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1 INTRODUÇÃO

O período antigo da filosofia divide-se em três importantes momentos: o período Pré-


Socrático, o Período Ático (ou Clássico), e o Período Helênico; estes três formam a base do
pensamento filosófico ocidental. O período Pré-Socrático é marcado pela reflexão sobre o
cosmos, sobre a constituição de todas as coisas. Estes primeiros filósofos buscavam um
substrato comum que, supostamente, deu origem a todas as coisas. Entre estes pensadores
estava Empédocles, mas sua maneira de pensar divergia da concepção de sua época e, por isso,
sua reflexão promoveu um grande avanço na reflexão daqueles tempos.
De seus antecessores, citamos as figuras de Tales, que propunha que tal substrato era
a água ou, mais precisamente, o úmido. Anaximandro acreditava que aquela substância era
indeterminada e, por isso, afirmou que a arché era o apeiron. Anaxímenes acreditava que o ar
era a substância comum; Heráclito, por sua vez, via no mundo uma razão (logos) que ele
acreditava ser comum a tudo que existe, mas que era representado pelo fogo; já Parmênides
acreditava que o Ser era o que existia de mais intrínseco nas coisas e que dava a elas as suas
características. A inovação de Empédocles, diante disso, consiste no fato de ele não escolher
uma substância como arché, mas propôs a existência de quatro, a saber: o fogo, a água, a terra
e o ar.
A criação e morte, para ele, não existem; o que existe é somente uma relação de
associação e dissolução dos elementos por meio das forças do amor e do ódio. Tais concepções,
pode-se dizer, foram refletidas em sua maneira de viver, de modo que, para muitos, era
considerado um louco, bruxo, enquanto que para outros era considerado um deus.
Abordaremos, neste trabalho, questões relativas à sua vida e pensamento, expondo de
maneira breve o seu raciocínio e, por fim, exporemos a sua importância para o avanço da
filosofia.

2 VIDA

Empédocles foi um dos filósofos pré-socráticos mais enigmáticos pois existem


diversos elementos misteriosos que cercam a sua vida. Pouco se sabe sobre ele, mas é fato que
ele nasceu em Agrigento, uma colona siciliana por volta de 490 a.C. e faleceu por volta de 435
a.C. Sabe-se, também, que o filósofo herdou o nome de seu avô, dado por seu pai, Melton.
De acordo com Burnet (2006, p. 218), ao que tudo indica, Empédocles seguiu o
exemplo de seus antepassados tendo uma forte participação política. No entanto, afirma Burnet
(2006), pouco do que diz respeito à sua vida pública chegou até nós a não ser o próprio caráter
democrático de sua obra.
Uma outra face de Empédocles diz respeito à sua dimensão religiosa. Contam os
historiadores que ele se dizia ser um deus e que, por isso, esperava receber veneração de seus
concidadãos. Embora haja indícios de que pertenceu à Ordem Pitagórica e que, posteriormente,
foi expulso da mesma por roubar discursos (cf. BURNET 2006, p. 218), como “taumaturgo”
propunha uma religião que promovesse uma libertação da concepção da época por meio da
pureza e da abstinência.
Além disso, Aristóteles afirmou que Empédocles foi o inventor da retórica e relatos
históricos sustentam a afirmação de que ele foi o fundador da escola italiana de medicina,
exercendo influência, inclusive, nos estudos médicos que seguiram, como também todo o
pensamento científico.

A doutrina fundamental dessa escola foi a identificação dos quatro elementos com o
quente e o frio, o úmido e o seco. Ela também afirmava que respiramos por todos os
poros do corpo e que o ato da respiração liga-se estreitamente ao movimento
sangüíneo [sic]. O coração, e não o cérebro, era visto como órgão da consciência. Uma
característica mais externa da medicina ensinada pelos seguidores de Empédocles é
que eles continuaram a se apegar a idéias [sic] de natureza mágica (BURNET, 2006,
p. 219).

