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MÓDULO 402: “DISTÚRBIOS SENSORIAIS, MOTORES E

DA CONSCIÊNCIA”

PROBLEMA 1:

CONTEÚDO EDUCACIONAL:

1. Síndromes miastênicas e miopatias.


2. Diagnóstico diferencial da fraqueza muscular proximal
3. Epidemiologia, fisiopatologia, diagnóstico, quadro clínico, diagnóstico
diferencial, tratamento e prognóstico da miastenia gravis.

OBJETIVOS EDUCACIONAIS

1. Citar os diagnósticos sindrômico e topográfico desta paciente,


correlacionando-o com os achados semiológicos. Citar as principais etiologias
desta síndrome.

Esta paciente apresenta uma síndrome miastênica. Esta síndrome é caracterizada


pela fadigabilidade dos músculos durante sua atividade, podendo afetar toda a
musculatura estriada do organismo. Tipicamente, a fraqueza surge ou se acentua ao
final do dia, considerando o aumento da demanda de atividade muscular neste horário.
Quando esta fadiga afeta os músculos extraoculares, ocorrem diplopia e ptose
palpebral durante uma leitura, por exemplo. Se afeta a musculatura comandada pelos
nervos de origem bulbar, ocorre fala nasalada e disfagia, que surgem ou progridem
durante a fala ou a ingesta alimentar. Quando ocorre nos músculos apendiculares,
usualmente afetam mais os proximais. Desta forma, a fraqueza encontrada nesta
síndrome é de natureza flutuante, por isso é possível que o paciente tenha um exame
neurológico normal durante o atendimento. Contudo, quando há esta suspeita é
importante testar a fadigabilidade dos músculos. São adicionadas algumas manobras:

1. Pede-se ao paciente que olhe fixamente para cima: pode haver ptose e estrabismo
2. Pede-se ao paciente que conte de 1 até 100: a fala pode se tornar nasalada.
3. Paciente mantém MMSS estendidos: pode haver queda bilateral.
4. Pede-se ao paciente que bata palmas repetidamente: pode haver fadiga.
5. Pede-se ao paciente que faça um movimento repetido de se levantar e agachar,
segurando as mãos do examinador: haverá fadiga, fazendo com que o paciente
aumente a força de preensão na mão do examinador.
A paciente do caso apresenta fadigabilidade dos músculos oculares e apendiculares.
O diagnóstico topográfico é nas junções neuromusculares.
Na síndrome miastênica, o tônus, trofismo muscular, os reflexos miotáticos e a
sensibilidade estão normais.

As principais etiologias da síndrome miastênica são:


1. Autoimunes: miastenia gravis, síndrome de Eaton-Lambert (paraneoplásica).
2. Genéticas: defeitos nos receptores de acetilcolina ou nas enzimas formadoras e
clivadoras de acetilcolina.
3. Tóxicas: botulismo, organofosforados.
2. Descrever o diagnóstico nosológico mais provável desta paciente,
correlacionando a fisiopatologia da doença com os sinais e sintomas
apresentados.

O diagnóstico nosológico mais provável desta paciente é miastenia gravis, transtorno


mais comum da transmissão neuromuscular.

- Epidemiologia: a miastenia grave tem prevalência de cerca de 15 por 100000 casos,


tendo aumentado nos últimos anos em função do maior reconhecimento da doença e
do aumento da sobrevida. É mais comum no sexo feminino, com pico de incidência na
segunda e terceira década nas mulheres, e na quinta e sexta década nos homens.

- Etiopatogenia e fisiopatologia: a miastenia é uma doença de origem autoimune,


mediada por anticorpos (Ac) que agem sobre estruturas pós-sinápticas da junção
neuromuscular. Em 85% dos casos, há detecção de Ac contra o receptor nicotínico de
acetilcolina (Ach), ao passo que em 10% essa ação ocorre contra outra estrutura da
membrana pós-sináptica: a cinase músculo-específica (MuSK). Nos 5% restantes,
ainda não foram detectados Ac circulantes. Atualmente, sabe-se que os Ac são da
classe IgG1 e agem de 3 formas sobre o receptor de Ach: bloqueio funcional do
receptor, formação de complexos Ac-Receptor com internalização do mesmo,
acarretando diminuição em sua quantidade, e ativação do complemento, com
destruição da membrana pós-sináptica. Isso acarretará uma elevação do limiar para a
geração do potencial de ação da placa motora e a diminuição progressiva de sua
amplitude. Nos pacientes com Ac anti-MuSK e naqueles sem Ac detectáveis, não se
sabe o mecanismo fisiopatológico. A produção destes Ac exige a ativação de linfócitos
T auxiliares (Th1) capazes de reconhecer determinantes antigênicos do receptor de
Ach. Já há evidências de que esta ativação ocorre no timo, que está anormal nos
casos de miastenia grave com Ac anti-receptor de Ach e anti-MuSK. Contudo, ainda
não foi possível caracterizar a resposta destes linfócitos T nesta doença.

- Quadro clínico: o paciente apresenta fraqueza muscular de natureza flutuante, que


aumenta com a atividade muscular e melhora com o repouso. Em 50% a 60% dos
pacientes, a fraqueza inicialmente se restringe à musculatura extraocular, acarretando
ptose palpebral branda ou acentuada e diplopia, inicialmente transitória. Pode haver
envolvimento inicial de musculatura de inervação bulbar, determinando fala nasalada
que se acentua durante a fala, ou disfagia com o progredir da ingesta alimentar. Nos 2
anos seguintes à miastenia ocular, 85% - 90% dos pacientes evoluem com
comprometimento da musculatura apendicular, com envolvimento predominante dos
músculos proximais. De maneira incomum, pode haver acometimento da musculatura
respiratória, acarretando hipoventilação e insuficiência respiratória. Cerca de 10%
destes pacientes podem desenvolver outras doenças autoimunes, como tireoidite de
Hashimoto, hipotireoidismo (caso da paciente apresentada), anemia perniciosa, artrite
reumatoide, vitiligo ou lúpus eritematoso sistêmico. Há uma forma de miastenia
neonatal, que ocorre em 15% a 20% de filhos de mães miastênicas, decorrentes da
passagem transplacentária de Ac anti receptor de Ach. Os neonatos apresentam
fraqueza transitória, dificuldade na sucção e depressão respiratória, mas o quadro
usualmente dura apenas alguns meses.
Os sintomas progridem por semanas ou meses, mantendo o caráter flutuante, sendo
incomuns as remissões espontâneas. Alguns pacientes, após os sintomas iniciais,
podem ir ao pronto-socorro com o quadro de crise miastênica, com dispneia
associada, sendo esta desencadeada por: infecções, temperatura elevada, gravidez,
tireotoxicose ou algumas medicações que afetam a função da junção neuromuscular.

3. Discutir o diagnóstico diferencial da fraqueza muscular proximal,


diferenciando aquelas de curso flutuante das que têm evolução progressiva.

A fraqueza muscular de predomínio proximal pode decorrer de: síndrome miastênica,


miopatia ou polirradiculoneuropatias.
- Miopatias: um importante diagnóstico diferencial com as síndromes miastênicas,
consistem em conjunto de doenças que afetam o músculo esquelético de forma
estrutural e/ou funcional. A fraqueza tem caráter progressivo na maioria dos casos.
Sua distribuição proximal determina uma marcha característica em alguns pacientes,
denominada “marcha anserina”: com báscula da bacia e base alargada, com
hiperlordose. Além disso, apresentam o sinal de Gowers ou levantar miopático. Os
reflexos tendinosos são normais no início, mas podem se tornar abolidos na fase
avançada. O trofismo muscular é normal no início, mas ocorrer atrofia tardiamente.
Pode haver mialgias difusas nos casos de miosite. Em relação aos exames
complementares, a enzima creatina quinase (CK) encontra-se usualmente elevada e a
ENMG apresenta um padrão típico da doença: potenciais de ação motores polifásicos
e de baixa amplitude, com fibrilação (atividade muscular espontânea em repouso), o
que ajuda a diferenciar das neuropatias. Podem ter causas hereditárias (distrofias
musculares, miopatias metabólicas, canalopatias) e adquiridas (inflamatórias,
endócrinas ou induzidas por drogas). A biópsia muscular é importante para definição
do tipo de miopatia.
- Síndrome miastênica: a fraqueza, com exposto acima, tem caráter flutuante.
Os reflexos tendinosos e o trofismo muscular estão normais durante todo o curso da
doença, diferentemente das miopatias. Em relação aos exames complementares, a
ENMG pode ser normal ou apresentar padrão caracterizado por decremento acima de
10% da amplitude do potencial de ação muscular após estimulação repetitiva do
nervo. A CK encontra-se normal.
- Polirradiculoneuropatias: estas condições decorrem de disfunção ou lesão em
múltiplas raízes nervosas e serão discutidas no problema 2. Em sua forma aguda,
denominada Guillain-Barré, embora haja fraqueza global e progressão em horas a
dias, ela predomina nos músculos proximais, e vem associada a queixa sensitiva
(ausente nas miopatias e nas síndromes miastênicas) e abolição dos reflexos
tendinosos.

4. Descrever a abordagem diagnóstica e terapêutica desta paciente, citando os


exames complementares necessários para este caso.

- Diagnóstico:
1. Teste terapêutico com neostigmina subcutânea ou intramuscular: usa-se dose
única de 1 mg a 2,5 mg, observando-se, nos casos positivos, remissão dos sintomas e
sinais. Deve ser feito em ambiente hospitalar, com atenção aos possíveis efeitos
adversos colinérgicos (bradicardia, síncope, náuseas e salivação), quando deverá ser
usada atropina IV.

2. ENMG: mostra alteração característica, há um decremento acima de 10% na


amplitude dos potenciais de ação musculares compostos. Pode ser normal nos casos
de acometimento exclusivamente ocular, o que não afasta o diagnóstico. Uma
alternativa é a realização da eletromiografia de fibra única, exame que registra fibras
musculares individuais, e que apresenta sensibilidade maior.

3. Pesquisa de Ac anti- receptor de Ach e Ac anti-MuSK: os Ac anti-receptor de


Ach estão presentes em 85% dos pacientes com sintomas generalizados e 50%
daqueles com sintomas oculares. Nos casos com ausência dos Ac anti-receptor de
Ach, deve-se pedir ao Ac anti-MuSK, presentes em cerca de 10% dos casos,
especialmente aquels com sintomas oculares, bulbares e cervicais.

4. Tomografia computadorizada de tórax: é importante para detecção de timoma,


presente em 10% dos pacientes com miastenia gravis.

- Diagnóstico diferencial: tumores de tronco encefálico, paralisia isolada de nervos


cranianos, miopatias, síndrome de Miller-Fisher (variante da síndrome de Guillain-
Barré que será discutida no problema 2), síndrome de Eaton-Lambert (alteração pré-
sináptica por Ac anti canal de cálcio voltagem dependente, na maioria das vezes
associada a carcinoma de pequenas células pulmonares) e doenças genéticas da
junção neuromuscular.

- Tratamento:

1. Inibidores de acetilcolinesterase: usa-se o brometo de piridostigmina via oral,


sendo um tratamento sintomático em todos os casos, pois esta medicação inibe a
metabolização da acetilcolina na fenda sináptica. Contudo, não alteram o processo
fisiopatológico básico. É usada de forma exclusiva e suficiente na miastenia neonatal,
porém nas outras formas de miastenia acaba havendo necessidade de tratamento
adicional. É importante ficar atento aos efeitos adversos, frequentes com doses
elevadas, que caracterizam a crise colinérgica: diarreia, aumento paradoxal da
fraqueza e salivação.

2. Corticoterapia: induzem a remissão da doença em até 80% dos pacientes. Usa-se


a prednisona via oral. Devido à possibilidade de aumento transitório da fraqueza no
início do tratamento, este deve começar com dose baixa e aumentar gradualmente até
a resposta clínica. Com doses altas, a maioria dos pacientes fica com remissão dos
sintomas por 4 a 12 semanas. Após 2 meses de estabilização, pode-se retirar
gradualmente a medicação até o ponto em que houver eventual recidiva do quadro. É
importante monitorização clínica e laboratorial destes pacientes pois usam corticoide
por longos anos.
3. Imussupressores: são usados nos pacientes que só respondem a doses altas de
prednisona ou naqueles que não o toleram. A primeira escolha é a azatioprina. Muitas
vezes, é associada à prednisona, permitindo doses menores do corticoide. Outras
opções nos pacientes que toleram a azatioprina: ciclosporina ou metotrexate.

4. Timectomia: indicada nas seguintes situações:

1. Todos os casos com timoma: sendo necessária radioterapia se o tumor for


invasivo.
2. Pacientes com menos de 45 anos, forma generalizada da miastenia gravis e sem
timoma: nos casos não responsivos ao tratamento medicamentoso. Ainda não há
evidência clínica sobre o benefício da timectomia nestes casos, mas pode induzir
remissão em até 60% dos pacientes, podendo levar entre 6 meses e 1 ano para a
resposta clínica. O benefício é máximo quando o procedimento é feito nos 2 primeiros
anos de doença.

5. Plasmaférese ou Imunoglobulina IV: usados nas crises miastênicas, antes da


timectomia ou de qualquer procedimento cirúrgico. Elas são igualmente eficazes.

Devido à interferência sobre a transmissão neuromuscular, os pacientes com


miastenia gravis devem evitar o uso das seguintes medicações:
- Antibióticos: aminoglicosídeos, ampicilina e macrolídeos.
- Antiarrítmicos: quinidina, lidocaína e procainamida.
- Beta-bloqueadores
- Fenitoína
- Cloroquina
- Bloqueadores neuromusculares: pancurônio, succinilcolina.
- Benzodiazepínicos
- Baclofen
- D-penicilamina
- Morfina
- Anestésicos gerais: metoxiflurano, ketamina

Estes pacientes devem portar esta lista consigo, porque é possível que sejam
atendidos em ambulatórios ou unidades de emergência devido a outras situações
clínicas. Desta forma, o médico generalista deve ter conhecimento desta informação.

5. Discutir o prognóstico desta paciente.

O prognóstico destes pacientes melhorou muito nas últimas décadas, com o advento
do tratamento imunomodulatório. Em décadas passadas, 25% dos pacientes morriam
de insuficiência respiratória com 3 anos após o diagnóstico. Atualmente, mais de 90%
apresentam boa resposta ao tratamento vigente.
PROBLEMA 2:

CONTEÚDO EDUCACIONAL:

1. Síndrome da Neuropatia Periférica


2. Abordagem diagnóstica das neuropatias periféricas
3. Principais etiologias das neuropatias periféricas
4. Epidemiologia, quadro clínico, fisiopatologia, diagnóstico, tratamento e
prognóstico da neuropatia diabética.
5. Epidemiologia, quadro clínico, fisiopatologia, diagnóstico, tratamento e
prognóstico da síndrome de Guillain-Barré.

OBJETIVOS EDUCACIONAIS:

1. Citar os diagnósticos sindrômico e topográfico de cada paciente,


correlacionando-os com a anatomia funcional do sistema nervoso periférico e os
achados semiológicos.

Caso 1:

Em relação ao paciente do caso 1, o diagnóstico sindrômico é de uma neuropatia


periférica, considerando o sintoma de parestesia em pés apresentado por ele, e os
sinais neurológicos representados por: padrão de perda de sensibilidade com
distribuição em “botas” e diminuição e/ou ausência dos reflexos miotáticos em MMII. O
conjunto destes sinais sugere uma síndrome de neuropatia periférica. A topografia da
lesão ou disfunção ocorre em múltiplos nervos periféricos na extremidade distal dos
MMII, particularmente das fibras nervosas mielinizadas finas ou amielínicas, visto que
os sintomas e sinais sugerem disfunção das fibras responsáveis pela sensação de tato
protopático e dor.

Cada nervo periférico é composto de grande número de fibras nervosas mielinizadas e


não mielinizadas de variados diâmetros. Um paciente com neuropatia periférica pode
apresentar os seguintes sintomas:

A. Fraqueza: resultam do acometimento das fibras nervosas motoras. Usualmente


envolve musculatura distal e é mais pronunciada em membros inferiores.

B. Cãimbras: pode ocorrer nas neuropatias motoras.

C. Alterações sensitivas: podem envolver as fibras nervosas amielínicas ou as


mielinizadas finas. As fibras mielinizadas finas e as amielínicas medeiam a nocicepção
e as funções autonômicas. A lesão ou disfunção destas fibras podem acarretar os
seguintes sintomas:

* Parestesias - sensações espontâneas anormais, na ausência de estímulos


específicos, descritas como por “queimação”, “sensação de frio”, “formigamento”,
“sensação de calor” ou “sensação de peso”.

* Disestesias - sensação anormalmente dolorosa ou desagradável após estímulo não


doloroso. O paciente refere sensação de “queimação” ou “alfinetadas” quando algum
objeto ou o examinador toca o segmento afetado.
D. Sintomas autonômicos: frequentemente associados à neuropatia periférica
associada ao diabetes mellitus e à amiloidose. Incluem incontinência urinária,
anormalidades na sudorese, constipação alternando com diarreia, hipotensão
ortostática e/ou impotência sexual.

E. Desequilíbrio e ataxia: resultam da lesão ou disfunção das fibras mielinizadas


grossas, que medeiam as sensibilidades de posição e vibração. O paciente apresenta
desequilíbrio que piora em lugares sem luminosidade.

Em relação ao exame neurológico, os pacientes podem apresentar déficit de força


envolvendo principalmente musculatura distal, podendo ocorrer atrofia muscular.
Podem apresentar perda sensitiva com distribuição em “meias e luvas”, mas nos
casos de lesão de fibras amielínicas, o exame sensitivo pode estar normal. Em relação
aos reflexos miotáticos, há ausência ou diminuição, podendo estar normais nos casos
de neuropatia de fibras finas. Quando há acometimento da propriocepção, podem
apresentar os achados de ataxia sensitiva.

Caso 2:

Em relação ao paciente do caso 2, o diagnóstico sindrômico é de uma


polirradiculoneuropatia, considerando o achado de tetraparesia arrefléxica
envolvendo predominantemente a musculatura proximal associada a lombalgia,
decorrente do acometimento das raízes nervosas. Este é um quadro clássico da
síndrome de Guillain-Barré, principal manifestação de paralisia flácida aguda no
cenário de pronto-socorro. A topografia da lesão ocorre em múltiplas raízes e nervos
periféricos, envolvendo as fibras autonômicas (explica o pico hipertensivo e a
taquicardia observadas), motoras (tetraparesia), sensitivas finas (lombalgia e
parestesias em pés) e sensitivas grossas (arreflexia).

2. Descrever o diagnóstico nosológico mais provável de cada paciente,


correlacionando a fisiopatologia de cada doença com os sinais e sintomas
encontrados. Citar outras possíveis etiologias envolvidas nestas doenças.

Caso 1:

Em relação ao paciente do caso 1, o diagnóstico nosológico mais provável é de uma


neuropatia diabética.

- Epidemiologia: O diabetes mellitus é a causa mais frequente de neuropatia periférica


no mundo Ocidental. Pacientes diabéticos com retinopatia e albuminúria têm
probabilidade duas vezes maior de ter neuropatia. Sua prevalência é estimada em
20% a 30% dos pacientes diabéticos.

- Etiopatogenia e fisiopatologia: A neuropatia diabética se manifesta através de dois


grandes grupos, com distintas fisiopatologias: A) Polineuropatias simétricas distais
sensitivas e/ou autonômicas e B) Neuropatias assimétricas agudas.

A. Polineuropatias simétricas distais: envolve primeiramente uma vasoconstricção da


microvasculatura nervosa. Ocorre também estresse oxidativo resultante da reação da
glicose com produtos de seu metabolismo e com o oxigênio, alterando a estrutura e
função de proteínas essenciais para o funcionamento neuronal. Há estimulação da
proteína C cinase, acarretando maior diminuição do fluxo sanguíneo na
microcirculação neuronal e diminuindo a velocidade de condução nervosa.

B. Neuropatias assimétricas agudas: ocorre oclusão das arteríolas endoneurais, com


resultante dano isquêmico ao nervo. Isso justifica o porquê da natureza focal desta
forma clínica.

- Quadro clínico: conforme exposto acima, há 2 formas de apresentação da neuropatia


diabética:

A. Polineuropatia simétrica distal: há perda sensitiva simétrica e insidiosa, afetando a


sensibilidade superficial (parestesias e disestesias dolorosas) e/ou profunda, com
ataxia sensitiva. Habitualmente a fraqueza muscular é mínima. Os reflexos patelares e
aquileus podem estar abolidos. Há progressão lenta dos sintomas da região distal para
a proximal, ocorrendo nos pés e nas mãos. Com a progressão da doença, podem
surgir sintomas autonômicos como gastroparesia alternando com diarreia, hipotensão
postural e impotência.

B. Neuropatias assimétricas agudas: ocorre dor aguda e intensa na região afetada,


seguida da perda sensitiva e déficit de força no local afetado. A maioria dos casos tem
remissão, pelo menos, parcial. A dor pode remitir após alguns meses, mas pode-se
levar um ano ou mais para a recuperação da fraqueza. Estas formas assimétricas
podem ocorrer como radiculopatia lombossacra (dor e fraqueza na região superior
da coxa), paralisia do III nervo craniano (ptose palpebral, oftalmoparesia,
tipicamente com preservação dos reflexos pupilares) ou como mononeuropatia
compressiva (exemplo mais comum é a síndrome do túnel do carpo).

Existem mais de 100 causas descritas para as neuropatias periféricas, envolvendo


doenças originadas tanto no sistema nervoso como em outros órgãos e sistemas. Por
isso, é importante para o médico generalista conhecer as principais etiologias destas,
para direcionar a investigação diagnóstica. As principais causas de neuropatia
periférica são:

A. Genéticas: atualmente, mutações em mais de 30 genes foram reconhecidas como


causas de neuropatia hereditária. Estas mutações ocorrem em proteínas da bainha de
mielina, citoesqueleto axonal e no transporte axonal. Têm evolução crônica, história
familiar e exigem estudo genético.

B. Inflamatórias / Imunes: Vasculites (Artrite reumatoide, Crioglobulinemia mista;


Poliarterite nodosa, Granulomatose de Wegener, síndrome de Churg-Strauss);
Paraneoplásicas; Gamopatia monoclonal, que pode estar associada a mieloma
múltiplo); Síndrome de Guilllain-Barré (embora também envolva raízes nervosas,
também é considerada uma importante causa de neuropatia periférica desmielinizante
aguda.

C. Metabólica: diabetes mellitus.

D. Tóxicas: por ação de medicações (Vincristina; Cisplatina; Taliodomida;


Amiodarona; Cloroquina; Isoniazida; Fenitoína; Dapsona) ou metais (Chumbo; Tálio;
Mercúrio).
E. Carenciais: deficiência de vitaminas B1 e B12.

F. Infecciosas: HIV; Hanseníase; Herpes-Zoster.

Em um estudo brasileiro sobre a prevalência de neuropatia periférica em uma


instituição de referência (Nascimento OJM et al., 2004), dentre 1034 pacientes
avaliados, foram evidenciadas as seguintes frequências, em ordem decrescente:
diabetes mellitus (32,5%), desmielinizantes (17,8%), infecciosas (10,8%, destacando-
se a hanseníase), hereditárias (9,9%), alcoólica e tóxicas (5,4%), associadas a
falências de órgãos e sistemas (4,7%0 e associadas a vasculites (2,8%), corroborando
a neuropatia diabética como a forma mais comum em nosso país.

Caso 2:

Em relação ao paciente do caso 2, o diagnóstico nosológico mais provável é a


síndrome de Guillain-Barré.

- Epidemiologia: com a eliminação da poliomielite, a síndrome de Guillain-Barré


passou a ser a causa mais comum de paralisia flácida aguda no cenário de pronto-
socorro, sendo uma importante emergência neurológica. Sua incidência é estimada
entre 0,89 e 1,89 casos/100000/ano nos países ocidentais.

- Quadro clínico: ocorre uma fraqueza bilateral e relativamente simétrica dos membros,
que progride em um período entre 12 horas e 28 dias até alcançar um platô, tendo um
caráter ascendente na maioria dos casos. Mas apesar da progressão ascendente, o
déficit de força usualmente é de predomínio proximal. Em cerca de 50% dos
pacientes, ocorre diplegia facial. Os pacientes podem cursar com parestesias distais e
lombociatalgia. Há comprometimento autonômico em cerca de 65 % dos casos, com
acometimento dos sistemas simpático e parassimpático. Cerca de 25% dos pacientes
podem evoluir com insuficiência respiratória, necessitando de intubação orotraqueal.
Nestes casos, podem complicar com pneumonia, sepse e/ou embolia pulmonar.
Dois terços dos casos são precedidos por infecções das vias respiratórias superiores
ou gastroenterites entre uma e quatro semanas antes dos início dos sintomas. Os
agentes infecciosos mais frequentemente associados são: Campylobacter jejuni (mais
comum), Citomegalovírus, Epstein-Barr, vírus varicela zoster e Mycoplasma
pneumoniae.
Com base em aspectos histológicos, eletrofisiológicos e clínicos, há variantes
clínicas distintas da síndrome de Guillain-Barré:
A. Polirradiculoneuropatia inflamatória desmielinizante aguda: forma mais comum.
B. Neuropatia axonal aguda: forma mais grave, com lesão em axônio. Ocorre evolução
mais rápida da fraqueza muscular. Pode ocorrer perda sensitiva.
C. Síndrome de Miller-Fisher: paciente apresenta oftalmoplegia e/ou ataxia associadas
à arreflexia. Os sintomas alcançam um pico após 1 semana, havendo recuperação
completa na maioria dos casos após 6 meses.

- Etiopatogênese e fisiopatologia:

Há evidências de como ocorre o processo fisiopatológico na síndrome de Guillain-


Barré. Os gangliosídeos são componentes importantes das raízes nervosas e nervos
periféricos motores e sensoriais e têm uma participação relevante na etiopatogênese
da doença. Na forma desmielinizante, anticorpos IgG se ligam à membrana externa
das células de Schwann e induzem ativação do sistema complemento. Esta ativação
forma o complexo de ataque à membrana, que acarreta vesiculação da mielina. Após
cerca de 1 semana da lesão mielínica, há invasão de macrófagos para fagocitose
desta (figura 1-A). Ainda não há evidências de quais antígenos são atacados neste
subtipo da doença. Já na forma axonal, há importante participação de 4 subtipos de
gangliosídeos: GM1, GT1A, GD1A e GQ1B. Dependendo de qual antígeno é atacado,
ocorre um padrão clínico distinto. Estes gangliosídeos estão localizados no axolema
das fibras motoras. Quando anticorpos se ligam a eles, ocorre ativação do
complemento e destruição axonal (figura 1-B) Os anticorpos anti-GM1, GT1A e GD1A
estão associados à forma axonal aguda do Guillain-Barré, já o anti-GQ1B está
associado à forma de Miller-Fisher, visto que esta substância está presente no
axolema dos nervos oculomotores e nos fusos neuromusculares.

Figura 1 – Etiopatogenia das formas desmielinizante (A) e axonal (B) da


síndrome de Guillain-Barré (Fonte: Nobuhiro Yuki et al., New England Journal of
Medicine, 2012).

