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enterite viral canina é uma das causas mais comuns de diarreia infecciosa em cães com menos de 6
meses de idade. O parvovírus (CPV; do inglês, canine parvovirus)­2 e o coronavírus (CoVC) caninos
têm  sido  incriminados  como  patógenos  primários.  O  CPV­1  e  os  rotavírus  caninos  (CRV;  do  inglês,
canine rotaviruses) podem causar doença leve a inaparente em filhotes caninos jovens (com menos de
8  semanas  de  idade)  e  seu  significado  clínico  é  considerado  baixo.  Foram  isolados  ou  identificados
astrovírus,  herpes­vírus,  enterovírus,  calicivírus,  vírus  parainfluenza,  reovírus  e  outras  partículas
similares a vírus em fezes de cães com diarreia, mas sua patogenicidade é incerta.*

Etiologia
Os CPV são pequenos vírus de DNA sem envoltório que precisam de células em divisão rápida para
sua replicação (Figura 8.1). Como no caso de todos os parvovírus, o CPV­2 e o 1 são muito estáveis e
resistentes a influências ambientais adversas (ver Criação). No texto a seguir, vamos usar CPV como
um  termo  geral  para  cepas  do  CPV;  as  cepas  específicas  serão  designadas  por  seus  respectivos
números.
É provável que a enterite causada pelo CPV seja um dos distúrbios infecciosos mais comuns de cães,
e  esse  vírus  o  mais  prevalente  nos  cães  com  diarreia  infecciosa.287,297  Essa  doença  altamente
contagiosa,  quase  sempre  fatal,  é  causada  pelas  cepas  do  CPV­2  (2,  2a,  2b  e  2c).  Como  outros
parvovírus de carnívoros, ele pertence ao subgrupo de parvovírus felinos do gênero Parvovirus.272 O
CPV­2 evoluiu a partir de uma fonte desconhecida de parvovírus no período de 10 anos antes de sua
adaptação  completa  aos  cães  e  da  disseminação  pandêmica  no  final  da  década  de  1970.19,206,251
Subsequentemente,  como  resultado  de  mutações  e  seleção  imune,  a  cepa  original  do  CPV­2  sofreu
mutações  genéticas  no  cão,  com  o  desenvolvimento  de  novas  cepas  virais.201,202,204  Em  1980,  a  cepa
original do CPV­2 evoluiu para o tipo 2a (CPV­2a); em 1984, surgiu outra variante, designada tipo 2b
(CPV­2b).  No  ano  2000,  outra  cepa  (CPV­2c)  foi  isolada  pela  primeira  vez  em  cães  na  Itália.15,151
Conhecida como Glu426, essa cepa tem uma substituição do aminoácido na posição 426 de asparagina/
ácido  aspártico  para  ácido  glutâmico  e  alterou  o  local  antigênico  do  capsídio  viral,  epítopo  A,
disseminando­se  rapidamente  e  tornando­se  um  dos  principais  isolados  em  todo  o  mundo.*  Essas
alterações  no  CPV  foram  associadas  a  adaptação  genética  e  mudança  na  região  do  epítopo  B  do
capsídio,  capacitando  o  parvovírus  a  replicar­se  e  disseminar­se  de  maneira  mais  eficaz  em  cães
suscetíveis,  além  da  propriedade  de  infectar  gatos.  Também  foram  identificadas  várias  cepas
coinfectando  o  mesmo  cão  ou  gato.8,105,283 Além  disso,  há  evidência  inicial  de  recombinação  entre  o
vírus  da  panleucopenia  felina  (FPV;  do  inglês,  feline  panleukopenia  virus)  e  cepas  do  CPV  na
natureza.190 As cepas do CPV­2 são pouco frequentes e os isolados são 2a, 2b ou 2c. Na América do
Sul, na Europa e no norte da África, todas as três foram observadas em muitos países onde se obteve
grande  número  de  amostras.  Os  isolados  2b  e  2c  predominam  na América  do  Norte.  Na  Ásia  e  em
nações insulares isoladas com restrições para importação, como o Reino Unido, o Japão e a Austrália,
predominam as cepas 2a e 2b.33,45,164

Figura 8.1 Estrutura do parvovírus. (Arte de Kip Carter © 2004 University of Georgia Research Foundation.)

