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Datas
753 AC a 130 AC: época arcaica
130 AC a 230 DC: época clássica
130 AC a 30 AC: época pré-clássica
30 AC a 130 DC: clássica central
130 DC a 230 DC: clássica tardia
230 a 530: época pós-clássica
530-565: época justinianeia
O direito romano
Enquadramento histórico
753 AC: data provável da fundação de Roma
Ribeiro de Almeida
b) Senatusconsulto - leis aprovadas pelo Senado (assembleia que constituía o
conselho supremo de Roma).
c) Jurisprudentia - consiste em doutrinas (aquilo que resulta dos pensamentos
dos grandes professores). O Direito Romano tinha uma construção
jurisprudencial: implica a existência de tribunais (ordens de resolução de
conflitos). A sociedade precisa de órgãos objetivos para resolver os conflitos, ou
seja, terceiros que não tenham qualquer interesse no caso: é para isso que
servem os magistrados. A jurisprudência é a regra que resulta da resolução de
um caso concreto.
d) Ius honorarium - vem corrigir o ius civile e o ius gentium: é um direito criado
por magistrados, cuja finalidade de qualquer um é de realizar a justiça, e não
necessariamente de aplicar a lei a todos os custos pois ela pode ser injusta. A
época do ius honorarium é a época da fonte de direito, das grandes escolas de
direito.
Até 27 AC a república atribuía aos magistrados meios para que pudessem viver pois
não tinham rendimento.
Em 27 AC, Roma ocupa o Egito e está a viver uma instabilidade política (a república
romana está a chegar ao fim). O Senado encarrega Augusto (fundador do Império
romano) de pacificar Roma pois ele está a ocupar o Egipto (conflito). Ele consegue-o
fazer e afasta-se da vida política por vontade própria, mas o Senado pede para ele ficar
e ele aceita com uma condição: a de ser prínceps (o que fica em 1º lugar). O Senado
concede-lhe essa vontade e ele passa a ser o imperador César. As políticas que
implementam vão ter efeito sobre toda a política de Roma, levando-a à cadencia.
O Senado é quem tem a posse do poder político, quem faz as leis. O prínceps tem
muito pouco poder, nem o poder militar lhe pertence. Mas o Senado é um órgão
pequeno que ele consegue controlar bem: ele foi retirando os poderes políticos ao
Senado, atribuindo-lhe poderes legislativos. Desaparece então a lex rogata. Porque o
Senado nunca coloca o poder em questão (nem quer porque ele é o imperador), ele
começa a fazer as leis sozinho (constituição imperial): o Senado perde igualmente
todo o poder legislativo. Os magistrados podem, no entanto, afastar a lei se a acharem
injusta. Então o imperador contrata-os e paga-lhes um salário: eram condenados à
morte se não aprovassem a lei dele.
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direito. No século 6º aparece a obra Corpus Iuris Civilis, que é na verdade uma
compilação de direito, que contém o direito romano da época clássica. Em
1453 o império do oriente cai. A obra não é conhecida do ocidente, pois a igreja
católica mantém o assunto em segredo e quase ninguém sabia ler (em latim).
Só lá chega no século 12, a Itália, em Ravena. A obra é estudada em Bolonha,
onde nasce a primeira universidade do ocidente. Eles leem a obra, mas não a
conseguem decifrar nem perceber pois ela está demasiado bem elaborada com
termos técnico-jurídicos. Porém, a obra é aplicada nos tribunais e ensinada nas
universidades até ao século 19.
Surge o primeiro código civil (francês) em 1804, o código civil português em 1867 e o
alemão em 1900, o francês e o alemão sendo os principais. Eles vão revogar o direito
romano, mas ele deixa de ser aplicado formalmente Þ influência do direito romano
no direito europeu
Ribeiro de Almeida
Época pós-clássica (230 DC-530 DC)
Decadência profunda do direito romano
Separação definitiva em 395: 2 impérios (oriente e ocidente)
230-395: já existe uma decadência do direito romano porque o imperador considera-
se deus e tem em si todos os poderes. Nesta época cria-se a confusão entre lei, direito
e justiça (termos idênticos na época). A única lei que conta é a do imperador
(constituição imperial).
O império está corrupto, a administração imperial está em decadência, direito em
crise, tem falta de rigor, sem intenção jurídica. O cristianismo também ajuda nessa
decadência. Os doutores de direito têm obras muito pobres.
A partir de 395: o império do ocidente estava a cair, os povos germânicos invadem-no
e em 476 ele cai. Eles trazem um direito não escrito, um direito romano muito
vulgarizado, rudimentar, com práticas bárbaras e agressivas. O direito romano passa a
ser uma simples referência.
No oriente, a partir de 395: reação de afastar o direito romano vulgar= anti
vulgarização. Época de ascensão do direito romano com o imperador Justiniano em
530, que se caracteriza como o regresso da época clássica. É dita uma época classicista.
O classicismo e a helenização (influência grega) contribuem ao crescimento do direito
romano.
