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Desigualdade de gênero - Conceito:

O conceito de gênero é relativamente novo, fruto do movimento feminista. Sua


contribuição em mostrar que a construção do ser feminino e ser masculino não é
biológica, mas social e cultural, por meio de relações, ações e valorações, também
serviu em grande medida para desnaturalizar a desigualdade entre homens e mulheres.
Assim como as diferenças no corpo, as diferenças de comportamento e de destino eram
consideradas naturais. A conceituação do gênero como constructo social, performance,
divisão de papéis concebida e consolidada no campo das relações humanas permitiu que
as discrepâncias também fossem identificadas no campo das relações de poder e,
portanto, passíveis de mudança.

A diferença de papéis entre homens e mulheres pode ser exemplificada na divisão


sexual do trabalho. Em muitas sociedades, as mulheres ficam a cargo do trabalho
reprodutivo e do ambiente privado (cuidar da casa e da família) e os homens a cargo do
trabalho produtivo no ambiente público (empreender, governar, conduzir a política e a
economia).

A construção de masculinidade e feminilidade é aprendida desde o nascimento, envolve


a maneira de agir, sentir, falar e pensar. A diferenciação dá-se de maneira muito rígida e
hierárquica, isto é, há constrangimento e uma gama de punições para aquele que
incorporar as características do outro lado, por exemplo, homens emotivos podem ser
considerados “bananas” e mulheres que se portam com firmeza podem ser consideradas
“machonas”, não existe uma liberdade na formação para que meninos e meninas
desenvolvam suas potencialidades que estão culturalmente atreladas ao grupo oposto.
Além disso, o que é considerado “coisa de mulher”, como ser emotivo, sensível,
detalhista, é desvalorizado, o que é considerado “coisa de homem”, como ser forte, viril,
corajoso, é valorizado. Isso se reflete em todos os campos da vida.
O trabalho doméstico, mesmo essencial, é considerado inferior e por isso não é
remunerado ou é mal remunerado. Cargos de liderança e decisão por vezes são
considerados incompatíveis com o “ser feminino”, e isso é um obstáculo para que
mulheres chefiem empresas, governem países, como no passado foi usado como
justificativa para que não pudessem votar.
A legitimação da desigualdade entre homens e mulheres, em grande medida, justifica-se
com base em características físicas, diferenças hormonais, assim, a mulher é
considerada mais fraca, menos ágil, menos racional, portanto, apta a atividades menos
complexas, possuidora de um instinto maternal e, por isso, apta a ser cuidadora dos
demais por vocação, como uma missão que não carece ser reconhecida ou retribuída.
Essas percepções aparentemente validadas pela natureza são, na verdade, concepções
sociais que limitavam, e ainda limitam, o campo de possibilidades das mulheres. A
desigualdade de gênero passa pela classificação e discriminação de qualquer natureza
associada ao fato de ser homem ou ser mulher. As diferenças entre o masculino e
feminino são instrumentalizadas para controlar e cercear as possibilidades de quem se
enquadra em cada grupo.
Embora esse fenômeno prejudique a todos, ele incide de maneira mais cruel sobre as
mulheres e projeta-se não só na mentalidade, cultura e relações, mas também nas
instituições e nos aspectos materiais da existência. É uma desigualdade de poder, de
acesso, de oportunidades, de liberdade de escolha, de valoração, de prestígio etc.
produzida nas relações de gênero, ou seja, nas expectativas atribuídas ao ser masculino
e ser feminino.

Consequências da desigualdade de gênero na sociedade

A classificação das pessoas pelo gênero como melhor ou pior, inferior ou superior, gera
consequências em todos os âmbitos da vida social. No mundo do trabalho, as mulheres
recebem salários menores que os homens desempenhando as mesmas funções e
realizam mais trabalho não remunerado, isto é, serviço doméstico e de cuidador.

