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SANGRAMENTOS DE SEGUNDA METADE DA GESTAÇÃO

Há uma vasta possibilidade de causas de hemorragia de segunda metade da gravidez, se


destacando como causas obstétricas o descolamento prematuro de placenta (DPP), a placenta
prévia, a rotura uterina, a rotura da vasa prévia, rotura do seio marginal, e como causas não
obstétricas as cervicites, as lesões cervicais, os pólipos endocervicais, câncer de colo uterino,
lesões vaginais e vulvares. Dentre elas, as que representam maior risco de vida são a DPP,
placenta prévia, rotura uterina e rotura da vasa prévia, sendo as duas primeiras correspondentes
a 50% dos diagnósticos.

DESCOLAMENTO PRÉVIO DE PLACENTA (DPP)


Introdução
Conceito: Consiste na separação espontânea e intempestiva, parcial ou total, da placenta
normalmente inserida no corpo ou fundo da cavidade uterina, antes da expulsão fetal em
gestação de 20 semanas completas ou mais. Compõe causa importante de sangramento vaginal.
Fatores de Risco: Fatores mecânicos e traumatismo são fatores predisponentes que aparecem
de forma sólida na literatura como responsável pelo DPP. Os estados hipertensivos estão
associados a até 50% dos casos de DPP não traumático (seja hipertensão arterial crônica ou a
pré-eclâmpsia). Outros fatores de risco são:

o Episódio prévio de DPP em gravidez anterior (aumenta em 10x o risco de recorrência)


o Rotura prematura de membranas ovulares
o Cesariana prévia (a cicatriz uterina próxima à implantação da placenta pode implicar
numa deficiência da perfusão sanguínea, favorecendo o DPP)
o Idade materna avançada e paridade (acredita-se que essas condições predispõem a
existência de decidualização anômala, anormalidades dos vasos uterinos e do
endométrio, as quais por sua vez facilitam o DPP)
o Gestação múltipla (esse risco é atribuído à rápida descompressão uterina consequente
ao nascimento do primeiro gemelar)
o Polihidrâmnio
o Corioamnionite (infecção intrauterina)
o Uso de cocaína (potente efeito vasoconstrictor e hipertensivo) e outras drogas (tabaco,
álcool, crack, etc.)

Diagnóstico
Assume um caráter clínico, baseando-se na manifestação clínica. A sintomatologia padrão
caracteriza-se pela presença de:

o dor abdominal repentina de intensidade variável – de leve desconforto a intensa – (na


condição de sintoma mais comum) atribuída a
o sangramento vaginal de coloração escurecida ou não;
o dor à palpação uterina;
o contrações uterinas acompanhadas de hipertonia ou taquissitolia.
OBS: Se em trabalho de parto, observa-se persistência do quadro álgico entre as contrações.
No exame físico pode-se verificar:

o sangramento genital visível externamente (vale ressaltar que, em caso de presença de


sangue exteriorizado, a sua quantidade pode não refletir a perda sanguínea efetiva, e,
portanto, não deve ser usado como parâmetro de gravidade; a coloração escurecida
indica a presença de coágulo retroplacentário);
o hipertonia uterina;
o sinais indicativos de CIVD (petéquias, equimoses, hematomas);
o achados alterados da vitalidade fetal na cardiotocografia (bradi ou taquicardia fetal
persistentes, desacelerações) ou no perfil biofísico fetal, sugestivos de insuficiência
uteroplacentária;
o nos quadros de hemorragia oculta, há aumento gradual da altura uterina;
o ao toque, tensão na bolsa das águas;

OBS: Nos casos de DPP crônico, o sangramento vaginal é pouco volumoso, acompanhado ou
não de sensibilidade e contrações uterinas, com vitalidade fetal preservada, e sinais de
coagulopatia ausentes.
No contexto do exame físico, deve-se proceder inicialmente com o ABC da reanimação:
avaliando sinais vitais; perviedade de vias aéreas; condição da mecânica respiratória e
circulatória, atentando para a necessidade de administrar reposição hipovolêmica. É importante
ressaltar que a gestante manifesta os sinais de hipovolemia (taquicardia e/ou mudanças
posturais da pressão) de forma mais tardia, e, por essa razão, quando presentes os
comemorativos do estado de choque sugere-se uma perda sanguínea de até 30% da volemia.

