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CARNEIRO. R. U. C.

Educação inclusiva: gestão, professores, comunidade - definindo


papéis. Doxa, v. 16. UNESP/FCLAR - Laboratório Editorial, 2012.

EDUCAÇÃO INCLUSIVA: GESTÃO, PROFESSORES, COMUNIDADE:


DEFININDO PAPÉIS

INCLUSIVE EDUCATION: MANAGEMENT, PROFESSORS, COMMUNITY –


DEFINING ROLES

Relma Urel Carbone CARNEIRO1

Resumo
Este artigo tem como objetivo desencadear uma reflexão sobre a educação inclusiva,
modelo educacional referendado por nossas políticas, no entanto, ainda distante da
realidade escolar. A reflexão é no sentido de diferenciar uma educação inclusiva como
ato, sem grandes alterações na escola, e uma educação inclusiva como concepção, que
pressupõe modificações tanto estruturais como de valores e atitudes capazes de
transformar uma escola historicamente excludente em uma escola para todos. Essa
transformação requer a ação de diferentes agentes educacionais, gestão, professores,
comunidade, de forma que a explicitação da ação de cada um deles se faz necessária.

Palavras-chave: Educação inclusiva. Gestão escolar. Formação de professores.

Abstract
This paper aims to promote a reflection on the inclusive education, an educational
model advocated by our policies yet still distant from the school reality. The reflection
aims to differentiate the inclusive education as an act, without great changes in the
school, and inclusive education as a conception, which assumes changes both in the
structure and values and attitudes that may transform a historically excluding school in a
school for all. This transformation requires the action of different educational agents,
management, professors and community, explaining the action of each.

Keywords: Inclusive education. School management. Professor training.

Recentemente fui convidada para participar de um encontro de Educação


Especial cujo tema geral era: “Inclusão: a escola em mudança”. Comecei então a pensar
no significado da palavra mudança e inicialmente recorri ao dicionário que apresenta a
palavra mudança como ato ou efeito de mudar. Entre outros, mudar significa alterar,
modificar, trocar, variar, transformar, sofrer alteração, modificação, deixar ou trocar
uma coisa por outra ou ainda tornar-se diferente do que era. Para que a escola seja
1
UNESP – Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências e Letras - Departamento de Psicologia da
Educação. Araraquara – SP – Brasil. 14800-901 - relmaurel@fclar.unesp.br
inclusiva, considerando a palavra inclusão como uma concepção e não como um ato, ela
realmente precisa mudar.
A inclusão como um ato tem aos poucos acontecido na realidade educacional
brasileira, sob a forma de matrícula de alunos com deficiência considerando, porém, que
nem todos os tipos de deficiências estão sendo atendidos e não sem resistência por parte
de algumas escolas ou de seus agentes. Ao considerar esse fato como um ato, me refiro
ao fato de que a mudança necessária para que esse aluno com deficiência tenha as
mesmas oportunidades de desenvolvimento e aprendizagem que qualquer outro aluno
sem deficiência, não tem acontecido de forma efetiva, por falta de entendimento do que
significa tal ação. Desta forma a escola “inclui” sem mudar.
Considerando a inclusão como uma concepção diferente de entendimento da
vida em sociedade, a tarefa escolar fica um pouco mais complexa. Em uma concepção
de escola inclusiva o que está em jogo não é a matrícula de alunos com ou sem
deficiência, mas sim, a abertura da escola para oferecer educação a todos os alunos. Essa
escola ainda não faz parte da nossa realidade porque historicamente a escola não foi
criada e nem desenvolvida para atender a todos, portanto, não sabemos fazer “inclusão”,
pois como concepção implica em mudança de valores e atitudes.
Voltando no conceito de mudança, para que a escola se torne realmente inclusiva
precisa fazer diferente, ou seja, se transformar seguindo outra direção. O fato é que essa
transformação tem que acontecer no processo, pois não dá para zerar e começar de
novo. Lima (2005), comenta que esta dificuldade de transformação da escola que está aí,
em uma escola inclusiva, pode ser comparada a uma conexão no meio de uma viagem.
No entanto, não é como descer de um avião com destino certo e entrar num segundo
avião com outro destino definido, mas sim uma alteração de rota dentro do mesmo
avião, com a mesma tripulação, mas sem que a torre de controle possa dar indicações
claras e precisas para onde devemos seguir.
Sabemos no entanto, que essa mudança implica necessariamente em garantia de
acesso, permanência e desenvolvimento de todos os indivíduos na escola. Esse “todos”
engloba a diversidade existente na sociedade sem distinção de nenhuma natureza,
conforme os termos da lei. Por isso uma escola inclusiva, enquanto concepção não é
uma escola que matricula alunos com deficiência, mas sim uma escola em que alunos
com quaisquer características, sejam elas físicas, raciais, étnicas, religiosas, sociais,
econômicas, psicológicas, mentais, etc, além de garantia de acesso, permanência e
desenvolvimento, tenham suas diferenças valorizadas como meio de promoção de uma
sociedade equitativa.
Nas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica
(BRASIL, 2001, p.40), encontramos a seguinte definição de escola inclusiva:

