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Pacto de São José da Costa Rica: uma

arma poderosíssima.
Em defesa do direito à vida desde a concepção
Elaborado em 08/2009.

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Luiz Carlos Lodi da Cruz

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Os militantes pró-vida da Europa olham com santa inveja para nós, do


continente americano, que assinamos e ratificamos a Convenção Americana sobre
Direitos Humanos, conhecida como Pacto de São José da Costa Rica. De fato, essa
Convenção, subscrita em 22 de novembro de 1969, é o único tratado internacional em
que aparece com clareza o direito à vida "desde o momento da concepção" e o direito
"ao reconhecimento da personalidade jurídica". Não há, nos tratados universais ou
regionais sobre direitos humanos, nada que se iguale ao Pacto de São José da Costa
Rica.

A força dessa Convenção é tão grande que até o grupo pró-aborto Comissão de
Cidadania e Reprodução (CCR), financiado pela Fundação MacArthur [01], fazendo um
estudo das decisões judiciais sobre o aborto eugênico [02], admirou-se que, nas decisões
pró-vida, nenhuma delas fizesse referência ao Pacto de São José da Costa Rica:

Em nenhum dos acórdãos não concessivos da interrupção da gravidez para casos de


anencefalia e má formação que apresentaram uma argumentação pró direito a vida
como absoluto verificou-se a referência ao Pacto de São José da Costa Rica, tratado
internacional de direitos humanos aprovado na esfera do Sistema Interamericano de
Direitos Humanos (OEA) e ratificado pelo Brasil. Este documento integra o
ordenamento jurídico brasileiro com força de lei e, de acordo com algumas teorias,
como a defendida pela jurista Flávia Piovesan, assumem status materialmente
constitucional, por força do §2º do artigo 5º da Constituição Federal.

O artigo 4º da Convenção Americana de Direitos Humanos (ou Pacto de São José da


Costa Rica) determina que o direito à vida deve ser protegido pela legislação em geral,
desde a concepção. Assim, em razão desta previsão expressa, era de se esperar que os
acórdãos não concessivos da autorização para a interrupção da gestação levantassem
como fundamento este dispositivo (p. 36-37).

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Após reconhecer o poder jurídico desta arma e estranhar que os pró-vida não a
usem, a CCR conclui:

A ausência de referência a tal norma pode significar pouco conhecimento, por parte
dos magistrados, destes instrumentos internacionais de direitos humanos ou pouco
apego às fundamentações jurídicas pautadas na doutrina dos Direitos Humanos (p.
37).

Os abortistas têm razão de estarem admirados pelo não uso de uma arma tão poderosa.

Conhecendo a arma

Vejamos o que dizem alguns artigos dessa preciosa Convenção, que foi aprovada pelo
Congresso Nacional do Brasil em 26 de maio de 1992 (Decreto Legislativo n. 27), tendo
o Governo brasileiro determinado sua integral observância em 6 de novembro seguinte
(Decreto n. 678):

Art. 1º, n. 2. Para os efeitos desta Convenção, pessoa é todo ser humano.

Art. 3º. Toda pessoa tem direito ao reconhecimento de sua personalidade jurídica.

Art. 4º, n. 1. Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser
protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser
privado da vida arbitrariamente.

Como não usar a arma


Se uma arma poderosa não for bem usada, pode não produzir efeito ou até voltar-se
contra aquele que a maneja. A maneira errada de usar o Pacto de São José da Costa
Rica é concentrar-se exclusivamente no seu artigo 4º, n. 1. Lê-se com alegria que a
Convenção defende o direito à vida "desde o momento da concepção". Mas ao deparar-
se com a expressão "em geral" (eis o perigo!), interpreta-se que a lei pode abrir
exceções ao direito à vida, sem violar o Pacto. Infelizmente, esse tem sido o modo com
que, na maioria das vezes, os juristas pró-vida têm entendido e usado a Convenção.

Como usar a arma

O poder de fogo da nossa arma está contido sobretudo nos artigos 1º e 3º, os quais
costumam ser sumariamente ignorados. Que diz o artigo 3º? Que "toda pessoa tem
direito ao reconhecimento de sua personalidade jurídica". Mas, o que a Convenção
chama de "pessoa"? A resposta está no artigo 1º, n. 2.: "para os efeitos desta
Convenção, pessoa é todo ser humano". Logo, segundo a Convenção, todo ser humano
(= toda pessoa) tem direito ao reconhecimento de sua personalidade jurídica!

Note-se que o direito de ser reconhecido por lei como pessoa é assegurado a todo ser
humano. Não há, no artigo 1º, n. 2 nem no artigo 3º, a expressão "em geral" ou qualquer
outra que possa ser interpretada como excepcionalidade.

Ora, até mesmo os abortistas, que não aceitam que o nascituro seja pessoa, admitem que
ele é um ser humano [03]. Portanto, a Convenção assegura, sem sombra de dúvida, que
também o nascituro (que é um ser humano) tem direito ao reconhecimento de sua
personalidade jurídica. Ora, se o nascituro é pessoa – assim diz o Pacto – não há no
ordenamento jurídico brasileiro lugar para o aborto.

Diante do exposto acima, uma tarefa árdua para os abortistas é conciliar o fato de que o
nascituro é pessoa com a afirmação de que, segundo eles, a proteção de sua vida
admitiria exceções diante da lei. Não há conciliação possível. Como alguém
reconhecido como pessoa (ou seja, sujeito de direitos) pode não ter direito à vida?
Assim, no artigo 4ª da Convenção, a expressão "em geral" só pode ser interpretada
como "sempre".