Mutações  genéticas  na  estrutura  da  superfície  do  receptor  de  transferrina  do  vírus  resultaram  em
alterações estruturais que controlam a adaptação do hospedeiro de cepas do CPV e podem influenciar a
reatividade cruzada em testes imunológicos.97,113,272 Em comparações lado a lado, há possibilidade de a
virulência de cepas geneticamente diferentes variar.176 A relevância clínica dessas alterações estruturais
e  o  grau  de  proteção  cruzada  heteróloga  entre  as  cepas  precisa  de  uma  classificação  adicional  (ver
Proteção  por  cepa  heteróloga,  no  item  Prevenção).  Para  uma  discussão  adicional  sobre  as  cepas  do
CPV em gatos, ver Infecção pelo parvovírus canino em gatos, no Capítulo 9.

Epidemiologia
Foram  relatadas  infecções  naturais  pelo  CPV  em  cães  domésticos  (Canis  familiaris),  cachorros­do­
mato  (Speothos  venaticus),  coiotes  (Canis  latrans),  lobos  (Canis  lupus),  raposas­do­mato  ou
guaraxains  da  América  do  Sul  (Cerdocyon  thous)  e  lobos­guarás  (Chrysocyon  brachyurus);  se  não
todos, a maioria dos canídeos é suscetível. Infecções experimentais podem ser provocadas em furões
domésticos, visões e gatos, mas em geral são autolimitadas. Foi isolado em guaxinins um parvovírus
relacionado, mas geneticamente distinto.130 Os isolados originais de CPV­2 causaram apenas infecções
sistêmicas  e  intestinais  em  cães,274  enquanto  as  cepas  mais  novas  dos  tipos  2a  e  2b  podem  infectar
felinos  tanto  em  circunstâncias  experimentais167,173,278  quanto  naturais171,273  (ver  Infecção  pelo
parvovírus  felino,  no  Capítulo  9).  Em  cães  domésticos,  a  infecção  pelo  CPV  não  resulta
necessariamente  em  doença  aparente;  muitos  cães  que  adquirem  a  infecção  experimental  nunca
desenvolvem sinais clínicos francos, em especial quando há anticorpos maternos residuais. Quando a
doença ocorre, a apresentação clínica é mais grave em filhotes caninos jovens em crescimento rápido
que  abrigam  helmintos  intestinais,  protozoários  e  certas  bactérias  entéricas,  como  Clostridium
perfringens,  Campylobacter  spp.  e  Salmonella  spp.  Em  animais  suscetíveis,  a  incidência  de  doença
grave e de óbitos pode ser muito alta.
O  CPV  é  altamente  contagioso,  e  a  maioria  das  infecções  ocorre  como  resultado  do  contato  com
fezes  contaminadas  no  ambiente.  Além  disso,  em  seres  humanos,  instrumentos  (equipamentos  em
instituições veterinárias ou de tosa), insetos e roedores podem servir como vetores. Há possibilidade de
cães transportarem o vírus na pelagem por longos períodos. O tempo de incubação das cepas originais
do CPV­2 em campo foi de 7 a 14 dias; no contexto experimental, foi de 4 a 5 dias. No caso das cepas
do CPV­2a, 2b e 2c, o período de incubação pode ser tão curto quanto de 4 a 6 dias.40,48,258
É  possível  observar  enterite  aguda  causada  pelo  CPV  em  cães  de  qualquer  raça,  idade  ou  sexo.
Apesar  disso,  filhotes  caninos  entre  6  semanas  e  6  meses  de  idade,  cães  das  raças  Rottweiler,
Dobermann  Pinscher,  Labrador  Retriever,  American  Staffordshire  Terrier,  Pastor­alemão  e  os  de
corrida de trenó (sled dogs) do Alasca parecem estar sob maior risco. 90,101,112 Também foram relatados
alguns surtos de gastrenterite grave com mortalidade por infecções pelo CPV­2c em cães adultos (com
mais de 6 meses de idade).18,43,44