De 530 a 565 foi a época justinianeia. Ele queria voltar a recuperar o império do
ocidente, mas não conseguiu no aspeto político. Ele elabora uma grande compilação
de direito em 530 que se chama Corpus Iuris Civilis e que vai buscar muito do direito
da época clássica. A primeira parte institutiones é uma introdução que tem 4 livros. A
segunda parte pandectae ou digesta: contém fragmentos de obras de jurisconsulto,
contém direito (o Ius), que provém da época clássica (50 livros). A parte codex contém
diversas constituições imperiais (12 livros). A última parte da obra é intitulada
novellae, constituições imperiais depois do codex estar encerrado.
565: morte de Justiniano. Ele proibiu que a obra sofresse qualquer alteração, o que
não foi respeitado, mas ela continua em vigor até ao início do século 20.
Fim da idade média: século 15, quando o império do oriente cai.
No século 12 algo muda no oriente: vive-se uma época de paz, aparece alguma
economia, feiras a funcionar etc. Com o avanço do império muçulmano, há uma fuga
de juristas para o ocidente. O CIC aparece no ocidente no século 12. Uma escola
chamada Glosadores tenta perceber o que está escrito na obra, mas não consegue. A
escola Comentadores tenta interpretar o espírito da obra. No século 16 com a
Renascença (regresso à época do classicismo) começa-se a estudar com mais
profundidade o direito romano e ensina-se nas universidades.
No século 19 há uma escola alemã chamada usus modernus pandectrum que vai
decidir o que faz sentido aplicar (nessa época) do direito romano e o que não faz. Até
1867, esse direito foi aplicado nos tribunais portugueses. Século 19, a época dos
códigos civis: esses códigos contêm direito romano Þ supervivência e influência do
direito romano
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• Poder direto sobre a res
• Não preciso da colaboração de ninguém
• Ninguém pode mexer sem autorização
• Direito com eficácia erga omnes: direito que se aplica a todos
• Essa eficácia erga omnes gera uma obrigação passiva universal – não precisam
fazer nada, só não mexer, não fazer nada
Direito real (versa sobre coisas): poder direto imediato sobre uma coisa, não
precisando da colaboração de ninguém, com a eficácia erga omnes, que gera a
obrigação passiva universal (igual ao direito romano).
Princípio da tipicidade: só existem os direitos reais que estão exaustivamente listados
na lei
Direito obrigacional – é um vínculo jurídico entre pessoas. O credor tem direito de
crédito sobre o devedor, e esse crédito só se realiza integralmente quando o devedor
cumpre a sua obrigação.
Direito de natureza obrigacional – é um direito que depende do comportamento do
devedor, por ex. o direito de crédito precisa da colaboração do devedor. Os direitos
obrigacionais são direitos a comportamentos de alguém: o meu direito dirige-se aos
comportamentos de alguém.
As obrigações só produzem efeitos entre as partes, não produzem efeitos com
terceiros.
Desde que não se viole a lei, há liberdade contratual.
Ribeiro de Almeida
Os quase contratos (negócios unilaterais): não são contratos, mas quase. Há promessa
unilateral (perder um cão e fazer promessa de dar dinheiro); não é contrato porque
nem sabíamos quem iria encontrar o cão, mas a situação é geradora de obrigação. Não
há contrato porque não há previamente nenhum acordo, mas um ato unilateral e a
pessoa que encontra o cão tem direito judicialmente de exigir o dinheiro.
Os contratos
Ribeiro de Almeida
b) Contratos reais quanto à sua constituição – não basta o acordo entre as
partes para o contrato estar perfeito, que é a aptidão para produzir efeitos
jurídicos, tem de implicar a prática de um ato material (transferência do
direito de propriedade ou da detenção).
Ao contrário, os contratos consensuais são contratos perfeitos por simples
acordo, pode haver incumprimento contratual, mas continua a haver
contrato pois o elemento principal do contrato foi realizado: o consenso.
• Contrato de fidúcia
Desaparece na época pós-clássica, mas chega até nós com as mesmas características
que tinha no direito romano.
Características – É um contrato unilateral, gratuito e real.
Fiduciante – aquele que transfere a propriedade de uma coisa com função de garantia
a outra pessoa – o fiduciário, quem beneficia da garantia.
É um contrato complexo, que envolvia dois pactos:
• Uma mancipatio (por vontade das partes): transferência do direito de
propriedade sobre uma coisa de grande valor
• Uma in iure cessio (através duma ação judicial): não tem necessariamente que
ser de grande valor
O pactum fiduciae é o acordo não formal de restituir a res.
Explicação: A transmite o direito de propriedade para B através de uma mancipatio. B
está obrigado a retransmitir o direito de propriedade para A através do pactum
fiduciae que foi estabelecido.
Implica uma transmissão de propriedade, não uma entrega da coisa: A pode continuar
a ter a posse da coisa e não tem de a entregar, mas B é o proprietário.