Conclusão: de acordo com o Pacto de São José da Costa Rica, todo ser humano, desde o
momento da concepção tem:

a) o direito de ser reconhecido como pessoa;

b) o direito à vida.

Poderosa, mas não usada

Em 2008, quando o Supremo Tribunal Federal julgou o direito à vida dos embriões
humanos congelados (ADI 3510), ninguém, nem a Procuradoria Geral da República
(autora da ação), nem a CNBB ("amicus curiae"), nem os Ministros Menezes Direito,
Ricardo Lewandowski e Eros Grau (que votaram contra a destruição dos embriões)
afirmaram que o nascituro tem direito ao reconhecimento de sua personalidade por
força do Pacto de São José da Costa Rica.

Assim, o relator Ministro Carlos Ayres Britto sentiu-se à vontade para dizer que estava
em pleno vigor o artigo 2º do Código Civil, que em sua primeira parte diz: "a
personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida". Concluiu que a criança
não nascida não é pessoa, que há lugar para o aborto no ordenamento jurídico brasileiro
e que os embriões congelados poderiam ser mortos sem qualquer problema legal ou
constitucional.

A potência da arma

Durante muito tempo, o Supremo Tribunal Federal assumiu a atitude estranha de


colocar os tratados internacionais sobre direitos humanos (como é o Pacto de São José
da Costa Rica) no mesmo nível de uma lei ordinária. Assim, se o Pacto proíbe a prisão
do depositário infiel (art. 7, n. 7), uma lei ordinária posterior (como o Código Civil de
2002) poderia permitir tal prisão (art. 652).

Esse entendimento mudou a partir do julgamento do Habeas Corpus 87.585-8


Tocantins, no qual o Ministro Celso de Mello proferiu, em 12 de março de 2008, um
voto-vista em que passava a atribuir aos tratados internacionais sobre direitos humanos
o status de norma constitucional [04].

O julgamento dos Recursos Extraordinários 349703/RS e 466.343/SP, cujos acórdãos


foram publicados em 5 de junho de 2009, afastou de vez a idéia antiga de que tratados
como o Pacto de São José da Costa Rica têm o mesmo nível que o de uma lei ordinária.
Os ministros Celso de Mello, Cezar Peluzo, Ellen Gracie e Eros Grau defendem que tais
tratados têm o mesmo nível hierárquico que o da Constituição. Já os ministros Gilmar
Mendes, Carlos Ayres Britto, Menezes Direito, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski
afirmam que esses tratados ocupam um nível supralegal, isto é, estão abaixo da
Constituição, mas acima de todas as leis ordinárias [05]. Esse último entendimento é o da
maioria, e consta no acórdão do RE 349703/RS: "o caráter especial desses diplomas
internacionais sobre direitos humanos lhes reserva lugar específico no ordenamento
jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna". Seja
com nível constitucional, seja com nível supralegal, o Pacto de São José da Costa Rica é
uma bomba com potência suficiente para destruir qualquer negação da personalidade do
nascituro (cf. art. 2º, CC) ou qualquer dispositivo do Código Penal que se queira
interpretar como "permissão" para o aborto (cf. art. 128, I e II, CP).

Uma esperança para destruir a ADPF 54

Queira Deus que no julgamento do mérito da Argüição de Descumprimento de Preceito


Fundamental n. 54 (ADPF 54), que pretende a liberação do aborto de crianças
anencéfalas, os defensores da vida no STF usem – e usem bem – a poderosíssima arma
pró-vida do Pacto de São José da Costa Rica.
Notas

1. Cf. <http://www.ccr.org.br/a_sobre_ccr.asp>.
2. COMISSÃO DE CIDADANIA E REPRODUÇÃO. Aborto e religião nos
tribunais brasileiros: análise dos dados referentes a casos de anencefalia e má
formação fetal julgados pelos tribunais estaduais e superiores no período de
2001 a 2006. Disponível em:
<http://www.ccr.org.br/uploads/noticias/330_aborto_e_religião_nos_tribunais_b
rasileiros.pdf>.
3. Veja-se, por exemplo, o voto do Ministro Carlos Ayres Britto, relator da ADI
3510, de 5 mar. 2008: "o início da vida humana só pode coincidir com o preciso
instante da fecundação de um óvulo feminino por um espermatozóide
masculino" (
4. O acórdão do HC 87.585-8/TO só seria publicado em 26 de junho de 2009.

05.Cf. http://www.direitointegral.com/2009/02/tratados-direitos-humanos-prisao-
civil.html

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Luiz Carlos Lodi da Cruz

Sacerdote. Presidente do Pró-Vida de Anápolis. Advogado. Estudante de


Licenciatura em Bioética no Pontifício Ateneu Regina Apostolorum - Roma

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Título original: "Pacto de São José da Costa Rica: uma arma poderosíssima."

Como citar este texto: NBR 6023:2002 ABNT

CRUZ, Luiz Carlos Lodi da. Pacto de São José da Costa Rica: uma arma
poderosíssima. Em defesa do direito à vida desde a concepção. Jus Navigandi,
Teresina, ano 14, n. 2232, 11 ago. 2009. Disponível em:
<http://jus.uol.com.br/revista/texto/13305>. Acesso em: 13 abr. 2011.

Assuntos relacionados: Aborto | Crimes contra a vida | Direito Penal

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