Patogenia
O  CPV  dissemina­se  rapidamente  de  um  cão  para  outro  via  exposição  a  fezes  contaminadas.  A
replicação do vírus inicia­se no tecido linfoide da orofaringe, em linfonodos mesentéricos e no timo,
disseminando­se  para  as  criptas  intestinais  do  intestino  delgado  por  meio  de  viremia.  Observa­se
viremia plasmática acentuada 1 a 5 dias após a aquisição da infecção. Subsequentemente à viremia, o
CPV localiza­se, na maioria dos casos, no epitélio de revestimento gastrintestinal (GI) da língua e das
mucosas bucal e esofágica, bem como no intestino delgado e no tecido linfoide, como timo, linfonodos
e medula óssea. Também pode ser isolado dos pulmões, do baço, do fígado, dos rins e do miocárdio.294
Normalmente, as células epiteliais das criptas intestinais amadurecem no intestino delgado e, então,
migram do epitélio germinativo das criptas para as extremidades das vilosidades (Figura 8.2 A). Após
alcançarem as extremidades das vilosidades, as células epiteliais intestinais adquirem sua capacidade
de absorção e ajudam a assimilar os nutrientes. O parvovírus infecta o epitélio germinativo das criptas
intestinais,  causando  destruição  e  colapso  do  epitélio  (Figura  8.2  B).  Como  resultado,  a  renovação
celular normal (em geral, entre 1 e 3 dias no intestino delgado) é prejudicada e as vilosidades ficam
mais  curtas.  O  CPV  também  destrói  mitoticamente  precursores  ativos  de  leucócitos  circulantes  e
células linfoides. Nas infecções graves, os resultados costumam ser neutropenia e linfopenia. Infecções
bacterianas  secundárias  por  flora  gram­negativa  e  anaeróbica  causam  complicações  adicionais
relacionadas  com  dano  intestinal,  bacteriemia  e  entotoxemia,  além  de  coagulação  intravascular
disseminada.192,276,277 A  excreção  ativa  de  cepas  do  CPV­2  começa  no  terceiro  ou  quarto  dia  após  a
exposição,  em  geral  antes  do  surgimento  dos  sinais  clínicos  francos.  O  CPV­2  é  eliminado
extensamente nas fezes por um máximo de 7 a 10 dias após a inoculação, conforme determinado pelos
métodos de isolamento do vírus e ensaio imunossorvente ligado a enzima (ELISA; do inglês, enzyme­
linked  immunosorbent  assay).  No  entanto,  empregando­se  ensaios  de  detecção  do  ácido  nucleico
(reação em cadeia da polimerase [PCR] em tempo real), foram detectadas variantes (a, b, c) do CPV­2
nas fezes por várias semanas após a infecção.40,48 É mais provável que o desenvolvimento de anticorpos
intestinais locais seja importante para o término da excreção fecal do parvovírus. Os títulos séricos de
anticorpo  podem  ser  detectados  já  com  3  a  4  dias  após  a  infecção  e  permanecer  razoavelmente
constantes por pelo menos 1 ano.

Achados clínicos
A  infecção  pelo  CPV  foi  associada  a  três  tecidos  principais  –  trato  GI,  medula  óssea  e  miocárdio  –,
mas  a  pele  e  o  tecido  nervoso  também  podem  ser  acometidos. Além  disso,  é  possível  haver  outras
complicações clínicas decorrentes de infecção secundária ou trombose. Observa­se variação acentuada
na resposta clínica de cães à infecção intestinal com o CPV, que vai desde infecção inaparente a doença
aguda  fatal.  Ocorre  infecção  inaparente,  ou  subclínica,  na  maioria  dos  cães,  sobretudo  em  filhotes
caninos com títulos intermediários de anticorpos de origem materna, que podem protegê­los da doença,
mas não da infecção.

Enterite causada pelo parvovírus


A enterite causada pelo CPV pode progredir rapidamente, em especial no caso de infecção pelas cepas
mais  novas  (a,  b,  c)  do  CPV­2.  Os  vômitos  em  geral  são  graves  e  seguidos  por  diarreia,  anorexia  e
início  rápido  de  desidratação.  As  fezes  são  amarelo­acinzentadas  e  com  estrias  de  sangue  ou
escurecidas  por  ele  (Figura 8.3).  Pode  haver  tanto  elevação  da  temperatura  retal  (40  a  41°C)  quanto
leucopenia  (sobretudo  linfopenia),  em  particular  nos  casos  graves. As  contagens  totais  de  leucócitos
podem estar dentro dos parâmetros de referência, em razão da linfopenia concomitante induzida pelo
vírus e da neutrofilia resultante de infecções por bactérias oportunistas. Os animais que desenvolvem a
síndrome da resposta inflamatória sistêmica estão mais sujeitos à mortalidade.125a A morte pode ocorrer
tão cedo quanto 2 dias após o início da doença e em geral está associada a sepse por gram­negativos ou
coagulação intravascular disseminada, ou ambas.