Estudos animais com o uso de anticorpos e fragmentos bacterianos de pacientes


doentes comprovaram a existência de um mimetismo molecular entre
lipopolissacarídeos da bactéria Campylobacter jejuni e os gangliosídeos axonais
descritos acima. Ainda não houve a mesma comprovação em relação às formas
desmielinizantes. Contudo, já há evidência de que infecções com citomegalovírus e o
vírus Epstein-Barr estão associados à forma desmielinizante e, as com o
Campylobacter jejuni, com as formas axonais e Miller-Fisher.
3. Descrever a abordagem diagnóstica e terapêutica em cada caso, citando os
exames complementares mais utilizados na investigação destes pacientes.

Caso 1:

- Diagnóstico: Na abordagem de um paciente com síndrome de neuropatia periférica,


há 6 tópicos importantes a serem avaliados na anamnese e exame físico:

1. Sistemas envolvidos: determinar se os sintomas e sinais envolvidos são motores,


sensitivos e/ou autonômicos. Quando há evidência de envolvimento exclusivamente
motor, a neuropatia motora deve ser diferenciada de miopatia ou doença da junção
neuromuscular, já discutidas no problema anterior.

2. Distribuição da fraqueza: se simétrica (envolvimento difuso dos nervos periféricos,


com predomínio distal: polineuropatias) ou assimétrica (envolvimento de um só nervo:
mononeuropatias, ou de múltiplos nervos em tempos distintos: mononeuropatia
múltipla).

3. Natureza do envolvimento sensitivo: se de fibras finas (dor e temperatura) ou de


fibras grossas (alterações proprioceptivas).

4. Evolução temporal: se os sintomas são agudos ( 1 mês), subagudos ( 6 meses)


ou crônicos ( 6 meses).

5. Evidência de história familiar: especialmente em pacientes com história crônica e


insidiosa.

6. História de problemas clínicos associados: doença atual, uso de medicações,


ocupação, cirurgias ou infecções prévias ou atuais.

Estas informações fornecem pistas para a etiologia da doença. O paciente do caso 1 é


um diabético que apresenta um quadro de neuropatia periférica com envolvimento
sensitivo de fibras finas, simétrico e de evolução crônica, o que corrobora o
diagnóstico nosológico descrito.

Nos pacientes com neuropatia periférica, é importante a realização de


eletroneuromiografia (ENMG) para confirmação do diagnóstico topográfico, análise
de envolvimento simétrico ou assimétrico e determinação se a neuropatia é de origem
desmielinizante (diminuição da velocidade de condução nervosa) ou axonal
(diminuição da amplitude dos potenciais de ação).

O algoritmo descrito abaixo descreve os passos na abordagem destes pacientes,


perimitindo a realização de diagnóstico diferencial. Aqui está incluída a síndrome de
Guilllain-Barré, diagnóstico do paciente do caso 2 (figura 2):
HISTÓRIA E EXAME FÍSICO

ENMG

DESMIELINIZANTE AXONAL

SIMÉTRICA ASSIMÉTRICA SIMÉTRICA ASSIMÉTRICA

AGUDA CRÔNICA AGUDA CRÔNICA AGUDA CRÔNICA AGUDA CRÔNICA


Guillain-Barré Gamopatia Guillain PDIC * Guillain Diabetes Vasculites NMM**
Difteria monoclonal -Barré -Barré HIV Paraneoplá
Genética Medicações sicas
Tóxicas Diabetes
Genética

Figura 2: Algoritmo de abordagem diagnóstica em um paciente com neuropatia


periférica. * PDIC: Polirradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória crônica;
** NMM: Neuropatia motora multifocal.

Em relação aos exames complementares usados na investigação dos pacientes, além


da ENMG, é importante a solicitação de exames sanguíneos: glicemia de jejum e teste
de tolerância a glicose (se necessário), hemograma, creatinina, ureia e eletrólitos.

Conforme suspeita clínica, pode-se solicitar: dosagem sérica de vitamina B12,


sorologia para HIV, investigação de hanseníase; VHS e anticorpos relacionados a
vasculites (fator reumatoide, c-ANCA, p-ANCA, anti-Ro/ SS, anti-La/SS, ANA e
sorologia para hepatite B); eletroforese de proteínas e pesquisa de paraproteína
(gamopatia monoclonal); pesquisa de tumores (se suspeita de paraneoplasias).

A biópsia de nervo periférico, realizada em nervos sensitivos, é indicada nos casos


suspeitos de: vasculite, amiloidose ou tumores do sistema nervoso periférico.

- Tratamento: Em relação à abordagem terapêutica da neuropatia diabética,


diagnóstico do paciente em questão, é importante lembrar que a neuropatia tem
importância crucial na fisiopatologia do pé diabético. O tratamento consiste em:

a. Controle rigoroso da glicemia: atualmente é a única medida que consegue prevenir


ou impedir a progressão da neuropatia diabética.

b. Cuidados com os pés: em função dos riscos de úlceras de pressão, devido às


alterações de sensibilidade. Evitar calçados apertados e fazer higiene adequada dos
pés.
c. Controle da dor neuropática: consenso atual estabelece as seguintes medicações
com bom nível de evidência;

- Anticonvulsivantes: Pregabalina; Gabapentina ou Valproato de sódio.

- Inibidores de recaptação de serotonina: Duloxetina ou Venlafaxina.

- Antidepressivos tricíclicos: Amitriptilina.

- Capsaicina tópica (0,075%).

Caso 2:

A abordagem diagnóstica dos pacientes com síndrome de Guilllain-Barré começa pela


história clínica, seguindo o algoritmo descrito acima. A suspeita clínica torna-se forte
em casos de tetraparesia flácida arrefléxica de instalação aguda e ascendente, com a
presença de sintomas sensitivos. É importante a pesquisa de infecções prévias,
gastrointestinais ou respiratórias.

Os exames complementares solicitados são:

a. ENMG: é um exame mais sensível para o diagnóstico. Principais achados:


alentecimento de condução nervosa não uniforme, ausência de ondas F, bloqueio de
condução e dispersão temporal. Também apresenta valor prognóstico.

B. LCR: em até 50% dos casos na primeira semana, e até 75% na terceira, pode haver
o achado denominado “dissociação proteinocitológica”, que consiste em celularidade
normal com níveis aumentados de proteínas. Portanto, esse achado pode não ocorrer
na primeira semana de doença. Se houve pleocitose acima de 50 céls/mm3 , deve-se
levantar suspeita de infecção pelo HIV , doença de Lyme ou meningorradiculite por
linfoma.

- Diagnóstico diferencial: poliomielite (síndrome de 2° neurônio motor); paralisia por


picada de carrapato (envolvimento pupilar precoce); botulismo; difteria; mielite
transversa aguda (presença de padrão sensitivo das síndromes medulares e presença
de alterações do 1° neurônio motor).

- Tratamento:

Internação em UTI:

A. Monitorização de funções cardíaca e pulmonar:

- ECG, medidas periódicas de PA e frequência cardíaca.

- Avaliação periódica da capacidade de deglutição

- Medidas periódicas da capacidade vital e gasimetria arterial

- Intubação orotraqueal se: capacidade vital menor que 15 ml/kg, pO2  56 mmHg
ou PCO2  48 mmHg.

- Uso de marcapasso cardíaco temporário se bradicardia importante.


B. Profilaxia de embolia pulmonar

- Em pacientes que não deambulam, com anticoagulante profilático.

C. Imunoterapia:

- Plasmaférese: deve ser feita até semanas após o inicio dos sintomas, quando é
mais benéfica. Diminui a lesão nervosa e acelera a melhora clínica.

ou

- Imunoglobulina intravenosa: deve ser feita até 2 semanas após o início dos
sintomas. Tem o mesmo benefício que a plasmaférese. Contraindicações: baixos
níveis de IgA, insuficiência renal e hipertensão arterial grave.

Até o momento, os estudos não comprovaram diferenças na eficácia entre as duas


modalidades de imunoterapia.

4. Discutir o prognóstico e os impactos funcionais de cada paciente.

Caso 1:

- Prognóstico: não há tratamento atualmente disponível para reverter o processo de


neuropatia diabética. A medida mais efetiva para sua prevenção e para impedir a
progressão é o rigoroso controle da glicemia. Os cuidados em relação aos pés são
importantes para a prevenção das complicações do pé diabético, como úlceras de
pressão ou até amputação dos dedos. Estas complicações são eficazmente evitadas
com as medidas de higiene e uso de calçados adequados. A presença de neuropatia
diabética tem relação direta com o tempo de diagnóstico do diabetes mellitus, mas
ainda não se estabeleceu o limiar de hemoglobina glicosilada para o surgimento da
neuropatia periférica.

Caso 2:

- Prognóstico: a maioria dos pacientes apresenta recuperação completa ou fica com


pequenas sequelas, de semanas a meses após a estabilização do quadro. Entretanto,
cerca de 20% ficam gravemente incapacitados. Com o uso da imunoterapia, houve
importante diminuição na taxa de mortalidade, porém esta ainda continua em 5%.

PROBLEMA 3:

CONTEÚDO EDUCACIONAL

1. Anatomia funcional dos sistemas do 1° e 2° neurônios motores.


2. Síndromes do NMS e do NMI
3. Diagnóstico diferencial entre as síndromes de: NMS, NMI, neuropatia
periférica, miastênica e miopatias.
4. Principais causas das síndromes de NMS e NMI.
5. Marcos básicos do desenvolvimento neuropsicomotor.
6. Quadro clínico, diagnóstico e tratamento da Paralisia cerebral.
OBJETIVOS EDUCACIONAIS

1. Revisar a anatomia funcional dos sistemas que envolvem o 1° e 2° neurônios


motores e correlacioná-la com a fisiopatologia dos sinais e sintomas resultantes
de sua lesão.

A. Sistema do neurônio motor superior ou 1° neurônio motor (NMS) ou via


piramidal:

A.1. Sistema lateral ou piramidal:

Trato corticoespinhal = corpo neuronal no córtex, porção superior do giro pré


central , e terminações nervosas axonais na medula espinhal.
Trato corticonuclear = corpo neuronal no córtex, porção inferior e lateral e
terminações nervosas axonais nos núcleos motores de alguns pares cranianos.

- Trajeto do tracto corticoespinhal:


1. Córtex do giro pré-central (quarta área de Brodmann)
2. Coroa radiada
3. Perna posterior da cápsula interna
4. Base do pedúnculo cerebral
5. Base da ponte
6. Pirâmide bulbar .
10 a 25 % das fibras continuam ventralmente e do
mesmo lado (suas fibras não cruzam) e forma o trato corticoespinhal anterior.
Na medula, ele ocupa o funículo anterior até o nível torácico médio. Os seus
axônios relacionam-se com interneurônios que, por sua vez, se relacionam
com o 2° neurônio motor contralateral após cruzar o plano mediano.
75 a 90% - das fibras cruzam o plano mediano e do
lado oposto para constituir o trato corticoespinhal lateral (o mais importante).
Ao longo de toda a medula, ele ocupa o funículo lateral e seus axônios se
relacionam com interneurônios que, por sua vez, se relacionam com o 2°
neurônio motor deste mesmo lado.
O trato mais importante do ponto de vista semiológico é
o corticoespinhal lateral. O trato anterior tem importância nas lesões parciais ou
lentamente progressiva da medula alta, onde o mesmo mantém parcialmente a
função do primeiro neurônio.
As fibras do trato corticoespinhal terminam na
substância cinzenta intermediária, faz sinapses com os interneurônios os quais
por sua vez se ligam ao 2° neurônio motor na coluna anterior da medula.
Algumas fibras deste trato tem função sensitiva, mas a principal função é
motora somática, é o principal trato responsável pela motricidade voluntária no
homem.

- Um sintoma sempre presente nos pacientes com lesão do trato


corticoespinhal é a perda da capacidade de fracionamento de um movimento.
Por exemplo, não conseguem movimentar os dedos da mão ou pé
isoladamente (abotoar a camisa é impossível). Esta função é exclusividade do
trato corticoespinhal.

- Trajeto do trato corticonuclear:


1. Parte inferior da área 4 de Brodmann ( Face no homúnculo de Penfield)
2. Joelho da cápsula interna
3. No tronco encefálico, fazem sinapse com neurônios internunciais situados na
formação reticular, que se conectam aos núcleos motores dos nervos cranianos.
Transmitem impulsos aos motoneurônios do tronco encefálico de alguns nervos
cranianos. Estão associadas ao trato corticoespinhal, destacando-se para:
A. Neurônios motores do III, IV, VI, XII nervos cranianos.
B. Fibras eferentes viscerais especiais para núcleo ambíguo e motor do V e VII
nervos cranianos.
- Suas fibras
- Do mesmo modo que o trato corticoespinhal, algumas fibras destacam-se
para núcleos sensitivos, grácil, cuneiforme, do trigêmeo e trato solitário.
- As fibras do trato corticonuclear cruzam o plano mediano, porém existe a
representação homolateral de uma grande quantidade de tratos (ex: paralisia facial
central). A maioria tem representação bilateral no córtex, são eles: músculos da
faringe, laringe, orbicular, supercílio, masseter, temporal, pterigóideo medial e os
músculos motores dos olhos (principalmente os músculos da metade superior da
face). A paralisia destes músculos nunca é completa, ex: paralisia facial central, onde
observamos desvio completo somente da porção inferior da face.

A.2. Sistema motor medial ou vias motoras extrapiramidais: são vias motoras
acessórias, mais antigas filogeneticamente, que não passam pela pirâmide bulbar,
mas se conectam de motoneurônios inferiores de localização medial, que comandam
os movimentos da musculatura axial e proximal. Desta forma, participam da
manutenção de postura e do controle do tônus muscular. Sua existência justifica por
que os pacientes com síndrome do NMS não apresentam usualmente déficits de força
completos. Estes indivíduos ainda preservam a movimentação axial e proximal,
controladas por estas vias acessórias. O NMS e o trato corticoespinhal lateral estão
envolvidos no controle dos movimentos da musculatura apendicular, responsáveis
pelos movimentos finos.
São elas:

A. Trato Rubroespinhal: como o trato corticoespinal lateral, controla a


movimentação das extremidades dos membros, principalmente nos animais inferiores.
Nos homens tem pouca atuação, possuindo um número menor de fibras, isto justifica a
presença de movimentos residuais em indivíduos com lesão do trato corticoespinhal
lateral.

B. Trato Tectoespinhal: Tem sua origem no colículo superior (área responsável


pela movimento de constante fixação dos olhos em um objetivo quando estamos
andando). O colículo superior recebe fibras da retina e do córtex visual. Este trato
termina nos seguimentos mais altos da medula cervical, controlando o movimento
cervical direcionado pelo olhar.
C. Trato Vestibuloespinhal: vai dos núcleos vestibulares (tronco encefálico)
aos neurônios motores inferiores da medula espinhal carregando
informações necessárias a manutenção do equilíbrio – ajustes no grau de
contração da musculatura, mesmo em alterações súbitas do movimento e
postura.

D. Trato Reticuloespinhal: É o mais importante deste grupo de tratos no


homem. Na área reticular, chegam informações do cerebelo e do córtex motor.
Desta forma, este trato influencia movimentos voluntários e involuntários dos
músculos axiais e proximais dos membros. Coloca o corpo em uma posição de
partida e dá suporte aos movimentos mais finos planejados pelo trato cortico
espinhal lateral. Ele justifica a preservação dos movimentos proximais e axiais
na síndrome de NMS.

- Principais sintomas e sinais decorrentes do comprometimento do NMS ou 1°


neurônio motor:

A. Déficit de força: ocorre na musculatura apendicular, com envolvimento


predominante dos movimentos finos.

* Os diferentes padrões de déficit motor encontrados nesta síndrome auxiliam no


diagnóstico topográfico da lesão:
1. Hemiparesia completa e proporcionada: o paciente apresenta o mesmo
grau de déficit entre MS e MI e há comprometimento facial. A lesão é
contralateral e está próximo à cápsula interna (há concentração das fibras do
trato corticoespinhal em uma pequena área, assim a lesão compromete a força
de forma igual).
2. Hemiparesia completa e desproporcionada: o paciente apresenta graus
de déficit diferentes entre MS e MI, com predomínio braquial ou crural. Neste
caso, há envolvimento do córtex do giro pré-central contralateral. Como há
distintas representações corporais no “homúnculo de Penfield”, é possível que
haja comprometimento maior de parte destas áreas, determinando a
desproporção entre os déficits.
3. Hemiparesia incompleta e proporcionada: o paciente apresenta o
mesmo grau de déficit entre MS e MI, sem envolver a face. Geralmente, a
lesão comprometeu uma região restrita do córtex motor ou da cápsula interna
contralaterais (atingiu um ramo arterial e não o tronco arterial), preservando as
regiões que controlam a face.
4. Hemiparesia incompleta e desproporcionada: o paciente apresenta
graus diferentes de déficit entre MS e MI, sem haver envolvimento da face. Há
comprometimento do córtex motor ou a área 4 de Brodmann na região superior
ou axial do cérebro, comprometendo de forma desigual os ramos da artéria
cerebral média.
5. Paraparesia: déficit de força nos MMII. Há comprometimento em duas
possíveis regiões: ambos os funículos laterais da medula espinhal cervical ou
torácica (onde passa o trato corticoespinhal lateral) ou córtex frontal medial
bilateral (representação dos músculos dos MMII no homúnculo de Penfield).
6. Tetraparesia: déficit de força nos 4 membros, quando decorrente de única
lesão. Há comprometimento de ambos os funículos laterais da medula cervical
(onde passa o trato corticoespinhal lateral).

B. Hipertonia espástica ou elástica: na fase aguda da lesão, o membro afetado fica


hipotônico, contudo, após alguns dias até 3 meses, ocorre a hipertonia do tipo elástica.
Os neurônios motores inferiores (NMI) do tipo gama, reguladores dos fusos
musculares e, consequentemente, do tônus muscular, estão sob controle inibitório de
vias descendentes extrapiramidais (já descritas acima). Quando a lesão afeta do tracto
corticoespinhal lateral e estas vias, os NMI gama ficam “desinibidos” e tornam os fusos
hipersensíveis, pois são ativados permanentemente. Por conseguinte, ocorre resposta
muscular a qualquer pequeno encurtamento do músculo. Esse tipo de hipertonia
envolve os músculos flexores dos MMSS e os extensores dos MMII. Esse tipo de
hipertonia se acentua de forma diretamente proporcional à força e velocidade
empregadas pelo músculo, diferentemente da hipertonia que ocorre na síndrome
Parkinsoniana.

C. Hiperreflexia: na fase aguda da lesão, ocorre hipo ou arreflexia. Após alguns dias
até 3 meses, os reflexos miotáticos retornam e ficam hiperativos, especialmente nos
músculos flexores dos MMSS e nos extensores dos MMII. A justificativa para tal fato é
a mesma explicada para a hipertonia acima: decorre da hipersensibilidade dos fusos
musculares.

D. Clônus: esse fenômeno também decorre da hiperexcitabilidade reflexa. O


estiramento súbito do músculo afetado produz uma contração reflexa. Com a
manutenção do estiramento do músculo (ao exame neurológico isso pode ser feito
realizando-se a dorsiflexão do pé ou o movimento súbito da patela para baixo), as
contrações reflexas continuarão ocorrendo.

E. Sinal de Babinski: obtido com a pesquisa do reflexo plantar. É caracterizado pela


extensão tônica dos artelhos e, algumas vezes, abertura em “leque” dos artelhos.
Resulta de liberação do reflexo dos flexores, que tem função protetora, normalmente
moderado pelo trato corticoespinhal lateral.

É importante destacar que a hiperreflexia e a hipertonia espástica só ocorrerão se a


lesão do trato corticoespinhal lateral ocorrer junto com as vias extrapiramidais, como
pode acontecer na cápsula interna, tronco encefálico e na medula espinhal. Lesões
que ocorrem no córtex motor primário não acarretam hiperreflexia ou hipertonia.

B. Sistema do neurônio motor inferior ou 2° neurônio motor (NMI):

- A parte periférica do sistema motor é composta por: NMI (corno anterior da medula
espinhal), núcleos motores dos nervos cranianos, raízes nervosas anteriores, plexos e
nervos periféricos e junção neuromuscular.

- Todas as estruturadas, exceto os NMI, já foram discutidas nos problemas anteriores


no que se refere às suas respectivas síndromes.
- Os NMI estão localizados no corno anterior da medula espinhal. São compostos
pelos NMI alfa e gama. Os NMI alfa recebem projeções do trato corticoespinhal
lateral, das vias extrapiramidais descritas acima e de fibras que entram pelas raízes
posteriores. Eles enviam projeções, através das raízes anteriores e nervos periféricos,
às fibras musculares extrafusais. Os NMI também recebem projeções das mesmas
fibras, seja diretamente, seja através de interneurônios. Eles se projetam às fibras dos
fusos musculares, regulando sua função.
- As unidades motoras são compostas por um NMI, seus axônios, ramos de seus
axônios e pelas fibras musculares inervadas por ele. Todos os impulsos relacionados
ao movimento são integrados nas unidades motoras e transmitidas às fibras
musculares. Os músculos que participam de movimentos finos possuem maior número
de unidades motoras (uma unidade para 5 – 20 fibras), ao passo que aqueles que se
contraem de forma indiferenciada possuem menos unidades (uma para 100 0 500
fibras).

- Principais sintomas e sinais decorrentes do comprometimento do NMI ou 2°


neurônio motor:

A. Déficit de força: usualmente ocorre de forma mais localizada (dependendo dos


NMI envolvidos) e acentuada que na síndrome do NMS. Há interrupção da unidade
motora, interrompendo a inervação voluntária e reflexa.

B. Hipotonia ou atonia: ocorre de forma permanente em função da interrupção da


inervação total da unidade motora.

C. Hiporreflexia ou arreflexia: ocorre de forma permanente, pelo mesmo motivo


descrito acima.

D. Atrofia muscular: os NMI exercem uma influência sobre o grau de nutrição das
fibras musculares. A atrofia muscular Já ocorre após algumas semanas, sendo o
músculo substituído gradativamente por tecido conectivo.

E. Fasciculações: são contrações visíveis, finas, rápidas e, por vezes, vermiculares


que ocorrem de forma intermitente nas fibras musculares. Podem ocorrer em
indivíduos normais, após exercícios, ansiedade ou uso de café e cigarro, mas nestes
casos não vêm associadas a outros sinais motores, como fraqueza ou atrofia.
Contudo, também podem ser encontradas na síndrome do NMI ou em neuropatias
periféricas sendo, nestes casos, frequentemente associadas a outros sinais
neurológicos. Resultam de descargas repetitivas das unidades motoras. Embora seja
um importante marcador clínico de lesão ou disfunção do NMI, os estudos
experimentais sugerem que sua origem ocorra nas terminações distais dos axônios
motores, talvez por mudanças nas propriedades condutoras dos canais iônicos nos
axônios.

2. Citar os diagnósticos sindrômico e topográfico de cada paciente.

A. O paciente do caso 1 tem síndrome do NMS ou síndrome piramidal. Em relação


à topografia, considerando a hipertonia espástica e hiperreflexia presente nos 4
membros, associados à deficiência mental, a lesão ocorreu em ambos os lobos
frontais, envolvendo a substância branca de ambos os lados (por onde passam
as fibras do trato cortiespinhal).

B. O paciente do caso 2 tem síndrome do NMI. A lesão ocorreu nos NMI de forma
difusa, considerando o acometimento da musculatura da língua e dos 4 membros.

3. Diferenciar os achados clínicos das síndromes de: neurônio motor superior


(NMS), neurônio motor inferior (NMI), miopatias, miastênicas e de neuropatia
periférica.
Após as discussões referentes aos problemas 1,2 e 3, os estudantes deverão estar
aptos a diferenciar clinicamente as síndromes de NMS, NMI, raiz anterior, miopatias,
síndromes miastênicas e de neuropatia periférica, para construir as respectivas
hipóteses diagnósticas etiológicas e investigar de forma adequada as prováveis
doenças destes pacientes.

REFLEXOS ALTERAÇÃO
SÍNDROME FRAQUEZA TÔNUS ATROFIA FASCICULAÇÕES
MIOTÁTICOS SENSIBILIDADE
Difusa e Ausente Ausente ou
Flácido no Diminuídos ou
distal nos no início, presente, se
início, mas ausentes no
membros, presente houver lesão
NMS aumentado Ausentes início, mas
preservando em fase de vias
após dias a hiperativos após
músculos tardia por sensitivas
meses dias a meses
axiais desuso associada
Focal,
Acentuada Diminuídos ou
NMI geralmente Flácido Presentes Ausente
e precoce ausentes
assimétrica
Ausentes ou Diminuído ou
Focal,
NEUROPATIA Flácido ou Presente e Presentes, se ausente
geralmente Presente
PERIFÉRICA Normal moderada lesão axonal (desproporcional
distal
motora à fraqueza)
Difusa e
MIASTÊNICA Normal Ausente Ausentes Normais Ausente
flutuante
Tardia e
Difusa e
se
proximal Diminuídos em
MIOPATIA Flácido acentua Ausentes Ausente
nos fase tardia
com o
membros
tempo

4. Citar as principais causas das síndromes de NMS e NMI.

- Causas de síndrome de NMS: qualquer lesão de natureza vascular, tumoral ou


inflamatória que envolva o NMS e a via piramidal (o que determinará a topografia será
o padrão de déficit motor e os sintomas e sinais associados, e a etiologia será
determinada pela forma de início e evolução do quadro); doença degenerativa do NMS
(Esclerose lateral amiotrófica: nesta doença, frequentemente os sinais de NMS vêm
associados aos de NMI); infecção pelo HTLV-1 (lesão da via piramidal em medula
espinhal).
- Causas de síndrome de NMI: infecciosas (poliomielite); doenças degenerativas do
neurônio motor: esclerose lateral amiotrófica (frequentemente vêm associados a sinais
de NMS), atrofia muscular espinhal (decorre de alteração genética, havendo 4
subtipos; a criança do segundo caso tem o subtipo 1, forma mais grave).

5. Citar os marcos do desenvolvimento neuropsicomotor básicos.

- Sorri: 1° mês de vida


- Controle do tônus cervical: do 1° ao 2° mês de vida
- Rola: entre 2 e 3 meses
- Senta-se: torno dos 6 meses
- Engatinha: torno dos 9 meses
- Anda: torno de um ano
- Fala: torno de um ano.

6. Descrever quadro clínico, diagnóstico e tratamento da Paralisia Cerebral.

OBSERVAÇÃO: ESTE É O DIAGNÓSTICO NOSOLÓGICO DA PACIENTE DO


PRIMEIRO CASO. SÃO PACIENTES EVENTUALMENTE ATENDIDOS NO
CENÁRIO PEDIÁTRICO E DE ADULTO, COM QUEIXAS CLÍNICAS ASSOCIADAS
OU NÃO À ESTA CONDIÇÃO. POR ISSO É IMPORTANTE QUE O ESTUDANTE
COM FORMAÇÃO GENERALISTA CONHEÇA AS FORMAS DE APRESENTAÇÃO,
ETIOLOGIA E A FORMA DE ABORDAGEM DIAGNÓSTICA E TERAPÈUTICA DOS
PACIENTES COM PARALISIA CEREBRAL.