No exame obstétrico, a palpação uterina é mandatória, verificando a apresentação fetal e o


status do tônus uterino; bem como aferir a medida uterina e os batimentos cardíacos fetais por
meio do monitoramento contínuo, sendo comum achados de padrão preocupante.

No contexto de investigação da história, a anamnese deve ser completa, se atentando ao


questionamento de todos os possíveis fatores de risco, como histórico de trauma (ex: violência
física), antecedentes de estados hipertensivos, abuso de drogas, etc.

No que tange recursos de diagnóstico de imagem, sabe-se que a ultrassonografia exerce papel
limitado na investigação do DPP, sendo útil apenas para excluir outros diagnósticos, como
placenta prévia, ou quando o diagnóstico clínico de DPP é duvidoso. Quando presentes, os
achados ultrassonográficos mais comuns são:

o identificação do coágulo retroplacentário;


o espessamento anômalo da placenta;
o descontinuidade da borda placentária.

A indicação da USG se dá nos casos de estabilidade hemodinâmica materna na presença de


manutenção da vitalidade fetal. No quadro agudo, na maioria das vezes o hematoma
retroplacentário não é passível de visualização por meio desse exame.
Quanto a exames laboratoriais, tem-se que não são úteis ao diagnóstico do DPP, mas são
utilizados na avaliação hemodinâmica materna, orientando, portando, o manejo da paciente.

Classificação: Sher & Statland 1985. Tal sistema de classificação tem importância
significativa, no sentido que direciona a conduta.

CONDIÇÃO VITALIDADE
GRAU SANGRAMENTO COAGULOPATIA
MATERNA FETAL
Oculto (coágulo
retroplacentário
Estabilidade
identificado a
hemodinamicamente
I partir do exame Preservada Ausente
Hipertonia uterina
histopatológico da
ausente
placenta) ou
discreto
Hipertonia uterina
II Moderado Repercussões Comprometida Ausente
hemodinâmicas
Hipertonia uterina
III A Volumoso Instabilidade Óbito fetal Ausente
hemodinâmica
Hipertonia uterina
IIIB Volumoso Instabilidade Óbito fetal Presente
hemodinâmica

Conduta
Cuidados hemodinâmicos maternos:
o Cateterização venosa de acordo com a gravidade. Utiliza-se cateter periférico ou
intracath;
o Sondagem vesical para avaliação do volume urinário e indiretamente da função renal;
o Oxigênio úmido em máscara aberta;
o Monitorização contínua da pressão arterial, frequência cardíaca e diurese;
o Avaliação laboratorial:
o Hemoglobina e hematócrito

● Teste de Weiner (avalia formação e dissolução do coágulo): colocar 5 a 10 ml


sangue tubo de ensaio Banho Maria 37 º C
▪ Tempo de coagulação de 10 min, tempo de observação 1 h= Coágulo
firme

▪ Alterado indica fibrinogênio < 100 mg %

● Contagem de plaquetas < 100.000 ml 🡪alterado


● Dosagem de Fibrinogênio (VN 300a 600 mg%), coagulopatia: < 100 mg%

● Produto degradação fibrinogênio-fibrina > 100 mcg/ml (alterado)

●Dosagem produtos da degradação da fibrina: Dímero D (Dímero da fibrina) –


proteína resultante do processo de coagulação < 500ng/dl
● Tipagem sanguínea
● Avaliação renal (ureia e creatinina)
● Gasometria arterial
o Reposição volêmica o mais precoce possível e a medida do necessário com cristaloides,
concentrado de hemácias, plasma fresco, crioprecipitados e plaquetas. Ressalta-se a
importância de reposição de hemoderivados.
Cuidados obstétricos:
o Aminiotomia: É mandatória e deve ser realizada imediatamente.
Sendo definida a classificação de gravidade da DPP, podemos orientar a conduta com base no
fluxograma a seguir:

DPP

Grau 1 Grau 2 Grau 3

Feto vivo Feto vivo Feto morto


Gestante estável Gestante estável Gestante estável

Sim Não
Parto vaginal Parto iminente

Parto vaginal Estabilidade


Sim Trabalho de Não
parto lento
Sofrimento fetal
Estabilidade
materna
Parto vaginal Cesárea

REFERÊNCIAS

1) BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações


Programáticas e Estratégicas. Gestação de alto risco: manual técnico. Brasília, 5 ed,
2012.
2) Zugaib
3) Rezende
4) Protocolo EBSERH
5) Gestação de Alto Risco FEBRASGO
6) Síndrome Hemorrágica na Gravidez

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