Figura 8.2 A. Vilosidade intestinal normal, mostrando diferenciação celular ao longo de sua extensão. B.  Vilosidade
infectada  pelo  parvovírus  mostrando  colapso  e  necrose.  (Arte  de  Dan  Beisel  e  Kip  Carter  ©  2004  University  of
Georgia Research Foundation.)

Doença neurológica
Há  possibilidade  de  o  CPV  causar  doença  neurológica  primária,  porém  ela  é  mais  comum  como
resultado de hemorragia no sistema nervoso central (SNC) em decorrência de coagulação intravascular
disseminada  ou  da  hipoglicemia  durante  o  processo  mórbido,  sepse  ou  distúrbios  no  equilíbrio
acidobásico.2 Também é possível haver infecção concomitante com outros vírus, como o da cinomose.
Hipoplasia  cerebelar  macroscópica,  comum  em  filhotes  de  gatos  infectados  no  período  pré­natal  ou
neonatal  com  o  FPV,  não  foi  frequentemente  associada  à  infecção  pelo  CPV.  O  DNA  do  CPV  foi
amplificado usando­se a PCR em tecido cerebral de 2 cães com hipoplasia cerebelar, mas o tempo de
exposição  ao  CPV  não  foi  mencionado.241  Esse  vírus  foi  detectado  por  imuno­histoquímica  e
hibridização in situ em lesões do SNC de filhotes caninos resultantes de cruzamentos consanguíneos e
com leucoencefalopatia.241a O CPV foi identificado por imuno­histoquímica em muitos tipos celulares
(inclusive neurônios) no interior do SNC de filhotes caninos com tremores generalizados e dismetria da
marcha  em  membro  pélvico.248  Encontrou­se  meningite  linfo­histiocítica  leve  a  moderada  ou
leucoencefalite e, em um caso, havia vacuolização cerebelar e da substância branca cerebral. A imuno­
histoquímica  falhou  em  demonstrar  antígenos  contra  o  CPV­2  no  cérebro  de  cães279  com  sinais  de
enterite  pelo  parvovírus  e  sem  manifestações  clínicas,  mas  com  alterações  histopatológicas
neurodegenerativas  discretas.  Entretanto,  o  DNA60  e  o  RNA  mensageiro  (mRNA) 76  do  CPV  foram
detectados  inclusive  em  títulos  elevados  no  cérebro  de  cães  sem  sinais  neurológicos,  indicando
replicação ativa do vírus nos tecidos nervosos. Além disso, foram detectadas sequências do CPV­2 no
cérebro  de  gatos  pelos  mesmos  pesquisadores,  porém  não  foram  incluídos  controles  negativos  com
relação  à  PCR  para  eliminar  a  possibilidade  de  contaminação  laboratorial  das  amostras  processadas,
sendo  necessária  maior  investigação  (ver  também  Infecção  do  sistema  nervoso  central  no  item
Infecção pelo parvovírus felino, no Capítulo 9).

Figura  8.3  Cão  com  diarreia  sanguinolenta  grave,  característica  de  enterite  grave  pelo  parvovírus.  (Fotografia  de
Craig Greene © 2004 University of Georgia Research Foundation.)