A. Formas de apresentação

O termo paralisia cerebral (PC) é qualquer desordem caracterizada por alteração


do movimento secundária a uma lesão não progressiva do cérebro em
desenvolvimento. O PC pode apresentar alterações que variam desde leve
incoordenacão dos movimentos ou uma maneira diferente para andar até inabilidade
para segurar um objeto, falar ou deglutir.
Os fatores potencialmente determinantes de lesão cerebral irreversível são:
infecções do sistema nervoso, hipóxia, TCEs, malformações do SNC, hemorragias,
malformações arteriovenosas e síndromes genéticas. Em muitas crianças, a lesão
ocorre nos primeiros meses de gestação e a causa é desconhecida.

- Tipos de Paralisia Cerebral


A alteração do movimento está relacionado com a localização da lesão no cérebro e a
gravidade das alterações depende da extensão desta lesão. A PC é classificada de
acordo com a alteração de movimento que predomina. Formas mistas são também
observadas.

A. Espástica

Quando a lesão está localizada na área responsável pelo início dos movimentos
voluntários, trato piramidal, o tônus muscular é aumentado, isto é, os músculos
são tensos e os reflexos tendinosos são exacerbados. Esta condição é chamada
de paralisia cerebral espástica. As crianças com envolvimento dos braços, das
pernas, tronco e cabeça (envolvimento total) têm tetraplegia espástica e são
mais dependentes da ajuda de outras pessoas para a alimentação, higiene e
locomoção. São causadas por sofrimento cerebral difuso grave (infecções, hipóxia
e traumas) ou com malformações cerebrais graves.
Se a lesão atinge a porção do trato piramidal responsável pelos movimentos das
pernas, localizada em uma área mais próxima dos ventrículos (cavidades do
cérebro), a forma clínica é a diplegia espástica, na qual o envolvimento dos
MMII é maior do que dos MMSS. A região periventricular é muito vascularizada e
os prematuros, por causa da imaturidade cerebral, com muita frequência
apresentam hemorragia nesta área. A diplegia espástica geralmente se
relaciona a prematuridade. A maioria das crianças adquire marcha
independente antes dos oito anos de idade.

Na hemiplegia espástica, são observadas alterações do movimento em um lado


do corpo como, por exemplo, perna e braço esquerdos. As causas mais
frequentes são alguns tipos de malformação cerebral, AVEs ocorridos ainda na
vida intrauterina e TCEs.

As crianças com espasticidade tendem a desenvolver deformidades e distrofias.

B. Com movimentos involuntários

Quando a lesão está localizada nas áreas que modificam ou regulam o


movimento, a criança apresenta movimentos involuntários que estão fora de seu
controle, e os movimentos voluntários estão prejudicados. São a PC com
movimentos involuntários forma coreoatetósica ou distônica. O termo
coreoatetose é usado para definir a associação de movimentos involuntários
contínuos, uniformes e lentos (atetósicos) e rápidos, arrítmicos e de início súbito
(coreicos). A criança com PC tipo distônica apresenta movimentos intermitentes
de torção devido à contração simultânea da musculatura agonista e antagonista,
muitas vezes acometendo somente um lado do corpo. A PC com movimentos
involuntários está frequentemente relacionada com lesão dos gânglios da base
causada por hiperbilirrubinemia neonatal. Os movimentos involuntários podem ser
leves ou acentuados e são raramente observados durante o primeiro ano de vida.
Nas formas graves, antes desta idade a criança apresenta hipotonia (tônus
muscular diminuído) e o desenvolvimento motor é bastante atrasado. Muitas
crianças não são capazes de falar, andar ou realizar movimentos voluntários
funcionais e são, portanto, dependentes para a alimentação, locomoção e higiene.

C. Atáxica

A paralisia cerebral atáxica está relacionada com lesões cerebelares ou das vias
cerebelares. Altera o equilíbrio e coordenação dos movimentos. As crianças têm
marcha cambaleante por causa da deficiência de equilíbrio, e apresentam, ainda,
incoordenação dos movimentos com incapacidade. Como nas formas
extrapiramidais de PC, durante o primeiro ano de vida, a alteração observada
é a hipotonia. A alteração mais frequentemente encontrada é a ataxia associada
a sinais piramidais (tônus muscular aumentado e reflexos tendinosos
exacerbados). Ataxia pura em crianças com PC é rara.
Causas: Infecções do SNC, Síndrome hipóxico-isquêmica, Traumatismo crânio
encefálico, hemorragias (malformações arterio-venosas), síndromes genéticas,
distúrbios metabólicos.

OBSERVAÇÃO: OS ASPECTOS SEMIOLÓGICOS DAS ATAXIAS E DOS


MOVIMENTOS INVOLUNTÁRIOS DESCRITOS ACIMA SERÃO DISCUTIDOS
EM PROBLEMAS SUBSEQUENTES. NÃO HÁ NECESSIDADE DE OS
ESTUDANTES DETALHÁ-LOS AGORA.

B. Diagnóstico

- Dificuldade de sucção, tônus muscular diminuído, alterações da postura e atraso


para firmar a cabeça, sorrir ou rolar são sinais precoces que chamam a atenção para a
necessidade de avaliações mais detalhadas e acompanhamento neurológico.

- A persistência de REFLEXOS PRIMITIVOS além dos seis meses de idade pode


indicar presença de lesão cerebral.. Os reflexos primitivos mais conhecidos são: o
reflexo de Moro, o reflexo da marcha (quem não se lembra do filho RN andando com o
pediatra?), a preensão palmar, a preensão plantar, a sucção automática e o reflexo da
busca. Finalmente o RTCA (Reflexo Tônico Cervical Assimétrico)

C. Desordens Associadas

* Retardo Mental
* Epilepsia
* Alterações Visuais
Na PC, o estrabismo é frequente. Catarata (opacidade do cristalino), coriorretinite e
glaucoma são desordens oculares comumente encontradas nas infecções congênitas.

* Deficiência Auditiva
Os métodos propostos para esta triagem são o potencial evocado auditivo de tronco
encefálico (Brainstem Evoked Response Audiometry - BERA) e as emissões
otoacústicas evocadas ('teste da orelhinha').

* Dificuldades para a Alimentação


Desordens da sucção, mastigação e deglutição são comuns nas crianças com
envolvimento total. Todos estes fatores contribuem para uma ingesta alimentar abaixo
das necessidades. Além disso, muitas crianças com limitações motoras são mantidas
por longos períodos com dietas próprias para bebês. A oferta monótona de certos
tipos de alimento, tais como, leite e derivados, farináceos ou sucos após os seis
meses de idade pode determinar quadros de anemias carenciais (principalmente por
falta de ferro), desnutrição e infecções de repetição. A criança desnutrida não cresce
normalmente e sua resposta aos estímulos que promovem o desenvolvimento é
prejudicada.
A dieta deve ser planejada de acordo com as características clínicas e as limitações
de cada criança. Por exemplo, para facilitar a deglutição e reduzir o refluxo de parte do
conteúdo gástrico para o esôfago, recomenda-se manter a criança com a cabeça e o
tronco em posição semi-elevada durante e por alguns minutos após cada refeição.
Nas crianças com refluxo gastroesofágico, as refeições devem ser de menor volume e
oferecidas em intervalos de tempo menores para que não haja prejuízo do total de
nutrientes ingeridos em um dia. As crianças com dificuldade para deglutir líquidos,
devem ser alimentadas com pequenos volumes de dieta pastosa e de sucos
engrossados com frutas e gelatinas, procurando-se assim manter um bom nível de
hidratação.

* Constipação Intestinal
Quanto mais tempo as fezes permanecem no colo, maior é a absorção de água e mais
endurecidas elas ficam, resultando em constipação. A constipação intestinal crônica
decorre de vários fatores, entre os quais pequena ingestão de fibras e líquidos,
atividade física reduzida, e uso de medicações como antiácidos e certos
antiepilépticos.
A ingestão adequada de líquidos em geral, alimentos ricos em fibras tais como frutas
(mamão, abacaxi, laranja com bagaço, ameixa preta, manga, melancia), verduras
(principalmente as folhagens cruas), leguminosas (feijão, ervilha, lentilha) e alimentos
integrais melhoram o funcionamento intestinal e são medidas que devem ser
recomendadas se o colo (intestino grosso) ainda não estiver dilatado.
Quando a constipação é grave e não se observa resposta às orientações iniciais, os
alimentos ricos em fibras devem ser suspensos imediatamente e a possibilidade de
megacolo deve ser investigada. O tratamento correto do megacolo (dilatação do
intestino grosso) requer a orientação de um pediatra com experiência neste tipo de
problema.

D. Tratamento

O tratamento, em suas diferentes modalidades, envolve profissionais de várias áreas e


a família. A PC não tem cura, mas seus efeitos podem ser minimizados. O objetivo
principal deve ser promover o maior grau de independência possível.

1. Estimulação do Neurodesenvolvimento

2. Atividades Físicas.

3. Treinamento nas Atividades de Vida Diária

4. Meios Alternativos de Comunicação e Locomoção

5. Tratamento da Espasticidade

- Usa-se Baclofen ou Diazepam. A injeção de álcool reduz sua espasticidade e este


efeito pode se prolongar por até seis semanas se houver programa mais intensivo de
atividades ou uso de gesso ou talas, tem que ser feito sob anestesia.

- Aplicações de toxina botulínica.


- Uso de órteses e cirurgias ortopédicas.

6. Educação

- Ensino de inclusão, estratégia personalizada.

PROBLEMA 4:

CONTEÚDO EDUCACIONAL

1. Atendimento inicial de pacientes com trauma raquimedular.


2. Anatomia e fisiologia da medula espinhal.
3. Principais síndromes medulares.
4. Exames complementares usados na investigação das síndromes medulares.

OBJETIVOS EDUCACIONAIS

OBSERVAÇÃO:
Neste problema, o estudante deverá compreender as funções da medula, sua
formação estrutural, em que região está localizada, alguns tratos principais e que tipo
de informação este trato transmite.
Após estar familiarizado com o que se propõe acima, compreender que os sinais e
sintomas apresentados pelo paciente dão forte indício da localização de uma
patologia.
Finalmente ele vai entrar em contato com o paciente lesado medular, compreender
o período de choque neurogênico, quando predomina a hipotonia e hiporreflexia e a
evolução para a clássica síndrome do motoneurônio superior.
Estudará com maior profundidade a sensibilidade profunda.
Finalmente estudará as síndromes medulares como parte do reforço da semiologia
da sensibilidade e da força.

1. Conhecer como deve ser o primeiro atendimento prestado a uma vítima com
suspeita de trauma raquimedular.

- O Trauma Raquimedular (TRM) é uma lesão traumática da medula espinhal que


pode variar de leve concussão e recuperação rápida e completa à contusão,
laceração, compressão da medula, até a transecção completa, que torna o indivíduo
paralisado abaixo do nível da lesão, ocasionando uma paralisação permanente ou
temporária.
- O acidente de trânsito é a principal causa do TRM, seguido por ferimentos por
arma de fogo e arma branca, quedas e acidentes desportivos, principalmente
mergulhos em águas rasas. Geralmente, as consequências do TRM são
devastadoras, com sequelas definitivas, e requerem mudanças significativas na rotina
da vida diária. Nos últimos 20 anos, têm ocorrido muitos casos de lesão da medula
espinhal. Embora o Brasil ainda não tenha dados epidemiológicos fidedignos sobre tal
lesão, o TRM acomete mais os jovens em idade entre 18 e 40 anos, com maior
proporção nos homens do que nas mulheres, sendo o trauma uma das principais
causas.
- O trauma de coluna pode levar a lesões de qualquer estrutura como: vértebras,
discos intervertebrais, ligamentos, raízes nervosas, nervos periféricos e medula, ou
qualquer combinação delas.
- As localizações mais frequentes de TRM são:
• Cervical baixa: entre a quinta vértebra cervical (C5) e a primeira torácica
(T1), geralmente associado ao TCE.
• Transição toracolombar: entre a décima primeira ou décima segunda
vértebra torácica (T11 e T12) e a primeira lombar (11).
• Traumas fechados são geralmente uma combinação de forças de contusão,
compressão, rotação e tração.
- As lesões ósseas vertebrais podem estar presentes sem que haja
envolvimento de medula espinhal; por isso, a vítima deve ser imobilizada de forma
adequada quando há qualquer suspeita de lesão de coluna. Tal imobilização deve ser
mantida até ser avaliada radiologicamente, afastando qualquer suspeita de fraturas ou
luxações. As fraturas ou luxações da coluna podem ser estáveis ou instáveis,
causando comprometimento neurológico.
- As lesões medulares ocorrem em aproximadamente 10% a 30% dos TRM,
dependendo do local do trauma. Elas podem ser completas ou incompletas,
caracterizando os quadros de tetraplegia (cervicais C4; C5 e C6), paraplegia
(Torácicas e Lombares) ou incompatibilidade com a vida, quando acometem de C1 a
C3.
- Os possíveis mecanismos de lesão raquimedular são:
* Carga axial
* Hiperflexão e hiperextensão
* Superalongamento da coluna e a hiperrotação
* Inclinação lateral repentina ou excessiva.
- Deve-se suspeitar de TRM nas seguintes situações:
• Vítimas inconscientes que sofreram algum tipo de trauma.
• Vítima politraumatizada;
• Qualquer vítima de trauma que apresente lesões acima das clavículas;
• Dor em qualquer região da coluna;
• Traumatismo facial ou de crânio fechado;
• Parestesia ou paralisia abaixo do pescoço;
• Priapismo;
• Dor localizada;
• Verificar a posição da cabeça e dificuldade e dor ao tentar colocá-la na
posição neutra.

- Para o diagnóstico de TRM, deve-se examinar a coluna vertebral


cuidadosamente, com a vítima em posição neutra e, em hipótese alguma fletir
qualquer segmento da coluna, verificando deformidades, dor, limitação de
movimentos e queixa de amortecimento de extremidades ou impossibilidade de
movimentação. A coluna cervical deve ser estabilizada com colar cervical e o
paciente deve colocado em prancha rígida.
2. Revisar a anatomia e fisiologia da medula espinhal (tractos mais
importantes).

- A medula espinhal tem formato aproximadamente cilíndrico, começando


superiormente no forame magno, onde é contínua com o bulbo, e terminando
inferiormente, no adulto, ao nível do disco intervertebral entre a primeira e a
segunda vértebra lombar. Desta forma, em adultos ela é mais curta que a coluna
vertebral. Em crianças pequenas, é um pouco mais longa, terminando na borda
superior da terceira vértebra lombar. Assim como o encéfalo, é circundada pelas três
meninges: dura-máter, aracnoide e pia-máter. A figura 1 mostra a medula espinhal
com seus envoltórios e sua relação com a coluna vertebral.

Figura 1 – Medula espinhal com seus envoltórios e a relação com a


coluna vertebral (Fonte: Machado A, Neuroanatomia Funcional, 1ª
edição, 1988)

- A substância cinzenta, vista em secção transversal, aparece com um pilar em forma


de “H”, com colunas cinzentas, denominadas: corno anterior e corno posterior,
unidas pela comissura cinzenta. Uma pequena coluna cinzenta intermédia,
denominada corno lateral, está presente nos segmentos torácicos e lombares
superiores. Os cornos anteriores contêm os NMI, nos laterais estão os neurônios
autonômicos, e nos cornos posteriores estão os neurônios sensitivos que fazem parte
das vias aferentes. Além disso, a medula contém um aparelho neuronal intrínseco
composto por interneurônios, neurônios associativos e comissurais, cujos processos
sobrem e descem pelo fascículo próprio.
- A substância branca é composta por tractos ascendentes e descendentes com
diferentes funções (figura 2). Eis os principais:

A. Descendentes:
* Tracto corticoespinhal lateral: localizado no funículo lateral, é composto pelos
75% a 90% de fibras que cruzaram na pirâmide bulbar, originando-se do córtex motor
primário. Suas fibras fazem sinapse com interneurônios na substância cinzenta
intermédia que, por sua vez, projetam-se aos NMI, no corno anterior da medula. Sua
função é a motricidade voluntária. Sua representação somatotópica está indicada na
figura 1.

* Tracto corticoespinhal anterior: localizado no funículo anterior, é composto


pelos 10% a 25% das fibras que não cruzaram na pirâmide bulbar. É visto até a
medula torácica média. Suas fibras fazem sinapse com interneurônios na substância
cinzenta intermédia que, por sua, cruzam o plano mediano e se conectam aos NMI.

* Tracto rubroespinhal: localizada no funículo lateral, suas fibras são originadas


do núcleo rubro. É um tracto filogeneticamente mais antigo que o corticoespinhal e
está envolvido no comando dos movimentos da musculatura distal, principalmente de
MMSS. Acaba tendo uma função compensadora pois, graças persistência de sua
função, os pacientes com lesão do tracto piramidal não apresentam usualmente déficit
de força completo.

* Tracto reticuloespinhal: localizada no funículo anterior, suas fibras originam-


se de neurônios da formação reticular pontina e bulbar. Está envolvido com o
comando dos movimentos de músculos proximais e axiais controlando, desta forma,
nossa postura. Em função de sua presença, as lesões piramidais preservam os
movimentos dos músculos proximais e axiais.

B. Ascendentes:

* Tracto espinotalâmico lateral: localizado no funículo lateral, é formado por


conjunto de axônios que ascende após ter cruzado o plano mediano a frente do canal
central. Estes axônios originam-se de neurônios localizados no corno posterior da
medula, os quais recebem projeções de neurônios do gânglio da raiz dorsal que
entram pela raiz posterior. Está envolvido com a transmissão da dor e temperatura,
ascendendo até o tálamo. Há uma distribuição somatotópica igual a do tracto
corticoespinhal lateral: as fibras mais laterais advêm da região sacral, e as mais
mediais advêm da região cervical. Cabe lembrar que, quando as fibras transmissoras
de dor e temperatura penetram na medula, emitem ramos que sobem e descem 1 ou 2
segmentos medulares antes de fazer sinapse com os neurônios do corno posterior.
Isso tem implicação clínica na investigação topográfica de lesões medulares,
explicando porque os testes de dor e temperatura têm maior poder de
localização.

* Tracto espinotalâmico anterior: localizada no funículo anterior, é formada


por axônios que ascende após ter cruzado o plano mediano. Estes axônios originam-
se de neurônios localizados no corno posterior da medula que, por sua vez, recebem
projeções de fibras nervosas originadas do gânglio da raiz dorsal que penetram na
medula pela raiz posterior. Portanto, este tracto está envolvido com a transmissão da
sensação de pressão e tato grosseiro. Quando as fibras penetram na medula, seus
ramos ascendem de 2 a 15 segmentos e descem entre 1 e 2 segmentos. Por
conseguinte, clinicamente o poder de localização da avaliação do tato grosseiro e
pressão é pequeno por haver superposição dos segmentos medulares.

* Fascículo grácil: localizado medialmente no funículo posterior, transmite as


informações relacionadas à noção de posição articular, vibração e tato discriminativo
da região sacral, MMII e metade inferior do tronco. Ascende até o núcleo do grácil, no
bulbo. Dos neurônios deste núcleo saem as fibras arqueadas internas que ascendem
através do lemnisco medial até o tálamo.

* Fascículo cuneiforme: localizado lateralmente no funículo posterior, transmite


as informações relacionadas à noção de posição articular, vibração e tato
discriminativo dos MMSS e metade superior do tronco. Ascende até o núcleo do
cuneiforme, no bulbo. Dos neurônios deste núcleo, saem as fibras arqueadas internas
que ascendem através do lemnisco medial até o tálamo.

* Tracto espinocerebelar posterior: localizado no funículo posterior, origina-se


de projeções de neurônios do corno posterior de medula que recebem fibras oriundas
fusos musculares e órgãos tendinosos. Ascende homolateralmente até o cerebelo pelo
pedúnculo cerebelar inferior. Este tracto transmite informações proprioceptivas até
cerebelo, permitindo com que ele controle “on-line” alguns parâmetros dos nossos
movimentos.

* Tracto espinocerebelar anterior: tem a mesma origem e composição do


tracto espinocerebelar posterior, exceto pelo fato de ascender homo e
contralateralmente na medula, e de penetrar no cerebelo pelo pedúnculo cerebelar
superior.

Figura 2: Visão transversal da medula espinhal: tractos ascendentes e


descendentes e sua distribuição somatotópica (Fonte: Baehr M, Frotscher
M; Duus Diagnóstico Topográfico em Neurologia, 4ª Ed, 2008).
- Para identificar a presença de uma síndrome medular, é importante que o médico
relembre este conjunto de tractos e suas posições dentro da medula, pois em muitas
síndromes medulares há uma mistura de distúrbios motores, sensoriais e
autonômicos. Para o diagnóstico topográfico, também é importante conhecer a
localização de alguns dermátomos. Estes são áreas de inervação cutânea
representadas por um segmento medular (figura 3). As alterações sensitivas que
ocorrem na distribuição de um ou mais dermátomos sugerem a topografia lesional em
uma ou mais raízes nervosas (síndromes radiculares), quando associadas a
lombociatalgia ou cervicobraquialgia, ou às síndromes medulares, que serão descritas
abaixo. Não é necessário que o médico generalista conheça todos eles, ficando este
nível de detalhamento a cargo do neurologista e neurocirurgião. Quando está diante
destes pacientes, o médico generalista pode consultar o mapa dos dermátomos ao
fazer o exame neurológico.

Figura 3: Distribuição dos dermátomos (Fonte: Baehr M, Frotscher M; Duus


DiagnósticoTopográfico em Neurologia, 4ª Ed, 2008).

3. Descrever as principais síndromes medulares (transecção medular completa,


Brown-Séquard ou hemissecção medular, da substância cinzenta, cordonal
posterior e do cone medular).

A. Síndrome de transecção medular completa: pode ser causada por traumatismos


ou por processos inflamatórios (mielite transversa). Quando ocorre de forma aguda,
produz o chamado choque espinhal, caracterizado por paralisia flácida e perda de
todas as modalidades de sensibilidade (superficial e profunda) abaixo do nível da
lesão. Este nível é delimitado por um dermátomo (nível sensitivo), o que ajuda a
localizar qual segmento medular está afetado. A borda superior do nível sensitivo
frequentemente é demarcado por uma zona de hiperalgesia. Também há perda das
funções vesicais, intestinal e sexual. Só há preservação do reflexo bulbocavernoso
(contração do músculo bulbocavernoso, atrás do escroto, após estímulo de beliscão
no dorso da glande), indicando preservação do cone medular. Após alguns dias a
semanas, começam a aparecer os sinais de liberação piramidal, já descritos no
problema anterior, e retenção urinária e micção reflexa. Quando a síndrome ocorre de
forma gradual, não ocorre a fase de choque medular. O padrão de perda sensitiva é
descrito na figura 4.

Figura 4 – Padrão de perda sensitiva na síndrome de transecção medular completa

B. Síndrome de hemissecção medular ou Brown-Séquard: suas causas mais


comuns são traumatismo e hérnia de disco cervical. Do mesmo lado da lesão, o
paciente apresenta uma paresia inicialmente flácida e arrefléxica, mas posterioirmente
com sinais de liberação, e perda da propriocepção. Contralateralmente à lesão, ocorre
perda da sensação de dor e temperatura porque o tracto espinotalâmico lateral
cruzado é interrompido. Todas estas alterações ocorrem abaixo do nível da lesão. O
tato grosseiro fica preservado (figura 5).
Figura 5 – Padrão de perda sensitiva na síndrome de Brown-Séquard

C. Síndrome da substância cinzenta: pode ser causada por siringomielia (etiologia


mais comum), hematomielia (hematoma central) ou tumores. A siringomielia consiste
na formação de uma ou mais cavidades cheias de líquido na porção central da
medula. Ocorrem mais comumente na medula cervical, podendo se estender para o
bulbo (siringobulbia), podendo ser idiopática ou secundária. O paciente apresenta
perda de sensibilidade térmica e dolorosa envolvendo ombros, MMSS e tórax até um
certo nível (anestesia suspensa). Com a expansão da lesão, pode ocorrer paresia
espástica e hiperrefléxica de MMSS, predominando em mãos, com atrofia destas
(figura 6).

Figura 6 – Padrão de perda sensitiva na síndrome da substância cinzenta (A).


Cavitação siringomiélica – principal causa desta síndrome (B).
D. Síndrome cordonal posterior: os processos patológicos que afetam os fascículos
grácil e cuneiforme podem também envolver as raízes dorsais e as células do gânglio
da raiz dorsal. Podem ser causadas por deficiência de vitamina B12, lesões medulares
compressivas posteriores (estenose medular, por exemplo) e neurossífilis (chamada,
nestes casos de “tabes dorsalis”). O paciente apresenta perda da propriocepção, tato
discriminativo e da estereognosia nos membros envolvidos. Também apresentam a
marcha talonante, ataxia sensitiva e o clássico sinal de Romberg (serão discutidos no
problema 6) (figura 7).

Figura 7 – Padrão de perda sensitiva na síndrome cordonal posterior

E. Síndrome do cone medular: decorre de lesões no cone medular, composta pelos


segmentos S3, S4 e S5. Pode ser causada por tumores ou hérnias discais lombares
maciças. O paciente apresenta retenção urinária (arreflexia do músculo detrusor),
incontinência fecal, impotência sexual, perda do reflexo anal e anestesia em sela
(figura 8). Não há paresia em MMII.

Figura 8 – Padrão de perda sensitiva na síndrome de cone medular

4. Citar o diagnóstico sindrômico e topográfico do paciente.

Após revisão da anatomia funcional da medula e das principais síndromes medulares,


podemos dizer que o paciente apresenta uma síndrome de hemissecção medular
ou Brown-Séquard, com topografia lesional em medula torácica, à esquerda do
segmento medular T9, visto que ele corresponde ao dermátomo acima da
cicatriz umbilical. Podemos afirmar que a lesão é à esquerda porque os sinais
piramidais e o déficit de propriocepção são homolaterais à lesão.

5. Citar os exames complementares que podem auxiliar na investigação


diagnóstica deste paciente.

Considerando o diagnóstico sindrômico e topográfico deste paciente, os exame


complementares úteis para o diagnóstico etiológico são: Ressonância magnética de
medula torácica (avalia com precisão lesões de medula e raízes nervosas, porém
não é útil para lesões ósseas) e Radiografia de coluna torácica ou Tomografia
computadorizada de coluna torácica (para avaliação das lesões de coluna
vertebral).

PROBLEMA 5:

CONTEÚDO EDUCACIONAL

1. Funções e exame clínico dos pares cranianos.


2. Anatomia do tronco encefálico.
3. Principais síndromes de tronco encefálico: bulbares, pontinas e
mesencefálicas.

OBJETIVOS EDUCACIONAIS

1. Revisar a função, semiologia e sinais e sintomas de lesão dos pares


cranianos.

1. OLFATÓRIO (1º PAR): Testa-se cada narina em separado, comprimindo a asa do


nariz do orifício nasal oposto, utilizando uma substância de odor conhecido e comum.
(por exemplo: aroma de café). E pergunta ao examinado o que ele está sentindo.

