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PROPÓSITO
Conhecer a história da infância significa apontar questões que definem a construção da nossa
sociedade. Isso favorece um entendimento das modificações ocorridas ao longo do tempo
sobre esse tópico, além de ampliar a visão da criança em seu papel social. Esse conhecimento
também favorece a compreensão dos avanços na legislação e a problematização de possíveis
afastamentos e aproximações entre diferentes períodos históricos, destacando as diferenças
que ainda permeiam a diversidade de infâncias no contexto brasileiro.
OBJETIVOS
MÓDULO 1 MÓDULO 2 MÓDULO 3
Explicar a construção Explicar a construção Reconhecer marcos legais
social do conceito de social do conceito de importantes na
infância ao longo do infância ao longo do construção histórica da
tempo no Brasil tempo no Brasil ideia de infância no Brasil
Em alguns casos, recordamos situações que aconteceram: sentindo cheiros e sabores, fazemos
comparações entre a ideia de uma “era que já se foi” e “tempo de hoje”.
Esse movimento de refazer caminhos da memória, estabelecendo conexões entre passado e
presente (ou da infância à vida adulta), nem sempre foi tão simples assim. A infância, da
maneira que a idealizamos ou discutimos hoje em dia, nem sempre existiu.
Philippe Ariès.
Relacionar algumas especificidades a um determinado momento da vida não era algo tão
natural naquela época; por isso, o autor foi considerado um dos precursores da discussão.
Fonte: EscolaDeFilosofia.org.
ATENÇÃO!
Estudos como o de Ariès ajudaram a criar uma nova dinâmica de entendimento sobre o
conceito de criança. Nota-se que a passagem dos anos cristalizou tais mudanças na própria
percepção dos pais, da sociedade e do sistema educacional sobre o que é uma criança. Por
isso, seus estudos foram tão importantes para essa abordagem.
Atualmente, isso pode parecer natural para você; afinal, todos sabemos a idade necessária
para abrir uma conta, obter a maioridade penal ou poder participar de cada série escolar. Isso
definitivamente está cristalizado em nossa mente, mas tais visões surgiram apenas nas
décadas de 1960 e 1970.
CRIANÇA ADULTO
Nesta concepção, que tem origem na Idade
Média, a criança era vista como um
“miniadulto”. As necessidades específicas
da faixa etária sequer eram pensadas.
Na Idade Média, era muito comum o infanticídio; desse modo, a alta taxa de mortalidade de
crianças era uma questão marcante. As famílias encaravam a perda dos filhos como algo
natural, pois logo eles poderiam ser substituídos por outros.
CRIANÇA INSTITUCIONAL
Na segunda concepção, a criança passa a
ser compreendida como um indivíduo
institucional que necessita de cuidados
específicos para cada faixa etária que são
essenciais para seu desenvolvimento.
A ideia de amor materno e da importância dos sujeitos por si só – e não por suas funções
sociais desempenhadas – é uma questão cujo desenvolvimento foi operado na sociedade ao
longo do tempo. No final do século XVIII, por exemplo, o cuidado com os filhos já é uma
realidade em muitos lares. A partir de sua ligação com a mulher, a maternidade coloca as
crianças em evidência. O ato de cuidar, até então função das “amas de leite”, agora constitui
uma tarefa pertinente às mães de cada criança.
A dependência dos adultos surge aí como mote para a construção da criança como centro de
atenção das famílias. Ela é entendida como um sujeito que requer esforços de terceiros para
poder se tornar um adulto considerado civilizado.
Embora reconhecida
institucionalmente em suas
especificidades, a criança
ainda é considerada o sujeito
da “falta”; afinal, para ela se
tornar um cidadão, falta-lhe
conhecimento sobre o mundo
e as suas regras.
Por isso, a escolarização é valorizada.
Nesta concepção, a família moderna, núcleo institucional que acolhe essas crianças, evoca
questões sobre o controle da população e as relações de poder que reverberam um ideal de
criança – e, desse modo, as relações estabelecidas para e com elas. Entendidos como seres
irracionais que precisavam ser “preenchidos” e moldados de acordo com as exigências da
sociedade, os infantes passaram a desenvolver um papel que constituía um ideal de futuro;
por isso, sua vida precisava ser preservada, acentuando um olhar agora mais atento para as
questões ligadas à saúde e à educação.