Doença cutânea
Diagnosticou­se  eritema  multiforme  em  um  cão  com  enterite  causada  por  parvovírus.81  As  lesões
cutâneas incluíram ulceração dos coxins plantares em pontos submetidos a pressão e na mucosa bucal e
vaginal.  Também  havia  vesículas  na  cavidade  bucal  e  placas  eritematosas  no  abdome  e  na  pele
perivulvar. Parvovírus foi confirmado por imuno­histoquímica nas células acometidas.
Miocardite causada pelo parvovírus canino 2
Pode  ocorrer  miocardite  decorrente  de  infecção  in  utero  ou  em  filhotes  caninos  com  menos  de  6
semanas de idade. Em geral, todos os filhotes de uma ninhada são acometidos. Aqueles com miocardite
causada pelo CPV em geral morrem, ou sucumbem após um episódio curto de dispneia, choro e ânsia
de vômito. É possível os sinais de disfunção cardíaca serem precedidos pela forma entérica da doença
ou  ocorrerem  subitamente,  sem  afecção  prévia  aparente.  O  espectro  de  doença  miocárdica  em
indivíduos é amplo e pode incluir qualquer dos seguintes: diarreia aguda e morte, sem sinais cardíacos;
diarreia e recuperação aparente seguida pela morte, semanas ou meses mais tarde, como resultado de
insuficiência cardíaca congestiva; ou início súbito de insuficiência cardíaca congestiva, observada em
filhotes caninos aparentemente normais com 6 semanas a 6 meses de idade. A doença miocárdica vem
se  tornando  cada  vez  menos  comum  em  cães  infectados  por  parvovírus,  desde  a  disseminação
pandêmica original do CPV­2 no final da década de 1970.2 Depois desse surto, a maioria das cadelas
foi  vacinada  ou  exposta  a  cepas  do  CPV,  tendo  desenvolvido  respostas  imunes  humorais  fortes;
portanto, o alto título de anticorpos de origem materna em filhotes caninos lactentes evita a ocorrência
de  infecção  neonatal  com  o  vírus  no  período  inicial  da  vida,  quando  está  ocorrendo  a  replicação  de
células  miocárdicas.  Ocasionalmente,  ainda  se  detecta  miocardite  em  filhotes  caninos  que  não
mamaram  o  suficiente  ou  nasceram  de  cadelas  isoladas,  não  vacinadas.288  Com  ou  sem  enterite,  a
miocardite foi associada a infecções naturais com o CPV­2a e 2b em cães com 6 a 14 semanas de idade
na  Coreia.295 A  infecção  pelo  CPV  não  parece  ser  uma  causa  comum  de  doença  cardíaca,  porque  a
análise por PCR à necropsia de 27 cães com miocardiopatia dilatada ou miocardite não detectou o CPV
em qualquer das amostras.159

Trombose
Cães com infecções naturais pelo CPV têm evidência clínica e laboratorial de hipercoagulabilidade,194
podendo desenvolver trombose ou flebite com cateteres ou trombos viscerais.

Bacteriúria
Detectou­se  infecção  assintomática  do  trato  urinário  em  aproximadamente  25%  de  filhotes  caninos
após enterite por CPV.131 Tal predisposição foi atribuída à contaminação fecal da genitália externa em
associação a neutropenia. A infecção subclínica do trato urinário não tratada pode resultar em infecção
urinária crônica como uma consequência indesejável.

Infecção de cateter intravenoso


Foram  isoladas  bactérias  de  origem  GI  ou  ambiental  de  cateteres  intravenosos  retirados  de  cães  que
estavam  sendo  tratados  por  causa  da  suspeita  de  infecções  por  parvovírus.141  A  maioria  desses
organismos  era  formada  por  tipos  gram­negativos  (Serratia,  Acinetobacter,  Citrobacter,  Klebsiella  e
Escherichia) e foi resistente às penicilinas, cefalosporinas de primeira geração e macrolídeos, embora
tenham sido suscetíveis aos aminoglicosídios, quinolonas, cloranfenicol, sulfonamidas potencializadas
e  penicilinas  potencializadas  com  clavulanato.  Apesar  dos  resultados  positivos  da  cultura  das
extremidades dos cateteres, nenhum dos cães mostrou sinais clínicos sistêmicos de infecção, apenas um
deles desenvolveu flebite local.