Ribeiro de Almeida
A fidúcia tem essencialmente uma função de garantia de cumprimento de uma
obrigação.
Caso prático
A, credor, banqueiro (contrato oneroso pois implica juros) celebra um contrato de
mútuo com B, devedor. A emprestou dinheiro a B com um prazo de pagamento de 3
anos. A quer uma garantia de que B irá pagar ao fim dos 3 anos. B é dono de um prédio
onde vive. A podia exigir que B lhe transferisse o direito de propriedade sobre o prédio
e A ficava dono desse prédio, mas B continuava com a posse do prédio e continuava lá
a viver.
Através do pactum fiduciae, A ficava obrigado a retransmitir esse direito de
propriedade a B quando ele pagasse a dívida. Þ fidúcia com função de garantia
• Contrato de depósito
Características – bilateral imperfeito, gratuito por regra e real.
Versa sobre coisas móveis ou imóveis e implica a entrega da coisa (traditio). Implica,
portanto, a transmissão da detenção e não da propriedade.
O detentor (depositário) guarda, mas não usa, e tem a obrigação de restituir a res
quando o depositante quiser.
Este contrato é bilateral imperfeito porque podem surgir obrigações para o lado do
depositante, ex. se o depositário guardar cavalos e tiver despesas ou prejuízos, o
depositante vai ter de o indemnizar pelos custos ou pelos danos causados.
O contrato pode ser classificado como oneroso se o depositário for indemnizado:
nesse caso não há só a perda patrimonial para o depositário que perde tempo a cuidar
da res, mas também há perdas patrimoniais para o depositante que tem de indemnizar
o depositário pelos custos ou danos causados a este, ou seja, perde dinheiro ao fazê-
lo. Se o depositante se recusar a pagar as despesas ou os prejuízos, o depositário tem o
direito de retenção da coisa até o depositante pagar.
Tipos de depósito
• Depósito necessário: o depositante não tem escolha (por questões de tempo,
urgência) de quem vai ser o depositário; o depositário tem então um grau de
responsabilidade maior (no DR)
• Depósito de sequestro: há um litígio em relação a uma certa coisa, guardada
pelo depositário e só é devolvida a quem vencer o litígio.
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Litígio: ação judicial que está entregue aos tribunais para apreciação e decisão
sobre uma determinada situação em relação à qual as partes não se entendem.
• Depósito irregular/ de coisas fungíveis: há uma transmissão de direito de
propriedade sobre a coisa do depositante ao depositário, e este obriga-se a
restituir o objeto do mesmo género e quantidade = contrato de mútuo, mas o
contrato de mútuo tem a ver com restituir a res que foi emprestada, mas por
exemplo, na questão do dinheiro, pode ser em moedas ou notas diferentes. No
depósito, tem de ser exatamente a mesma coisa pois o depositário guarda, mas
não usa, ou seja, tem de a entregar no mesmo estado em que a recebeu.
Ribeiro de Almeida
• Contrato de comodato
Vulgarmente conhecemos por empréstimo de uso de uma coisa que não é fungível.
Uma pessoa (comodante) entrega uma coisa a outra para que essa outra pessoa
(comodatário) use a coisa e a restitua nos mesmos termos que a recebeu, salvo as
deteriorações normais possíveis.
Tem por objeto coisas móveis ou imóveis e normalmente não tem por objeto coisas
consumíveis, e nesse caso, o comodatário não as pode consumir: ex. maçãs para
enfeitar. Só pode usar a coisa para os fins que ela se destina e de acordo com as
orientações e restrições do comodante. Se a usar diferentemente, incorre no furtum
usus (furto de uso).
O comodatário é um mero detentor – não é proprietário nem possuidor: não é preciso
ser proprietário da coisa para a poder usar.
Características – é essencialmente gratuito (seria um contrato de locação se fosse
oneroso); é bilateral imperfeito, ou seja, gera obrigações para o comodatário e
raramente para o comodante, só em situações extremas (travões do carro que o
comodante cedeu ao comodatário que não funcionam e mesmo assim entrega a coisa,
sem avisar); é real pois implica um ato material (transferência da detenção da res).
• Contrato de penhor
Uma pessoa entrega uma coisa a outra para garantir uma obrigação própria ou alheia
(de pagar uma dívida). O devedor (credor da obrigação garantida) é detentor dessa
coisa em nome do credor (não há transmissão de propriedade) até ele pagar a dívida
na qual ele é devedor. Este contrato tem uma função de garantia.
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O credor pignoratício tem obrigação de guardar a coisa, não a pode usar e tem de a
restituir no fim do contrato, quando o prazo acordado acabar (quando o devedor
pagar a dívida).
O penhor é uma garantia real: o credor tem um direito real sobre a coisa que só se
manifesta se o devedor não cumprir. Se o devedor não cumprir a obrigação de pagar a
dívida, o credor executa então a garantia e poderá vender a coisa. Se realmente vier a
executar a garantia, imaginemos que a dívida era de 1000 euros e a res que serviu de
garantia foi vendida por 2000 – o excedente do preço tem de ser dado pelo credor
pignoratício ao devedor.