2. ÓPTICO (2º par): Testa-se a acuidade visual, um olho de cada vez, com as tabelas
de Snellen colocadas a 6 metros do examinado e pedindo-se para o mesmo ler a
menor linha possível (pelo menos 50% das letras). Do lado das letras, existe uma
fração onde o numerador indica a distância do paciente ao cartaz e, o denominador, a
distância que uma pessoa normal conseguiria ler esta mesma linha. Esta tabela, na
prática do neurologista, é substituída pela de Jaeger, menor, e que é colocada
aproximadamente a 36 cm dos olhos do examinado.
Avalia-se o campo visual, um olho de cada vez. Para tanto,
colocamo-nos a uma distância em torno de um metro do examinado, de modo que a
altura de nossos olhos seja a mesma da do examinado e do nosso nariz idem.
Pedimos que o paciente fixe os olhos nos nossos próprios olhos. À meia distância,
entre as duas faces, introduzimos um objeto ( ex: uma tampa de caneta de qualquer
cor) de fora para dentro e solicitamos ao paciente que comunique se percebe o objeto.
O examinado oclui o olho não testado e o examinador também o olho que está na
mesma direção do olho ocluído do paciente (o examinador funciona como “controle” e,
se houver normalidade, deverá perceber o objeto ao mesmo tempo do paciente.
Aqui deveremos lembrá-los das hemianopsias homônima e heterônima e das
quadrantopsias (não é necessário fixação dos conceitos)
Fundoscopia: aparelho próprio exige habilidade do
examinador.

3. OCULOMOTOR (3º par), TROCLEAR (4º par), ABDUCENTE (6º par): são
responsáveis pela oculomotricidade (motricidade extrínseca dos olhos) e pela
elevação da pálpebra superior, motricidade conjugada e extrínseca dos olhos e
motricidade intrínseca ou pupilar. Os músculos responsáveis pela movimentação do
globo ocular são: retos laterais e mediais, superiores e inferiores e os oblíquos
superior e inferior. Todos os músculos extrínsecos oculares, com exceção do oblíquo
inferior, inserem-se no tendão de Zinn, localizado no ápice da orbita. O oblíquo inferior
origina-se na porção mais baixa da parede anteromedial da órbita.
* Nervo oculomotor:
Reto medial – adução do globo ocular
Reto superior – elevação do olho abduzido
Oblíquo inferior – elevação do olho aduzido e inciclodução
Reto inferior – abaixamento do olho abduzido
Elevador da pálpebra superior

* Nervo troclear:
Oblíquo superior – abaixamento do olho aduzido e inciclodução

* Nervo abducente:
Reto lateral – abdução.

A motricidade intrínseca dos olhos tem seu controle localizado em diversas áreas
corticais e subcorticais. Os centros corticais estão localizados nos lobos frontais
(dilatação), occipitais (constricção) e sistema límbico(dilatação. Dentre as áreas
subcorticais, temos:

* Hipotálamo (sistema integrador da atividade pupilar). Ele comanda os sistemas


simpático e parassimpático através de diferentes núcleos.

Autonômico simpático: hipotálamo (1º neurônio)  tronco encefálico  funículo


lateral  centro cilioespinhal no segmento cervicocotácico (C8-T12)(2º neurônio), em
que seus axônios deixam a medula através das raízes espinhais anteriores(C8-T12)-
sobem pela cadeia simpática até o gânglio cervical superior, onde está o terceiro
neurônio desta via. As fibras pós-ganglionares penetram no crânio intimamente
relacionado ao plexo carotídeo, entram na órbita pela fissura orbitária superior,
passam pelo gânglio ciliar e vão inervar o músculo dilatador da pupila.

Autonômico parassimpático: O primeiro neurônio pré-ganglionar está localizado no


núcleo de Edinger-Westphal (EW: parte do complexo nuclear oculomotor). Suas fibras
seguem incorporadas ao 3° nervo craniano, terminando no gânglio ciliar e segue junto
à parte simpática, pelo nervo ciliar curto, para inervar o músculo constrictor da íris.
As fibras musculares circulares (esfíncter da Iris) que contraem a pupila são
parassimpáticas do 3° nervo craniano. As fibras musculares radiadas, com
função dilatadora, dependem do simpático cervical.

Reflexo de acomodação: Fibras sensitivas da retina para o nervo óptico(2º par) 


para a região pré tectal do mesencéfalo  partem fibras para o núcleo de EW
homolateral e contralateral  de lá, partem fibras eferentes parassimpáticas pré-
ganglionares acopladas ao 3° nervo  gânglios ciliares  fibras pós ganglionares
para a musculatura circular da íris: contrição das pupilas.

* Lesões:
No nervo oculomotor: midríase unilateral + perda do reflexo fotomotor direto e
consensual.
Nervo óptico: midríase + abolição do reflexo fotomotor direto + conservação do
fotomotor consensual por iluminação da pupila oposta
Via simpática: miose unilateral.

5. TRIGÊMEO (5º par): parte sensitiva dos 2/3 anteriores do segmento cefálico
(lembrar que área do ângulo da mandíbula e a região occipital não são inervadas pelo
trigêmeo). Deve ser testado com ambos os olhos fechados e com um chumaço de
algodão, testando-se comparativamente os dois lados da mandíbula, do maxilar e.
finalmente, a porção direita e esquerda da fronte, pois são inervados por ramos
diferentes do 5° nervo.
Parte motora: avalia-se com movimentos mastigatórios da mandíbula e através do
reflexo mandibular ou masseterino (percussão do mento com interposição do dedo do
examinador e o paciente com a boca semiaberta).

7. FACIAL (7º par): Avalia-se simetria facial em repouso e a contração dos músculos
da mímica facial:
Frontal – enrrugar a fronte
Orbicular das pálpebras – fechar os olhos
Orbicular dos lábios – fechar os lábios e assoviar
Bucinador – retrair os cantos da boca, como um sorriso.
Platisma – contrair os cantos da boca e da musculatura cervical anterior.
É importante diferenciar clinicamente as paralisias faciais de origem central e
periférica, pois têm topografias e etiologias distintas.
Paralisia facial periférica: lagoftalmo do olho do lado afetado, região frontal sem
rugas do lado afetado, perda do sulco nasogeniano do lado afetado e este está mais
aparente do lado contralateral. Desvio da comissura labial para o lado contrário ao
lado paralisado.
Paralisia facial central: observa-se apenas o desvio da comissura labial para o lado
contralateral ao da paralisia. Os olhos mantêm a capacidade de fechamento o
enrugamento da fronte é mantido. Explicação: Os músculos frontais e orbiculares das
pálpebras recebem informações ipsi e contralateral (córtex frontal dos dois lados). Os
demais músculos recebem informações apenas contralaterais.

8. VESTIBULOCOCLEAR (8º par):


Ramo Vestibular: faz-se a pesquisa de nistagmo e exame do equilíbrio estático e
dinâmico, que serão discutidos no problema 6.

Ramo Coclear (audição): testa-se com a voz falada e sussurrada, com o roçar dos
dedos ou das unhas ou tic-tac de um relógio. Teste de Rinne: Com um diapasão,
normalmente os sons conduzidos pela via aérea são mais prolongados que aqueles
conduzidos pela via óssea. Assim, colocamos o diapasão encostado na mastóide e
pedimos para o paciente declarar quando parar de ouvir o som (condução óssea).
Imediatamente, colocamos o diapasão próximo ao ouvido, o paciente é capaz de voltar
a escutar o som. Na surdez condutiva (por lesões nas estruturas que conduzem o
som: tímpano ou ouvido médio), a relação entre condução aérea e óssea é menor que
1. Na surdez sensorial (lesões na cóclea ou no ramo coclear), esta relação é igual ou
maior que 1.
Teste de Weber: Coloca-se o diapasão no vértice do crânio, normalmente a vibração
é percebida nos dois ouvidos com a mesma intensidade. Em caso de perda auditiva
por condução, o paciente perceberá o som mais intenso na orelha com perda auditiva.
Se a perda auditiva for sensorial unilateral, o diapasão será mais percebido na orelha
normal.

9. GLOSSOFARÍNGEO E VAGO (IX e X pares): São pesquisados em conjunto.


Funções: deglutição de sólidos e líquidos, reflexo do vômito (faríngeo) e gustação do
terço posterior da língua e da epiglote (habitualmente não testado).
Durante o exame do véu palatino, a úvula vai se desviar para o lado não acometido e
observa-se rebaixamento do véu do paladar do lado paralisado. Temos também voz
com som anasalado e refluxo pelo nariz de conteúdo líquido. História de disfagia e
ausência do reflexo de vômito.

11. ACESSÓRIO (11° par) medular ou espinhal: tem importante relação com o
fascículo longitudinal medial e, através deste, com os núcleos dos III,IV, VI e VIII pares
cranianos, todos envolvidos na movimentação automática e/ou reflexa da cabeça e
dos olhos, que necessita dos músculos esternocleidomastoideos.
Testa-se através dos músculos esternocleidomastoideos e trapézios.
Assim, pede-se ao paciente que eleve os ombros contra uma resistência oferecida
pelas suas mãos. Será observado déficit na elevação do lado afetado. E, contra uma
resistência, pede-se para o paciente virar a face para os lados. O paciente terá
dificuldades em virar a face para o lado oposto ao do músculo comprometido.

12. HIPOGLOSSO (12° par): Faz-se inspeção estática da língua: desvios, atrofias ou
fasciculações. Em seguida, pede-se para o paciente protrair a língua e executar
diversos movimentos. Devido à perda da função da musculatura de uma metade da
língua, nos casos de alterações, ao protrair a língua, sua ponta se desviará para o lado
da musculatura com problema.

2. Descrever a anatomia do tronco encefálico e pares cranianos (principalmente


em que região estão os respectivos núcleos dos pares cranianos e o seu local
de saída do tronco).
- O tronco encefálico está entre a medula e o diencéfalo, ocupa posição ventral em
relação ao cerebelo. Tem relação íntima com o 4º ventrículo. Em sua constituição
interna, são observadas formações cinzentas (núcleos) e brancas (tractos, fascículos e
lemniscos). Em sua superfície, são observadas depressões, elevações, sulcos
importantes na localização de núcleos, tratos, nervos cranianos e sua emergência na
superfície do SNC. É dividido em bulbo, ponte e mesencéfalo (figuras 1 e 2).

Figura 1 – Visão posterior do tronco encefálico (Fonte: Machado A, Neuroanatomia


Funcional, 1ª Ed., 1988).
Figura 2 – Visão anterior do tronco encefálico (Fonte: Machado A, Neuroanatomia
Funcional, 1ª Ed., 1988).

- BULBO:
* Porção mais inferior do tronco – tem relação com a medula no limite inferior e a
ponte na sua porção superior. Em sua superfície observam-se sulcos, continuação
daqueles que vem da medula. Estes delimitam a superfície ventral, lateral e dorsal do
bulbo. Em sua superfície ventral, observamos um sulco muito profundo à fissura
mediana anterior que termina cranialmente no forame cego. De cada lado da fissura,
temos a formação piramidal (feixe compacto de fibras motoras descendentes – feixe
corticoespinhal ou trato piramidal). Na porção inferior do bulbo, 75% a 90% destas
fibras cruzam o plano mediano (decussação das pirâmides). Este detalhe é
importantíssimo, pois lesões acima deste ponto têm sintomatologia homolateral. E nas
lesões abaixo deste ponto, observa-se sinais contralaterais. Em sua face lateral,
observamos a oliva (complexo olivar inferior- relacionado com o fenômeno da
aprendizagem motora – onde podemos realizar movimentos repetitivos cada vez mais
rápidos e com maior precisão). Do sulco lateral anterior, na altura da oliva, emergem
as fibras do nervo hipoglosso (XII par). Do sulco lateral posterior, emergem as
fibras que, ao se unirem, formarão o nervo glossofaríngeo (IX par) e o vago (X par),
e as fibras que compõe a raiz craniana do nervo assessório (XI par). Em sua
superfície dorsal, temos uma porção aberta (o início do assoalho do IV ventrículo).
Entre o sulco mediano posterior e o sulco lateral posterior, em sua porção inferior,
observamos a área posterior do bulbo, que contem fibras dos fascículos grácil e
cuneiforme e duas saliências: o tubérculo do núcleo grácil e o tubérculo do
núcleo cuneiforme, lateralizado em relação ao anterior, que se continuam para cima
com o pedúnculo cerebelar inferior.

* Topografia das estruturas internas de um corte do bulbo (figura 3):


Considerando o corte transversal do bulbo visto na figura 3, temos dentre as estruturas
mais importantes, da superfície dorsal à ventral:
A. Fascículo e Núcleo grácil, fascículo e núcleo cuneiforme;
B. Núcleo do trato solitário (sensitivo: aferentes viscerais gerais do VII,IX e X pares
e especiais relacionada com a gustação).
C. Núcleo dorsal do n. vago (parassimpático).
D. Núcleo do n. hipoglosso (XII).
E. Fibras arqueadas internas dos núcleos grácil e cuneiforme, que cruzam e
ascendem ao tálamo, passando pelo lemnisco medial.
F. Núcleo do tracto espinhal do n. Trigêmeo: sensibilidade dos 2/3 do segmento
cefálico (pelo V) e do pavilhão auditivo e conduto auditivo externo (VII, IX, X).
G. Núcleo ambíguo profundo: motor viscerais especiais (IX,X,XI), musculatura
estriada de origem branquiomérica ( musculatura do laringe, e da faringe).
H. Tractos espinocerebelares posterior e anterior.
I. Complexo olivar inferior – aprendizagem motora.
J. Pirâmides bulbares – por onde passa e decussa os tractos corticoespinhais.

Figura 3: Vista transversal do bulbo (Fonte: Machado A, Neuroanatomia


funcional, 1ª Ed., 1988)

- PONTE:

* Está localizada entre o bulbo e o mesencéfalo – localizada ventralmente em relação


ao cerebelo e repousa sobre parte do osso occipital e o dorso da sela turca. Em sua
superfície ventral, observa-se uma estriação transversal (fibras transversais) que, ao
convergirem, formam o pedúnculo cerebelar médio. De sua porção lateral, emerge o
nervo trigêmeo (V par): uma raiz maior (sensitiva) e uma mais fina (motora). Em sua
superfície ventral, medianamente observamos uma depressão, o sulco da artéria
basilar. Entre a ponte e o bulbo, observamos o sulco bulbopontino. Deste sulco,
emergem o VI, VII e VIII pares cranianos, da linha da depressão basilar para fora.
Entre o VII e o VIII, emerge a raiz sensitiva do VII par denominado nervo intermédio.
Observe que uma lesão nesta área fica rica em sintomatologia devido aos vários
elementos muito próximos um do outro. Denominamos este quadro de Síndrome do
ângulo pontocerebelar, comumente causada por tumores dos nervos localizados
nesta região.
* A parte dorsal da ponte constitui o assoalho do quarto ventrículo. O assoalho do IV
ventrículo tem a forma de um losango - formado pela porção aberta do bulbo e a
região dorsal da ponte. Suas saliências, depressões e sulcos são formadas por
núcleos dos pares cranianos aí localizados. Em uma visão do região dorsal da
ponte, podemos evidenciar as seguintes estruturas, de baixo para cima:
A. Trígono do hipoglosso – núcleo do n. hipoglosso.
B. Trígono do vago – núcleo dorsal do vago.
C. Abertura lateral do IV ventrículo.
D. Área vestibular – núcleos vestibulares
E. Sulco limitante
F. Colículo Facial – fibras do nervo facial que envolvem, nesta altura, o núcleo
do nervo abducente
G. Locus ceruleus – envolvido na fisiologia do sono, com a função de despertar.
Importância deste conhecimento: Lesões expansivas que comprometem o IV
ventrículo (por exemplo: tumor do epitélio ependimário) comprimem estas
estruturas, causando alteração das suas funções.

* A figura 4 mostra um corte transversal da ponte, mostrando as principais estruturas


encontradas.

Figura 4: Vista transversal da ponte (Fonte: Machado A, Neuroanatomia


funcional, 1ª Ed., 1988)

- MESENCÉFALO:

* Coloca-se entre a ponte e o diencéfalo – atravessado pelo aqueduto de Sylvius, que


une o III ao IV ventrículo – é dividido em teto do mesencéfalo (região dorsal) e
pedúnculos cerebrais, na região ventral, que, por sua vez, divide-se em uma porção
interna predominante celular, o tegmento e outra predominantemente formada por
fibras longitudinais, denominada base do pedúnculo cerebral. Entre o tegmento e a
base, observamos uma porção escura denominada substância negra (neurônios
ricos em melanina). Dois sulcos são importantes: o sulco lateral do mesencéfalo e o
sulco medial do pedúnculo cerebral. Deste último, emergem o terceiro par
(oculomotor).
* Teto do mesencéfalo: na sua superfície dorsal apresenta quatro eminências
arredondadas, os colículos superiores e os colículos inferiores (corpo
quadrigêmeo). Acima destes, temos outra eminência, a pineal (que pertence ao
diencéfalo). Abaixo de cada colículo inferior emerge o IV par craniano (único nervo
craniano que emerge pela região dorsal do tronco). Os colículos se ligam aos corpos
geniculados do diencéfalo através de um feixe de fibras denominadas “braço do
colículo inferior” para o corpo geniculado medial (função auditiva), e o “braço do
colículo superior” para o corpo geniculado lateral (função visual – movimentos dos
olhos na direção vertical).
* Pedúnculos Cerebrais: observados pela superfície ventral do tronco encefálico, são
dois grandes feixes de fibras que partem da borda superior da ponte e, em formação
de um “V”, penetram nos hemisférios cerebrais. Atrás do sulco medial do pedúnculo
cerebral emerge o 3° par craniano. O pedúnculo cerebral é formado por fibras dos
tratos corticoespinhal, corticonuclear e corticopontino.
* A figura 5 mostra um corte transversal do mesencéfalo, sendo as estruturas mais
importantes:
1. Base do pedúnculo cerebral – fibras corticoespinhais, corticonucleares e
corticopontina
2. Substância negra – neurônios contêm melanina, utilizam a dopamina como
neurotransmissor. Importante relação com o corpo estriado. Sua lesão é uma
das principais alterações vistas na doença de Parkinson.
3. Lemniscos: medial, espinhal, trigeminal e lateral (sensitivas).
4. Núcleo Rubro\; motricidade somática – recebe fibras do córtex e do cerebelo
e coordena a musculatura distal dos membros
5. Fascículo longitudinal medial (auxilia na coordenação da movimentação
ocular com a cabeça e o equilíbrio vestibular)
6. Núcleo do nervo Troclear
7. Núcleo do nervo Oculomotor (incluindo os subnúcleos motores e do de
Edinger Westphal - controle parassimpático: contração pupilar)).
8. Substância Cinzenta central
9. Aqueduto de Sylvius.

Figura 5: Vista transversal do mesencéfalo (Fonte: Machado A, Neuroanatomia


funcional, 1ª Ed., 1988)
3. Descrever as principais síndromes de tronco encefálico. Neste item, os
tutores deverão FRISAR aos estudantes que existem as síndromes que atingem
o bulbo, a ponte e o mesencéfalo e são descritas de acordo com a combinação
do comprometimento do par craniano com os tractos motores e sensitivos e/ou
vias cerebelares envolvidas.

- Existem diversas síndromes resultantes de lesão no tronco encefálico, algumas com


epônimos. Mas o conhecimento de todas elas não é necessário ao médico generalista.
É importante saber que todas possuem uma característica em comum: sempre ocorre
comprometimento de um ou mais nervos cranianos e/ou ataxia homolateral à lesão, e
déficits motor e/ou sensitivo contralaterais, visto que os tracto motores e sensitivos são
cruzados. Por isso, elas são chamadas de “síndromes alternas”.
- Eis abaixo algumas síndromes principais (embora sejam citados epônimos em
alguns livros-texto, não é necessário que o estudante tenha que saber a nomenclatura.
A revisão anatômica realizada acima é suficiente para diferenciar síndromes
bulbares, pontinas e mesencefálicas.

A. Síndrome bulbar medial: afeta pirâmide bulbar e nervo hipoglosso. Ocorre


hemiparesia do lado oposto ao lado lesado e desvio da ponta da língua para o lado
lesado.

B. Síndrome bulbar lateral: afeta pedúnculo cerebelar inferior, trato espinhal do


trigêmeo e seu núcleo, tracto espinotalâmico lateral, núcleo ambíguo e tracto
simpático. Alterações homolaterais à lesão: ataxia apendicular, anestesia térmica e
dolorosa em hemiface, síndrome de Horner, disfagia, ausência do reflexo do vômito.
Alterações contralaterais à lesão: anestesia térmica e dolorosa em hemicorpo, exceto
face. Também ocorrem soluços e disfonia. Em função de sua prevalência, vale a pena
citar seu epônimo: “síndrome de Wallenberg”. Sua principal causa é um infarto na
região dorsolateral do bulbo decorrente de dissecção da artéria vertebral homolateral.
Esta síndrome associada a dor cervical é altamente sugestiva desta etiologia, sendo
uma das causas de AVE isquêmico em jovens.

C. Síndromes pontinas: de forma geral, homolateralmente à lesão, o paciente pode


apresentar: paralisia do olhar conjugado horizontal (o centro subcortical do olhar
conjugado horizontal está localizado na ponte), déficit do 6° nervo, paralisia facial
periférica, ataxia apendicular, nistagmo horizontal, vertigem e oftalmoparesia
internuclear (lesão do fascículo longitudinal medial). Contralateralmente à lesão, pode
ter hemiparesia incompleta, preservando a face. Também pode haver lesões bilaterais
na base da ponte que acarretam quadro motor puro na forma de tetraparesia e
diplegia facial, com manutenção exclusiva da motilidade ocular extrínseca e
preservação do nível e conteúdo da consciência. Este quadro é chamado de
“síndrome do cativeiro”. É uma condição grave, irreversível e frequentemente
causada por hemorragia ou mielinólise pontina (este último pode ser causado por
reposição inadequadamente rápida de sódio nos casos de hiponatremia).

D. Síndromes mesencefálicas: de forma geral, homolateralmente à lesão pode


haver: déficit do 3° nervo craniano. Contralateralmente, pode haver: hemiparesia
completa, tremor (será discutido no problema 7, este tremor é chamado “tremor
rubral”: com amplitude alta e frequência baixa, acentuando-se na ação) e ataxia
apendicular. Havendo envolvimento do teto mesencefálico, há comprometimento do
olhar conjugado para cima. Cabe destacar a síndrome de Parinaud, resultante de
lesão do teto mesencefálico: ocorre paralisia do olhar vertical para cima, déficit de
convergência pupilar e pupilas fixas. A principal causa desta síndrome é o tumor de
glândula pineal.

- Em todos estes casos, se a lesão envolver a formação reticular ativadora


ascendente (estrutura importante na manutenção da vigília), localizada no tegmento
pontomesencefálico, o paciente terá rebaixamento do nível de consciência, inclusive
podendo chegar ao coma. Cabe destacar que naqueles pacientes com coma de
instalação rápida, que não seja justificado por alterações tóxico-metabólicas e que
tenham uma tomografia computadorizada de crânio normal (este exame é pouco
sensível para identificar lesões de tronco encefálico), é muito provável que tenham
lesão em tronco encefálico.

4. Citar os diagnósticos sindrômico e topográfico deste paciente.

- Diagnóstico sindrômico: Síndrome mesencefálica, pois o paciente tem déficit de III


nervo craniano de um lado e hemiparesia completa do outro. Embora não seja
obrigatório conhecimento dos epônimos, só por curiosidade esta é a síndrome de
Weber.
- Diagnóstico topográfico: mesencéfalo à direita, pois o déficit do III nervo é
homolateral à lesão.

5. Citar a possível etiologia, com base na história clínica.

Considerando a instalação aguda, pois acordou com o déficit, a etiologia deste quadro
é vascular.

PROBLEMA 6:

CONTEÚDO EDUCACIONAL:

1. Diagnóstico diferencial entre as ataxias vestibular, sensitiva e cerebelar.


2. Anatomia e fisiologia do cerebelo.
3. Anatomia e fisiologia do sistema vestibular.
4. Semiologia da coordenação, equilíbrio e marcha.
5. Principais causas das ataxias vestibulares, cerebelares e sensitivas.

OBJETIVOS EDUCACIONAIS:

1. Elaborar os diagnósticos sindrômico e topográfico dos quadros descritos no


problema, diferenciando as ataxias de origem vestibular, sensitiva e cerebelar.

- Este problema aborda as alterações clínicas que envolvem a coordenação motora


e/ou o equilíbrio.
- A manutenção do equilíbrio corporal depende da integração de informações
sensoriais provenientes dos sistemas visual, vestibular e proprioceptivo em núcleos
vestibulares do tronco encefálico, sob a coordenação do cerebelo. O objetivo final da
função do equilíbrio é estabilizar o campo visual e manter a postura ereta.
Considerando as estruturas citadas, para conhecimento do controle do equilíbrio é
importante o conhecimento da anatomia e fisiologia das seguintes regiões: sistema
vestibular, vias proprioceptivas e o cerebelo, especialmente as porções denominadas:
arquicerebelo e paleocerebelo.
- A coordenação dos movimentos tem participação fundamental da porção filogenética
mais recente do cerebelo: o neocerebelo. O neocerebelo funciona como um “assessor”
ao lobo frontal para determinados parâmetros do movimento. Quando um indivíduo
programa uma determinada ação através do córtex cerebral pré-motor (lobo frontal),
antes de executá-lo, esta região envia fibras ao neocerebelo, “perguntando” ao mesmo
qual velocidade e grau de contração mais adequado para aquele movimento. Este
controle é continuamente realizado, tanto antes de iniciar o movimento como durante o
mesmo. Desta forma, é fundamental uma revisão anatômica e fisiológica desta região.
- As alterações envolvendo o equilíbrio e/ou a coordenação motora de um indivíduo
são denominadas ataxias. Os pacientes com ataxia podem se apresentar com uma ou
mais das seguintes queixas:

A. Tonturas: sensação de perturbação do equilíbrio corporal. É um dos


sintomas mais prevalentes no mundo, presente em mais de 10% da população
mundial, sendo mais incidente em adultos e idosos. Mais de 40% dos adultos
relatam sua ocorrência em alguma época de suas vidas (GANANÇA,
CAOVILLA, 1998). É importante ressaltar ao médico generalista que nem todas
as tonturas estão associadas às ataxias, embora as vestibulopatias sejam as
etiologias mais frequentes. A sensação de tontura também pode decorrer de
hipoperfusão encefálica (pré-síncopes ou arritmias) ou de causa psicogênica
(nos ataques de pânico que ocorrem nos transtornos de ansiedade, por
exemplo), mas estas duas situações não estão no escopo deste problema.

B. Vertigem: é uma alucinação de movimento. A vertigem pode ser: objetiva


(percepção de movimento dos objetos e/ou do ambiente ao redor) ou subjetiva
(percepção de movimento do próprio corpo).

C. Dificuldade de marcha e desequilíbrio: variável ou não com o uso da visão.

D. Dificuldade de pegar objetos de forma adequada: decorre de uma


incoordenação dos movimentos finos, acarretando falta de destreza dos
movimentos. É importante ressaltar que isto é bem diferente da queixa de
“fraqueza” ou de “déficit de força”, presentes nas síndromes discutidas nos
problemas anteriores.