SAIBA MAIS
Para aprofundar seus conhecimentos, leia a resenha “Família na contemporaneidade:
mudanças e permanências”, de Carolina M. B. de Souza (2008).
O estudo específico desta etapa trouxe à tona a preocupação com a escolarização dos
menores. Um ideal de universalização do ensino começava a ser traçado em consonância com
a (já citada) construção de um cidadão. Consequentemente, as crianças foram se afastando
cada vez mais de seus papéis ocupados nos postos de trabalho, embora saibamos que
infelizmente o trabalho infantil ainda é uma realidade em nosso país.
CRIANÇA SOCIAL
A partir do século XIX, surge uma terceira
maneira de conceber a criança: percebida
como um sujeito de direitos, ela se torna
um ser social.
Destaca-se a criança:
Diante desses casos, ela deixa de ser um elemento auxiliar e passa a figurar nas discussões da
ordem do dia, justificando, pouco a pouco, estudos, percepções, direitos e proposições na
construção desses “seres”.
É POR ISSO QUE PASSAMOS A ENTENDER A EXISTÊNCIA DE UM
UNIVERSO INFANTIL PRÓPRIO, AINDA QUE NÃO SISTEMATIZADO.
A PERCEPÇÃO SOBRE ESSAS PESQUISAS E AS TRANSFORMAÇÕES
VIVIDAS É UM DOS MÉRITOS DA PESQUISA DE ARIÈS.
TENDÊNCIA
Exercitemos um pouco nosso pensamento:
Para muitos, isso pode parecer uma realidade distante; no entanto, ainda é muito recorrente,
evidenciando um traço de nossa sociedade.
Há diferentes maneiras de vivenciar as infâncias. Realidade em vários países, no Brasil ela não
se justifica apenas por questões históricas e culturais. Em nosso território, ela opera de acordo
com a classe social e etnia, dado o grande número de crianças negras e indígenas cujos
antepassados foram escravizados.
As escolhas para nossa exposição são teórico-metodológicas. Para isso, nos basearemos na
perspectiva da educação decolonial, já que ela busca lidar com as nossas mazelas. Nosso
objetivo é indicar maneiras de se reconhecer as características desse passado colonial,
observando como elas nos marcam e reestruturam a nossa formação.
Vista como adulto, o infante inserido no mercado de trabalho é o centro de atenção das
famílias. Negros e indígenas compõem as múltiplas facetas dessa noção de criança que ainda
carrega as marcas das diferenças que sempre permearam a história da infância. Embora
devamos levar em consideração o fato de que, no Brasil, tal história se assemelha muito à da
Europa em termos teóricos e conceituais, a perspectiva de desnaturalização do sujeito e a
exploração escravista acabam por merecer alguns destaques e um olhar mais atento.
Desse modo, podemos destacar as múltiplas infâncias que constituíram a história no Brasil,
salientando as especificidades que abarcavam (e ainda abarcam) as inúmeras que faziam parte
daqueles grupos.
Entre 1500 e 1800, as crianças passaram pelo processo de catequização realizado pelos
jesuítas por serem consideradas mais acessíveis que os adultos, especialmente em termos de
doutrinação religiosa.
Crianças Nativas
Novamente compreendidas sob uma visão servil, as crianças nativas tinham sua força de
trabalho utilizada por senhores de escravos (órfãos ou não).
TENDÊNCIA
Como vimos, existe um componente histórico e sociológico na relação das crianças com a
própria infância. Realidades sociais como pobreza e escravidão são componentes que exercem
influência na questão, não podendo ser ignorados. Observar o paradigma da criança no Brasil é
definitivamente uma tarefa difícil.
- Esta criança faz assim por falta de castigo físico (tradição que herdamos de nossa
história).
Ou ainda:
- Está assim porque as crianças não têm a mãe em casa, é a ausência do modelo
tradicional que leva a esse quadro confuso em que nós vivemos.