Este contrato, a cuja perfeição é necessária a traditio da res, produz duas relações
jurídicas distintas:
a) Um direito sobre a res (ius pignoris) a favor do credor da obrigação que se
pretende garantir;
b) A obrigação de o credor pignoratício conservar e restituir a res depois da
extinção da obrigação garantida.
Ribeiro de Almeida
Depósito: igual; consagra o depósito necessário e de sequestro
Fidúcia: num diploma à parte; igual
Penhor: igual
Contratos consensuais
A origem destes contratos remonta ao ius gentium.
São perfeitos por simples acordo entre as partes, que pode manifestar-se de qualquer
modo. Não é necessária uma forma determinada nem a entrega da res (prática dum
ato material) para produzirem efeitos jurídicos. A validade dos contratos consensuais
é, então, independente da forma.
A vontade é o elemento essencial para a perfeição do contrato, mas podem surgir
problemas: as divergências entre a vontade e a declaração (enganos, coações).
Ribeiro de Almeida
A mancipatio era muito formal, mas o ius gentium tinha como objetivo tornar as coisas
mais leves e fáceis, ou seja, os dois não eram compatíveis. A mancipatio não admite
que o direito de propriedade se transmita por simples consenso. O que se transmite
com a compra e venda é a posse, e o vendedor tem de assegurar a posse livre e
pacífica na esfera jurídica do comprador.
No tempo do imperador Justiniano a mancipatio deixa de existir. Já estava consagrada
a distinção entre coisas móveis que implicavam uma traditio, e imóveis que requeriam
uma escritura pública na presença de um notário ou magistrado que guardava um
exemplar.
Obrigações do vendedor
1. Transferir a posse livre e pacífica da coisa: o vendedor assegura essa posse na
esfera jurídica do comprador, que deve encontrar-se sem vícios e não ser
precária, temporária.
O A obriga-se a que B fique nessa posse de forma pacífica, sem limitações e
restrições. Quem é o proprietário? Havendo a transferência da posse (diferente
da detenção) é um poder de facto sobre uma coisa que permite a transferência
de propriedade pela figura jurídica da usucapião. No direito romano a
usucapião existia no ius civile e não no ius gentium. Imaginemos que o
vendedor é estrangeiro, mas o comprador é cidadão romano (ele pode invocar
o ius civile onde consta a usucapião), ou seja, adquire a propriedade através da
posse e em particular porque a posse leva à usucapião.
A obrigação do vendedor de assegurar a posse livre e pacífica na esfera jurídica
do comprador acaba no momento em que o comprador adquire o direito de
propriedade através da usucapião (através da posse).
Ribeiro de Almeida
Se o comprador é estrangeiro não pode invocar a usucapião por via da posse
porque a usucapião não consta no ius gentium, que é o direito dos
estrangeiros. Nesse caso o vendedor está obrigado a assegurar a posse livre e
pacífica na esfera jurídica do comprador para sempre. Isso poderia mudar
quando por exemplo o estrangeiro adquire a nacionalidade romana e pode
adquirir a propriedade.
2. Responder por evicção: e se o vendedor não conseguisse assegurar a posse
livre e pacífica na esfera jurídica do comprador? Imaginemos que um terceiro
vem dizer que ele é que é proprietário da coisa ou está em posse dela. Ele age
então judicialmente contra B e B chama o A e confronta-o: o A responde por
evicção, ou seja, se o C vencer a ação, o B vai receber o preço no dobro quando
for indemnizado pelo A.
3. Cuidar da res até à entrega: a partir do momento em que o contrato está
realizado (e perfeito), se a coisa se perder, o risco corre por conta do
comprador.
Se o contrato estiver sujeito a alguma condição (suspensiva, que suspende os
efeitos do contrato porque o comprador quer verificar, experimentar a coisa)
os efeitos do contrato não se produzem enquanto essa condição não se
realizar. O risco continua a correr por conta do vendedor: o contrato não está
perfeito porque não está a produzir todos os seus efeitos, neste caso porque o
comprador ainda não está a gozar da coisa livremente e pacificamente.
4. Responder pelos vícios ocultos da res: são vícios não aparentes, limitações
físicas ou jurídicas.
Em Roma havia um conjunto de ações que permitiam ao comprador
responsabilizar o vendedor por esses vícios ocultos (de animais e escravos).
Quais ações?
Ação redibitória: é a ação de resolução de contrato. O comprador pode colocar
termo ao contrato desde que tenha fundamentos para isso. Se realmente o
vendedor fosse culpado tinha que devolver o preço no dobro.
O comprador também pode não querer resolver o contrato e continuar a ter
interesse na coisa: no direito romano podia convocar uma ação estimatória (de
diminuição do preço) em virtude do vício que a coisa tinha.