Em suma, o pensador era considerado “um misto de cientista, de místico, de


alcmeônida, de pitagórico e de órfico” (OS PRÉ SOCRÁTICOS, 1990, não paginado). No que
diz respeito à sua morte, alguns afirmam ele teria se suicidado atirando-se no vulcão Etna para
provar a sua origem divina. Há outra lenda que afirma que ele teria desaparecido
misteriosamente durante um ritual religioso.
Sobre a sua obra, sabe-se que ele escreveu dois poemas: Sobre a Natureza e Purifições.
O primeiro livro apresenta sua cosmovisão pluralista, enquanto que o segundo trata de uma
doutrina religiosa apresentada pelo autor.

3 PENSAMENTO COSMOLÓGICO

Empédocles promove um grande avanço na concepção cosmológica em que estava


inserido. Até o momento, a reflexão sobre a natureza havia rendido a compreensão de que havia
um substrato primordial que não morreria (athánatos), não envelheceria (aguéros) e que fosse
comum a todos os seres. Este elemento único seria, portanto, a arché (princípio) de todas as
coisas. Com Parmênides, a concepção toma novo corpo com a descoberta do Ser e o princípio
da não contrariedade (o que é não pode não ser). Diante desta concepção monista, Empédocles
apresenta a novidade pluralista.
Assim como Parmênides, Empédocles acreditava que que é impossível o “nascer” e o
“morrer”, isto é, nada pode vir do nada e voltar ao nada, pois, se isso fosse possível, deveria
haver um outro princípio diferente daquele que é. Se é, não pode deixar de ser. Assim, na
concepção de Empédocles, o nascimento das coisas se dava por meio de uma relação de mistura,
enquanto que a morte seria uma relação de dissolução entre as substâncias.
Ora, se haveria, então, esta relação de mistura e dissolução nos seres, então haveria de
existir mais de um elemento de fosse comum a todas as coisas e que promoveria estas relações.
Nesta afirmação fundamenta-se o pensamento de Empédocles e afirma a diferença fundamental
de seus predecessores: enquanto os filósofos até então afirmavam que existia um único
elemento fundamental que deu origem a todas as coisas, Empédocles acreditava que tudo que
existe contém em sua formação quatro elementos primordiais, a saber, a água, a terra, o ar e o
fogo.

Estes elementos são para o mundo o que são as cores para o pintor, ou como a água e
a farinha com as quais se faz a massa. Isto significa que tudo provém de sua reunião,
de sua separação e de suas diferentes dosagens. Mas nenhum dos elementos tem a
prioridade sobre o outro, pois, igualmente eternos, eles não derivam um do outro.
Consequentemente, toda mudança acontece graças à combinação ou à dissociação dos
elementos (ALMEIDA, 2021, p. 43).

De acordo com Cruz (2019, p. 14), por influência da mitologia presente no pensamento
grego até aquele momento, o filósofo não apenas listou estes quatro elementos como também
os relacionou com quatro deuses gregos: Zeus, representando o fogo; Hera, como o ar; Nestis,
entendida como a água; e Edoneu, que representa a terra. Há ainda uma outra concepção que,
de acordo com a autora supracitada, acredita que a nomeação dos elementos conforme os deuses
da época aconteceu por conta de que os primeiros pensadores chamavam de deuses aquilo que
eles consideravam como substância primordial, assim como pontua Almeida (2021, p. 25), em
sua obra História da Filosofia Antiga, expondo o pensamento de Burnet: “Para ele, o termo
théos de que se serviam os jônicos para exprimirem a ‘substância primária’ não tem outro
significado se senão o daqueles outros adjetivos divinos”, referindo-se aos adjetivos gregos de
aguéros e athánatos. Também Mora (2001, p. 869) descreve: “para esse pensador, Deus é uma
esfera em todos os lugares sem limites”.
As relações que proporcionam a origem e a separação das coisas, segundo Reale e
Antiseri (2017, p. 60), são representadas por Empédocles através das figuras das forças
cósmicas do amor ou da amizade (philia) e do ódio ou discórdia (neikos). Estas forças motrizes
acontecem uma sobre a outra de tempos em tempos, de modo que nenhuma se deixa dominar
pela outra, apenas acontecem em um espaço de tempo para que as relações de junção e
separação dos elementos possa acontecer.
No entanto, mesmo diante dessa certa “harmonia” que não permite que uma força
sobreponha a outra, pode-se perceber que o que realmente há nelas, e o que proporciona este
movimento, é uma disputa existente entre ambas. E é esta mesma disputa, diz Reale e Antiseri
(2017, p. 60), que proporcionou o surgimento do cosmo e proporciona a sua constante
renovação, pois, segundo os autores, “em cada um desses períodos, tem-se progressivo nascer
e progressivo destruir-se de um cosmo que, necessariamente, supõe a ação conjunta de ambas
as forças” (REALE; ANTISERI, 2017, p. 60).

