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Sangramentos da Primeira Metade da Gestação

5 a 10% das gestações podem cursar com sangramentos até a metade da gestação e as
principais etiologias obstétricas para esses sangramentos são: Abortamento, Gravidez
Ectópica e Doença Trofoblástica Gestacional.

Sangramento de 1ª metade
(até 20-22 semanas)

Obstétrico Não obstétrico

Doença
Abortamento Gravidez trofoblástica
ectópica gestacional

Abortamento
Segundo a OMS, abortamento é definido como a interrupção da gestação com feto
pesando menos de 500 gramas ou com idade gestacional inferior a 20 semanas
Interrupção espontânea ou induzida da gestação antes da viabilidade fetal.

IG < 20 semanas ou peso fetal < 500g


O abortamento é a complicação mais comum da gravidez e estima-se que 1 em cada 4
mulheres terá um abortamento espontâneo. Dentre as gestações diagnosticas entre 15 à
20% evoluem com abortamento.
Podemos classificar o abortamento das seguintes formas:
• Espontâneo  sem interferência intencional;
• Induzido  com interferência intencional;
• Habitual  > 2 episódios de perdas espontâneas;
• Precoce  até 12 semanas (80%);
• Tardio  12 a 20 semanas.
Podemos dividir didaticamente as etiologias do abortamente em 3 grupos: Alterações
cromossômicas, fatores maternos e fatores paternos.
1- Alterações cromossômicas: são a principal etiologia, responsáveis por
50-80% dos casos de abortamento. Dentre as alterações
cromossômicas, ganha destaque as aneuploidias. As trissomias são as
aneuploidas mais encontradas em casos de abortamento e, em seguida, a
monossomia
do cromossomo X. Essas alterações cromossômicas decorrem de fertilização por
gametas anormais, de fertilização anômala ou de irregularidades na divisão
embrionária.
2- Fatores maternos: Devemos destacar a presença de infecções virais
ou bacterianas (destaca-se: infecção por Treponema Pallidum e
Clamydia trachomatis que podem causar lesões na decídua, placenta,
membranas ovulares e embrião, além das infecções, destaca-se:
diabetes mellitus, tireoideopatias, obesidade mórbida, desnutrição,
causas uterinas (Síndrome de Arsheman, miomatose, insuficiência istmo-cervical),
fatores imunológicos (destaque para a síndrome do anticorpo antifosfolipídico),
agentes nocivos (tabagismo, alcoolismo e cafeína) e trauma.

3- Fatores paternos: fator que necessita de maiores estudos, mas sabe-se que as
anomalias cromossômicas dos espermatozoides aumentam risco de abortamento.
Entendido esse arcabouço teórico de definição, classificação e etiologia é necessário
começar a desenvolver um raciocínio clínico perante o abortamento e para isso é
fundamental conhecer as formas clínicas do abortamento e a respectiva conduta para cada
caso. Essas informações estão sumarizadas na tabela a seguir:

FORMAS CLÍNICAS E PRINCIPAIS ASPECTOS DOS ABORTAMENTOS


Aborta Aborta
Sinais e Abortamento
Ameaça de mento mento
Incomple
Abortamento Abortamento
sintoma inevitá- comple Infectado Retido
abortamento -to
s vel -to

Ainda ocorreu Eliminaçã Morte
expulsão
não o parcial Infecção embrionári
Não ocorreu completa
Definiçã houve dos polimicrobi a ou fetal,
aborta- do
o expulsão produtos ana com
mento produto
do da sobreposta retenção
da
material
concep-
concepção do produto
ção
Presente
Sangra Intenso ou
-Às Variável, às Presente
mento Leve Leve intermiten
vezes fezes fétido ou ausente
vaginal te
intenso
Presente,
Dor/Cól Discreta ou Pre-
Discreta Presente pode haver Ausente
icas ausente sente
peritonite
Febre Ausente Ausente Ausente Ausente Presente Ausente
Compatí-
Menor Menor que
vel amolecido Menor que
Compatível ou não que o o
Útero e doloroso o esperado
com a IG com a espera- esperado
à palpação à IG
IG do à IG à IG
Fecha-
Aberto, do ou se Aberto,
Orifício podendo
fechan- com saída Geralment
interno Fechado haver Fechado
do em de restos e aberto
do colo bolsa
herniada
poucas ovulares
horas
Negativo Negativo Negativo
Geralme
Beta- ou ou ou
Positivo nte Negativo
hCG decresc decrescen decrescent
positivo
ente te e
Saco Útero
Restos
Embrião e gestacio vazio, Produtos
ovulares,
BCF nal em endomé da Embrião
endométri
presentes, expulsã -trio concepção, presente,
USG o
pode haver o; BCF linear, endométri porém sem
irregular,
hematoma present espes- o espesso, BCF
espessura
subcoriônico es ou sura < irregular
> 15 mm
não 15 mm
Expec-
tante, Considerar
Tratament
analge- tratament Pode ser
Expectante;A o cirúrgico,
sia e o necessário
CONDUT nalgesia; antibioticot
vigiar clínico/cir controle
A Repouso no erapia
sangra- urgico e ultrassono
leito endovenos
mento e avaliar gráfico
a*
infecção hemorragia
uterina.
*Antibioticoterapia endovenosa para abortamento infectado, realizar: Clindamicina +
Gentamicina (ou Ceftriaxone) OU Ampicilina + Gentamicina + Metronidazol