Independentemente se foi feito com dolo ou não, de má ou boa-fé,
conhecimento ou desconhecimento... Se o vendedor sabe que a coisa tem
algum tipo de vício tem o dever de informar, mas mesmo que não soubesse,
respondia por evicção.
Obrigações do comprador
• Pagar o preço, ou seja, transmitir a propriedade do pretium ao vendedor
• Receber a coisa. Se recusar, pode depois ter que indemnizar o vendedor pelos
danos causados pelo atraso
• Responder pelo risco
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a res; ou fazia depender esses efeitos da declaração de agrado do
comprador (condição suspensiva)
2. A in diem addictio, que concedia ao vendedor a faculdade de rescindir o
contrato se, dentro de certo prazo, outra pessoa oferecesse melhores
condições (sob condição resolutória ou suspensiva, dependia do acordo
entre as partes)
3. A lex commissoria, o pacto que atribui ao vendedor a faculdade de
considerar o contrato não realizado se o comprador não pagar o pretium
dentro do prazo fixado entre as partes (sob condição resolutória ou
suspensiva, dependia do acordo entre as partes)
4. O pactum de retrovendendo, a venda a retro: o vendedor reservava a
faculdade de resgatar a res restituindo, dentro de certo tempo, o pretium
ao comprador (arrependimento)
5. O pactum protimeseos, pacto de preferência: o comprador comprometia-
se, caso quisesse alienar a res, a vendê-la a quem lha vendeu – A vende a
coisa a B, mas se B (comprador) mais tarde quer vender essa coisa a outra
pessoa, ele tem de dar preferência a A com as mesmas condições.
• Locação de coisa
As principais obrigações das partes
a) Locador – no DR e no DP, ele está obrigado a proporcionar o gozo da coisa
locada ao locatário durante o tempo que o contrato durar e nos termos deste;
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fazer as reparações necessárias para evitar a deterioração ou destruição da res;
ressarcir o locatário dos gastos que fizesse em reparações necessárias;
b) Locatário – pagar a renda ou o aluguer; conservar a res em boas condições e
usá-la para os fins a que ela se destina; restituir a res no termo da locação e nos
mesmos termos que a recebeu; ressarcir o locador dos eventuais danos
causados na res.
Relação entre o locador e o locatário: relação jurídica de natureza obrigacional e não
real, sendo o locatário mero detentor.
Caso prático
A (locador) é proprietário e B (locatário) é mero detentor. O locador entrega a coisa ao
locatário para ele gozar da coisa durante 10 anos. B paga uma renda (mensal). Mas 5
anos depois o A (cidadão romano) vende a coisa a C (cidadão romano) e C passa a ser
proprietário. Pode C expulsar B do prédio?
Contrato de natureza obrigacional: só produz efeitos entre as partes. O C é um
estranho a esta relação jurídica entre A e B. C dirige-se ao seu prédio, encontra B e
expulsa-o, o que pode fazer.
Direito de natureza real, neste caso o direito de propriedade – tem eficácia erga
omnes: se C tem esse direito, pode opô-lo a B. Esse direito sobrepõe-se ao direito de
natureza obrigacional.
Incumprimento das obrigações: A tinha a obrigação de proporcionar o gozo da coisa a
B até o termo do contrato de locação. B pode dirigir-se a A e reclamar, e tem neste
caso um direito de indemnização pela parte de A pelos prejuízos causados.
Desta situação resultou que a compra e venda afasta a locação no direito romano. Mas
o artigo 1057 do CC proíbe que a compra e venda afaste a locação – inverte a regra do
DR.
Quanto à resolução do contrato, além do critério geral segundo o qual se uma das
partes não cumpre (responsabilidade) ou não pode cumprir (risco) as suas obrigações,
à outra é permitido resolver o contrato, podia pedi-la:
a) o locador, quando:
• o locatário não paga a renda durante dois anos
• a res é objeto de abuso (fins diversos) ou sofre deterioração
• tem necessidade de habitar a casa ou pretende reformá-la (tanto no direito
romano como no português)
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b) o locatário, quando:
• o locador se atrasa na entrega da res
• a res tem defeitos que impedem, limitam ou dificultam a sua utilização
• há um temor fundado de um perigo
• Locação de trabalho
Nesta locação, o trabalhador (locador) obriga-se a pôr a sua atividade laboral à
disposição do locatário durante um certo tempo, mediante o pagamento de uma
remuneração.
Não foi inteiramente pacífica no quadro do direito romano – a atividade laboral era
vista como uma locação da pessoa e não do seu trabalho, que era principalmente
fornecido por escravos: a locação de homens livres (cidadãos romanos) não era bem
vista. Era uma diminuição da capacidade jurídica da pessoa, do exercício de direitos.
Os jurisconsultos fizeram então uma distinção: a locação de trabalho não tem por
objeto a pessoa, mas sim a sua atividade laboral. Com esta distinção (ficção jurídica) já
foi possível a atividade laboral do homem livre, ou seja, do cidadão romano ser objeto
de locação de trabalho e não da pessoa, sem diminuir a sua personalidade e
capacidade jurídica – assim chegou ao direito português.