O conceito de escola inclusiva implica uma nova postura da escola


comum, que propõe no projeto pedagógico – no currículo, na
metodologia de ensino, na avaliação e na atitude dos educadores –
ações que favoreçam a interação social e sua opção por práticas
heterogêneas. A escola capacita seus professores, prepara-se,
organiza-se e adapta-se para oferecer educação de qualidade para
todos, inclusive para os educandos que apresentem necessidades
especiais. Inclusão, portanto, não significa simplesmente matricular
todos os educandos com necessidades educacionais especiais na classe
comum, ignorando suas necessidades específicas, mas significa dar ao
professor e à escola o suporte necessário a sua ação pedagógica.

A transformação necessária na escola passa, entre outros fatores como políticos,


sociais, econômicos, pela mudança de concepção dos atores educacionais, a saber,
gestão, professores, comunidade. A definição de papéis de cada um desses segmentos é
fundamental para que as mudanças aconteçam.

Atribuições da gestão escolar

O termo gestão escolar surgiu de forma efetiva no vocabulário educacional


brasileiro após a LDB (BRASIL, 1996), e apresenta uma concepção de gestão
democrática e participativa em contraposição a um modelo de administração escolar
pautado em formas empresariais de administração. Independente do termo, a idéia é
construir um modelo de organização da escola em que seus atores atuem de forma
sincrônica, considerando as especificidades da educação, de forma que a gestão trabalhe
em prol do pedagógico como objetivo prioritário. Essa indagação se faz necessária, uma
vez que a administração escolar até então vigente, muitas vezes trabalhava mais
considerando os aspectos organizacionais que os pedagógicos.
Conforme Carneiro (2006), este formato de administração levou ao
distanciamento as questões propriamente administrativas das pedagógicas, e os diretores
administradores a se distanciarem da função primordial da escola, a saber, o processo de
ensino/aprendizagem. Neste sentido:
Se o administrador da educação já não se identifica necessariamente
com a própria condição de educador, ou seja, se ele é “da
administração” e não “da educação”, suas decisões não serão
inspiradas nem pela “ciência prática da educação”, que desconhece, e
nem pela “práxis educacional”, em que não se reconhece. Não haverá
como concretizar em sua escola a dialética da Pedagogia e da
Educação, se ele como “administrador” não dominar os elementos do
“par dialético” a partir do qual deveria orientar sua ação
administrativa. (SILVA JÚNIOR, 1990, p.74).

