
executivos, você não está entendendo a mensagem".
É POSSÍVEL APRENDER A SER LÍDER?

Ora, para que gastar dinheiro em treinamento com pessoas que nunca vão chefiar nenhum
departamento? Por uma razão muito simples, diz Robert H. Rosen, presidente da Healthy
Companies Institute (Instituto de Companhias Saudáveis, uma organização americana sem
fins lucrativos): quando nos tornamos melhores líderes, tornamo-nos também melhores
seguidores. Liderar é ter noção de responsabilidade, ter paixão, honrar compromissos e saber
tomar decisões. Isso é bom em qualquer nível da empresa.
Alguns empresários antigos ainda pensam que não precisam de funcionários com autonomia,
pelo menos em cargos mais baixos. Imaginam que isso só vá servir para elevar o custo da
folha de pagamentos. Mas, na economia do conhecimento, não há setor que não possa lucrar
com um pouco mais de inteligência, e dificilmente haverá investimento mais lucrativo do que
aprimorar as qualidades dos seus funcionários.
O guru Peter Senge, diretor do Centro de Aprendizado Organizacional da Sloan School,
chega a especificar alguns tipos de liderança dentro de uma empresa:
• Líderes locais: criam subculturas que podem diferir bastante da cultura principal da
empresa. São bons para a companhia, porque em geral é deles que vem a inovação. A
independência é sua força e sua fraqueza. Força, porque permite experiência fora dos limites
da cultura da empresa. Fraqueza, porque eles não pensam muito em aprender dentro da
organização, tipicamente têm pouca paciência para compartilhar seus resultados e podem
desenvolver uma postura "nosso departamento contra o mundo", achando-se
incompreendidos pela organização.
• Líderes executivos: devem proteger os líderes locais e atuar para juntar gerentes com linhas
de pensamento complementares dentro da organização.
• Construtores da rede: seu poder vem justamente do fato de não terem poder nenhum. Eles
podem se mover pela organização livremente e são vistos como pessoas com credibilidade,
conhecimentos e senso de compromisso. Servem como elos de ligação porque ninguém os vê
como ameaça.
É claro que corremos o risco de esbarrar na hipocrisia. Uma empresa não pode dar o mesmo
tipo de recompensa e reconhecimento a todos os funcionários. (Isso se aplica especialmente
ao Brasil, um dos países com maior disparidade salarial entre altos executivos e operários.)
Chamar todo mundo de líder não é o mesmo que dizer que não há líder nenhum?
Sim, é. Essa questão está intimamente ligada a uma outra: é possível aprender a ser líder?
A professora Chris Argyris, de Harvard, diz que agir de acordo com um modelo pode ser
muito contraproducente. "Se um líder L recebe a avaliação de que é muito controlador, ele
pode tentar agir de forma menos autoritária. Mas esse raciocínio exclui as razões pelas quais
ele é autoritário. Pode ser porque ele considera seus subordinados fracos, sem iniciativa.
Então ele pode mudar seu comportamento sem mudar as crenças que o sustentavam. O que
faz esse tipo de mudança? Se L falava muito, agora fala pouco. Se era agressivo, torna-se
mais passivo. Os novos comportamentos não representam uma nova teoria, são apenas as
características opostas da velha. Por isso, em geral têm curta duração, especialmente quando
o indivíduo se sente constrangido ou ameaçado."
A única forma de melhorar o relacionamento é abandonar os raciocínios defensivos. Eles
levam a estratégias unilaterais, que provocam outras estratégias unilaterais, até criar um
diálogo de surdos.
O paradoxo da liderança é que o líder eficiente em geral não está tentando ser líder, está
apenas se esforçando para expressar suas verdades. É alguém que quer aprender e buscar o
autoconhecimento. Se cada funcionário for incentivado a fazer isso, a empresa terá gente
muito mais motivada no presente e muito mais possibilidades de escolher o líder ideal para o
futuro, no futuro.
Na mitologia hassídica (uma seita judaica criada a partir de 1740), o rabino Zusya de Hanipol
ensinava: "Na outra vida, ninguém vai me perguntar: 'Por que você não foi mais parecido
com Moisés, nosso líder?'. Eles vão me perguntar: 'Por que você não foi mais parecido com
Zusya?'
Bibliografia

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