A locação de trabalho caducava com a morte do locador e não do locatário: o locador
podia prestar os seus serviços aos herdeiros do locatário que, portanto, substituí-lo-
iam na obrigação de pagar a merces (se um dos sucessores do locatário continuasse a
explorar a atividade em causa). Se o locador estivesse doente ficaria dispensado de
prestar o seu trabalho, mas não era pago: o locatário estava desobrigado de pagar a
remuneração durante a doença.
• Locação de obra
Contrato de empreitada no direito português.
O locador entrega uma coisa ao locatário para ele realizar a obra acordada e pagar-lhe
a remuneração como retribuição.
O locador fornece as matérias-primas que o locatário vai utilizar para realizar a obra.
Se o locatário adquire as matérias-primas e as transforma, é um contrato de compra e
venda e não uma locação de obra.
O locatário deve executar essa obra com correção e entregá-la no prazo acordado ou,
se não foi fixado, no tempo normalmente utilizado para a realizar.
Se o locatário tivesse trabalhadores com ele, eles poderiam também executar a obra,
salvo se o locador quisesse que fosse especificamente elaborado por ele.
Ribeiro de Almeida
Personalidade jurídica coletiva
4 sócios constroem uma sociedade. Essa sociedade tem personalidade jurídica, dívidas
próprias, créditos próprios, património próprio, não dos sócios. Pelas dívidas responde
o património da sociedade e não aquele dos sócios.
Em Roma não era assim: as sociedades comerciais não tinham personalidade jurídica
coletiva, mas havia na mesma contrato de sociedade.
Elementos
• Consenso – acordo entre as partes de cada um entrar com património, dinheiro
ou trabalho para a realização de um fim comum útil.
• Objeto – dinheiro, património e serviços que os sócios levam para a societas.
Um sócio entra com um imóvel na sociedade: esse imóvel passa a ser dos 4
sócios porque a sociedade não tem personalidade jurídica. O imóvel deixa de
pertencer exclusivamente ao sócio que entrou com ele no regime de
condomínio. O condomínio no DR corresponde à compropriedade no DP.
O que é a compropriedade? Uma coisa que pertence a duas ou mais pessoas.
Se um sócio entra com um imóvel para a sociedade, mas esse tem defeitos ou
vícios ocultos, ele responde por evicção.
• Finalidade – o interesse comum que as partes se propõem realizar deve ser
lícito e suscetível de constituir uma utilidade ou vantagem patrimonial para
todos os sócios. O DR já admitia que os sócios tivessem participações diversas
(como hoje), por ex. nos lucros e nas despesas, e proibia a participação
unicamente nos lucros.
O DR dividia as sociedades em 2 tipos: sociedades universais – os sócios
entravam com todo o património (presente e futuro). Sociedades com fins
específicos – constituídas apenas para realizar um certo negócio jurídico.
Quando a obra termina, a sociedade dissolve-se.
O contrato de sociedade não cria uma pessoa jurídica distinta dos sócios; por isso, não
existem relações obrigacionais entre a sociedade e terceiros: só há créditos e
obrigações de cada sócio com terceiros.
Se um dos sócios (A) celebra um contrato com um terceiro (E): esse contrato tem de
estar relacionado com a atividade mercantil dessa sociedade. Não tendo a sociedade
personalidade jurídica, e o E não foi pago (incumprimento contratual), a quem é que o
E se pode dirigir para tratar da coisa judicialmente?
Ribeiro de Almeida
• 1ª hipótese: todos os sócios intervêm no contrato (todos constituem partes no
contrato) e todos eles são condenados a pagar ao E.
• 2ª hipótese: o A foi mandatado pelos outros sócios.
O que acontecia no DR: o E vai demandar o A, e o A diz ao pretor que está
mandatado pelos outros sócios, que realizou o contrato em representação de
todos os outros sócios. O pretor vai então chamar todos os outros sócios à ação
judicial. Todos eles serão condenados a pagar. Ação de substituição de pessoas
• 3a hipótese: não há mandato dos outros sócios, todos os sócios tiraram
benefício dos bens que foram colocados à venda no estabelecimento comercial
e foram vendidos. O A vai dizer ao pretor que comprou os produtos a E, mas
não para consumo próprio e sim para a sociedade: todos os sócios tiraram
benefício disso e então são todos chamados à ação judicial para pagar ao E.
• 4ª hipótese: o A é o gerente do estabelecimento comercial (com o acordo dos
outros sócios). O A está então implicitamente mandatado para celebrar
negócios jurídicos que estejam conexionados com a atividade comercial em
causa. Consequentemente, se o A celebra com E e não lhe paga, o E demanda o
A. O A vai dizer ao pretor que fez esse contrato na qualidade de gerente, e que
está implicitamente mandatado para realizar esses negócios jurídicos. O pretor
vai chamar os outros sócios à ação, pois vão ser condenados a pagar.