A gestão escolar dentro de uma concepção de escola inclusiva pressupõe um


trabalho conjunto entre diretor, coordenador, professores, equipe de apoio, família,
comunidade, considerando aqui apenas uma unidade escolar, sem esquecer obviamente,
que cada unidade escolar está atrelada a um sistema maior. Esse trabalho conjunto deve
estar refletido no projeto político pedagógico que contempla a diversidade e aponta
estratégias de ação para garantir oportunidades para todos. Se o projeto político
pedagógico não for um contrato assinado por todos a escola não pode ser inclusiva, uma
vez que, como já disse, inclusão não é um ato. Não existe inclusão em uma escola em
que só o professor é inclusivo, ou só o diretor é inclusivo, ou que tem um professor
especializado em educação especial (que às vezes não é inclusivo), o que quero
reafirmar é que sem uma mudança de princípios, valores e atitudes por parte de todos os
segmentos educacionais, não existem leis ou decretos que farão com que a escola se
transforme.
Para transformação da escola a gestão escolar deve articular um trabalho em que
oferecer ensino de qualidade a TODOS seja a meta. Conforme Brasil (2008) para que
essa meta seja atingida a escola precisa conhecer as necessidades educacionais de cada
aluno, independente de essas necessidades serem especiais ou não, identificar as
respostas educacionais que essas necessidades requerem, e essa identificação de
respostas caracteriza o respeito à diversidade existente na escola, e por fim, estabelecer
um planejamento sistemático das ações a serem desenvolvidas para garantir o
cumprimento da meta.
Algumas ações diretas por parte da gestão escolar são fundamentais nesse
processo, são elas:
- Caracterizar a demanda de sua escola. Esse trabalho pode ser realizado anualmente,
com as devidas alterações mediante a entrada e saída de alunos. Essa caracterização
fornece um panorama geral e dá indicadores das necessidades abrangentes, de acordo
com o nível social, cultural e econômico daquela clientela.
- Identificar quais são as necessidades educacionais dos alunos. Diante da realidade
daquela escola quais são os caminhos a serem percorridos para que os alunos possam
atingir os objetivos. Muitas vezes as necessidades educacionais dos alunos não são as
mesmas previstas nos currículos daquela turma e provavelmente os alunos não estão
realmente incluídos na escola porque a mesma não oferece aquilo eles precisam de
acordo com suas características específicas, e sim, oferece um ensino padronizado com
vistas a alcançar resultados incompatíveis com a realidade de cada aluno.
- Identificar necessidades educacionais especiais dos alunos. Entendemos como
especiais aquelas necessidades educacionais que requerem recursos físicos, humanos
e/ou pedagógicos diferentes dos que a escola dispõe. A política nacional de educação
especial na perspectiva da educação inclusiva (BRASIL, 2008) classifica esses alunos
como aqueles que possuem deficiências (físicas, sensoriais ou mentais), altas
habilidades/superdotação e transtornos globais do desenvolvimento. Sabemos, no
entanto, que muitos alunos que não se enquadram nessa classificação muitas vezes
necessitam de recursos diferenciados para alcançarem o sucesso acadêmico, como por
exemplo, um aluno estrangeiro que não domina a língua. Porém, as necessidades
específicas dos alunos alvo da educação especial, caracterizados pela política, não
podem ser negligenciadas uma vez que sem os recursos especiais necessários como
LIBRAS, Braille, comunicação alternativa, recursos de tecnologia assistiva, para citar
apenas alguns exemplos, sua inclusão acontece como um ato, mas seu desenvolvimento
e aprendizagem se tornam impossíveis.
- Elencar quais são as adequações necessárias para responder positivamente às
necessidades da demanda. Essa ação é fundamental, pois, as adequações necessárias
dependem inteiramente da realidade de cada escola. Uma escola para ser inclusiva não
precisa de um intérprete de Libras se em sua clientela ela não possuir nenhum aluno
surdo, no entanto, precisará de um professor de Braille se tiver um aluno cego ou de um