- As ataxias podem ser de origem: vestibular, sensitiva e cerebelar. Há ainda


as de origem frontal, que não precisa ser discutida neste problema, pois será
melhor abordada durante a discussão sobre as síndromes demenciais. O
diagnóstico diferencial é determinado pelos sintomas e o exame neurológico,
especialmente nos itens que avaliam o nistagmo, equilíbrio, coordenação e
marcha. É importante que o médico generalista saiba que o conhecimento do
tipo de ataxia determinará quais exames complementares serão solicitados e o
tipo de tratamento a ser realizado. Em alguns casos, poderá ter a consultoria
de um otorrinolaringologista, e em outros, a de um neurologista.

A. Ataxia vestibular

- Nesta ataxia, os pacientes queixam-se predominantemente de tonturas,


vertigem e desequilíbrio postural, tanto estático (quando parado em posição
supina) quanto dinâmico (quando em movimento). Nas disfunções de origem
periférica há presença importante de sintomas autonômicos, como náuseas
e/ou vômitos, podendo acarretar desidratação do paciente. A lesão ou
disfunção ocorre no sistema vestibular, ou na sua porção periférica (labirinto
e/ou ramo vestibular do VIII nervo craniano) ou na porção central (núcleos
vestibulares do tronco encefálico e/ou conexões com o cerebelo, córtex
cerebral ou fascículo longitudinal medial). É importante distinguir se a ataxia
vestibular é periférica ou central porque as etiologias de cada subtipo são de
diferentes gravidades. As doenças que acarretam ataxia vestibular central
usualmente são mais graves e exigem internação por mais tempo, ao contrário
das que causam o tipo periférico.
A tabela abaixo mostram as diferenças de sinais e sintomas encontrados nas
ataxias periféricas e centrais:

ATAXIAS VESTIBULARES ATAXIAS VESTIBULARES


PERIFÉRICAS CENTRAIS

DESVIO POSTURAL * Persistentemente para um lado, * Tendência a queda para frente


modificando a direção da queda ou para trás
conforme mudamos a posição da
* Teste dos braços estendidos:
cabeça
queda de um ou ambos os braços
* Teste dos braços estendidos: e desvios não conjugados
desvio conjugado dos braços

* Marcha em estrela de Babinski-


Weil

VERTIGEM Mais intensa Menos intensa

SINTOMAS Presentes Ausentes


AUTONÔMICOS
(NÁUSEAS,
VÔMITOS,
SUDORESE)

SINTOMAS E Ausentes Presentes (diplopia, dismetria e


SINAIS DE decomposição de movimentos,
DISFUNÇÃO DO disfagia, paralisia facial periférica,
TRONCO dormência em hemiface e/ou
ENCEFÁLICO OU DE incoordenação de movimentos,
CEREBELO por exemplo)

SINTOMAS Presentes (zumbido, hipo ou Ausentes


AUDITIVOS anacusia)

PADRÃO DE * Latente (demora entre 2s e 30s * Não há latência


NISTAGMO para surgir)
* Não há fadigabilidade
* Fadigável (cessa após um
tempo de até 40 s) *Movimento puramente
horizontal ou vertical
* Movimento rotatório e
* Não esgota com a fixação visual
horizontal

* Esgota com a fixação visual

B. Ataxia sensitiva

- Nestes casos, a tontura referida pelos pacientes vem associada à dificuldade de


marcha, principalmente nas situações em que não é possível usar o sistema visual
como, por exemplo, nos ambientes sem luminosidade. As lesões ou disfunções
ocorrem nas fibras proprioceptivas (presentes nos nervos periféricos) ou no funículo
posterior da medula espinhal, onde se encontram os fascículos grácil e cuneiforme.
- Os pacientes apresentam os seguintes sinais:
A. Tendência a queda sem direção preferencial e disbasia quando fecha os
olhos. Esta alteração configura o clássico sinal de Romberg.
B. Nas provas do índex-nariz e calcâneo-joelho, usados para avaliar a
coordenação dos movimentos, o paciente faz estas manobras de maneira
adequada quando está de olhos abertos. Contudo, ao fechar os olhos, passa a
apresentar dismetria e decomposição dos movimentos.
C. Marcha talonante: O paciente caminha com a base alargada, olhando para o
solo, e a perda da noção da proximidade do chão em relação aos pés, faz com
que ele os arremesse para diante e bata-os com força no chão.
D. Perda da propriocepção: diminuição ou ausência da sensibilidade vibratória
e perda da noção cinético-postural nos segmentos afetados.
E. Arreflexia: diminuição ou perda dos reflexos miotáticos nos segmentos
afetados.
F. Ausência de nistagmo.

C. Ataxia cerebelar:

- Os pacientes com ataxia cerebelar apresentam alterações na marcha, equilíbrio e


coordenação motora, mesmo com olhos abertos, não sendo usual se queixarem de
tontura. Os sintomas e sinais decorrem de lesão ou disfunção do cerebelo e suas
conexões. As alterações nos hemisférios cerebelares acarretam os sinais
apendiculares, sendo homolaterais às lesões. Aquelas que ocorrem na porção central
cerebelar, chamada vérmis, causam os sinais axiais.

A. Sinais apendiculares: estes sinais ocorrem homolateralmente à lesão


cerebelar.
- Dismetria: o paciente erra o objeto-alvo.
- Decomposição dos movimentos: ocorre nos membros e nos movimentos
oculares.
- Disdiadococinesia: incapacidade de realizar movimentos alternados.
- Tremor intencional: acentuação do tremor quando se aproxima do objeto-
alvo.
- Hipotonia

B. Sinais axiais:
- Disbasia: mesmo de olhos abertos, o paciente mantém base de sustentação
alargada
- Marcha cerebelar: o paciente caminha de forma cambaleante e com passos
irregulares, ora pequenos, ora grandes. Mantém as pernas afastadas,
configurando a disbasia.
- Ataxia de tronco: ocorre mesmo de olhos abertos, apresentando balanço para
os lados ou de frente para trás, o que acarreta contração dos tendões dos pés
(“dança dos tendões”).
- Dissinergia tronco-membros: quando o paciente está em decúbito dorsal e
tenta elevar a cabeça, há elevação das coxas de modo que ele não consegue
completar o movimento.
- Fala escandida: é um tipo de disartria, com fala lenta, hesitante, de pausa
inadequada e sílaba prolongada.

- Considerando os tipos de ataxia abordados acima e adicionando-se o que foi


aprendido dos problemas anteriores, é possível definirmos os diagnósticos sindrômico
e topográficos dos dois casos acima.

- Caso 1:
Diagnóstico sindrômico: síndrome atáxica vestibular periférica
Diagnóstico topográfico: labirinto do lado direito (nistagmo mais acentuado
à direita e desvio postural para a direita)

- Caso 2:
Diagnóstico sindrômico: síndrome atáxica sensitiva
síndrome piramidal (hiperreflexia dos membros
inferiores e sinal de Babinski bilateral)
Diagnóstico topográfico: funículos posterior e lateral da medula espinhal
(fascículos grácil e cuneiforme e tratos
corticoespinhais laterais)

Obs.: O problema objetiva discutir sobre o diagnóstico diferencial das


ataxias. Por isso, é importante que os estudantes identifiquem, com base
no exame neurológico, as diferenças das ataxias nos dois casos.
Contudo, utilizando conhecimento prévio adquirido após as discussões
dos problemas anteriores, espera-se que eles também identifiquem a
presença da síndrome piramidal (ou de neurônio motor superior) neste
segundo caso.

2. Revisar a anatomia e fisiologia básica do cerebelo.

- O cerebelo faz parte do sistema nervoso suprasssegmentar.

- Diferente do sistema segmentar, a substância cinzenta envolve a branca.


Mergulhado em sua substância branca, há núcleos de substância cinzenta com
funções específicas (denteado, emboliforme, globoso, fastigial). Ele difere
citologicamente do cérebro por ter uma citoarquitetura mais simples e também,
fisiologicamente, por atuar no nível involuntário e inconsciente.

A. HISTOLOGIA:

O cerebelo possui as seguintes camadas (da superfície para o interior) (Figura 1):

* Camada Molecular – É constituída pelas células estreladas em cesto, além de fibras


na direção paralela. As células em cesto têm prolongamentos que envolvem as células
de Purkinje.
* Camada de células de Purkinje (célula básica do cerebelo) - é a mais importante,
seus dendritos se ramificam na camada molecular e seu axônio se dirige às camadas
mais profundas do cerebelo, terminando nos núcleos profundos, com ação inibitória
sobre estes.
* Camada Granular - Composta por células granulares, as menores do corpo humano
e com citoplasma escasso. Seus axônios sobem em direção à camada molecular e lá
se bifurcam para constituir as fibras paralelas, que fazem sinapse com os dendritos
das células de Purkinje. Assim, as células granulares fazem sinapse com várias
células de Purkinje. Nesta camada, há também a célula de Golgi.

- Fibras que penetram no cerebelo e se dirigem ao córtex deste:

- Fibras Musgosas: Ao penetrarem no cerebelo vindo de outras áreas encefálicas,


fazem sinapse com os núcleos profundos, exercendo função excitatória sobre seus
neurônios. Em seguida, dirigem-se para a camada granular, onde também exercem
função excitatória sobre as células granulares. Estas, por sua vez, atuam sobre as
células de Purkinje. Das células de Purkinje, partem fibras que exercem efeitos
inibitórios sobre os núcleos profundos. Destes, partem as vias eferentes do cerebelo.

- Fibras Trepadeiras: São axônios de neurônios situados no complexo olivar inferior.


Terminam enrolando-se sobre os dendritos das células de Purkinje, exercendo ação
excitatória sobre esta.

- Neurotransmissores:
Células de Golgi, Células em Cesto, estreladas e Células de Purkinje: GABA
(inibitório).

Células granulares: glutamato (excitatória).

Figura 1: Aspecto microscópico do cerebelo (Fonte: Ângelo Machado,


Neuroanatomia Funcional,1ª ed., 1988)

Núcleos profundos (Figura 2):

* Núcleo Denteado: mais lateral e maior, nele se projetam os axônios das células de
Purkinje dos hemisférios cerebelares. É o núcleo mais recente filogeneticamente,
contribuindo com o controle dos movimentos finos das extremidades do corpo.

* Núcleo Fastigial: próximo à linha média e menor. Nele estão projetados os axônios
das células de Purkinje da zona medial. É o mais antigo filogeneticamente e
responsável pelo controle da musculatura axial do corpo.

Entre os dois, temos o globoso e o emboliforme, semelhantes em estrutura e função,


por isso, recebem o nome de núcleo interpósito. Neles, projetam-se os axônios das
células de Purkinje da zona intermediária, tendo um papel no controle motor das
raízes dos membros e no controle do movimento ocular.
Figura 2: Núcleos profundos do cerebelo (Fonte: Frank
Netter, Atlas de Anatomia, 2000).

B. TRATOS CEREBELARES AFERENTES:

- Trato olivocerebelar: envolvido na aprendizagem motora: realização de determinada


tarefa com velocidade e eficiência cada vez maior, quando ela se repete várias vezes.

- Trato vestibulocerebelar: para o lobo floculonodular: transmite informações sobre a


posição do segmento cefálico para os ajustes posturais e do equilíbrio.

- Trato espinocerebelar anterior: entra pelo pedúnculo cerebelar superior e vai até o
córtex do paleocerebelo. Através dele o cerebelo recebe informações oriundas do trato
corticoespinhal, modulando a função deste.

- Trato espinocerebelar posterior: entra pelo pedúnculo cerebelar inferior e vai até o
córtex do paleocerebelo. Transmite informações oriundas dos proprioceptores (fusos
musculares, órgãos tendinosos de Golgi e terminações das cápsulas articulares)
avaliando o grau de contração muscular, tensão nas cápsulas articulares e tendões,
posição dos membros em relação ao corpo e velocidade destes.

- Trato pontocerebelar: penetra no cerebelo pelo pedúnculo cerebelar médio, tem


origem nos núcleos pontinos e vai ao córtex do neocerebelo (hemisférios cerebelares).
Compõe a via corticopontocerebelar, trazendo informações do córtex pré-motor sobre
o movimento planejado e enviando de volta as correções necessárias, após passar
pelo núcleo denteado.

C. TRATOS CEREBELARES EFERENTES:

C.1. Zona medial:


- Fibras fastigiovestibulares: exercem influência sobre os neurônios do grupo medial
da coluna anterior da medula espinhal que, por sua vez, controlam a musculatura axial
e proximal dos membros, mantendo o equilíbrio e a postura.

- Fibras fastigiorreticulares: função semelhante às fibras fastigiovestibulares.

C.2. Zona intermediária:

- Via interpósito-rubroespinhal: devido a sua simplicidade, esta via tem pouca


influência nos seres humanos. Provavelmente exerce influência sobre os movimentos
dos membros superiores.

- Via interpósito talamocortical: exerce influência sobre os neurônios motores do grupo


lateral da coluna anterior da medula espinhal que, por sua vez, controlam os músculos
distais dos membros responsáveis pelos movimentos delicados.

C.3. Zona lateral:

- Via dentatotalamocortical: do núcleo denteado, os impulsos seguem para o tálamo do


lado oposto e, daí, para as áreas motoras do córtex cerebral, responsáveis pelos
movimentos delicados.

D. FUNÇÕES DO CEREBELO:

A. Manutenção do equilíbrio e postura: através do arquicerebelo (lóbulo


floculonodular) e do vérmis, exerce controle sobre o tônus dos músculos axiais e sobre
os proximais dos membros, mantendo o indivíduo equilibrado seja quando está de pé,
seja quando caminha.

B. Controle dos movimentos voluntários: participa das correções dos


movimentos planejados tanto antes de seu início como durante os mesmos. O
planejamento é realizado no córtex pré-motor (lobo frontal), tendo a participação do
neocerebelo através de correções realizadas tanto antes do início do movimento (via
corticoponto - cerebelo – dentato – talamocortical) como após o início deste (as vias
espinocerebelares enviam informações ao núcleo interpósito e este envia os impulsos,
através do tálamo, ao córtex motor).

C. Aprendizagem motora: ao realizarmos um movimento várias vezes, este


cada vez é mais rápido e necessita de menos correções. As fibras olivocerebelares
participam desta função. No córtex cerebelar, estas informações chegam através das
fibras trepadeiras, fazendo sinapse diretamente com as células de Purkinje.

3. Revisar a anatomia e fisiologia básica do sistema vestibular

- O aparelho vestibular tem a função de informar ao sistema nervoso central sobre a


direção dos movimentos cefálicos e a posição da cabeça.
Ele é composto por um sistema de tubos, ossos e câmaras na parte petrosa do osso
temporal, denominado labirinto ósseo. Dentro deste, há um sistema de tubos e
câmaras membranosas (labirinto membranoso), que é a parte funcional desse
aparelho. O labirinto membranoso é composto pela cóclea, três canais semicirculares
(anterior, posterior e lateral) e duas grandes câmaras (o sáculo e o utrículo) (Figura 3).
- A cóclea é a principal área sensorial para a audição. Não será aqui nosso tema de
estudo.
- O utrículo e o sáculo informam sobre movimentos de aceleração linear da cabeça,
para frente ou para trás, para cima ou para baixo (por exemplo, quando descemos em
um elevador ou quando um avião está decolando). Localizada na superfície interna de
cada sáculo e utrículo, existe uma pequena área sensorial de 2 a 3 mm de diâmetro
denominada mácula. Esta área responde a estímulos mecânicos decorrentes da
movimentação cefálica linear, a qual gera deslocamento da endolinfa presente no
labirinto membranoso. A mácula do utrículo se localiza no plano horizontal e exerce
seu papel quando a pessoa está na posição ereta. Já a mácula do sáculo se localiza
no plano vertical, sendo importante no equilíbrio quando a pessoa está deitada. Cada
mácula é recoberta por uma substância gelatinosa na qual estão imersos pequenos
cristais de carbonato de cálcio, denominados otólitos (Figura 4). Na mácula há
milhares de células ciliadas que projetam seus cílios na camada gelatinosa. Estas
células são receptores sensoriais e fazem sinapses com fibras do VIII nervo craniano.
As células ciliares possuem os estereocílios e o cinocílio (maior), que está em uma
das extremidades da célula. Estes estão ligados entre si por fino filamento. Assim, se a
movimentação dos cílios se dá na mesma direção do cinocílio, ocorre a abertura de
centenas de canais em cada membrana ciliar para o íon sódio, acarretando uma
despolarização. Contudo, se os cílios se movimentam em direção oposta à do
cinocílio, ocorre fechamento dos canais iônicos e, como consequência, uma
hiperpolarização. Em repouso, as fibras que saem das células ciliares transmitem
impulsos nervosos contínuos. Se os cílios se dobram em direção ao cinocílio, o tráfego
de impulsos aumenta muito. Se os cílios se dobram em direção oposta, este tráfego de
impulsos diminui muito, ocorrendo, por vezes, uma supressão.
Em cada mácula, as células ciliadas estão orientadas em várias direções. Assim,
algumas são estimuladas quando a cabeça se curva para frente, outras quando se
curva para trás, outras se a cabeça se curva para um lado, por exemplo.
- Os canais semicirculares são três: anterior, posterior e lateral, formando ângulo reto
entre si e representando os três planos espaciais. Eles informam sobre os movimentos
angulares cefálicos (direção e velocidade). Cada canal apresenta uma dilatação em
uma de suas extremidades: a ampola. (Figura 3). A ampola contém em seu interior
um líquido viscoso: a endolinfa. O fluxo da endolinfa de um dos canais em direção à
sua ampola excita o órgão sensorial desta: a crista ampular. Na parte superior da
crista ampular existe uma massa gelatinosa (a cúpula). Durante um determinado
movimento, esta endolinfa fica parada e o movimento das paredes de determinado
canal semicircular causa um fluxo do líquido para a ampola, acarretando
encurvamento da cúpula para um lado. As células ciliadas localizadas ao longo da
crista ampular projetam para o interior da cúpula centenas de cílios, dentre eles o
cinocílio, e mecanismo semelhante ao descrito anteriormente para mácula volta a
ocorrer, e determinado impulso trafega pelo nervo vestibular para alertar o sistema
nervoso central sobre as variações da velocidade, direção e da rotação da cabeça nos
três diferentes planos espaciais.
Figura 3: Labirinto membranoso

Figura 4: Estrutura da mácula (Fonte: Roberto Lent. Cem Bilhões de


Neurônios, 2002)

- A porção periférica do sistema vestibular é composta pelo labirinto e o ramo


vestibular do VIII nervo craniano. Este penetra no tronco encefálico através da
ponte, estabelecendo conexões com os núcleos vestibulares, localizados no
assoalho pontino. Destes núcleos, partem fibras às seguintes regiões (Figura
5):
1. Cerebelo: chegam ao lobo floculonodular, que compõe o arquicerebelo, já
citado antes.
2. Fascículo longitudinal medial: é um conjunto de fibras localizado na região
pontomesencefálica, que conecta os núcleos dos nervos responsáveis pela
motricidade ocular (III, IV e VI nervos cranianos), permitindo os movimentos
oculares conjugados. Graças a esta conexão, os olhos movimentam-se de
forma harmoniosa com os movimentos cefálicos (reflexo oculovestibular),
fixando os objetos de forma adequada, mesmo quando estes ou o paciente
estão se movimentando. Esta interação é a responsável pela geração do
nistagmo (movimento oscilatório e rítmico dos olhos) tanto fisiológico quanto o
patológico.
3. Medula espinhal: através do trato vestibuloespinhal, há ajustes reflexos da
musculatura axial do corpo de acordo com a movimentação cefálica, evitando
quedas.
4. Córtex cerebral: as fibras chegam ao córtex cerebral, permitindo a
conscientização do indivíduo com relação à posição da cabeça e à direção do
movimento cefálico. Estudos demonstraram que a porção do córtex que recebe
informações vestibulares está localizada no lobo temporal, lobo parietal inferior
e lobo da ínsula posterior.

Figura 5: Conexões centrais do sistema vestibular

Obs.: A anatomia e fisiologia do sistema proprioceptivo, um dos possíveis


protagonistas das ataxias, já foi discutido durante o fechamento do problema 4,
durante a revisão da anatomia da medula espinhal.
4. Descrever a semiologia do equilíbrio, coordenação e marcha.

- Para avaliação adequada dos pacientes com ataxia, é importante que o


estudante reveja a forma de examinar o equilíbrio, coordenação e marcha
durante o exame neurológico.

A. Equilíbrio: há muitas formas de se testar o equilíbrio, mas os testes abaixo são os


mais utilizados na prática clínica.

A.1. Equilíbrio estático:

* Teste de Romberg: o paciente é mantido em posição ortostática, com


calcanhares unidos e pontas dos pés afastados a 30°, com os braços ao longo
do corpo em posição anatômica. Depois, pede-se para que o mesmo feche os
olhos por um minuto. Se houver dúvidas no achado, pode-se sensibilizar o
teste pedindo-se ao paciente que coloque um pé à frente do outro em linha reta
(Manobra de Romberg-Barré).
Possíveis achados:
- Pacientes sem alterações: não há queda nem de olhos abertos nem de
olhos fechados por um minuto
- Ataxias vestibulares periféricas: queda com lateralização para esquerda ou
direita, mudando a direção da queda conforme rodar sua cabeça para a direita
ou esquerda, pois muda a posição dos canais semicirculares do labirinto.
- Ataxias vestibulares centrais: queda para frente ou para trás.
- Ataxias cerebelares: disbasia e queda com lateralização para esquerda ou
para direita já de olhos abertos, sem mudar a direção da queda com a rotação
da cabeça.
- Ataxias sensitivas: sem quedas de olhos abertos; disbasia, oscilação e
queda do tronco logo após fechar os olhos, sem haver direção preferencial.

* Braços estendidos: o paciente é mantido em posição ortostática, com os


braços estendidos à sua frente, paralelos entre si, com seus indicadores
apontando para os indicadores do examinador, que fica diante dele. Pede-se
ao paciente que feche os olhos.
Possíveis achados:
- Pacientes sem alterações: sem queda dos braços após um minuto.
- Ataxias vestibulares periféricas: desvio conjugado dos braços para o lado
lesado, modificando a direção conforme a rotação cefálica.
- Ataxias vestibulares centrais: desvio não conjugado ou queda de um ou
ambos os braços.
- Ataxias cerebelares: desvio não conjugado dos braços e disbasia já de
olhos abertos.
- Ataxias sensitivas: sem alterações de olhos abertos, apresentando disbasia
e queda sem direção preferencial após fechar os olhos.

A.2. Equilíbrio dinâmico: os testes abaixo são úteis para pacientes com suspeita de
ataxia vestibular, seja periférica ou central. Os achados anormais referentes aos
outros tipos de ataxia já podem ser encontrados nos testes do equilíbrio estático.
* Teste de Babinski-Weil: utilizado para detectar se o paciente apresenta a
“marcha em estrela de Babinski-Weil”, específica das ataxias vestibulares
periféricas. Pede-se ao paciente que caminhe em linha reta, de olhos fechados,
para frente e para trás, um percurso de 1,5 metros. Em pacientes normais, não
há desvio. Naqueles com ataxia vestibular periférica, há desvio da marcha para
o lado lesado, mantendo a mesma lateralização preferencial seja quando
caminha para frente, seja quando caminha para trás. Se mudarmos a direção
de sua caminhada, desviará para o mesmo lado, formando um desenho de
“estrela” no chão (Figura 6).

Figura 6: Desenho mostrando o percurso que o paciente com


vestibulopatia periférica faz durante o teste.

* Teste de Fukuda: pede-se ao paciente que marche com os braços


estendidos e olhos fechados, elevando os joelhos a 45° e sem deslocar-se
para frente. A marcha deve ser executada por um minuto. Em pacientes sem
alterações, não há desvios. Naqueles com ataxia vestibular periférica, há
desvio conjugado dos braços em angulação acima de 30°. Naqueles com
ataxia vestibular central, há desvio não conjugado dos braços.

B. Coordenação

B.1. Coordenação apendicular

B.1.1 Prova índex-nariz: pede-se ao paciente que mantenha seus braços


abduzidos e toque a ponta de seu nariz com o indicador sucessivas vezes. Faz
inicialmente de olhos abertos e, depois, continua o movimento de olhos
fechados.
B.1.2. Prova calcâneo-joelho: com paciente deitado, pede-se que ele eleve
uma das pernas, toque o joelho da perna contralateral e, em seguida,
escorregue seu calcanhar pela crista tibial. Este movimento deve ser feito
sucessivas vezes, inicialmente de olhos abertos e, depois, de olhos fechados.
Possíveis achados dos testes acima:
Ataxias cerebelares: de olhos abertos, apresenta dismetria, decomposição dos
movimentos e tremor intencional (tremor que se acentua quando se aproxima
do alvo). As alterações são homolaterais à lesão cerebelar.
Ataxias sensitivas: execução normal de olhos abertos, porém com dismetria
após fechar os olhos.
B.1.3. Diadococinesia: capacidade de realizar movimentos sucessivos e
alternados. Há várias formas, mas no teste mais usado, pede-se ao paciente
que realize movimento de pronação-supinação das mãos sobre as coxas. Nas
ataxias cerebelares, ocorre a disdiadococinesia, homolateralmente à lesão.

B.2. Coordenação axial


B.2.1. Pesquisa da dissinergia tronco-membros: com o paciente em
decúbito dorsal, pede-se que ele levante da cama sem o auxílio das mãos. Em
um paciente normal, os músculos posteriores da coxa e os do glúteo agem
como sinergistas fixando os membros inferiores na cama. Em casos de lesões
cerebelares, esta fixação não ocorre e o movimento da cabeça é acompanhado
pela elevação da coxa, dificultando seu levantar.

B.3. Prova do Rechaço (Sinal de Stewart-Holmes)


Mantém-se o paciente sentado e com apoio sobre as costas. Pede-se a ele, de
olhos fechados, para fletir o braço contra a resistência do examinador. Sem
que ele espere, o examinador interrompe a força. O examinador deve proteger
o rosto do paciente com a mão que não estiver usando para testar a força de
flexão do braço. Em pacientes normais, após interromper a resistência haverá
a contração imediata do músculo antagonista (tríceps), impedindo que o
paciente seja atingido pelo seu próprio braço. Entretanto, isto não ocorrerá no
paciente com lesão cerebelar, sendo seu rosto atingido pelo próprio braço, pois
não houve o “freio” adequado.