O património em condomínio é que respondia pelas dívidas, e se este não fosse
suficiente, era o património pessoal.
Caso prático
A (gerente) celebra com E (banqueiro) um contrato. A necessita de dinheiro para fazer
obras no estabelecimento comercial e precisa de dinheiro emprestado: contrato de
mútuo. O A vai contratar F para fazer as obras: locação de obra. C (sócio) compra a G
uma joia para oferecer ao seu cônjuge: contrato de compra e venda. D (sócio) contrata
H para ficar a trabalhar no estabelecimento como empregado de mesa: locação de
trabalho.
Nem o A, nem o C, nem o D pagaram o que deviam.
Caracterizar e definir os contratos (elementos).
Ribeiro de Almeida
1. G quer ser pago e entrepõe uma ação judicial a C. Não é relevante o facto de C
ser sócio pois o contrato entre estes não está conexionado com a atividade
comercial e a finalidade da sociedade (usado para fins pessoais).
2. H quer ser pago e pretende demandar a sociedade, mas não o pode fazer
porque ela não tem personalidade jurídica. Pode então demandar o D. D não é
gerente, não está mandatado, não intervieram os sócios no contrato: D
demonstra que todos os sócios tiraram proveito da atividade do H. O pretor
chama todos os sócios à ação judicial e todos eles são condenados a pagar a H.
3. A celebrou 2 contratos na qualidade de gerente e não pagou a E nem a F. Eles
demandam o A em tribunal porque foi com ele que celebraram os contratos
pois a sociedade não tem personalidade jurídica. A está implicitamente
mandatado pelos outros sócios. Os outros sócios serão chamados à ação e
condenados a pagar.
Obrigações
a) Do mandatário – obrigação de cumprir a atividade a partir do momento que
aceitou; efetuar a atividade nos termos que o mandante estabeleceu (se não o
fez, realizá-la segundo a natureza dela); prestar contas da sua gestão ao
mandante
Ribeiro de Almeida
O mandatário pode encarregar outras pessoas dessa atividade, mas responde
pelo trabalho do substituto.
b) Do mandante – obrigação de pagar as eventuais despesas que o mandatário
teve ao realizar a atividade; indemnizar os danos que a realização da atividade
causou ao mandatário
Sociedade
Ribeiro de Almeida
- art. 980: noção igual
- No DP a sociedade tem personalidade jurídica
- Contrato de locação (1022, de coisa): noção igual
- Obrigações do locador: igual
- Obrigações do locatário: 1037 n.2 – ele é um detentor, pode recorrer aos
instrumentos de tutela da posse (no DR e no DP)
- Contrato de trabalho: 1152
- Contrato de empreitada: 1207
Mandato
- art. 1557, noção igual, características iguais
- Obrigações das partes: igual
Francês
Compra a venda: consensual; regime idêntico ao português e não ao do DR por causa
da transmissão da posse e não da propriedade
Locação: consagra diversos tipos de locação além das 3 que conhecemos do DR; usa a
nomenclatura que vem do DR (locação de coisa, obra e trabalho)
Sociedade: tem personalidade jurídica
Mandato: é igual
Alemão
Compra e venda: não é consensual, é real quanto à sua constituição, o contrato não
está perfeito pelo simples consenso das partes, só produz os seus efeitos com a
entrega da coisa (móveis) ou com o registo (imóveis), ou seja, só com essas exigências
é que o direito de propriedade se transmite
Locação: igual
Mandato: igual
Sociedade: tem personalidade jurídica
Espanhol
Compra e venda: a maioria da doutrina espanhola quanto a este contrato é que ele é
real quanto à sua constituição. Implica a traditio quanto a coisas móveis.
Locação: usa a nomenclatura que vem do DR (locação de coisa, obra e trabalho)
Sociedade: tem personalidade jurídica
Mandato: igual
Ribeiro de Almeida
Contratos inominados
São relações obrigacionais que não têm denominação própria – são contratos sem
nome. Trata-se de relações cujo vínculo jurídico, que liga as partes, surge quando só
uma delas realizou a sua prestação e, por isso, pode exigir à outra a prestação a que se
comprometeu.
Elementos:
• Consenso – é o acordo em que cada parte se obriga, em relação à outra, a dar
uma determinada res ou a realizar uma certa atividade (facere) = dar dar, dar
fazer, fazer dar, ou fazer fazer.
• A execução de uma das prestações – ex. avaliador de joias: o vínculo jurídico só
surge quando eu lhe entrego a joia para ele avaliar, e não quando ele consente
em avaliar a coisa.
4 contratos
1. Contrato de permuta, permutatio: uma pessoa transfere o direito de
propriedade sob uma coisa e a outra parte faz o mesmo. É, por isso, um
contrato do tipo dar dar.