atendimento especializado a um aluno disgráfico. As adequações podem ser de ordem
estrutural, física, de recursos humanos, pedagógicos, tecnológicos etc. O imprescindível
é que a gestão escolar compreenda sua responsabilidade na provisão das adequações.
- Elaborar um planejamento para implementação das adequações necessárias. Essa
etapa inclui um estudo das necessidades mais e menos urgentes, considerando que as
mudanças são processuais e dependem de fatores externos à escola, como recursos
financeiros, contratação de recursos humanos etc. O importante é que esse planejamento
seja acompanhado regularmente para que as mudanças propostas sejam efetivadas. Um
cronograma com as ações de curto, médio e longo prazo deve ser elaborado para que os
objetivos não se percam.
- Implementar sistematicamente ações que respondam às necessidades
apresentadas. Isso implica em trabalho contínuo da gestão escolar junto ao sistema
educacional maior seja ele municipal, estadual ou federal, na busca dos meios
necessários para concretizar as adequações que demandam recursos externos, bem
como, ações práticas de reorganização da unidade escolar como, definição do número de
alunos por sala, definição de espaços etc.
- Definir sistema de formação em serviço para os professores, favorecendo o
desenvolvimento profissional contínuo. Em certa medida a formação em serviço do
professor tem que ser garantida de forma sistemática pelo próprio sistema de ensino,
garantindo assim, tempo e espaço apropriados para que essa formação ocorra.
- Definir sistema de formação em serviço para equipe de apoio. Todos os envolvidos
no trabalho escolar participam do processo de mudança e precisam de formação para
acompanhar essas mudanças. Muito do desenvolvimento e aprendizagem dos alunos se
dá fora das salas de aula nas interações escolares, parte do chamado currículo oculto
presente em todo processo educacional.
- Estabelecer convênios e parcerias que possam dar suporte ao trabalho escolar.
Me refiro a parcerias com instituições de ensino e pesquisa com o intuito de criar uma
cultura de colaboração capaz de pensar a educação de forma conjunta, tirando a escola
do isolamento em que se encontra, e ao estabelecimento de convênios com outros
setores como de saúde, transporte, bem estar social etc, objetivando o atendimento de
necessidades pontuais.
- Acolher e fortalecer o serviço de atendimento educacional especializado quando
ele se fizer presente em sua escola através de sala de recursos ou de serviço
especializado itinerante ou ainda, trabalhar em parceria com escolas ou centros
que possam oferecer esse atendimento a seus alunos. A inclusão de alunos com
necessidades educacionais especiais em salas de aula comum não significa que os
mesmos não precisem de atendimentos especializados. O atendimento educacional
especializado deve oferecer aquilo que é específico ao processo de ensino/aprendizagem
de alunos com necessidades educacionais especiais, por isso, a escola deve trabalhar
conjuntamente com esse serviço. A literatura tem apontado o trabalho colaborativo,
entre professor comum e especializado ou através de consultoria colaborativa em suas
várias formas, como um fator positivo na transformação da escola para tornar-se
inclusiva. Argueles, Hughes e Schumm (2000) definem ensino colaborativo como uma
abordagem educacional, onde os professores de educação especial e regular se
responsabilizam pelo planejamento e avaliação do ensino para um grupo heterogêneo de
estudantes (com e sem necessidades educacionais especiais). No entanto, uma das
dificuldades encontradas para realização da colaboração tem sido o tempo em comum
para que os professores envolvidos possam planejar e avaliar conjuntamente. Nesse
sentido a gestão escolar deve trabalhar de forma a organizar tempo e espaço favoráveis
para o trabalho de colaboração.
Essas ações podem ser consideradas como iniciais dentro do processo de
transformação da escola, sendo que, a rotina de cada unidade escolar é que vai ditar à
gestão os caminhos a serem seguidos e aqueles a serem abandonados.