Diagnóstico
O início súbito de diarreia sanguinolenta de odor fétido em um cão jovem (com menos de 2 anos de
idade)  em  geral  é  considerado  indicativo  de  infecção  por  CPV.  Contudo,  nem  todos  os  cães  com
diarreia sanguinolenta (com ou sem vômitos) estão necessariamente infectados com o CPV, e diarreia
não  hemorrágica  em  geral  é  causada  pelo  CPV.  Infecções  parasitárias  ou  por  bactérias
enteropatogênicas, sozinhas ou combinadas, também devem ser consideradas64 (ver Capítulo 37), bem
como outras infecções virais, inclusive por CoVC entéricos e pantrópicos.37 Em raros casos, todos os
sinais  clínicos  característicos  de  infecção  pelo  CPV  estão  evidentes  ao  mesmo  tempo. A  leucopenia,
embora não encontrada em todos os cães, costuma ser proporcional à gravidade e ao estágio da doença
no momento da coleta do sangue. O monitoramento das alterações leucocitárias pode dar informação
prognóstica sobre a evolução provável da infecção.91 Filhotes caninos que morrem por causa da doença
em  geral  apresentam  contagens  leucocitárias  totais  iguais  ou  inferiores  a  1.030  células/μ ℓ   e  têm
linfocitopenia,  monocitopenia  e  eosinopenia  persistentes  nos  primeiros  3  dias  de  hospitalização.
Resultados  anormais  nas  provas  de  coagulação  podem  incluir  prolongamento  do  tempo  de
tromboplastina  parcial  ativado,  aumento  da  amplitude  do  tromboelastograma  e  menor  atividade  da
antitrombina III.194 Em cães com enterite causada por parvovírus, os níveis séricos de colesterol total e
lipoproteína de alta densidade diminuíram e os de triglicerídios aumentaram, embora os aumentos no
colesterol  tenham  sido  proporcionais  à  gravidade  da  doença.299  Similarmente,  concentrações  séricas
altas de cortisol e baixas de tiroxina 24 e 48 h após a hospitalização foram associadas a mortalidade em
cães com diarreia causada por parvovírus.243 A troponina I cardíaca é um marcador plasmático de dano
miocárdico e tem sido usada para detectar lesão cardíaca após doenças traumáticas ou infecciosas em
cães. Cães com 6 meses a 4 anos de idade e infecção por parvovírus não tinham níveis elevados,73 o
que  sugere  que  o  dano  miocárdico  é  restrito  a  filhotes  caninos  muito  jovens.  Os  índices  de  estresse
eritrocitário  oxidativo  foram  significativamente  maiores  em  cães  com  gastrenterite  e  resultados
positivos para CPV fecal à PCR do que naqueles com resultados negativos.196