5. Citar alguns diagnósticos etiológicos dos casos acima com base nos
diagnósticos sindrômico e topográfico.

Caso 1:

* Diagnóstico sindrômico: Síndrome atáxica vestibular periférica


* Diagnóstico topográfico: Labirinto à direita
* Diagnóstico etiológico: pode ser um processo patológico infeccioso, tóxico ou
metabólico.
* Diagnóstico nosológico: diante das hipóteses acima, os possíveis diagnósticos
nosológicos para esta paciente são:

- Vertigem posicional paroxística benigna: é a causa mais provável. O quadro


clínico caracterizado pelos ataques de vertigem, náuseas e vômitos desencadeados
pela movimentação cefálica é típico. Este quadro tem maior incidência após os 40
anos. Em relação à etiopatogenia, a teoria mais aceita atualmente é a de que há um
deslocamento dos otólitos (descritos na histologia acima) para o interior de um dos
canais semicirculares. Este quadro tende a remitir, mas pode durar semanas. O
diagnóstico pode ser feito através de uma manobra que tenta desencadear o nistagmo
e a vertigem, chamada: “manobra de Dix-Hallpike”. A melhor terapêutica consiste em
realizar outra manobra, chamada “Manobra de Epley. Esta manobra é geralmente
realizada por otorrinolaringologistas. Os pacientes ficam um certo período com colar
cervical, para evitar movimentações cefálicas.
Outras causas de ataxias vestibulares periféricas: neuronite vestibular (causa
infecciosa); síndrome de Ménière; traumatismo cranioencefálico; tumor do VIII nervo
craniano (Schwannoma); ototoxicidade (aminoglicosídeos, fenitoína, excesso de
cafeína, álcool e estimulantes, por exemplo).
* Exemplos de causas de ataxia vestibular central: tumor de tronco encefálico;
esclerose múltipla; AVE de tronco encefálico (isquêmico ou hemorrágico).
- Para os estudantes, basta que citem algumas etiologias para as ataxias vestibulares
periféricas e centrais e saibam que nas primeiras, em geral, ocorrem situações clínicas
menos graves que na segunda. Entretanto, os dois tipos de pacientes procuram as
unidades de emergência. Nas ataxias vestibulares periféricas, podemos usar
medicações sintomáticas chamadas antivertiginosas (dimenidrinato, cinarizina,
flunarizina, clonazepam, por exemplo). Entretanto, estas medicações apenas ajudam a
acelerar o natural mecanismo de compensação vestibular, por isso seu tempo de uso
não deve ultrapassar um período de dois meses. Deve-se levar em consideração as
contraindicações e a idade dos pacientes durante a escolha da medicação. Estes
pacientes devem ser encaminhados aos otorrinolaringologistas para melhor
investigação do quadro e, em geral, fazem avaliação de função vestibular (testes feitos
em laboratório), audiometria e exames sanguíneos.
- Nos casos de ataxia vestibular central, o tratamento é direcionado para a causa e é
fundamental a realização de ressonância magnética de encéfalo, pois este exame
radiológico é mais preciso que a tomografia computadorizada de crânio na
visualização do tronco encefálico. São casos acompanhados e tratados por
neurologistas.

Caso 2:

* Diagnóstico sindrômico: Síndrome atáxica sensitiva


Síndrome piramidal (ou de neurônio motor superior)
* Diagnóstico topográfico: Funículos posterior e lateral da medula espinhal
* Diagnóstico etiológico: pela forma de início e evolução do quadro, pensa-se
primeiramente num processo patológico expansivo (tumor ou compressão), mas outra
possibilidade é a de patologia metabólica.
* Diagnóstico nosológico: a presença de um processo tumoral comprimindo os
funículos posterior e lateral da medula deve ser afastado através de uma ressonância
magnética de medula lombossacra. Porém, considerando que o paciente é etilista
crônico e propenso a um déficit alimentar, outra possibilidade é a de deficiência de
vitamina B12 levando a um quadro conhecido como: degeneração combinada
subaguda da medula (pois tipicamente afeta os funículos posterior e lateral da medula
espinhal). Este quadro tem sido uma frequente complicação de pacientes com história
de etilismo crônico. Portanto, os estudantes estarão raciocinando de forma adequada
se pensarem primeiramente do processo tumoral. Neste paciente, é fundamental a
realização de ressonância magnética de medula lombossacra e dosagem sérica de
vitamina B12. Um processo tumoral é tratado cirurgicamente e a deficiência de
vitamina B12 deve ser tratada com reposição parenteral, acarretando ótima resposta
clínica.

PROBLEMA 7:

CONTEÚDO EDUCACIONAL:
1. Classificação dos distúrbios de movimento: hipocinéticos e hipercinéticos.
2. Anatomia e fisiologia dos núcleos da base.
3. Síndrome Parkinsoniana e Doença de Parkinson
4. Coreia de Sydenham.
OBJETIVOS EDUCACIONAIS:

INTRODUÇÃO:

O estudante deverá compreender que estes são problemas onde a obtenção de


dados na história é fundamental para o diagnóstico.
O exame neurológico destes pacientes, embora sempre deva ser completo, deve
focar na observação dos movimentos automáticos (se são adequados ou não),
na pesquisa da força muscular, tônus, reflexos e na busca de movimentos
anormais, cuja descrição dependerá de uma detalhada observação clínica.
Deve saber que a origem destes distúrbios de movimento está nos gânglios da
base, estruturas neuronais subcorticais que participam no controle de alguns
aspectos dos movimentos, ao auxiliar o córtex cerebral motor. Portanto, a
revisão da anatomia e fisiologia destas estruturas é indispensável.

1. Reconhecer e classificar os distúrbios de movimentos, identificando os


aspectos semiológicos importantes destes durante o exame físico.

Os distúrbios de movimento podem sem agrupados em síndromes hipocinéticas e


hipercinéticas.

A. Síndromes Hipercinéticas: a grande maioria destes movimentos ocorrem de


forma involuntária, acentuando-se durante a realização de atos voluntários ou sob
estresse emocional, e cessando durante o sono.

A.1. TREMORES: movimentos rítmicos, oscilantes, motivados por contrações


alternadas de grupos musculares antagônicos. Ocorrem em torno de um plano de
movimento, sendo regulares ou irregulares em frequência e amplitude. Podem
envolver uma ou mais partes do corpo, sendo mais prevalentes nos membros. Devem
ser descritos conforme alguns parâmetros: amplitude (pequena ou grande); frequência
(baixa ou alta); localização; relação com repouso, postura ou ação.
Exemplos de causas: Tremor essencial (é a causa mais comum; tem alta frequência e
pequena amplitude, ocorrendo na postura e na ação); Síndrome Parkinsoniana
(embora ocorra em uma síndrome hipocinética, trata-se de um sintoma hipercinético
decorrente do excesso de atividade colinérgica no corpo estriado; é de baixa
frequência e pequena amplitude, predomina movimento pronação-supinação,
ocorrendo no repouso e diminuindo na ação); Lesões cerebelares (frequência baixa e
grande amplitude; ocorre na ação, acentuando-se quando o segmento se aproxima de
um alvo, por isso denominado “tremor intencional”); Tremor fisiológico exacerbado
(alta frequência e pequena amplitude, presente no repouso e na ação; exemplos:
hipertireoidismo; por estimulantes, como cafeína ou anfetaminas; transtorno de
ansiedade).
Cabe citar algumas opções de tratamento farmacológico: tremor essencial -
propranolol ou primidona; tremor parkinsoniano - mesmo tratamento usado na doença
de Parkinson, será discutido abaixo; tremor cerebelar – clonazepam; tremor fisiológico
exacerbado – retirada da substância causadora e tratamento do hipertireoidismo, se
existente.
A.2. DISTONIA: contrações musculares involuntárias e sustentadas,
determinando posturas anormais das partes afetadas. Ocorre contração simultânea de
músculos agonistas e antagonistas. Podem envolver todo o corpo (generalizada) ou
partes dele (segmentar).
Exemplos de causas:

Formas generalizadas - causas genéticas, com início em crianças ou adultos jovens:


Distonia muscular deformante; Doença de Wilson (defeito em uma proteína
transportadora de cobre); Doença de Segawa (responsiva a levodopa); As opções de
tratamento farmacológico são: anticolinérgicos (triexifenidil ou biperideno), baclofeno
(agonista gabaérgico de ação medular) ou benzodiazepínicos. Na doença de Segawa,
há boa resposta a levodopa. Em alguns casos, pode-se tentar abordagem cirúrgica
através de estimulação cerebral profunda do globo pálido medial.

Formas segmentares ou focais: distonia cervical (torcicolo espasmódico); cãimbra do


escrivão; distonia oromandibular. Para estas formas são usadas aplicações periódicas
de Toxina Botulínica, com alívio das contrações distônicas.

A.3. COREIA: movimentos involuntários irregulares, despropositados, aleatórios


e de não rítmicos. Têm início abrupto e ocorrem de forma não sustentada. A
distribuição corporal é variável, podendo ocorrer de forma generalizada ou afetar
alguns segmentos. Os pacientes muitas vezes tentam incorporar os movimentos
coreicos em seus atos voluntários, tornando-os desajeitados.
Exemplos de causas: Doença de Huntington; Coreia de Sydenham (febre reumática);
Vasculites do SNC (LES, doença de Behçet); Hiperglicemia não-cetótica (geralmente
unilateral); Infarto ou Hemorragia de gânglios da base (unilateral); Medicações
(levodopa, anticoncepcionais, fenitoína, metoclopramida, neurolépticos).
Além da abordagem relacionada à causa da síndrome coreica, há opções de
tratamento sintomático, onde se utiliza bloqueadores dopaminérgicos (haloperidol,
clorpromazina ou olanzapina) ou valproato de sódio.

A.4. ATETOSE: movimentos lentos, serpentiformes, sustentados, de amplitude


um pouco maior que a da coreia. Usualmente apresenta um componente rotatório em
torno de um eixo maior do membro. Ocorre comumente nas porções distais dos
membros.
Exemplos de causas: lesões em gânglios da base no período neonatal ou na
infância (anóxia, encefalopatia bilirrubínica).

A.5. BALISMO: são movimentos despropositados e não sustentados como os


coreicos sendo, contudo, mais amplos e mais “violentos”, acarretando movimentos de
chute ou arremesso, pois afetam predominantemente as porções proximais dos
membros. Ocorrem usualmente de forma unilateral.
Exemplos de causas: lesões do núcleo subtalâmico (hemorragia, infarto, tumor,
por exemplo).
Costuma ser refratário ao tratamento medicamentoso, usando-se como
opções: haloperidol ou valproato de sódio. Há opção alternativa de tratamento
neurocirúrgico, com talamotomia ou estimulação cerebral profunda.
A.6. MIOCLONIAS: são contrações ou relaxamentos musculares súbitos,
breves ( 500ms), semelhantes a choques, que podem envolver porções de um
músculo ou mais de um grupo muscular. Quando decorrem de contrações súbitas, são
chamadas mioclonias positivas (são as mais prevalentes). Se decorrerem de
relaxamento muscular anormal e transitório, são denominadas mioclonias negativas.
Podem ser epilépticas ou não epilépticas. Dentre aquelas não epilépticas, temos as
fisiológicas e as sintomáticas.
Exemplos de causas:
- Mioclonias positivas:
Mioclonias epilépticas: epilepsias generalizadas (usualmente ocorrem após o
despertar).
Mioclonias fisiológicas: mioclonia do sono (surgem quando o indivíduo está
iniciando o sono, desaparecendo durante o mesmo); soluços.
Mioclonias sintomáticas: encefalopatias urêmica e anóxica; doença de Wilson;
encefalopatias priônicas (doença de Creutzfeldt-Jakob, por exemplo); doença
de Alzheimer em fase avançada.
O tratamento sintomático das mioclonias positivas pode ser feito com:
valproato de sódio; clonazepam; levetiracetam (esta droga é usada há mais de
10 anos nos EUA e Europa, porém ainda não padronizada no Brasil).

- Mioclonias negativas: são denominados asterixis, usualmente ocorrendo na


encefalopatia hepática.

A.7. TIQUES: movimentos espasmódicos, estereotipados e coordenados. Os


pacientes têm consciência destes movimentos, conseguindo suprimi-los pela vontade.
Contudo, frequentemente sentem-se compelidos a realizá-los devido a uma sensação
de tensão premonitória, aliviando-se após o movimento. Podem ser motores
(movimentos simples ou complexos envolvendo qualquer parte do corpo) ou vocais
(pigarros, gritos, por exemplo). Os tiques podem ocorrer de forma isolada, entretanto
quando vêm associados a gestos imitativos, ecolalia (repetição da última palavra ou
frase dita por outra pessoa) e coprolalia (obscenidades e palavrões compulsivos)
configuram a síndrome de Tourette, que tem início frequentemente na infância e está
associada a fatores genéticos, decorrendo de disfunções de receptores de dopamina.
Tratamento farmacológico: clonidina; haloperidol.

A.8. DISCINESIAS MEDICAMENTOSAS: podem ocorrer na forma de reações


distônicas agudas ou de discinesias tardias. As reações distônicas agudas usualmente
ocorrem até os primeiros cinco dias de uso de bloqueadores dopaminérgicos
(metoclopramida, risperidona, haloperidol) e consistem em distonia craniocervical, com
trismo lingual e crises oculógiras associadas. O tratamento consiste em suspensão da
droga causadora e uso de anticolinérgico (biperideno) ou diazepam parenteral. As
discinesias tardias inicia-se até os seis primeiros meses de uso da droga causadora,
que consiste usualmente em bloqueadores dopaminérgicos (haloperidol, risperidona,
sulpirida, metoclopramida, cinarizina e flunarizina). Os sintomas consistem em mais de
um tipo de hipercinesia, como distonias focais ou generalizadas e/ou coreias, podendo
persistir até um mês a suspensão da medicação. O tratamento consiste na suspensão
da medicação causadora.
OBS.: É POSSÍVEL QUE OS ESTUDANTES LEIAM TAMBÉM SOBRE OS
TRATAMENTOS SINTOMÁTICOS EMPREGADOS NESTAS
HIPERCINESIAS, ENTRETANTO O OBJETIVO PRINCIPAL ESTÁ EM
DIFERENCIAREM OS TIPOS DE HIPERCINESIAS ATRAVÉS DA
OBSERVAÇÃO CLÍNICA E CONHECEREM ALGUNS EXEMPLOS DE SUAS
RESPECTIVAS ETIOLOGIAS.

B. Síndromes hipocinéticas: o exemplo clássico é a síndrome Parkinsoniana.

B.1. SÍNDROME PARKINSONIANA OU PARKINSONISMO: (Observamos


quatro elementos básicos):
1. Tremor de repouso: é um tremor de baixa frequência e pequena amplitude,
presente durante o repouso, podendo desaparecer durante o sono e ser
suprimido temporariamente durante o movimento e acentuado por estímulos
emocionais. Comumente começa envolvendo as mãos, com ação semelhante
a “contar dinheiro”, em função do envolvimento predominante do movimento de
pronação-supinação. Quando decorre da doença de Parkinson (etiologia
degenerativa) costuma iniciar de forma unilateral e mesmo quando evolui para
a outra mão, ainda se mantém assimétrica.

2. Rigidez postural e apendicular: aumento uniforme e constante da


resistência ao movimento passivo, no deslocamento de uma articulação com o
paciente relaxado (hipertonia plástica ou cérea). Observa-se o sinal da roda
denteada quando a resistência é quebrada periodicamente no deslocamento
passivo do segmento que está sendo examinado.

3. Instabilidade postural: postura fletida e dificuldade de readaptação


postural nos testes de equilíbrio. Para avaliar esta alteração, o paciente deve
ser colocado em pé, de olhos fechados, com o examinador atrás dele. O
médico puxa o paciente para trás na altura dos ombros e abruptamente. Em
condições normais, o paciente conseguirá manter o tronco equilibrado, no
máximo trocando o passo uma vez. Se houver instabilidade postural, ele terá
que dar 2 ou 3 passos para trás para evitar a queda ou cairá.

4. Acinesia: Ocorrem pobreza e lentidão da iniciação e execução de


movimentos voluntários e dificuldade na mudança de um padrão de movimento
para o outro, na ausência de paralisia. Há uma incapacidade em executar atos
motores simultâneos. Também observamos perda de movimentos automáticos
associados na marcha (ausência do balanço passivo de MMSS durante a
caminhada). O paciente apresenta fala hipofônica e monótona. Durante a
escrita, ocorre micrografia. Podemos evidenciar hipomimia facial, com
diminuição do piscamento palpebral bilateral. Ao exame neurológico, podemos
solicitar ao paciente que faça o “finger taps” (toques sucessivos do indicador
sobre o polegar). Se houver acinesia, haverá diminuição progressiva da
velocidade e amplitude dos movimentos, com interrupções bruscas da ação
solicitada.
Se dois destes quatro elementos estiverem presentes, poderemos dar o
diagnóstico de síndrome Parkinsoniana.

2. Revisar a anatomia e fisiologia das vias dos núcleos da base.

Os núcleos da base são um conjunto de núcleos situados em diferentes partes do


encéfalo, que possuem conexões entre si e têm as seguintes funções:

1. Controle motor: controlam a inicialização e sequenciamento dos


movimentos, programando a sequência de contração e relaxamento de cada
músculo e evitando movimentos indesejados. São as alterações desta função
que serão discutidas neste problema.
2. Memória de procedimento: estão envolvidos na memorização das
sequências dos movimentos automáticos, como aqueles envolvidos na
locomoção.
3. Interação entre as emoções e os movimentos: os núcleos accumbens e
amigdaloide contribuem com esta função. O núcleo accumbens, através de
projeções aferentes e eferentes, está envolvido nos comportamentos que
buscam a recompensa e o prazer. Ele tem um papel importante nos circuitos
de recompensa do cérebro, influenciando nas dependências de drogas. O
núcleo amigdaloide, através de projeções aferentes e eferentes, está envolvido
em comportamentos associados ao medo e à raiva. As alterações das funções
destas estruturas não serão discutidas neste problema, estando associados a
transtornos psiquiátricos que serão abordados no módulo 401.
Os núcleos da base apresentam três diferenças importantes em relação ao
cerebelo: recebem apenas aferentes corticais (não há aferentes sensoriais ou
de regiões motoras subcorticais, como no cerebelo); emitem eferentes
exclusivamente para o tálamo; e seus eferentes são inibitórios (e não
excitatórios, como no cerebelo).
São eles: núcleo caudado, putâmen (formam o corpo estriado, a função de ambos é
semelhante), globo pálido (lateral e medial), núcleo accumbens, claustrum,
amígdala, núcleo subtalâmico e substância negra (partes reticulada e compacta).
O globo pálido e o putâmen formam o núcleo lentiforme. Este, em associação ao
núcleo caudado, compõe o neoestriado (Figuras 1 e 2). Os núcleos accumbens e
amigdaloide fazem parte de sistema límbico, envolvido nas reações emocionais
(Figura 3). As funções do claustrum ainda não são plenamente compreendidas.
GLOBO PÁLIDO

NÚCLEO PUTÂMEN
LENTI-
FORME
NEO
ESTRIADO

ESTRIADO
VENTRAL
(NÚCLEO
ACCUM-
BENS)

ESTRIA- CABEÇA DO
TUM NÚCLEO CAUDADO AMÍGDALA
NÚCLEO
CAUDADO CAUDA DO NÚCLEO
CAUDADO

Figura 1: Núcleos da base

Figura 2: Núcleo subtalâmico (Fonte: Roberto Lent, Cem Bilhões de


Neurônios, Ed. Atheneu, 2002).
NÚCLEO
ACCUMBENS
AMÍGDALA

Figura 3: Núcleos accumbens e amigdaloide

- Circuitos dos núcleos da base envolvidos no controle motor

Já há amplo conhecimento sobre as vias aferentes e eferentes dos núcleos da base e


de suas conexões intrínsecas. As aferências corticais projetam-se no corpo estriado
(núcleo caudado e putâmen). Estas aferências são excitatórias tendo, como
neurotransmissor, o glutamato. O núcleo caudado recebe fibras do córtex pré-frontal e
do córtex parietal posterior, tendo importante papel em funções cognitivas. O putâmen
recebe fibras do córtex sensório-motor, tendo importante em funções motoras. As vias
eferentes são projeções de neurônios do globo pálido medial, que têm influência
inibitória sobre núcleos do tálamo. São projeções gabaérgicas. Os núcleos talâmicos
ventral anterior e ventral lateral enviam projeções glutamatérgicas (excitatórias) ao
córtex pré-motor e motor primário. Este, por sua vez, envia o comando final à
execução dos movimentos. Os núcleos talâmicos centromediano e parafascicular
recebem projeções do globo pálido medial e enviam projeções à área motora do giro
do cíngulo, a qual está envolvida em atos motores de conteúdo emocional. Estas
conexões demonstram que os movimentos com conteúdo emocional são controlados
por vias diferentes daquelas que controlam os outros movimentos corporais.
Os circuitos dos núcleos da base e respectivos neurotransmissores envolvidos no
controle motor são mostrados na figura 4.
Figura 4: Anatomia funcional normal dos núcleos da base envolvidos no
controle motor (Fonte: Adams & Victor, Principles of Neurology, 2005)

Há, basicamente, dois circuitos com ações antagônicas: circuito direto e circuito
indireto. O circuito direto começa com projeções dopaminérgicas advindas da
substância negra (parte compacta) e ação excitatória da dopamina sobre receptores
D1 de neurônios do corpo estriado. Isto aumenta a inibição do globo pálido medial,
acarretando uma desinibição dos núcleos talâmicos. Portanto, este circuito é dito
facilitador do movimento. O circuito indireto começa com projeções dopaminérgicas
advindas da substância negra (parte compacta) e ação inibitória da dopamina sobre
receptores D2 dos neurônios do corpo estriado. Este circuito depende de uma
conexão recíproca entre o globo pálido e o núcleo subtalâmico. A inibição dos
receptores D2 acarreta a desinibição do globo pálido lateral, que passa a aumentar a
influência excitatória do núcleo subtalâmico. Este, por sua vez, aumentará sua
influência excitatória sobre o globo pálido medial, acarretando, ao final, um aumento
da inibição sobre os núcleos talâmicos. Portanto, este circuito é dito inibidor dos
movimentos, com participação do núcleo subtalâmico. Os circuitos diretos e indiretos
normalmente agem de forma harmoniosa, havendo predomínio de um ou outro
conforme a demanda do indivíduo (Figura 5).
Figura 5: Núcleos da base: Circuitos direto e indireto do controle motor
(Fonte: Adams & Victor, Principles of Neurology, 2005).

Considerando o conhecimento anatomofisiológico acima, foi possível a descrição dos


modelos de lesões que determinam as síndromes hipocinéticas e hipercinéticas acima.
De forma geral, a lesão ou a hipofunção do circuito indireto acarreta as síndromes
hipercinéticas, ao passo que a lesão ou hipofunção do circuito direto acarreta a
síndrome hipocinética (Figuras 6 e 7).
Figura 6: Modelo funcional das síndromes hipercinéticas ((Fonte: Adams
& Victor, Principles of Neurology, 2005).

Figura 7: Modelo funcional das síndromes hipocinéticas ((Fonte: Adams &


Victor, Principles of Neurology, 2005).
3. Citar os diagnósticos sindrômico e topográfico dos casos acima.

Caso 1: Diagnóstico sindrômico: síndrome parkinsoniana


Diagnóstico topográfico: núcleos da base: substância negra

Caso 2: Diagnóstico sindrômico: síndrome coreica


Diagnóstico topográfico: núcleos da base: lesão de estruturas do
circuito indireto (atualmente acredita-se
que ocorra no putâmen).

4. Discutir a abordagem diagnóstica e tratamento para estes dois pacientes.

A. Caso 1: O paciente do primeiro caso tem diagnóstico de doença de


Parkinson.

1. Aspectos gerais

* A síndrome parkinsoniana, conforme descrito acima, é caracterizada por:


bradicinesia, hipertonia plástica, tremor de repouso e instabilidade postural. A
presença de 2 destes 4 sinais já configura esta síndrome.
* Esta síndrome tem várias etiologias, mas dentre estas, a mais comum é a doença de
Parkinson, que representa 80% dos casos. É importante o reconhecimento de outras
causas porque estas têm aspectos clínicos diferentes, sendo algumas reversíveis e
outras não responsivas à levodopa.
* Causas de síndrome parkinsoniana:
- Doença de Parkinson;
- Medicações: flunarizina, cinarizina, lítio, antipsicóticos (haloperidol,
risperidona);
- Lesões estruturais: infartos subcorticais; tumores em gânglios da base;
TCE (traumas do pugilista, por exemplo) e encefalites;
- Tóxicas: manganês, MPTP (contaminante da heroína);
- Associação com outras doenças degenerativas.

2. Doença de Parkinson

2.1. Epidemiologia

* Estudos americanos demonstram prevalência de 1% de doença de Parkinson em


pessoas acima de 65 anos. No Brasil, há poucos dados estatísticos, porém um
importante estudo realizado na cidade de Bambuí-MG, que avaliou população acima
de 64 anos, encontrou prevalência de 3,3% de doença de Parkinson nestes
pacientes.
* 75 % dos casos são esporádicos e 25% estão relacionados a mutações genéticas, já
tendo sido identificado 13 mutações diferentes até o momento.

2.2. Etiopatogenia
* O modelo atualmente mais aceito para explicar a etiopatogenia da doença de
Parkinson envolve a associação de fatores genéticos a ambientais. Tanto mutações
genéticas quanto fatores ambientais acarretariam disfunção mitocondrial e acúmulo de
proteínas anormais (corpúsculos de Lewy), o que acarretaria deficiência da sinalização
neuronal e morte neuronal. A substância MPTP (presente na heroína) tem sido usada
em modelos experimentais, onde se demonstrou que ela inibe uma das etapas da
fosforilação oxidativa do ciclo de Krebs nas mitocôndrias dos neurônios da substância
negra, contribuindo com parte do entendimento da etiopatogenia.
* O marcador patológico da doença é a diminuição acentuada dos neurônios
nigroestriatais e a presença, nestes, dos corpúsculos de Lewy.
* Estudos já demonstraram que a degeneração que ocorre nos neurônios da parte
compacta da substância negra, embora expliquem os clássicos sintomas motores
descritos, é apenas uma das alterações do processo. A degeneração começa anos
antes, acometendo, em ordem cronológica: núcleos bulbares  bulbo olfatório 
núcleos pontinos  substância negra  córtex cerebral. Isto explica os sintomas que
precedem as manifestações motoras. Provavelmente, o processo degenerativo no
sistema nervoso começa cerca de 7 a 10 anos antes do diagnóstico clínico de doença
de Parkinson.

2.3. Quadro clínico

* De forma geral, na maioria dos casos os sintomas começam entre 40 e 70 anos de


idade, com pico de incidência na sexta década de vida. Entretanto, há casos poucos
frequentes com início em pacientes menores de 40 anos, sendo denominado
Parkinson juvenil.
* Manifestações pré-motoras: são sintomas que podem preceder as alterações
motoras em meses ou anos:
- Anosmia
- Transtorno comportamental do sono-REM: durante o sono - REM, o indivíduo
apresenta normalmente uma atonia muscular para evitar atividades motoras
inadequadas durante os sonhos. Entretanto, neste transtorno, em função da
degeneração de núcleos pontinos, o paciente apresenta intensa atividade
muscular durante os sonhos, os quais usualmente tem conteúdo persecutório e
apresentam situações de perigo. Isso pode acarretar agressões físicas ao
parceiro. Este transtorno pode preceder em anos os sintomas motores da
doença de Parkinson, porém pode estar associado a outras doenças
degenerativas.
- Depressão
- Constipação intestinal
Obs.: Evidentemente estes sintomas podem ter outras etiologias, mas se estas
não forem achadas e os pacientes ainda não estiverem com síndrome
parkinsoniana, devem ser seguidos por longos períodos em função de terem
alta probabilidade de desenvolver os sintomas motores da doença de
Parkinson.

