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Direito Romano: Aspectos mais importantes durante a

Realeza, a República e o Império


Breve análise histórico-jurídica da civilização Romana em seus diversos períodos, com o
intuito de demonstrar a importância do seu estudo para a melhor compreensão dos
institutos jurídicos atuais.

31/mar/2004
George Magalhães Rodrigues
ã putrefactus@hotmail.com
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C ada vez menos presente dentro das grades curriculares das diversas Faculdades de
Direito existentes e espalhadas atualmente pelo país, o Direito Romano, que atravessou
séculos até chegar aos tempos atuais como primeira fonte do Direito dentro do mundo
ocidental, especialmente no que tange à matéria cível, é de indiscutível importância para
que possamos melhor compreender os institutos jurídicos atuais, muitos dos quais
brotaram da época Pretoriana, com suas devidas adaptações e adequações às necessidades
do mundo atual.

Isto posto, torna-se necessário esclarecer que o presente trabalho que se segue procura, a
partir de uma breve análise sócio-cultural e jurídica da sociedade romana, enfocar o
nascimento das relações jurídicas, que à princípio eram muito mais específicas, regendo
determinada situação de direito já existente, para aos poucos começar a ganhar um caráter
geral, regendo situações generalizadas, o que conseqüentemente gerou uma maior
abrangência da norma jurídica. Estudar os institutos jurídicos atuais fazendo uma prévia
análise do Direito Pretoriano proporciona ao acadêmico uma visão geral do mundo
jurídico, ao mesmo passo em que o estudante passa a compreender, e não apenas decorar,
inúmeros conceitos derivados do latim, língua oficial da civilização romana.

Para fins didáticos, dividiremos em três partes o presente trabalho: O Direito Romano na
Realeza, O Direito Romano na República e o Direito Romano no Império. Obedecendo à
ordem cronológica dos fatos, passaremos a fazer breves comentários sobre cada uma das
fases da História Romana na Antigüidade, para que possamos, ao final, ter uma visão
superficial, mas suficiente, da importância de se estudar o Direito Romano, disciplina
esta cada vez mais suprimida das Faculdades de Direito.

O DIREITO ROMANO NA REALEZA

Trata-se do período histórico em que Roma foi governada pelos reis, compreendendo
uma faixa de aproximadamente 250 anos, segundo os cálculos de VARRÂO, desde a
fundação de Roma, em 753 a.C., até o desaparecimento do trono, com Tarquínio, o
Soberbo, em 510 a.C.
Havia duas classes bem distintas e opostas entre os habitantes da cidade de Roma: os
patrícios e os plebeus. Os primeiros, homens livres, descendentes de homens livres,
agrupados em clãs familiares patriarcais, que recebiam o nome de gentes, formavam a
classe detentora do poder e privilegiada. Os plebeus, por sua vez, não faziam parte das
gentes, estando, no entanto, sob a proteção do rei. Até o reinado de Sérvio Túlio, os
plebeus não faziam parte da organização política de Roma.

Durante a Realeza, o Poder Público em Roma era composto por três elementos: o Rei
(rex), o Senado (senatus) e o Povo (populus romanus), este último, como acima
mencionado, constituído apenas por patrícios. Enquanto o rei, indicado por seu antecessor
ou por um senador, era detentor de um poder absoluto, ou imperium, com atribuições
políticas, militares e religiosas, sendo ao mesmo tempo chefe de governo e de Estado, o
Senado era um órgão de assessoria do rei, com função predominantemente consultiva.
Era, pois, o Senado detentor da auctoritas, sendo ouvido pelo rei nos grandes negócios
do Estado.

O povo romano (somente patrícios, inicialmente) reunia-se em assembléias, que recebiam


o nome de comícios curiatos, com o objetivo de discutir e votar as propostas de lei,
sempre de iniciativa do rei. A unidade de voto recebia a denominação de cúria. A lei,
assim votada e aprovada, recebia o nome de leges curiatae. No entanto, com as reformas
empreendidas pelo rei Sérvio Túlio, a plebe foi favorecida, quando a riqueza de cada um,
e não mais apenas as suas origens, passou a ser base para a distinção entre as pessoas.
Com isso, ganhavam o direito de voto os plebeus contribuintes, sendo por estes
entendidos aqueles que dispunham de meios para pagar impostos e que agora tinham
direito de prestar serviço militar. Estes plebeus contribuintes votavam nos comícios
centuriatos, sendo a unidade de voto a centúria. Ao mesmo tempo, adquiriam os plebeus
o direito de praticar atividade comercial, o que favorecia, conseqüentemente, o contato
com outros povos e outras culturas, culturas estas que mais tarde viriam a ser
incorporados pelo Império Romano, ao mesmo tempo em que ganhava o povo romano
poder econômico, passo fundamental para se alcançar o poder político.