Detecção do organismo
Testes  antigênicos  pelo  ELISA fecal  estão  disponíveis  para  uso  hospitalar  em  casos  de  infecção  pelo
CPV. Tais testes são específicos, porém pouco sensíveis para detectar infecção pelo CPV.* Ao usar o
ELISA,  lembre­se  de  que  o  período  de  eliminação  fecal  costuma  ser  curto,  correspondendo  aos
primeiros dias de doença clínica. Com um período de incubação que varia de 4 a 6 dias, é raro detectar
cepas do CPV pelo ELISA por mais de 10 a 12 dias após a infecção natural, e a eliminação pode ser
intermitente. Portanto, resultados negativos durante ou após esse período não excluem a possibilidade
de  infecção  pelo  CPV.  Resultados  falso­negativos  obtidos  com  métodos  com  base  no  ELISA  foram
associados  ao  surgimento  precoce  de  anticorpos,  capazes  de  sequestrar  partículas  do  CPV  no  lúmen
intestinal, impedindo assim a ligação subsequente ao anticorpo monoclonal utilizado no teste.69 Não há
diferença  significativa  na  capacidade  de  detecção  de  variantes  do  CPV­2  pelos  testes  ELISA,  com  a
recém­surgida  CPV­2c  sendo  detectada  nas  mesmas  taxas  da  CPV­2a  ou  da  CPV­2b.46 Os resultados
negativos  no  teste  ELISA  para  o  CPV  podem  ser  confirmados  pelos  métodos  de  PCR.  Resultados
positivos  confirmam  infecção  ou  é  possível  que  sejam  encontrados  quando  se  empregam  alguns  dos
métodos  de  ensaio  comerciais  após  a  administração  de  vacinas  com  o  CPV  vivo  atenuado.  Em
contraste  com  os  resultados  fortemente  positivos  habituais  após  infecção  natural,  o  vírus  da  vacina
pode levar a um resultado falso­positivo fraco em cães 4 a 8 dias após a vacinação.
Também  foi  desenvolvido  um  teste  de  aglutinação  em  lâmina,  em  que  se  utilizam  eritrócitos  de
suínos para detectar o CPV­2 em amostras fecais e intestinais.157 Pode­se usar a hemaglutinação com
eritrócitos suínos ou felinos para detectar o CPV­2, mas provou­se que ela é apenas ligeiramente mais
sensível  do  que  o  ELISA  e  pouco  específica  com  relação  à  possível  existência  de  isoaglutininas  em
amostras fecais ou outros vírus hemaglutinantes (sobretudo reovírus). Além disso, esse método requer
a disponibilidade constante de doadores de eritrócitos.69
Outros procedimentos de imunoensaio têm sido usados para detectar vírus nas fezes ou em tecidos
(ver  Achados  patológicos).  O  CPV  tipicamente  acarreta  lesões  no  jejuno,  no  íleo,  nos  linfonodos
mesentéricos e em outros tecidos linfoides, podendo ser isolado desses tecidos ou de fezes por meio de
sistemas de cultura tecidual, se isso for feito logo de início. Em uma fase mais adiantada da evolução
da  doença,  os  vírions  ficam  cobertos  por  anticorpos  e  são  depurados.  São  observadas  inclusões  na
maioria  dos  tecidos.  No  epitélio  lingual,  é  parecer  que  tais  inclusões  estão  dentro  do  citoplasma,
quando na verdade originam­se no espaço nuclear.115 Também há possibilidade de serem empregados
métodos imunoquímicos, em conjunto com microscopia óptica (MO) ou eletrônica (ME), para detectar
vírus em cultura de tecidos ou fezes (ver Achados patológicos).
Os  métodos  de  amplificação  do  ácido  nucleico  baseados  no  DNA  viral  aumentaram  bastante  a
sensibilidade  da  detecção  do  vírus.69  Não  apenas  a  metodologia  da  PCR  tem  sido  um  meio  sensível
para detectar o CPV nas fezes de cães infectados,26,167,173,281 como também ensaios quantitativos (PCR
em  tempo  real)  podem  dar  uma  estimativa  da  carga  de  DNA  viral. 52,133a  Embora  os  métodos
imunoquímicos  e  de  isolamento  viral  geralmente  detectem  vírus  nas  fezes  por  menos  de  10  dias  de
infecção,  os  resultados  da  PCR  quantitativa  para  o  CPV­2c  atingiram  o  máximo  em  10  dias  e
permaneceram  positivos,  ainda  que  em  níveis  inferiores,  por  até  54  dias.48  Estudos  de  transmissão
precisam  determinar  se  o  vírus  detectado  pela  PCR  é  infeccioso.  A  PCR  também  detecta  o  vírus
vacinal no sangue e nas fezes por pelo menos 2 semanas após a vacinação.244a,285 O ensaio quantitativo
para  o  vírus  foi  capaz  de  distinguir  a  infecção  decorrente  da  vacinação  versus  a  natural  porque,  no
último caso, a carga viral é maior.285 Além disso, agora dispõe­se dos ensaios de PCR em tempo real
com  sondas  de  ligação  de  sulco  mínimo  para  a  identificação  específica  das  variantes  do  CPV­2
circulantes em campo53  e  para  a  discriminação entre cepas vacinais e de campo.51,58 Tais  ensaios  são
particularmente úteis para excluir a reversão potencial para virulência do vírus da vacina ou, com mais
frequência,  a  detecção  simultânea  de  cepas  da  vacina  e  de  campo  do  CPV  em  filhotes  caninos  que
apresentam gastrenterite aguda logo após vacinação com o CPV.49

Detecção de anticorpo
A sorologia não é o melhor método para diagnosticar infecção pelo CPV, porque a maioria dos cães é
vacinada  contra  ele  ou  já  foi  exposta  a  ele  antes.  Em  contrapartida,  os  testes  sorológicos  podem  ser
úteis  para  avaliar  os  títulos  de  anticorpos  maternos  em  filhotes  caninos  ainda  não  vacinados.  Como
regra  geral,  os  parvovírus  causam  hemaglutinação  de  eritrócitos.  É  possível  usar  a  inibição  da
hemaglutinação (IH) de eritrócitos porcinos pelo CPV adicionando­se soros de teste para demonstrar a
existência  do  anticorpo  sérico  específico  contra  o  CPV.157  Um  alto  título  na  IH  feita  com  uma  única
amostra de soro coletada após um cão não vacinado ter ficado clinicamente enfermo por 3 dias ou mais
é  diagnóstico  de  infecção  pelo  CPV.  Também  é  possível  demonstrar  títulos  em  elevação
(soroconversão) quando são comparadas amostras de soro das fases aguda e de convalescença em 10 a
14  dias,  usando­se  CPV  ou  parvovírus  felino  (FPV;  do  inglês,  feline  parvovirus)  em  testes  de  IH  e
neutralização viral (NV). Dispõe­se ainda do ELISA para distinguir IgG de IgM. 235 Há kits comerciais
para  realização  do  ELISA  em  consultório,  destinados  a  estimativas  semiquantitativas  de  IgG  e  IgM
(Immunocomb, Biogal Labs, Megiddo, Israel)289–291 e para determinação dos títulos adequados de IgG
para vacinação (TiterCHEK CPV/CDV Test Kit, Synbiotics, San Diego, CA).