Agora que já vimos essa tabela resumindo os principais aspectos dos diversos quadros
clínicos de abortamento, é necessário ter um olhar mais apurado sobre os tratamentos e
condutas possíveis.

Quando falamos em Conduta expectante, devido aos riscos de sangramento, infecção e


coagulopatia, a conduta expectante não é recomendada pela maioria dos autores, e só pode
ser aventada, excepcionalmente, em gestações de 6 a 8 semanas, com estabilidade
hemodinâmica, sem sangramentos excessivos. Caso não haja expulsão completa após 72
horas, o esvaziamento uterino deverá ser indicado.

Quando falamos em tratamentos clínicos para esvaziamento uterino pensamos em


perfusão venosa de ocitocina ou uso de comprimidos de misoprostol no fundo de saco
vaginal.

o A Perfusão venosa de ocitocina até a expulsão do feto, seguida de posterior


esvaziamento uterino cirúrgico, ou paralelamente ao tratamento cirúrgico, de forma
a diminuir o risco de perfuração uterina e hemorragia.
o Uso de comprimidos de misoprostol no fundo de saco vaginal: O misoprostol é
um análogo da prostaglandina E1 e pode ser utilizado na tentativa de favorecer a
expulsão fetal em quadros que se desenvolvem após 12 semanas. Isso pode ser
obtido por diferentes protocolos, como dose de 200 mcg a cada 4 horas, 400 mcg a
cada 12 horas ou 800 mcg a cada 24 horas. Atualmente, o uso de misoprostol vem
sendo considerado o tratamento de escolha, pelos menores riscos quando
comparados aos procedimentos cirúrgicos.

Quando falamos em tratamentos cirúrgicos para o esvaziamento uterino pensamos em


aspiração manual intrauterina (AMIU), Aspiração à vácuo e curetagem uterina.

o AMIU (aspiração manual intrauterina): é procedimento desenvolvido para ser


realizado ambulatorialmente, sem necessidade de anestesia geral ou internação.
Apresenta menor risco de perfuração uterina, de necessidade de dilatação cervical e
risco de sinéquias. É o procedimento de eleição em gestações com até 12 semanas. É
menos traumática que a curetagem uterina e diminui o risco de sinéquias.
o Aspiração a vácuo: semelhante à AMIU, porém necessita de sistema de vácuo para sua
realização.
o Curetagem uterina: indicada quando há impossibilidade de realização da AMIU ou na
presença de grande quantidade de material. Quando a idade gestacional for maior que
doze semanas, mas o feto ainda esteja dentro da cavidade uterina, é necessária a
expulsão fetal através do uso de misoprostol ou ocitócitos para somente então realizar
a curetagem. A curetagem uterina é o procedimento com maior risco de perfuração
uterina. Na suspeita de perfuração uterina, a conduta mais adequada é parar
imediatamente o procedimento e manter conduta expectante com infusão venosa de
ocitocina.

Por fim, após ter realizado o tratamento ideal é necessário que em casos de Abortamento
Habitual, proceda-se investigação das causas, além disso é fundamental solicitar tipagem
sanguínea e coombs indireto para a paciente e encaminhá-la para realizar planejamento
familiar.

Legislação e interrupção voluntária da gravidez no Brasil

 O abortamento deve sempre ter o consentimento da mulher, salvo nos casos de risco
iminente de vida. O abortamento só é permitido no Brasil nas seguintes situações:
o Abortamento em situações de risco à gestante (abortamento terapêutico) –
no caso, quando há doenças graves em que a gestação pode conduzir a risco de
vida para a paciente, precisando de uma anuência por escrito de dois médicos;
o Abortamento em caso de malformações congênitas (anencefalia não
necessita autorização judicial);
o Abortamento para gravidez decorrente de violência sexual.
 As técnicas utilizadas para interrupção voluntária da gestação são as mesmas descritas
aos casos de abortamento espontâneo, podendo, o procedimento, ser realizado até 20
semanas de gestação.

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