São duas as principais fontes do Direito Romano na Realeza: o costume e a lei. O


costume, ou jus non scriptum, uso repetido e prolongado da norma jurídica tradicional
não proclamada pelo Poder Legislativo, é a principal delas. A lei, de menor importância
neste período, nascia com a proposta do rei ao povo, que, reunido em comícios curiatos
ou centuriatos, aceitavam ou rejeitavam a iniciativa do rei. Se aceita, a regra de direito,
depois de ratificada pelo Senado, tornava-se obrigatória. Vale ainda ressaltar que as leis,
durante este período, eram particulares, e não gerais, regendo verdadeiros contratos entre
patres da cidade.

O DIREITO ROMANO NA REPÚBLICA

Abolida a Realeza em Roma, foi implantada a República, advinda de uma revolução


chefiada por patrícios e militares, e que se prolongou de 510 ate 27 a.C. Caracterizava-se
por ser uma República Aristocrática, onde a administração se subdividia em várias
magistraturas.

O poder consular, ou dos cônsules, substitui o rei, enquanto detentores do imperium.


Encarnavam a suprema magistratura. Estes cônsules eram eleitos em número de dois para
um período de um ano, cada um deles governando alternadamente um mês cada. Assim,
enquanto um governava, o outro fiscalizava, tendo contra o primeiro o direito de veto, ou
intercessio, em caso de discordância. No entanto, o grande desenvolvimento da
população romana fez com que as funções consulares se repartissem por outras pessoas.
Foi assim que surgiram cargos como questores (responsáveis pela administração das
finanças), censores (encarregados de promover o recenseamento e de fiscalizar os
costumes), pretores (importantes magistrados para o Direito. Estavam encarregados da
administração da justiça), edis curis (cuidavam da fiscalização do comércio e do
policiamento da cidade), governadores das províncias, ou procônsules (encarregados de
distribuir a justiça).

Além dos cônsules, a organização política de Roma na República ainda era composta
pelo Senado e pelo povo. O Senado, nesta época, era um órgão consultivo e legislativo
composto por 300 patres, nomeados pelos cônsules. Os atos oriundos do Senado eram os
senatusconsultus.

O povo (populus romanus), por sua vez, agora era composto por patrícios e plebeus, que
reuniam-se em comícios (comícios curiatos, comícios centuriatos e comícios tributos)
para votar. A plebe, cuja maior conquista na época foi a criação do tribuno da plebe
(magistrados plebeus invioláveis e sagrados, com direito de veto – intercessio – contra
decisões a serem tomadas), também se reunia sozinha no concilia plebis, onde se
votavam os plebiscitos.

As fontes do Direito Romano na República são as seguintes: costume, lei, plebiscito,


interpretação dos prudentes e os editos dos magistrados. O costume, apesar de conservar
extrema importância na sociedade romana, tornava-se, pela incerteza a ele inerente,
importante arma de que dispunham os patrícios contra os direitos da plebe.

A lei, por sua vez, é a segunda fonte de Direito Romano na República. É redigida, apesar
de muita resistência por parte dos patrícios e do Senado, a Lei das XII Tábuas, cuja
importância é incontestável, sendo considerada pelos próprios romanos como a fonte de
todo o direito público e privado. O cunho de romanidade presente em suas disposições
garantiu-lhe imediata aceitação por parte de todos, passando a reger as relações jurídicas
do povo romano. Mais tarde, numerosas outras leis surgiram também com o intuito de
reger as relações dos povos de Roma e dos territórios submetidos, como a leges rogatae e
a leges datae.

O plebiscito é aquilo que a plebe deliberava por proposta de um magistrado plebeu,


aplicando-se, a princípio, unicamente à plebe, adquirindo, a partir da Lei Hortênsia, valor
de lei.

Os prudentes, ou jurisprudentes,são jurisconsultos encarregados de adaptar os textos


legais às mudanças do direito vivo, preenchendo, assim, as lacunas deixadas pelas leis. A
interpretação dos prudentes corresponde ao que atualmente chamamos de doutrina,
diferindo, portanto, do que atualmente entendemos por jurisprudência (decisões repetidas
dos tribunais). Tais pareceres, ou seja, a interpretação dos prudentes, passaram a influir
na formação do direito.

Por fim, são também fontes do direito romano os editos dos magistrados, conjunto de
declarações (edicta) destes, em que expunham aos administrados os projetos que
pretendiam desenvolver. Para o Direito Romano, assumem maior relevância os editos dos
pretores, e, em especial, os editos urbanos. O pretor, como magistrado que o era, era
detentor do poder de fazer editos, contribuindo assim para o florescimento, em oposição
ao jus civile (formalista e rigoroso), do jus honorarium, mais humano, pois com ele se
fazia uso da equidade, instrumento através do qual o pretor adequava a justiça ao caso
concreto, abrandando-se a impessoalidade do caso concreto.