Atribuição dos professores

Diante da necessidade de mudança da escola para atender um novo paradigma


que pressupõe o oferecimento de condições iguais de ensino e aprendizagem para uma
clientela diferenciada de alunos, o papel do professor ganha uma dimensão diferente.
Embora o professor não seja o único responsável pelas mudanças necessárias, sua
função ganha destaque uma vez que na escola é o responsável direto pelo processo de
ensino/aprendizagem dos alunos. Com a proposta de definir papéis na construção da
escola inclusiva algumas ações diretas por parte dos professores também são
fundamentais, são elas:
- Identificar as necessidades educacionais dos seus alunos. Cabe ao professor o
conhecimento individualizado de seus alunos de forma que possa organizar seu trabalho
pedagógico levando em conta o individual e o coletivo na busca da satisfação das
necessidades de todos. Esse conhecimento requer avaliação diagnóstica dos aspectos
pedagógicos e investigação aprofundada dos aspectos sociais e culturais. Só assim o
professor poderá fazer um planejamento inclusivo, ou seja, capaz de considerar as
individualidades de seus alunos.
- Identificar as necessidades educacionais especiais dos seus alunos. Cada vez mais o
professor tem se deparado com alunos com necessidades educacionais especiais,
advindas de deficiências ou não, e necessita identificar o que de especial ou de diferente
esses alunos precisam. Essa identificação deve servir para nortear seu planejamento
pedagógico, suas estratégias de ensino e sua forma de avaliação. Cada necessidade
educacional especial requer um tipo de intervenção, por isso a identificação precisa
auxilia o professor na busca das ações adequadas.
- Desenvolver estudo de caso quando necessário. Em casos em que a necessidade
educacional especial difere em muito daquilo que o professor conhece e sabe lidar, ele
deve desenvolver um estudo detalhado buscando conhecer todas as particularidades
daquele aluno para que possa pensar nas adequações e planejar a ação pedagógica de
forma a oferecer ao aluno as melhores condições possíveis de desenvolvimento e
aprendizagem. Este estudo de caso deve envolver anamnese, análise documental, tanto
da área técnica quanto pedagógica e avaliação pedagógica e comportamental.
- Planejar e implementar as adequações pedagógicas necessárias. O planejamento
do trabalho pedagógico é imprescindível para as mudanças necessárias no interior da
escola. Costumamos dizer que as práticas não se modificam por decretos, o que
significa que se o professor não planejar sua ação conhecendo as necessidades de seus
alunos e adequando a sua prática a essas necessidades as mudanças necessárias não
ocorrerão. Cabe ressaltar que o planejamento requer constante revisão de acordo com o
desenvolvimento e aprendizagem do aluno.
- Atuar de forma colaborativa com professores especializados. A educação inclusiva
que prevê a escolarização de todos os alunos em ambientes comuns não pressupõe a
negação do trabalho especializado necessário a alunos com especificidades tais que
extrapolem os conhecimentos do professor. A atuação de forma colaborativa com
professores e outros profissionais especializados no planejamento, escolha de
metodologias e estratégias, avaliação e acompanhamento de alunos com necessidades
educacionais especiais oferece ao professor o suporte necessário ao seu trabalho e ao
aluno mais oportunidades de sucesso. Essa colaboração requer um aprendizado por parte
dos professores, tanto comuns quanto especializados, que não estão acostumados a
trabalhar dessa forma. Esse aprendizado deve fazer parte de um trabalho de formação
em serviço constante por parte desses profissionais.
- Realizar acompanhamento sistemático do trabalho através de registro. Essa é uma
ação muitas vezes negligenciada pelo professor, que absorto por muitas tarefas deixa de
registrar de forma sistemática sua prática pedagógica e o desenvolvimento dos alunos,
elemento fundamental para refletir sobre sua ação e buscar constantemente o
aprimoramento de seu trabalho com vistas à inclusão de todos os alunos de forma
efetiva e para acompanhar o desempenho de cada aluno.
- Indicar adequações estruturais necessárias ao desenvolvimento do seu trabalho.
A princípio as adequações estruturais são de responsabilidade da gestão, que como já
disse deve atuar em conjunto com os professores e demais segmentos escolares, porém,
além de fazer parte dessa equipe gestora, como estamos falando em mudança
processual, muitas vezes é o professor que em sala de aula está vivendo dificuldades
práticas ainda não identificadas pela gestão, e ele deve então apontar essas dificuldades
e cobrar soluções.
- Estabelecer trabalho de colaboração com outros profissionais que atuam com
algum de seus alunos. A literatura tem mostrado que a colaboração é uma ótima
estratégia de trabalho para garantir oportunidades diferenciadas de ensino/aprendizagem
a alunos com necessidades educacionais especiais e que essa forma de trabalho favorece
a todos os alunos da turma. O atendimento a diversidade implica em conhecimentos
variados até então ausentes na escola comum. No entanto, tradicionalmente, o trabalho
do professor tem sido isolado, e de certa forma muitas vezes ele se orgulha de que em
sua sala de aula é ele quem define como as coisas serão. Desta forma, aceitar o trabalho
do outro, planejar junto, avaliar de forma conjunta com outros profissionais, dividir seu
espaço de trabalho etc, é um processo que faz parte das mudanças que a escola procura,
e o professor deve estar aberto para experimentar essa nova forma de atuação
profissional, entendendo que o trabalho do outro não é nem melhor nem pior, mas sim,
complementar ao seu.
- Buscar formação em serviço permanente. Independente da formação em serviço
institucionalizada, necessária a função profissional do professor, individualmente cada
professor deve buscar sua formação permanente como algo inerente ao seu trabalho. O
professor que não lê, não pesquisa, não investiga, não reflete sobre seu trabalho, não
acompanha a dinamicidade do processo educacional, consequentemente não conseguirá
acompanhar as mudanças necessárias reclamadas pelo atual paradigma. Buscar
formação constante implica em abertura para o novo, o diferente, e reconhecimento da
incompletude do ser professor e humano.
As atribuições dos professores são infindáveis, como infindáveis são as
características dos alunos. O importante a partir do que foi exposto aqui é a disposição
para buscar alternativas de atendimento às necessidades diferenciadas dos alunos,
valorizando essas diferenças como constitutivas da condição humana e, disposição para
fazer da sua profissão um mecanismo de transformação social para além dos muros
escolares.
Atribuições da comunidade