4 CONTRIBUICÕES PARA O AVANÇO DA FILOSOFIA

Em toda a história da filosofia, há quem afirme que pouco há de “novidade”. O que


pode-se constatar é que existe um avanço progressivo na maneira de pensar, isto é, os primeiros
pensadores formam a base de reflexão para os que vieram posteriormente e que, por sua vez,
darão conteúdo para a reflexão daqueles que virão depois, e assim sucessivamente.
Desta forma, Empédocles encontra-se no período de transição da filosofia Pré-
Socrática para a filosofia Clássica. Isto quer dizer que o pensador se apropria de conteúdos
próprios de seus antecessores ao mesmo tempo que proporciona a base para a reflexão futura.
O fato de ele romper com o monismo que predominava até então e avançar a um pluralismo
abre o horizonte de reflexão pois sua atitude questiona aquilo que era tido como verdade
consensual entre os pensadores da época.
Diante disso, considera-se que o pensamento de Empédocles não é um pensamento
acabado, mas é uma das peças de um grande quebra-cabeças que é a reflexão filosófica, do qual,
certamente, sem os contributos deste pensador, careceria em seu desenvolvimento.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto neste trabalho, pudemos perceber que o pensamento de Empédocles


proporcionou um grande avanço na filosofia de sua época. A novidade trazida pelo pluralismo
rompe com o monismo jônico e proporciona o avanço na reflexão filosófica.
Pode-se constatar que, embora hajam poucos registros sobre o assunto, a sua vida foi
bastante enigmática. A consciência de que ele era uma divindade e a formulação de uma
doutrina religiosa proporcionaram, pela parte daqueles que o seguiam, uma lenda sobre a sua
morte, e um relato de suicídio pelos demais. O fato que realmente nos interessou, no entanto,
foi a sua reflexão filosófica acerca da constituição, formação e dissolução das coisas, o que
revelou a sua concepção cosmológica.
A concepção de que os quatro elementos (terra, ar, fogo e água) constituíam todas as
coisas era uma ideia bastante avançada e que confrontava a concepção da época. A sua tese de
que nada nasce nem morre, mas sim se associa e dissocia, é bastante atual principalmente nas
ciências atuais, opinião que é manifestada na famosa expressão de Antoine-Laurent de
Lavoisier (1743-1794): “na Natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. Sua
teoria de que no cosmos existe uma “guerra” entre os opostos é bastante pertinente e nos leva a
uma reflexão atual.
Por fim, percebemos que a ideia deste autor promoveu uma continuidade na evolução
do pensamento filosófico ocidental e proporcionou uma abertura de horizontes para novas
concepções que vieram posteriormente.

6 REFERÊNCIAS

ALMEIDA. Rogério Miranda de. História da filosofia antiga. Curitiba: FASBAMPRESS,


2021.

BURNET, John. A aurora da filosofia grega. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Contraponto
- PUC-Rio, 2006.

CRUZ, Sebastiana Ferreira da. Cosmologia em Empédocles de Agrigento. 29 f. Monografia


(Graduação) - Filosofia, Universidade Federal do Tocantins, Palmas, 2019. Disponível em:
http://repositorio.uft.edu.br/handle/11612/1867. Acesso em: 11 mai. 2021.

MORA, José Ferrater. Dicionário de Filosofia, tomo II (E-J). Trad. Maria Stela Gonçalves et
al. Loyola: São Paulo, 2001.

PRÉ SOCRÁTICOS. Os pensadores: Fragmentos, doxografia e comentários. São Paulo:


Abril, 1990. (Recuso digital). Disponível em: http://files.filosofia-
com0.webnode.com/200000001-90f1191ea9/_Colecao_Os_Pensadores__Vol_01.pdf. Acesso
em: 11 mai. 2021.

REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. Filosofia: Antiguidade e Idade Média. Trad. José
Bortolini. São Paulo: Paulus, 2017. Coleção filosofia.

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