O DIREITO ROMANO NO ALTO IMPÉRIO

Também conhecido como principado, ou diarquia, é um período de transição entre a


República e o Dominato (ou Baixo Império), estendendo-se de 27 a.C. a 284 d.C.

Aqui, o príncipe ou imperador congrega poderes quase ilimitados, sendo o chefe supremo
das forças armadas. A sua autoridade é máxima, e o seu poder é partilhado com o
Senado. O poder judiciário, portanto, é repartido entre o príncipe e o Senado. As
magistraturas, de início, continuavam a funcionar normalmente.

Dado o seu caráter de transição, numerosas são as fontes de direito romano durante esta
fase. Somando-se às fontes da República (costumes, leis, editos dos magistrados,
senatusconsultos), acrescentam-se as constituições imperiais e as respostas dos
jurisconsultos.

O costume ainda nesta época desempenha papel importante enquanto fonte de direito.
Quanto às leis, adquirem maior importância as leges datae, medidas tomadas em nome
do povo pelo imperador, correspondendo aos nossos atuais regulamentos administrativos.
Os editos dos magistrados perdem muita importância neste período, tendo o novo regime
praticamente tirado de fato a independência e o espírito de iniciativa dos pretores,
fazendo com que estes aos poucos passassem a apenas reproduzir os editos de seus
antecessores. Os senatoconsultos são medidas de ordem legislativa que emanam do
Senado. Durante o Alto Império, o senatoconsulto é feito a pedido do príncipe.

As constituições imperiais eram medidas de ordem legislativa promulgadas pelo


imperador e elaboradas pelo consilium principis, colégio constituído pelos mais
importantes jurisconsultos da época. Gradualmente, esta fonte vai adquirindo maior
importância até chegar a constituir a fonte única de direito romano durante o Baixo
Império. Ainda como fonte do direito romano no Alto Império, as respostas dos
jurisconsultos são as sentenças e opiniões feitas por quem fixa o direito, mas é somente a
partir de Adriano que tais respostas passaram a ganhar força de lei. Em havendo
divergência entre os pareceres, ao juiz era lícito seguir a opinião que a ele parecesse
melhor, o que se aproxima, desta forma, da utilização do instituto que hoje conhecemos
como eqüidade.

O DIREITO ROMANO NO BAIXO IMPÉRIO

O Baixo Império, também conhecido como Dominato, estende-se de 284 d.C. a 565 d.C.,
e caracteriza-se pelo poder supremo do imperador, que, ao assumir atribuições dos outros
órgãos constitucionais, torna-se monarca absoluto, concentrando todos os poderes em
suas mãos. Durante este período, o Império Romano encontrava-se subdivido em Império
Romano do Ocidente e Império Romano do Oriente, sendo cada um desses blocos
entregue a um imperador.

As constituições imperiais, ou leges,,são a única fonte do direito romano neste período. A


maior parte delas tem forma de editos. As codificações, ou compilações, que aqui surgem
podem ter caráter oficial ou particular, conforme sejam elaboradas por iniciativa de
imperadores ou por iniciativa privada. A importância de Justiniano é tamanha que
podemos dividir as compilações existentes neste período como anteriores, posteriores ou
da época de Justiniano.

Ocorre, no entanto, que a maior contribuição deste período e, certamente, um dos maiores
legados deixados pela civilização romana corresponde ao Corpus Juris Civilis, obra esta
que reúne o direito romano propriamente dito. O direito de Justiniano é uma obra que
reúne em um só corpo numerosos textos de lei das épocas anteriores, assim como de sua
época também, tendo tido vigência em todo o Império Romano, daí a sua incontestável
importância não apenas para a época, mas também para a posterioridade, pois é o Direito
Romano, cujos principais institutos encontram-se condensados no Corpus Juris Civilis,
que constitui a raiz a partir da qual brotaram-se os principais institutos jurídicos
ocidentais dos tempos atuais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CRETELLA JR., José. Curso de Direito Romano. 8ª edição, Rio de Janeiro, Forense,
1983.

MOURA, Paulo César Cursino de. Manual de Direito Romano. 1ª edição, Rio de
Janeiro, Forense, 1998.

PEIXOTO, José Carlos de Matos. Curso de Direito Romano. Tomo I, 3ª edição, Rio de
Janeiro, Haddad Editores, 1955.

TABOSA, Agerson. Direito Romano. Volume Único. Fortaleza, Imprensa Universitária,


1999.
Veja mais sobre este tema no DireitoNet:

Resumos
• Teorias da Separação dos Poderes

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