Recente em nossa história, a análise sobre a forma de se lidar com a criança e o adolescente
será objeto do próximo módulo, mas a conexão entre os problemas deste e do próximo pode
ser sistematizada e provocada a partir das ações políticas pensadas.
Você já ouviu falar do Estatuto da Criança e do Adolescente no
Brasil (ECA)?
Vamos ver o que um especialista tem a nos dizer sobre a sua história nas terras do Brasil.
AS PRIMEIRAS LEGISLAÇÕES SOBRE A
INFÂNCIA NO BRASIL
Uma das primeiras leis que
visava a garantir o direito das
crianças, a Lei nº 2040,
conhecida como “Lei do
Ventre Livre”, foi promulgada
em 1871 para garantir que as
crianças nascessem livres,
além de vetar a compra e
venda daquelas menores de
12 anos.
Esta lei constitui um dos grandes avanços
do período escravocrata; embora não
impedisse o trabalho infantil, ela foi um
marco precursor para a produção de outras
leis e políticas que tratavam da proteção
das crianças.
A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E A
INFÂNCIA NO BRASIL
A educação passa a ser
reconhecida como direito
social somente a partir da
Constituição Federal de 1988,
quando o Estado assume a
obrigação legal de oferecer
para todos uma que seja de
qualidade.
Antes disso, a educação pública já existia, mas era compreendida como uma assistência aos
que não podiam pagar, enquanto o ingresso nas escolas não era facilitado para as classes mais
populares, havendo pouca oferta de vagas e acesso limitado à informação.
O documento não se limita a anunciar direitos, representando um grande avanço ao nomear
os responsáveis por seu cumprimento.
ATENÇÃO!
O poder público não pode se negar à oferta de educação, assim como os familiares e a
comunidade não podem deixar de cumprir tal obrigação.
A Constituição Federal também prevê:
A obrigatoriedade do Estado
na oferta de vagas em
creches e pré-escolas ao
declarar como direito dos
trabalhadores a assistência
gratuita de seus filhos e
dependentes até os cinco
anos de idade. No entanto,
seu caráter assistencialista
ainda persiste, sendo uma das
questões mais discutidas no
campo da educação infantil.
SAIBA MAIS
Veja a contextualização histórica do atendimento à infância no Brasil (1889-1985).
A história da infância é construída, ao longo do tempo, de acordo com seu contexto social e
sua época. A concepção de infância, entre outras diferenças registradas, é por vezes
modificada, suscitando tanto concepções de um sujeito com características próprias, segundo
as quais se constroem possibilidades de um futuro, quanto a noção de criança como um
miniadulto.
Com o avanço dos estudos na área e a necessidade de garantir direitos para esses sujeitos,
surgia uma série de políticas públicas construídas em prol dos pequenos: a Lei do Ventre Livre,
que garantia, desde o nascimento, a não escravização das crianças de outra etnia ou as menos
favorecidas; a Constituição Federal de 1988, que tornava obrigação legal do Estado o amparo à
educação delas; o ECA, que se apresentava como mecanismo de garantia da proteção e dos
direitos das crianças e dos adolescentes; e, por fim, a LDB, que impõe a obrigatoriedade de
matrícula delas em creches e escolas. Elas constituem, nesse âmbito, os principais marcos
alcançados.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARIÈS, P. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Guanabara, 1981.
BARBOSA, A. A.; MAGALHÃES, M.G.D. A concepção de infância na visão de Philippe Ariès e sua
relação com as políticas públicas para a infância. In: Revista eletrônica de Ciências Sociais,
História e Relações Internacionais, v. 1, n.1, 2008.
BRASIL. Lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013. altera a Lei n. 9.394 de 20 de dezembro de 1996,
que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para dispor sobre a formação dos
profissionais da educação e dá outras providências. Brasília, 2013.
PRIORE, M. (Org.). História das crianças no Brasil. São Paulo: Contexto, 2004.
EXPLORE +
• Assista ao vídeo: Concepções de infância na história.
• Leia o texto: A concepção de infância na visão de Philippe Ariès e sua relação com as
políticas públicas para a infância.
• Leia o texto “Situação das crianças e dos adolescentes no Brasil” para se aprofundar no
assunto.