* Em 1992, a partir do estudo anatomopatológico post-mortem realizado em cérebros


de pacientes com doença de Parkinson, o Banco de Cérebro de Londres estabeleceu
os critérios diagnósticos usados atualmente.
CRITÉRIOS DO BANCO DE CÉREBROS DE LONDRES (1992):

A. Critérios de Inclusão

1. Presença de síndrome parkinsoniana associada a três ou mais dos quesitos


abaixo:
- Início unilateral e curso assimétrico dos sintomas
- Presença do tremor de repouso
- Progressão dos sintomas
- Resposta excelente à levodopa
- Resposta à levodopa durando, pelo menos, 5 anos
- Discinesia induzida pela doença: sinal que comprova o processo degenerativo
- Evolução clínica ≥ 10 anos
Desta forma, nota-se a diferença clínica da síndrome parkinsoniana causada
pela doença de Parkinson daquela associada a outras situações,
especialmente pela excelente resposta a levodopa, início unilateral e evolução
assimétrica dos sintomas. Outro aspecto clínico que reforça o diagnóstico da
forma degenerativa é a presença de anosmia, que ocorre em 70% a 80% dos
pacientes.

B. Critérios de exclusão:

- Antecedentes comprovados de TCEs de repetição ou múltiplos AVEs


- Uso de neurolépticos desde o início dos sintomas
- Remissão prolongada dos sintomas
- Persistência de acometimento unilateral por mais de 3 anos (sugere lesão
estrutural)
- Presença de sintomas e sinais não parkinsonianos no início do quadro
(sugerem a presença de outra doença degenerativa que não o Parkinson)
* Disfagia
* Acometimento do sistema nervoso autônomo
* Demência
* Paralisia de movimentos oculares
* Síndrome piramidal
- Pouca resposta a doses elevadas de levodopa

2.4. Tratamento:

A. Medicações usadas: há um arsenal terapêutico que pode ser utilizado,


dependendo do grau de acometimento e idade do paciente. As classes que
podem ser usadas são:

1. Levodopa: é um precursor da dopamina. Tem meia-vida de 90 minutos e deve


ser utilizada até 30 minutos antes da alimentação, principalmente alimentos proteicos,
em função de sua competição com aminoácidos à absorção intestinal. É associada a
inibidores de descarboxilase do sangue periférico (que clivam a levodopa em
dopamina), porque aumentam a disponibilidade da levodopa no sistema nervoso e
diminuem os efeitos adversos da dopamina periférica (náuseas, vômitos e hipotensão
ortostática). São eles: benserazida ou carbidopa.

2. Agonistas dopaminérgicos: em nosso país, os mais usados são: pramipexol e


piribedil, sendo que o primeiro usualmente é mais bem tolerado. Há também a
apomorfina, que é usada por via subcutânea e tem meia-vida de 30 minutos. Embora
não esteja disponível no Brasil, é uma boa opção em casos graves de acinesia ou de
não resposta a levodopa.

3. Inibidores enzimáticos:

A. Inibidores da MAO-B (monoamino-oxidase B): enzima que cliva a dopamina no


sistema nervoso central) Há duas opções: selegilina ou rasagilina.

B. Inibidores da COMT (catecol-ortometiltransferase: enzima que cliva a dopamina


no sangue periférico): a mais usada é a entacapona. É uma boa opção quando os
agonistas dopaminérgicos e/ou a levodopa começam a perder seus efeitos na
evolução da doença. Por isso, só podem ser usadas em associação às duas
medicações citadas.

C. Amantadina: antagonista de receptor de glutamato (NMDA). É usada tanto nas


fases iniciais como em fases avançadas, para tratar as discinesias. As discinesias são
complicações encontradas na fase avançada da doença, decorrente do uso crônico de
agonistas dopaminérgicos e da levodopa. Consistem em movimentos coreicos e
distonias. Provavelmente estão associada à hipersensibilidade de receptores
glutamatérgicos presentes no estriado.

D. Anticolinérgicos: usados em pacientes mais jovens, com sintomas leves, havendo


predomínio de tremores. Há duas opções: biperideno ou triexifenidil.

O algoritmo abaixo representa um fluxograma terapêutico atualizado do


tratamento dos sintomas motores da doença de Parkinson:
TRATAMENTO - ALGORITMO
DIAGNÓSTICO DE DOENÇA DE PARKINSON

SINTOMAS LEVES SINTOMAS COM INCAPACITAÇÃO


E SEM ALGUM GRAU DE OU ATIVO NA
INCAPACITAÇÃO INCAPACITAÇÃO PROFISSÃO OU 
E  70a 70a

IMAO-B OU
AMANTADINA OU AGONISTAS LEVODOPA
ANTICOLINÉRGICOS DOPAMINÉRGICOS
PIORA DOS
PIORA DOS PIORA DOS SINTOMAS
SINTOMAS SINTOMAS

ADICIONAR
ADICIONAR ADICIONAR AGONISTA
AGONISTAS LEVODOPA DOPAMINÉRGICO OU
DOPAMINÉRGICOS ICOMT

Fonte: Ferraz, H. B., Guia Prático para o diagnóstico e tratamento


da Doença de Parkinson, Ed. OMNIFARMA, 1ª ed., 2009

B. Tratamento cirúrgico: é indicado nos casos onde há refratariedade ao tratamento


medicamentoso ou intolerabilidade às doses efetivas destes. As modalidades mais
usadas são: estimulação subtalâmica (a mais usada) e a estimulação do núcleo
ventral intermédio do tálamo (tratamento dos tremores).

C. Sintomas não motores e sua abordagem terapêutica:

* Depressão (ocorre em até 50% dos casos): amitriptilina, sertralina ou


escitalopram.
* Demência (comum após 10 anos de quadro, na fase avançada): rivastigmina.
* Alucinações ou delírios
- Primeiro retirar, se possível, amantadina ou anticolinérgico, se estiver
usando;
- Investigar distúrbios eletrolíticos ou infecções;
- Se não for nenhuma das causas acima: iniciar clozapina (antipsicótico
atípico que não acarreta parkinsonismo).
* Transtorno comportamental do sono-REM: clonazepam.

B. Caso 2: A paciente do caso 2 tem diagnóstico de Coreia de Sydenham.

* A Coreia de Sydenham usualmente inicia-se entre 5 e 15 anos de idade.


* Está associada à resposta autoimune após infecção com estreptococos beta-
hemolíticos do grupo A. Após um período de 1 a 5 semanas após a faringite,
sobrevêm os sintomas de febre reumática aguda. A coreia pode ocorrer entre 1 a 6
meses após a faringite, tanto de forma isolada, como associada a outros sinais da
doença reumática. Cerca de 60% a 80% dos pacientes apresentam cardite
concomitante e 30% têm artrite associada. Na paciente do caso 2, por exemplo, além
dos movimentos coreicos havia evidência clínica de valvopatia cardíaca.
* O quadro é autolimitado na maioria das vezes, com remissão completa entre 9
meses e 2 anos do início dos sintomas. Em 20% dos pacientes pode haver recidiva,
principalmente durante a gravidez ou após uso da algumas medicações, como
anticoncepcionais ou fenitoína.
* Alguns pacientes podem evoluir com manifestações psiquiátricas, principalmente
transtornos obsessivo-compulsivos. Alguns estudos demonstraram uma incidência de
70% de sintomas obsessivo-compulsivos em pacientes com coreia de Sydenham.
* A dosagem do anticorpo anti-estreptolisina O (ASLO) é importante para o
diagnóstico.
* Em relação ao tratamento, podem ser usados: haloperidol ou valproato de sódio, por
até 2 meses. Além disso, preconiza-se a profilaxia com penicilina para evitar ataques
recorrentes.

5. Discutir o prognóstico destes pacientes.

A. Caso 1: Doença de Parkinson


* A doença de Parkinson não é fatal, mas os sintomas progridem ao longo dos anos,
tornando-se grave após 10 a 25 anos, devido à incapacidade motora e cognitiva do
paciente. A taxa de progressão e seu curso variam entre os pacientes acometidos,
agravando-se em menos tempo naqueles cujos sintomas começaram mais
precocemente.
* A mortalidade destes pacientes decorre principalmente de sua predisposição a
pneumonias de repetição, decorrentes da disfagia.
* Nos primeiros 10 anos de quadro, usualmente há boa resposta às medicações
usadas, trazendo uma boa capacidade funcional ao paciente durante um período
razoável. Contudo, estas medicações não impedem a progressão do quadro.
* Nos Estados Unidos, acredita-se que a prevalência deva triplicar devido ao
envelhecimento populacional. As pesquisas mais promissoras têm buscado identificar
o controle da degeneração neuronal, a identificação de possíveis fatores ambientais e
novos genes e novos tratamentos clínicos e cirúrgicos.

B. Caso 2: Coreia de Sydenham


* Diferentemente da etiologia degenerativa vista na coreia da doença de Huntington, o
prognóstico da coreia de Sydenham é excelente, com remissão do quadro entre 9
meses e 2 anos.

6. Discutir o impacto funcional e social destes dois casos.

A. Doença de Parkinson

* A doença de Parkinson apresenta sinais e sintomas que afetam a qualidade de vida


do indivíduo nos aspectos físico, mental/emocional, social e econômico. Na literatura
médica, os sinais e sintomas mais impactantes foram: bradicinesia, tremor, rigidez,
instabilidade postural, distúrbios da marcha, dor, fadiga, depressão, distúrbios
cognitivos e sexuais. (Camargos A.C., et al., 2004).
* A doença de Parkinson acarreta custos econômicos diretos e indiretos. Os custos
diretos decorrem de gastos com hospitalizações, medicações e reabilitação. Os
indiretos decorrem da perda da produtividade, diminuição da renda familiar e
aposentadoria precoce. Alguns trabalhos demonstraram que os custos indiretos são os
principais responsáveis pela sobrecarga econômica e que a aposentadoria precoce é
o principal fator (Schenkman et al., 2001; Keränen et al., 2001).

B. Coreia de Sydenham

* Embora tenha um bom prognóstico, o principal impacto decorrente dos movimentos


coreicos relacionados à coreia de Sydenham é de natureza social. Como acomete
mais frequentemente crianças e adolescentes, a ignorância em relação à natureza
desta hipercinesia pode levar o paciente a um isolamento social ou a ser vítima de
bullying, sendo chamada de “desajeitada” pelos colegas de escola. É importante a
informação sobre esta doença através da educação e, se necessário, fazer
acompanhamento psicológicos destas crianças.

PROBLEMA 8:

CONTEÚDO EDUCACIONAL

1. Conceito de Paroxismos, Crises epilépticas e Epilepsias.


2. Classificação das crises epilépticas.
3. Diagnóstico diferencial com as crises epilépticas.
4. Abordagem diagnóstica de pacientes com epilepsia.
5. Tratamento das epilepsias.
6. Prognóstico e impacto socioeconômico das epilepsias.

OBJETIVOS EDUCACIONAIS
1. Conceituar “paroxismo”, “crise epiléptica” e “epilepsias”.

- Paroxismo: evento clínico caracterizado por manifestações intensas, periódicas ou


não, com início e fim abruptos. Há diversos sintomas na prática clínica que se
comportam como paroxismos Exemplos: crise asmática, síncopes, alguns tipos de dor,
crises epilépticas, crises psicogênicas, parassônias. Portanto, os paroxismos podem
ser epilépticos ou não epilépticos.

- Crise epiléptica: paroxismo caracterizado pela ocorrência transitória de sinais e/ou


sintomas sensoriais, motores, psíquicos e/ou autonômicos decorrentes de atividade
neuronal anormal excessiva ou sincrônica cerebral. Embora possa haver exceções, na
maioria dos eventos ocorre ativação de neurônios corticais.

- Epilepsias: desordem cerebral caracterizada por predisposição duradoura a gerar


crises epilépticas e pelas consequências neurobiológicas, cognitivas, psicológicas e
sociais desta condição. Requer a ocorrência de, pelo menos, uma crise epiléptica, e a
predisposição duradoura citada pode consistir em anormalidade estrutural encefálica
permanente e/ou alterações eletrofisiológicas detectadas pelo EEG. A palavra
“Epilepsia” foi utilizada pela primeira vez por Avicena (980 - 1037 d.C.), no século XI,
sendo originada do verbo grego “Epilambanein”, que significa ser tomado, atacado ou
dominado. As epilepsias têm uma prevalência de cerca de 1% na população. No
Brasil, considerando todos os grupos etários, os estudos epidemiológicos sugerem
como causas principais o AVE isquêmico (17,3%) seguido da neurocisticercose (8,8%)
(Valença MM et al., 2000; Gomes MM et al., 2002; Borges MA et al., 2004).
- É importante ressaltar que embora todo paciente com diagnóstico de epilepsia
tenha crises epilépticas, nem todo aquele que apresenta eventos epilépticos tem,
necessariamente, diagnóstico de epilepsia. Os eventos epilépticos podem representar
sintomas de eventos neurológicos ou não neurológicos agudos, como eventos febris
(principalmente em crianças), distúrbios metabólicos ou tóxicos, além de lesões
encefálicas agudas. Nestes casos, são denominadas “crises sintomáticas agudas”.
É relevante que o clínico tenha esta noção porque os anticonvulsivantes devem,
usualmente, ser prescritos aos pacientes com epilepsia.

2. Classificar e descrever as crises epilépticas (a classificação atualmente usada


é a de 1981, da ILAE). Citar os tipos de crises epilépticas apresentados pelos
pacientes dos 2 casos.

A. Crises parciais (ou focais): resultam da ativação anormal e excessiva de grupos


neuronais localizados em uma região de um hemisfério cerebral. Embora possam
estar associadas a epilepsias genéticas em algumas crianças, a maioria destas crises
decorrem de anormalidades estruturais encefálicas.

A.1. Crises parciais simples (CPS): ocorre preservação da consciência. Podem


ocorrer os seguintes subtipos:

A.1.1. Com sinais motores:


- Clonias: contrações musculares que recorrem de forma regular com intervalos
menores que 1 a 2 s em um segmento corporal. Resultam da ativação do córtex
motor primário contralateral. As clonias podem iniciar em um segmento corporal e
envolver progressivamente segmentos contíguos, o que é denominado marcha
jacksoniana. Este fenômeno está usualmente associado a lesões estruturais.
- Tônica assimétrica: ocorre contração muscular desigual ou assíncrona de
grupos musculares de ambos os lados do corpo, produzindo postura assimétrica. Na
forma mais clássica, o paciente apresenta a “postura de esgrima”. Duram entre 10s e
40s, podendo levar a quedas. Resultam da ativação da área motora suplementar
(córtex frontal medial).
- Versiva: ocorre versão cefálica e ocular para um lado. Resulta da ativação da
área motora ocular contralateral (giro frontal superior).

A.1.2. Com sintomas somatossensoriais: estes sintomas podem ser


denominados de “auras” e auxiliam bastante na localização da área cortical onde
começa a crise.
- Somatossensitivas: parestesias (“formigamento” ou “choques”), dores ou
sensação de movimento envolvendo um segmento corporal em um ou ambos os
lados. Quando envolve um lado, sugere ativação do córtex parietal contralateral.
- Visuais: alucinações visuais simples (faíscas, luzes piscando, estrelas, discos
coloridos, por exemplo) ou complexas (visões de animais ou pessoas, por exemplo);
ilusões visuais (macropsia, micropsia, perseveração da imagem visual, chamada
palinopsia, metamorfopsia: distorção da forma do objeto); amaurose. Todos, exceto a
metamorfopsia, usualmente sugerem ativação do córtex occipital. A metamorfopsia
sugere ativação do córtex parietal.
- Auditivas: alucinações auditivas pouco definidas (som de apito, sussurro ou
badalar de sino). Resultam da ativação do giro temporal transverso ou giro
temporal superior. São diferentes daquelas associadas a transtornos psiquiátricos
(módulo 401), as quais são prolongadas e têm um conteúdo bem definido pelo
paciente, o qual associa a sua realidade.
- Olfatórias: alucinações olfativas, geralmente desagradáveis. Resultam da
ativação da região do uncus (lobo temporal) ou da base do lobo frontal (bulbo
olfatório).
- Gustatórias: alucinações gustativas. Podem resultar da ativação do córtex da
ínsula ou temporoparietal.
- Vertiginosas: sensações de deslocamento ou rotação. Resultam da ativação
do giro temporal superior.
- Abdominais: sensações desagradáveis abdominais que podem ocorrer em
qualquer área do abdome, predominando no epigástrio. Resultam da ativação do
córtex da ínsula.

A.1.3. Com sinais e sintomas autonômicos: rubor facial, piloereção,


bradicardia, por exemplo. Podem ocorrer em crises originadas da ínsula ou do giro do
cíngulo.

A.1.4. Com sintomas psíquicos: podem ocorrer sintomas dismnésicos (deja-vu;


jamais-vu), emocionais (medo, prazer) ou surgimento de pensamentos forçados.
Resultam da ativação estruturas localizadas no lobo temporal medial, como núcleo
amigdaloide ou hipocampo.

A.2. Crises parciais complexas (CPC): ocorre alteração da consciência,


caracterizada por perda completa ou parcial do contato. Na maioria delas ocorrem
movimentos repetitivos, complexos e direcionados a um fim, sendo chamados:
automatismos. Podem se originar dos lobos temporal ou frontal. As do lobo
temporal, também chamadas automotoras, são caracterizadas por automatismos
oroalimentares e manuais (manipulação da própria roupa e/ou de algum objeto com as
mãos), que podem ser seguidos por automatismos mais complexos como “roçar o
nariz” ou deambulação. Em alguns eventos, ocorre postura distônica de um dos
membros superiores (propagação da atividade ictal para os gânglios da base), sendo
contralateral ao foco de origem. Duram de 30s a 3 minutos, podendo haver confusão
pós-crise. As do lobo frontal, também chamadas hipermotoras, são caracterizadas
por automatismos mais amplos e bizarros, envolvendo musculatura proximal dos
MMSS e MMII (o mais comum é o automatismo de pedalar), movimentos pélvicos e
vocalizações. Ocorrem predominantemente durante o sono, frequentemente
agrupadas em dezenas de crises. Duram menos de 1 minuto.
Estas crises podem ou não ser precedidas pelos sintomas somatossensoriais ou
psíquicos descritos acima, sugerindo propagação secundária da atividade ictal ao lobo
temporal ou frontal.

B. Crises secundariamente generalizadas: são as mesmas crises parciais simples


ou complexas, descritas acima, que evoluem para crise tonicoclônica generalizada, em
função da propagação difusa da atividade ictal.

C. Crises primariamente generalizadas: resultam da ativação anormal e excessiva


de grupos neuronais localizados bilateralmente. Usualmente decorrem de
anormalidades genéticas.
C.1. Crises tonicoclônicas (CTCG): são as crises com maior morbidade. São
caracterizadas pela ocorrência de 2 fases: tônica e clônica. Inicialmente ocorre a fase
tônica: há contração tônica inicialmente da musculatura axial, com desvio dos olhos
para cima, evoluindo para contração da musculatura apendicular dos 4 membros. Os
pacientes assumem postura de emprostótono (figura 1) seguida da postura de
opistótono (figura 2). Durante a fase tônica, ocorre um grito resultante da contração da
musculatura torácica expulsando o ar pela glote fechada. Além disso, há dilatação
pupilar, mordedura da borda lateral da língua e apneia. A fase tônica dura entre 10s
e 20s. Após isso, ocorre a fase clônica, caracterizada por clonias generalizadas
inicialmente de frequência alta e evoluindo para redução progressiva desta. Durante
esta etapa, ocorre sialorreia. Ela dura cerca de 40 segundos. Ao final da fase clônica,
pode ocorrer enurese, em função do relaxamento vesical. Estas crises podem
acarretar as seguintes complicações: fratura de vértebra torácica em 5% a 15% dos
casos (deve-se suspeitar disto se o paciente ficar com dorsalgia persistente após a
crise), TCE, laceração da língua, luxação de ombro e pneumonia aspirativa.

Figura 1: CTCG: fase de emprostótono (Fonte: Yacubian EM et al.,


Semiologia de Crises Epilépticas, 2003)
Figura 2: CTCG: fase de opistótono (Fonte: Yacubian EM et al.,
Semiologia de Crises Epilépticas, 2003)

C.2. Crises tônicas: ocorre contração tônica da musculatura flexora cervical,


elevação dos ombros, abdução e rotação externa dos MMSS, podendo haver
extensão dos MMII. Duram até 20s, ocorrendo comumente à noite. Estão usualmente
associadas a epilepsias graves.

C.3. Crises mioclônicas: ocorrem abalos súbitos, não rítmicos e de duração


menor que 500 ms, envolvendo mais frequentemente os MMSS. Ocorrem
predominantemente após o despertar, em 30% dos casos, podem ser desencadeadas
por estímulos luminosos intermitentes.

C.4. Ausências típicas: caracterizadas por perda da consciência com olhar vago,
durando entre 4s e 20s, e de início e término abruptos. A maioria dos casos pode ser
desencadeada pela hiperventilação, sendo esta manobra realizada em cenário de
ambulatório para diagnóstico. São mais frequentes em crianças em idade escolar.

C.5. Ausências atípicas: ocorre comprometimento parcial da consciência,


acompanhadas de perda do tônus muscular facial e cervical, acarretando queda
cefálica. Diferentemente das típicas, não são usualmente desencadeadas pela
hiperventilação, seu início e término é gradual, e ocorrem em crianças com deficiência
mental.

C.6. Crises atônicas: perda súbita do tônus postural, durando entre 1s e 2s,
podendo haver queda ao solo. Ocorrem usualmente em associação a epilepsia
graves. As crianças frequentemente precisam de capacetes para proteção contra as
complicações do TCE.

C.7. Espasmos: ocorre flexão súbita do pescoço e dos 4 membros, com adução
dos MMSS semelhante ao movimento de abraço. São frequentes após o despertar e
usualmente estão associadas a uma síndrome epiléptica que ocorre em lactentes: a
síndrome de West.

Em relação aos pacientes dos casos apresentados:


Caso 1: Mariana tinha crises do tipo ausência típica e apresentou crise
tonicoclônica generalizada.
Caso 2: José tinha crises do tipo parcial simples com aura abdominal que
evoluem para parcial complexa automotora, e também apresentou crises
secundariamente generalizadas.

3. Compreender a fisiopatologia das crises epilépticas.


Há diversos modelos experimentais que objetivam o estudo do mecanismo da
epileptogênese. Esta consiste na transformação de uma célula neuronal normal em
outra com propriedades epilépticas. De forma geral, as crises epilépticas resultam de 2
mecanismos básicos:
A. Hiperexcitabilidade neuronal: por excesso de atividade excitatória ou
diminuição de atividade inibitória.

B. Hipersincronia neuronal: excesso de sincronia da atividade elétrica neuronal.


Obs.: Os estudantes não precisam discutir de forma detalhada este tópico. Basta que
compreendam a ocorrência destes 2 mecanismos.

4. Descrever os diagnósticos diferenciais das crises epilépticas.

1. Síncopes: resultam de hipoperfusão cerebral. Têm duração em torno de 5 a


10 minutos, não há fenômenos motores durante o evento e os pacientes não
apresentam amnésia ou confusão pós-ictal.

2. Parassônias: alterações comportamentais que ocorrem durante o sono, com


duração acima de 2 minutos. Subtipos: sonambulismo, terror noturno e despertar
confusional. Fazem diagnóstico diferencial principalmente com as CPC hipermotoras.

3. Crises de enxaquecas: fazem diagnóstico diferencial com as CPS com


sintomas visuais. Contudo, os sintomas visuais da enxaqueca são comumente
brilhantes (as auras visuais epilépticas são coloridas) e duram de 5 a 60 minutos (as
epilépticas duram segundos), além de serem seguidas pelo cortejo de sintomas típicos
da enxaqueca: cefaleia pulsátil, náuseas, fotofobia e fonofobia.

4. Crises não epilépticas psicogênicas: são eventos frequentemente


confundidos com as crises TCG, mas estão associadas a transtornos psiquiátricos,
especialmente os conversivos e os dissociativos (módulo 401). Estes pacientes
usualmente têm histórico de abuso sexual. Estudos recentes descreveram alguns
sinais clínicos preditivos de eventos psicogênicos: preservação da consciência,
movimentos assincrônicos dos membros, curso flutuante dos fenômenos clínicos e
fechamento palpebral forçado. Apesar disso, frequentemente os pacientes precisam
realizar vídeo-EEG para adequado diagnóstico. O conhecimento destes eventos é
importante porque estes pacientes precisam ser encaminhados ao psiquiatra, e evita-
se o uso desnecessário de medicações antiepilépticas.

5. Citar os exames complementares usados na investigação de pacientes com


epilepsia e as principais causas de epilepsia e crises sintomáticas agudas.

* Exames complementares usados na investigação com epilepsia:


A. Tomografia computadorizada (TC) de crânio: na investigação inicial de todos
os pacientes. Elucida a causa da epilepsia.

B. Ressonância magnética de encéfalo: mais sensível na investigação etiológica


das epilepsias. Detecta lesões sutis não vistas pela TC de crânio

C. Eletrencefalograma (EEG): ajuda na confirmação diagnóstica e classificação do


tipo de síndrome epiléptica. É importante que o paciente também faça durante o sono
porque este aumenta a chance do aparecimento de descargas epileptiformes.

D. Vídeo-EEG: usado em situações especiais. Consiste na monitorização


prolongada dos pacientes para registro simultâneo das crises e do EEG. É importante
para identificação foco de origem das crises naqueles pacientes candidatos à cirurgia
(não responderam aos medicamentos) e no diagnóstico diferencial entre crises
epilépticas e não epilépticas.

* Causas de crises sintomáticas agudas: distúrbios metabólicos (hiponatremia,


hipocalcemia, hipoglicemia); drogas (cocaína, anfetaminas, abstinência por álcool ou
benzodiazepínicos, por exemplo); encefalites; crise tireotóxica; TCE; AVE
hemorrágico.
* Causas de Epilepsia: Alterações genéticas; Tumores cerebrais; Neurocisticercose;
Malformação do desenvolvimento cortical; Esclerose mesial temporal (40% das
epilepsias focais do adulto); Lesões glióticas decorrentes de AVE prévio ou hipóxia
perinatal.

6. Descrever as medicações usadas para as crises epilépticas (principais


medicações usadas, mecanismos de ação e efeitos adversos).

* Principais medicações usadas:

1. Fenobarbital: aumenta inibição gabaérgica. Principais efeitos adversos: sonolência


excessiva, ataxia, contratura de Dupuytren. É um indutor do sistema enzimático hepático p450,
diminuindo nível sérico de outras medicações.