No âmbito das relações afetivas, as mulheres possuem menos liberdade sexual e são
duramente penalizadas quando decidem expressar-se sobre sua sexualidade, além
disso são objetificação, e isso faz com que sejam vítimas de assédio, importunação, que
em alguns casos culmina em violência sexual.
Outra consequência da objetificação é o feminicídio, isto é, elas são objetificadas ao
ponto de serem assassinadas por companheiros ou ex-companheiros quando não
desejam prosseguir no relacionamento ou encontram outros parceiros. Nas relações
familiares, pesa sobre as mães uma cobrança muito maior do que sobre os pais na
criação dos filhos.
Pode parecer que os resultados negativos da desigualdade de gênero afetam somente as
mulheres, mas eles prejudicam o conjunto da sociedade, cerceiam a liberdade de
homens que desejem seguir em caminhos profissionais ou comportamentos que são
classificados como femininos e impedem que mulheres ofereçam e desenvolvam seu
potencial em diversas áreas do conhecimento e liderança que são classificadas como
masculinas. Após o surgimento do feminismo, essa temática passou ser amplamente
debatida e alguns avanços já aconteceram, mas ainda há uma longa jornada a ser
percorrida rumo à equidade de gênero.

A igualdade entre homens e mulheres no Brasil foi consagrada na Constituição de 1988.


Desde então, têm sido desenvolvidas políticas públicas e legislação específica para
mulheres no âmbito político, no mercado de trabalho e no ambiente doméstico. Há
avanços e uma ampliação da participação feminina em todas as esferas, mas ainda há
muitos obstáculos a superar para que igualdade promulgada em lei seja plenamente
efetiva na sociedade brasileira.
Em 2019, conforme o Fórum Econômico Mundial, o Brasil ocupava a 92ª posição em
um ranking que mede a igualdade entre homens e mulheres num universo de 153 países.
As mulheres brasileiras estão sub-representação na política, têm remuneração menor,
sofrem mais assédio e estão mais vulneráveis ao desemprego. Segundo a Organização
Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o quinto país do mundo em número de
feminicídios.
Observando dados educacionais, é possível perceber que as mulheres permanecem mais
tempo na escola e têm maior escolaridade do que os homens. De acordo com a Pesquisa
Nacional por Amostras de Domicílio Contínua de 2016, feita pelo IBGE, na população
entre 25 e 44 anos, 21,5% das mulheres concluíram o Ensino Superior, enquanto entre
os homens o percentual era de 15,6%. No entanto, a maior escolaridade não se reflete no
mercado de trabalho.
Conforme o IBGE, em 2017, as mulheres brasileiras ganhavam em média 24% menos
que os homens e eram mais afetadas pelo desemprego (13.4%) do que os homens
(10,5%). Quando as pesquisas são estratificadas entre mulheres brancas e negras,
observa-se que entre estas a taxa de desemprego era ainda maior, 15,9% contra 10,6%
entre as mulheres brancas.
Um estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) constatou que a maternidade
é um dos principais motivos de discriminação sofrida por mulheres no mercado de
trabalho. A pesquisa que acompanhou a licença-maternidade de um grande grupo de
mulheres entre 2009 e 2012 apontou que metade delas foi demitida no período de até
dois anos após tirarem a licença.
Conforme a pesquisadora Cecília Machado, os salários são baixos para ser possível
pagar por uma babá ou escola privada, as creches públicas não absorvem a demanda e
muitas empresas não têm um suporte para funcionárias que são mães, sendo que esse
conjunto de fatores retira muitas delas do mercado de trabalho.
Em relação ao assédio e violência, embora haja avanços, especialmente após
a promulgação da Lei Maria da Penha (2006), é necessário ampliar a proteção de
mulheres por meio de políticas públicas. Segundo pesquisa Datafolha, no ano de 2016:

 22% das brasileiras sofreram agressão verbal;


 10% sofreram ameaça de violência física;
 8% sofreram agressão sexual;
 4% sofreram ameaça com objeto cortante ou arma de fogo;
 3% sofreram tentativa de estrangulamento ou espancamento;
 1% levou tiros.
De acordo com essa pesquisa, 503 mulheres são vítimas de violência a cada hora no
Brasil.
Quando o assunto é participação política, conforme o Mapa Mulheres na Política 2019,
relatório da ONU, o Brasil ocupa a 134ª posição entre 193 países no ranking de
representação feminina no Parlamento. O percentual de mulheres no atual Congresso
Nacional é somente de 15%.

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