Em última instância a escola forma o cidadão para viver em comunidade. Em qual


comunidade? Falar em inclusão social me parece um paradoxo na medida em que
fazemos parte da sociedade ao nascer. Ninguém nasce sozinho, isolado, no entanto,
historicamente a sociedade criou mecanismos de separação, categorizando e
diferenciando as pessoas por características pessoais ou sociais o que implicou na
exclusão de muitos aos bens materiais, sociais, econômicos, artísticos, etc, produzidos
pela humanidade. Desta forma, falar em inclusão social implica em um movimento
social de reintegração dessas minorias marginalizadas ao que de direito lhes foi negado.
Essa reintegração, porém, não se dará com soluções minimalistas em que se
garante a coexistência, mas não a comunicação, conforme nos alerta Touraine (1998).
Segundo ele:
Mesmo quando vai além da simples tolerância e reconhece
positivamente em cada cultura um movimento para o universal, a
criação e o significado universal duma experiência particular, ela
deixa sem solução o problema da comunicação. Ela nos coloca diante
dos outros como diante das vitrinas de um museu. Reconhecemos a
presença de culturas diferentes da nossa, a sua capacidade de enunciar
um discurso sobre o mundo, sobre o ser humano e sobre a vida, e a
originalidade dessas criações culturais nos impõe o respeito, incita-nos
também a conhecê-las; mas não permite que nos comuniquemos com
elas. Ela nos coloca em caminhos paralelos em que podemos no
máximo nos cumprimentar cordialmente; ela não facilita a informação
mais do que o fato de saber que o chinês é uma língua culta nos ajuda
a conversar com um chinês se não aprendemos sua língua.
(TOURAINE, 1998. p.17).

Seguindo esse princípio, o papel da comunidade na inclusão do surdo, por


exemplo, passa não só pela sua aceitação enquanto diferente e na sua escolarização junto
com ouvintes, mas na incorporação de sua língua como fator imprescindíve l de
comunicação. A inclusão do cego, de igual modo, passa pela organização social pensada
também pela experiência tátil, auditiva, e não apenas visual. Ou seja, incluir é se
relacionar plenamente. É ouvir e se fazer ouvir. É valorizar a singularidade dentro da
pluralidade.
Assim, o reconhecimento e garantia da individualidade precisa de proteção
institucional. Ainda segundo Touraine (1998, p.25):
Só podemos viver juntos, isto é, combinar a unidade de uma sociedade
com a diversidade das personalidades e das culturas, se colocarmos a
idéia de sujeito pessoal no centro de nossa reflexão e de nossa ação. O
sonho de submeter todos os indivíduos às mesmas leis universais da
razão, da religião ou da história, sempre se transformou em pesadelo,
em instrumento de dominação; a renúncia a todo princípio de unidade,
a aceitação de diferenças sem limites, conduz à segregação ou à guerra
civil. Para sair deste dilema, este livro pinta o sujeito como
combinação de uma identidade pessoal e duma cultura particular com
a participação num mundo racionalizado e como afirmação, por este
mesmo trabalho, de sua liberdade e sua responsabilidade. Só esta
aproximação permite explicar como podemos viver juntos, iguais e
diferentes.

O papel da comunidade na transformação social, a meu ver implica na


reinterpretação de seus valores, a tal ponto, em que a convivência mútua produza
oportunidades iguais a indivíduos diferentes tendo a equidade como valor absoluto.
Iniciamos este texto afirmando que estamos vivendo a mudança. Estamos no
processo. Uma sociedade historicamente excludente não se tornará inclusiva de forma
mágica. A mudança de concepção é a última em um processo histórico de mudança. Já
dizia Einstein que é mais fácil desintegrar um átomo que desfazer um preconceito,
portanto, a sociedade inclusiva tão almejada depende da ação de cada um e de todos.

Referências

ARGUELLES, M. E.; HUGHES, M. T.; SCHUMM, J. S. Co-teaching: a different


approach to inclusion. Principal, Arlington, v.79, p.48-51, 2000.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Especial. Política de


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Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf>.
Acesso em: 06 maio 2011.

______. Diretrizes nacionais para educação especial na educação básica. Brasília:


MEC/SEESP, 2001.

______. Projeto escola viva: garantindo o acesso e permanência de todos os alunos na


escola: alunos com necessidades educacionais especiais. Brasília: SEESP, 2000.

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da


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<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>. Acesso em: 9 maio 2011.
CARNEIRO, R. U. C. Formação em serviço sobre gestão de escolas inclusivas para
diretores de escolas de educação infantil. 2006. 173f. Tese (Doutorado em Educação
Especial) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2006.

LIMA, L. Apertem os cintos, a direção (as) sumiu! os desafios da gestão nas escolas
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inclusiva e necessidades educacionais especiais. Santa Maria: Ed. da UFSM, 2005.
p.85-111.

SILVA JUNIOR, C. A. da. A escola pública como local de trabalho. São Paulo:
Cortez, 1990.

TOURAINE, A. Poderemos viver juntos? iguais e diferentes. Petrópolis, RJ: Vozes,


1998.

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