2. Fenitoína: interfere no transporte de sódio; Principais efeitos adversos: nistagmo, ataxia e


confusão mental (dose-dependente), hipertrofia gengival (importante orientar higiene dental
para prevenção), hiperglicemia em diabéticos, distúrbio de condução cardíaca (na
administração intravenosa). É um indutor do sistema enzimático hepático p450, diminuindo
nível sérico de outras medicações. Sua farmacocinética é do tipo não linear, ou seja, se
dobramos a dose, o nível sérico quadruplica. Desta forma, a faixa terapêutica está próxima da
tóxica, o que demanda cuidado no momento de ajustar-se a dose.

3. Carbamazepina: diminui a condutância de canais de sódio e bloqueia receptores de NMDA.


Principais efeitos adversos: sonolência excessiva, tontura, diplopia, hiponatremia ( secreção
de HAD) e leucopenia. É um indutor do sistema enzimático hepático p450, diminuindo nível
sérico de outras medicações.

4. Oxcarbazepina: derivada da molécula de carbamazepina. Os mecanismos de ação


semelhantes, mas os efeitos adversos são menos frequentes por melhor tolerado.
5. Ácido valproico: aumenta a ação gabaérgica. Principais efeitos adversos: náuseas, pirose,
aumento de peso, alopecia (11% dos casos - pode-se corrigir com reposição de zinco e
biotina), síndrome metabólica, plaquetopenia, pancreatite (raro) e hepatotoxicidade (mais
frequente em crianças menores de 2 anos, por isso não se usa nesta idade). Diferentemente
dos anteriores, é um inibidor do sistema enzimático hepático, aumentando o nível sérico de
outras medicações usadas juntamente com ele. Há outra medicação, chamada divalproato de
sódio, com mesmo mecanismo de ação, mas com menos efeitos adversos por ser absorvida
no duodeno e por ter absorção lenta.

6. Etossuximida: inibição de canais de cálcio tipo T talâmicos, sendo, assim, específicos para
as crises de ausência. Principais efeitos adversos: náuseas, sonolência excessiva.

7. Topiramato: aumenta a atividade dos receptores GABA-A, bloqueio de receptores AMPA e


inibição da anidrase carbônica. Principais efeitos adversos: alterações cognitivas (dose-
dependente), perda de peso, litíase renal (2% dos casos), glaucoma.

8. Lamotrigina: bloqueio de canais de sódio voltagem-dependente. Principais efeitos


adversos: rash cutâneo (10% dos casos – tenta-se prevenir com introdução lenta da dose),
sonolência excessiva. Estudos animais e em epilépticas grávidas sugerem que a lamotrigina é
a medicação com menor incidência de efeitos teratogênicos, sendo uma ótima escolha em
gestantes. Entretanto, a gestação reduz seu nível sérico em até 75% do basal, havendo a
necessidade de aumento da dose com monitorização mensal do nível sérico durante a
gravidez.

9. Benzodiazepínicos: os mais usados em epilepsia são: clonazepam, clobazam e


nitrazepam. Principais efeitos adversos: sonolência excessiva e aumento da secreção
traqueobrônquica.

* Princípios gerais do tratamento:

1. Usar a medicação de primeira linha conforme o tipo de crise epiléptica (vide


algoritmo).
2. Iniciar com monoterapia titulando até dose mínima efetiva.
3. Conforme resposta clínica, aumentar até dose máxima tolerada pelo paciente.
4. Se esgotadas 2 monoterapias, associar outra medicação com efeito sinérgico.
5. Em função dos possíveis efeitos adversos, solicitar exames sanguíneos
anualmente: hemograma, creatinina, ureia, sódio, potássio, cálcio, glicemia de
jejum, amilase (se uso do ácido valproico), gama-GT, fosfatase alcalina, TGO,
TGP.

Em geral, 70% a 80% dos pacientes obtêm remissão completa das crises com o
tratamento medicamentoso, porém 20% a 30% deles evoluem com refratariedade ao
tratamento medicamentoso, necessitando de avaliação para busca de tratamentos
alternativos (centros de atenção terciária): cirurgia, dieta cetogênica ou estimulação
vagal.
* Algoritmo de tratamento conforme o tipo de crise epiléptica:

A. Crises parciais simples e complexas e as parciais com generalização


secundária:

1ª MONOTERAPIA:

CARBAMAZEPINA OU OXCARBAZEPINA
OU FENITOÍNA

SEM RESPOSTA

2ª MONOTERAPIA:

CARBAMAZEPINA OU OXCARBAZEPINA
OU FENITOÍNA

SEM RESPOSTA

ASSOCIAR 2ª MEDICAÇÃO:

CLOBAZAM OU ÁCIDO VALPROICO

SEM RESPOSTA
AVALIAR TRATAMENTO
ALTERNATIVO:
ASSOCIAR 3ª
MEDICAÇÃO: ENCAMINHAR A CENTROS
TERCIÁRIOS:
TOPIRAMATO OU
LAMOTRIGINA CIRURGIA OU ESTIMULAÇÃO
VAGAL OU DIETA CETOGÊNICA
B. Crises generalizadas:

1ª MONOTERAPIA:

* SE TCG, MIOCLONIAS, TÔNICAS, AUSÊNCIAS  ÁCIDO VALPROICO OU


DIVALPROATO DE SÓDIO

* SE TCG OU CRISES NEONATAIS  FENOBARBITAL

* SE AUSÊNCIAS  ETOSSUXIMIDA

SEM RESPOSTA

ASSOCIAR 2ª MEDICAÇÃO:

* SE ÁCIDO VALPROICO OU DIVALPROATO DE SÓDIO:

SE TCG  LAMOTRIGINA

SE MIOCLONIAS: CLONAZEPAM OU LAMOTRIGINA

SE AUSÊNCIAS: ETOSSUXIMIDA

* SE ETOSSUXIMIDA: ÁCIDO VALPROICO OU DIVALPROATO DE SÓDIO

SEM RESPOSTA

ASSOCIAR 3ª MEDICAÇÃO:

* TOPIRAMATO OU BENZODIAZEPÍNICO

AVALIAR TRATAMENTOS ALTERNATIVOS:

- CIRURGIA: CALOSOTOMIA, CONFORME O CASO

- ESTIMULAÇÃO VAGAL

- DIETA CETOGÊNICA

* No caso de mulheres em idade fértil, recomenda-se o uso adicional de ácido fólico


(5mg/d), porque este diminui o risco de malformações fetais relacionadas às
medicações antiepilépticas, especialmente se usado até 3 meses antes da gravidez.
* O método anticoncepcional mais eficaz em mulheres com epilepsia é o DIU, visto
que maioria dos anticoncepcionais orais tem seus níveis séricos diminuídos pelas
medicações antiepilépticas.

7. Discutir prognóstico e impacto socioeconômico dos pacientes com epilepsia.

* Prognóstico:
- O prognóstico em relação ao controle de crises é determinado principalmente pela
etiologia, sendo pior nos casos secundários à lesão encefálica.
- Nos pacientes com alto risco de recorrência de crises (certos tipos de síndromes
epilépticas, presença de lesão encefálica e exame neurológico alterado), as
medicações devem ser usadas continuamente. Contudo, em algumas epilepsias
benignas da infância, nas quais o exame neurológico e a neuroimagem são normais,
as medicações podem ser retiradas gradualmente após 2 a 4 anos livres de crises.
- Mortalidade: está relacionada aos acidentes que acontecem em decorrência das
crises (acidentes de trânsito, TCE, afogamento, queimaduras), sendo maior nas crises
TCG. Mas existem casos de morte súbita, denominados “Morte Súbita Inexplicada
em Epilepsia”, que ocorrem com maior incidência que na população geral (incidência
1:300). Os pacientes mais propensos a esta complicação são aqueles com epilepsia
refratária aos medicamentos e que estão em politerapia, ou seja, uma minoria dos
pacientes. Seus mecanismos ainda não estão elucidados.
- Transtornos psiquiátricos associados: são mais frequentes nos pacientes com
Epilepsia do Lobo Temporal, necessitando de intervenção medicamentosa. Os mais
frequentes são: depressão (45 %) e transtorno psicótico (5 % - 15%).

* Impacto socioeconômico: em relação aos impactos sociais, cabe destacar os


preconceitos que estes pacientes ainda sofrem, o que acarreta isolamento social e
dificuldade de emprego. Há custos elevados, especialmente naqueles com epilepsia
refratária, sendo relacionados ao pagamento de auxílio-doença, aposentadoria e
pensões do INSS.

* Direção de veículos: a preocupação trazida pelo José (2° caso) é a de muitos


pacientes. O Código de Trânsito Brasileiro, instituído pela Lei 9602, de 22/01/1998,
determinou a obrigatoriedade do Exame de Aptidão Física e Mental para os
candidatos à direção, sendo este renovável. No momento de responder ao
questionário deste exame, caso o candidato tenha diagnóstico de epilepsia, é obrigado
a informar. Se o diagnóstico tiver ocorrido depois, deverá parar de dirigir e informar o
mesmo ao DETRAN. Se quiser adquirir ou renovar a habilitação, deverá trazer um
relatório dos seus dados clínicos e de exames, preenchido por um médico
assistente que o acompanhe por, pelo menos, um ano.

- Critérios de aprovação da carteira de habilitação ao paciente epiléptico:


A. Aqueles que manterão uso contínuo de medicação antiepiléptica:
1. Estar há 1 ano sem crise epiléptica.
2. Ter parecer favorável do médico assistente desde que este o acompanhe há,
pelo menos, 1 ano.
3. Boa adesão ao tratamento.

B. Aqueles que estão em retirada da medicação:


1. Estar há, no mínimo, há 2 anos sem crises.
2. Se a retirada tiver duração mínima de 6 meses.
3. Estar sem crises há, no mínimo, 6 meses após a retirada completa da
medicação.
Por conseguinte, o paciente José deve ser orientado a suspender a direção de
veículos.
PROBLEMA 9:

CONTEÚDO EDUCACIONAL:

1. Divisão anatômica e funcional das áreas corticais cerebrais.


2. Conceito de Apraxia, Agnosia e Afasia. Classificação das afasias.
3. Classificação e abordagem diagnóstica das síndromes demenciais.
4. Principais causas das síndromes demenciais.
5. Doença de Alzheimer.

OBJETIVOS EDUCACIONAIS:

1. Descrever a classificação anatômica e funcional das áreas corticais, citando


os sintomas resultantes de suas lesões.

- Divisão anatômica: o córtex cerebral é dividido nos lobos: frontal, temporal, parietal
e occipital. Há ainda um outro lobo, o da ínsula, que fica “escondido” ao fundo do
sulco lateral durante o desenvolvimento fetal. As figuras 1 e 2 ilustram os principais
giros e sulcos corticais.

Figura 1 – Principais giros e sulcos cerebrais – perspectiva lateral (Fonte: Baehr M,


Frotscher M; Duus Diagnóstico Topográfico em Neurologia, 4ª Ed, 2008).
Figura 2 – Principais giros e sulcos cerebrais – perspectiva medial (Fonte: Baehr M,
Frotscher M; Duus Diagnóstico Topográfico em Neurologia, 4ª Ed, 2008).
- Divisão funcional:

A. Áreas de projeção: recebem ou dão origem às fibras diretamente relacionadas à


sensibilidade e à motricidade. Podem ser chamadas de áreas primárias. Determinam
com que fiquemos conscientes das qualidades sensoriais, porém sem ainda interpretá-
las.

A.1. Áreas sensitivas primárias: função primordialmente receptora. Graças a elas,


somos capazes apenas de ter a sensação, sem ainda interpretar seu significado.

* Área somestésica: fica no giro pós central e está relacionada à temperatura, dor,
pressão, tato e propriocepção consciente da metade oposta do corpo. Há uma
representação somatotópica (Homúnculo de Penfield – figura 3). Lesões desta área
acarretam alterações no tato discriminativo. O tato grosseiro, dor e temperatura não se
alteram porque se tornam “conscientes” em nível talâmico.

Figura 3 – Área somestésica primária: esquema de


representação somatotópica (Fonte: Machado A,
Neuroanatomia funcional, 1ª Ed., 1988).
* Área visual primária: lábios do sulco calcarino. Recebe fibras do corpo geniculado
lateral (núcleo talâmico). Áreas da retina têm uma relação direta com áreas do sulco
calcarino. A lesão bilateral desta área causa cegueira completa na espécie humana

* Área auditiva primária: giro temporal transverso anterior. Nela chegam fibras do
corpo geniculado medial (núcleo talâmico). As vias auditivas não são totalmente
cruzadas, têm representação de ambos os lados. Por conseguinte, lesões nesta região
usualmente não causam surdez.

* Área vestibular primária: está no lobo parietal, área somestésica próximo à área de
representação da face.

* Área olfatória primária: pequena região na parte anterior do uncus e giro para-
hipocampal (lobo temporal). As crises epilépticas uncinadas são manifestadas por
alucinações olfatórias caracterizadas por cheiros desagradáveis.

* Área gustativa primária: fica na região inferior do giro pós central, próximo à insula
e da área correspondente à língua.

A.2. Área motora primária: é uma área efetuadora do movimento, recebendo


projeções das áreas que o planejam e programam. Fica no giro pré-central e tem uma
representação somatotópica igual a da área somestésica primária (figura 4). Nesta
região estão os neurônios motores superiores ou 1° neurônio motor.

Figura 4 – Área motora primária: esquema de


representação somatotópica (Fonte: Machado A,
Neuroanatomia funcional, 1ª Ed., 1988).

B. Áreas de associação: estão envolvidas com a interpretação das informações


sensoriais, sua correlação com experiências prévias, com a adição do significado
afetivo delas e o consequente processamento da resposta motora. Podem ser:
secundárias (sensitivas e motoras), sendo estas unimodais, e terciárias, sendo estas
polimodais.
B.1. Áreas secundárias: recebem ou enviam fibras às áreas primárias, estando
envolvidas em uma análise mais refinada da informação sensorial que chegam por
estas áreas e comparando esta informação com experiências prévias.

B.1.1. Áreas motoras secundárias:

* Área motora suplementar: programação de sequências complexas de


movimentos já aprendidos.

* Área pré-motora: programação de sequências complexas de movimentos


durante sua execução.

* Área de Broca (no giro frontal inferior): planejamento da atividade motora


da expressão da linguagem – sua lesão causa afasia de expressão ou de
Broca.

- Lesões nestas áreas acima acarretam apraxias: incapacidade de executar


movimentos voluntários previamente aprendidos, sem haver déficit motor.
Leões na área pré-motora também acarretam o retorno do reflexo de preensão
palmar em adultos (“grasping”).

B.1.2. Áreas sensitivas secundárias:


* Área somestésica secundária: fica logo atrás da área somestésica
primária. É uma área de interpretação e comparação com experiências prévias
somáticas – gnosia.

* Área visual secundária: fica nas regiões occipital e temporo – occipital. É


uma área de interpretação das informações visuais e comparação com
experiências prévias visuais (gnosia).

* Área auditiva secundária: circunda a área auditiva primária. É uma área de


interpretação das informações auditivas e comparação com experiências
prévias auditivas (gnosia).

B.2. Áreas terciárias: são regiões do córtex muito especializadas que processam
informações de múltiplas modalidades somatossensoriais e elaboram de
estratégias comportamentais de memória e emocionais.

B.2.1. Área pré-frontal: É a parte anterior e não motora do lobo frontal. No


homem, muito desenvolvida, ocupa 25% do tamanho do córtex. Recebe fibras de
todas as outras áreas de associação do córtex e se liga ao sistema límbico. Na
lesão desta área, o paciente mantém as funções básicas normais, porém pode ter
as seguintes alterações: perde o senso de responsabilidade, fala grosserias,
esquece informações faladas minutos antes (memória de trabalho), tem distrações
e não apresentam frustração ou arrependimento.
B.2.2. Área temporoparietal: entroncamento das áreas secundárias auditivas,
visual e somestésica. Tem importância na percepção espacial e a relação do
indivíduo com o meio que o cerca, sendo também área do esquema corporal.

B.2.3. Área límbica: Formado principalmente pelo giro do cíngulo, giro para-
hipocampal, hipocampo e núcleo amigdaloide. Está envolvida com a formação e
consolidação na memória das informações sensoriais que chegam ao córtex
cerebral, além interpretar emoções a partir de padrões de reações autonômicas e
físicas e programar comportamentos motivados.

2. Compreender o significado das Apraxias, das Agnosias e das Afasias.

* Apraxias: incapacidade de executar atos motores complexos previamente


aprendidos, sem haver déficit motor.

* Agnosias: perda da capacidade de reconhecer as informações sensoriais, apesar


das vias sensitivas e áreas de projeção estarem intactas. Podem ser: visuais, táteis ou
auditivas. Se um indivíduo perde uma modalidade, mantém intacta a capacidade de
reconhecimento e interpretação a partir de outras modalidades. Por exemplo: um
indivíduo com agnosia visual, ao ver um objeto, não o que é, mas passa a reconhecê-
lo após tocá-lo.

* Afasias: são alterações na função de linguagem que ocorrem em indivíduos nos


quais esta função foi estabelecida. Desta forma, se uma criança apresenta atraso na
aquisição da linguagem, não se pode afirmar que ela tem afasia, e sim, atraso de
linguagem. Eis os principais tipos de afasia:

A. Afasia de Broca ou motora ou de expressão: o paciente compreende a palavra


falada ou escrita, porém tem dificuldade em expressar adequadamente através da
escrita ou da fala. Decorre de lesão na área de Broca, localizada no hemisfério
cerebral dominante para a linguagem.

B. Afasia de Wernicke ou sensitiva ou de compreensão: o paciente mantém a fluência


normal, embora fale algumas palavras não existentes no vocabulário (neologismos),
porém apresenta déficit na compreensão da palavra escrita ou falada. Decorre de
lesão da área de Wernicke no hemisfério cerebral dominante para a linguagem.

C. Afasia nominativa: dificuldade de nomear objetos. Decorre de lesões perissilvianas


anteriores do hemisfério dominante para a linguagem.

D. Afasia condutiva: há déficit de repetição de fonemas ou palavras, porém a fala e a


compreensão estão preservadas. Decorre de lesão no fascículo arqueado (conjunto de
fibras que conectam a área de Broca à área de Wernicke).

E. Afasias transcorticais: há dificuldade na expressão e/ou compreensão da palavra


falada e escrita, porém o paciente consegue repetir o que foi falado ou imitar gestos do
examinador. Decorre de lesões perissilvianas difusas do hemisfério dominante para a
linguagem.
3. Descrever a abordagem diagnóstica de um paciente com síndrome demencial.
Conhecer o Miniexame do estado mental (MEEM) e a interpretação de seus
achados.

* Quadro clínico

- Critérios diagnósticos de demência do DSM-IV (Associação americana de


Psiquiatria):

1. Redução da memória de curto prazo (incapacidade de aprender informações


novas), redução da memória de longo prazo (incapacidade de lembrar-se de
informações pessoais passadas).

2. Pelo menos um dos seguintes:


- Dificuldade de abstração
- Dificuldade para fazer julgamentos e para controlar impulsos
- Outros distúrbios: afasia, apraxia e agnosia
- Modificações da personalidade

3. Os distúrbios A e B interferem significativamente com a ocupação ou com as


atividades sociais e os relacionamentos.

4. As alterações acima não ocorrem exclusivamente durante o delirium e a


perturbação não é mais bem explicada por um transtorno psiquiátrico.

* Um aspecto invariavelmente presente nas síndromes demenciais é a perda da


percepção quanto à extensão das suas próprias perdas cognitivas e funcionais.

* Diagnóstico:

A. História clínica: obtenção de dados com paciente e familiares, buscando alteração


de um ou mais domínios da cognição, alterações de humor e comportamento, tempo
de história e interferência com a vida ocupacional, social e familiar.

B. Exame físico: além do exame neurológico, é importante a aplicação do MEEM,


instrumento de triagem para déficits cognitivos. Consiste em uma série de questões
envolvendo: orientação temporal e espacial, memória imediata, linguagem, memória
de evocação, cálculo e habilidade construtiva. O MEEM pode ser aplicado pelo médico
generalista com o intuito de triar pacientes com suspeita de demência. O teste vale 30
pontos. As questões são pontuadas de acordo com a resposta correta ou não dom
paciente. Conforme a escolaridade, os seguintes valores são considerados normais:

Analfabetos: ≥ 15 pontos
1 a 11 anos de escolaridade: ≥ 22 pontos
≥ 11 anos: ≥ 27 pontos

C. Para investigar possíveis causas secundárias, solicita-se:


* Exames laboratoriais: Hemograma completo, glicemia, ureia, creatinina,
nível de vitamina B12, TSH e T4 livre, enzimas hepáticas, cálcio sérico, VDRL,
Fta-abs (Neurossífilis) sorologia para HIV.

* LCR: na suspeita de Hidrocefalia de pressão normal.

* Neuroimagem:

- Tomografia computadorizada de crânio: afastar causas estruturais


- Ressonância magnética de encéfalo: afastar causas estruturais
-Tomografia por emissão de pósitrons (PET) cerebral: avaliação funcional
baseada no metabolismo cerebral quando há dúvida sobre o tipo de
demência degenerativa. Não é usado de rotina.

* EEG: quando há demência de evolução rápida associada a mioclonias,


pode-se suspeitar de doença de Creutzfeldt-Jakob (forma rara). O EEG mostra
padrão específico nestes casos.

4. Classificar e citar as principais etiologias das síndromes demenciais.

* Classificação e principais etiologias das demências:

1. Com evidência de lesão estrutural:

1.A. Primárias: são as formas degenerativas, nas quais a demência é a


síndrome principal (doença de Alzheimer, degeneração frontotemporal, demência por
corpúsculos de Lewy) ou está associada a outras doenças degenerativas (doença de
Parkinson, doença de Huntington).

1.B. Secundárias: demências vasculares, hidrocefalia de pressão normal (tríade


de demência, incontinência urinária e apraxia de marcha), hematoma subdural crônico,
doenças priônicas (doença de Creuzfeldt-Jakob).

2. Sem evidência de lesão estrutural: distúrbios eletrolíticos; deficiência de


vitamina B12, hipotireoidismo, demência pelo HIV.

As principais causas de demência degenerativa são: doença de Alzheimer, Demência


por corpúsculos de Lewy e degeneração frontotemporal. Após as causas
degenerativas vem a demência vascular.

5. Descrever a epidemiologia, quadro clínico, diagnóstico, tratamento e


prognóstico da doença de Alzheimer.

* Epidemiologia: a doença de Alzheimer é a causa mais frequente de síndrome


demencial, representando 60% a 80% dos casos. Em indivíduos com mais de 65 anos,
a prevalência é estimada em 5%. Após os 65 anos, a prevalência duplica a cada 5
anos, chegando a 30% nos indivíduos com 85 anos. Os fatores de risco estabelecidos
até o momento para a doença de Alzheimer são: idade avançada e história familiar.
* Fisiopatologia:

- Há 2 alterações histopatológicas encontradas na doença de Alzheimer: placas


neuríticas (formadas por acúmulo da proteína -amiloide) e emaranhados
neurofibrilares (agregados intracelulares da proteína tau associada a
microtúbulos). A presença de, pelo menos, 6 placas neuríticas nos córtices frontal,
temporal ou parietal e a presença de emaranhados neurofibrilares no neocórtex do
lobo temporal e em outras áreas de associação estabelecem o diagnóstico definitivo
de doença de Alzheimer.
- O mecanismo fisiopatológico mais aceito atualmente é a de que a formação da
proteína -amiloide, pela clivagem da proteína precursora de amiloide (localizada na
membrana celular), levaria às seguintes consequências: acúmulo de -amiloide,
levando a um processo inflamatório, excitoxicidade pelo glutamato e oxidação, levando
à morte celular; hiperfosforilação da proteína tau (formação dos emaranhados
neurofibrilares), levando a um déficit da neurotransmissão. Na doença de Alzheimer,
este acúmulo inicia-se no córtex entorrinal e hipocampo, depois se estendendo a
outras áreas. O principal sistema de neurotransmissão afetado é o colinérgico,
presente em regiões que se projetam ao hipocampo.
- A maioria dos casos é esporádica, sem história familiar. Entretanto, há um número
menor de casos de origem genética e com herança autossômica dominante. Há 3
genes identificados, os quais acarretam, como alteração comum final, a produção
excessiva de proteína -amiloide. Nestes pacientes, a doença tende a começar de
forma mais precoce (entre 20 e 60 anos). Os pacientes com síndrome de Down
(trissomia do 21), que compartilham a alteração de um destes genes, têm risco
aumentado de desenvolver a doença.

* Quadro clínico: o quadro se inicia de forma lenta e insidiosa. A evolução inicial é


dominada pela amnésia anterógrada. Os déficits de memória inicialmente são
ocasionais, mas evoluem para falhas mais constantes. No início as atividades de vida
diária rotineiras ainda ficam preservados. Pode haver dificuldades de lidar com
dinheiro ou contabilidade. Podem evoluir com mudanças na personalidade, ficando
apáticos, com perda da iniciativa e perda de interesse por hobbies e passatempos
prévios. O paciente com déficits de linguagem, inicialmente com anomia. Com a
progressão, a capacidade de realizar atividades diárias fica cada vez mais difícil,
necessitando de um cuidador. Na fase avançada da doença, há perda total da
comunicação e imobilidade motora.

* Diagnóstico:

- História e exame físico: buscam-se os critérios de demência da DSM-IV. Há


evidência de perda de memória e de, pelo menos, outra função cognitiva.
- Exames complementares: não há, até o momento, nenhum teste laboratorial
específico para a doença de Alzheimer. Fazem-se os exames séricos descritos acima
para exclusão de outras causas.
- RM de encéfalo (deve-se pedir com cortes em pano de hipocampos); pode ser
normal ou mostrar atrofia hipocampal.
* Diagnóstico diferencial: com outras formas de demência de início insidioso e
evolução progressiva, como demência por Corpúsculos de Lewy e degeneração
frontotemporal (inicia-se por alteração de comportamento e não por déficit de
memória. A principal dificuldade é diferenciar com demência vascular, visto que as 2
formas podem coexistir no mesmo paciente.

* Tratamento:

- A abordagem destes pacientes deve incluir orientações aos familiares sobre


cuidados específicos no ambiente da residência, manuseio de medicações e, na fase
avançada, no auxílio à higiene pessoal. É importante a participação de profissionais
denominados: cuidadores.
- Não há medida preventiva estabelecida, com bom nível de evidência, até o
momento para a doença de Alzheimer.
- Há 2 classes de medicações aprovadas até o momento para uso nesta doença:

A. Inibidores da acetilcolinesterase: rivastigmina, donepezil ou galantamina.


Devem ser instituída de forma gradativa, alcançando a dose plena após 4 semanas,
pois isso diminui a incidência de efeitos adversos. Nas formas leve a moderada da
doença de Alzheimer, estas 3 medicações demonstraram retardar a progressão dos
sintomas de 6 a 12 meses.

B. Memantina: antagonista dos receptores NMDA de glutamato. Também


demonstrou retardar a progressão dos sintomas. Usado na fase avançada da doença.

* Prognóstico: até o momento não há terapia curativa ou que impeça completamente a


progressão da doença. Os sintomas evoluem de forma progressiva, levando a uma
dependência total dos pacientes. A taxa de mortalidade é de cerca de 10% por ano.
Os pacientes comumente morrem de: pneumonia, sepse ou insuficiência cardíaca
congestiva.
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