Achados patológicos
As  lesões  iniciais  são  mais  pronunciadas  no  duodeno  distal;  em  seguida,  o  jejuno  é  acometido  mais
gravemente. A parede intestinal costuma estar espessada e com alteração da cor em segmentos, áspera
ou com fibrina aderida nas superfícies serosas; dentro do lúmen, há desnudação da mucosa intestinal e
material  escuro  aquoso,  às  vezes  sanguinolento,  no  estômago  e  no  intestino  (Figura  8.4).  Nos  casos
leves, não é fácil distinguir as lesões daquelas de uma enterite inespecífica. Foram observados aumento
e edema de linfonodos torácicos e abdominais.
As  lesões  intestinais  caracterizam­se  por  necrose  do  epitélio  das  criptas  no  intestino  delgado.261
Podem ser vistos corpúsculos de inclusão intranucleares nessas células epiteliais e por todo o epitélio
descamativo  do  trato  GI  superior.158  Há  possibilidade  de  as  alterações  patológicas  variarem  de
inflamação  discreta  a  enterite  hemorrágica  difusa.  As  vilosidades  estão  encurtadas  ou  obliteradas
devido  à  ausência  de  substituição  epitelial  pelas  células  em  maturação  das  criptas,  resultando  em
colapso  da  lâmina  própria  (Figura  8.5).  Há  necrose  e  depleção  do  tecido  linfoide  (p.  ex.,  placas  de
Peyer,  linfonodos  mesentéricos,  timo  e  baço).  É  possível  observar  edema  pulmonar  ou  alveolite  em
cães que morrem em decorrência de septicemia como complicação.277 O exame histológico costuma ser
definitivo,  embora  possa  haver  identificação  específica  do  parvovírus  em  amostras  de  tecidos  por
imunofluorescência  ou  outros  métodos  imunoquímicos.  O  teste  do  anticorpo  fluorescente  indireto
possibilita  encontrar  o  antígeno  em  cães  com  enterite  letal  pelo  CPV  no  lado  dorsal  da  língua  (em
96,3% dos casos), na faringe (81%), no esôfago (50%), na parte ventral da língua (20,4%), no plano
nasal (5,6%), na mucosa do intestino delgado (85,2%), na medula óssea (81,6%), no baço (79,6%), no
timo  (66,7%),  em  linfonodos  mesentéricos  (50,4%),  nas  tonsilas  palatinas  (58,5%)  e  no  miocárdio
(1,9%).294 A  hibridização  in  situ  ou  os  métodos  quantitativos  da  PCR  têm  sido  recursos  específicos
valiosos para a identificação do vírus em amostras de tecidos.76,287 Ele pode ser detectado com maior
prevalência  na  língua,  em  comparação  com  outros  tecidos,  quando  há  autólise  ou  congelamento  e
descongelamento antes da necropsia.162 A PCR quantitativa de amostras de cães com a infecção natural
mostrou distribuição tecidual similar entre as cepas virais, com as mais altas concentrações do vírus em
tecidos linfoides, níveis intermediários no tecido nervoso e os mais baixos na bexiga.59
A  miocardite  causada  pelo  parvovírus,  quando  houver,  é  reconhecida  à  observação  macroscópica
como  estrias  pálidas  no  miocárdio  (Figura 8.6). As  lesões  miocárdicas  consistem  em  miocardite  não
supurativa  com  infiltração  multifocal  de  linfócitos  e  plasmócitos  dentro  do  miocárdio.  Foram
observados  corpúsculos  de  inclusão  basofílicos  nas  fibras  do  músculo  cardíaco  e  demonstradas
partículas virais semelhantes às do parvovírus à ME e pela hibridização in situ288  nos  corpúsculos  de
inclusão.

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