Foi discutido durante a época clássica central se este contrato não era uma
compra e venda. Na permuta qual é a coisa que funciona como um preço para
ser uma compra e venda? Não sabemos, e por isso não é compra e venda –
escola proculeiana. É um contrato real, ao contrário da compra e venda.
É um contrato que implica a transmissão do direito de propriedade, o que
significa que ambos têm de ser proprietários das coisas que vão dar.
Em todo o restante, aplicava-se o regime da compra e venda.
2. Contrato estimatório, aestimatum: uma pessoa entrega uma coisa a outra para
que essa outra a venda.
• Elementos:
a) Entrega da res da parte de A para que B a venda
b) Fixação do valor a pagar a A da parte de B
c) Obrigação alternativa de B pagar o valor fixado ou restituir a res se
não for vendida
d) Faculdade de B se apoderar da diferença entre aquele valor e o
preço da venda
Corresponde à venda à consignação no regime português: ex. as joias numa
ourivesaria à venda não pertencem à ourivesaria (ao proprietário dela),
pertencem à outra parte que levanta essas joias se elas não forem vendidas.
Este contrato é celebrado no domínio mercantil do direito português.
Ribeiro de Almeida
pode a qualquer momento por fim a essa concessão (por isso se chama
precário).
4. Contrato de transação, transactio: é um contrato em que as partes põem fim
ou evitam um litígio mediante concessões recíprocas.
Este contrato consta no artigo 1248 do CC.
Ribeiro de Almeida
Quase contratos
São relações que geram obrigações, ainda que não sejam contratos por completo. Não
há acordo, mas sim um ato unilateral que gera obrigações para mais do que uma
pessoa, senão aquela que praticou o ato.
Gestão de negócios
Ela ocorre quando alguém, sem estar mandatado pelo serviço que desempenha ou
sem ter nenhum dever de ofício (dever de profissão), realiza, por sua própria iniciativa
e no interesse alheio, a gestão de um ou mais negócios de outra pessoa.
Desta atividade unilateral nasce uma relação obrigacional entre quem faz a gestão (o
gestor) e aquele em cujo interesse atua (o dono de negócio). O seu objeto é
constituído pelas seguintes obligationes:
1. Do gestor:
a) Realizar a gestão, que iniciou, segundo a natureza do negócio e no
interesse do dono deste
b) Transmitir ao dono do negócio os efeitos dos negócios jurídicos
concluídos, quando os ratifique
2. Do dono do negócio: ressarcir ao gestor os gastos que realizou e liberá-lo das
obrigações assumidas, desde que a gestão tenha sido útil
Ribeiro de Almeida
A gestão de negócios assenta nos seguintes princípios:
• Princípio da ordem pública – ninguém se deve meter na esfera jurídica e
patrimonial alheia
• Princípio da relação de solidariedade entre as pessoas – evitar que o
vizinho sofra mais danos
O regime deste quase contrato é igual em todos os ordenamentos jurídicos estudados
anteriormente.
Alguém efetua um pagamento a outra para que essa realize uma atividade. Essa
pessoa não o faz: estamos perante um enriquecimento sem causa porque a pessoa
recebeu o dinheiro, mas não realizou a atividade. Havendo um contrato não se aplica o
enriquecimento sem causa, porque nesse caso seria um incumprimento contratual.
Ofereço uma prenda para alguém que se vai casar, mas o casamento nunca se verifica:
posso pedir de volta o que ofereci, porque a causa da minha oferta nunca se realizou.
Se eu levar a minha roupa a uma lavandaria e esta a perde, eu tenho direito a ser
indemnizada. Mais tarde a lavandaria contacta-me e diz-me que a roupa apareceu. A
indemnização que me foi dada tem de ser restituída pois ela já não faz sentido.
Uma obrigação é natural quando já não é judicialmente exigida, mas é uma obrigação
jurídica. Se o dono do bar não agir judicialmente contra o aluno que não pagou,
estamos perante uma prescrição presuntiva. Mas a obrigação existe, porque a dívida
existe, mas o dono do bar já não pode agir judicialmente contra esse aluno. Anos
depois, o aluno vai pagar e o dono do bar recebe o pagamento devido. Mas o aluno
vem a saber que a dívida prescreveu: vai até ao dono do bar e pede de volta, mas não
o pode fazer, porque ele fez um pagamento devido e cumpriu uma obrigação (natural).
Ribeiro de Almeida
Delitos e quase delitos
Também são fonte de obrigações.
Os delitos derivam da prática de um ato ilícito, sem ser um contrato ou um quase
contrato. Temos como exemplo a responsabilidade aquiliana, que tem origem na
época arcaica, hoje chamada responsabilidade civil (483 CC).
O direito romano distinguia delitos e quase delitos pois aqueles vigoravam no ius civile
e estes no ius honorarium, mas substancialmente são exatamente iguais.
Direitos reais
• De gozo – como o direito de propriedade e os iura in re aliena: usufruto,
servidões prediais, uso e habitação, direito de superfície
• De garantia – como o penhor, a fidúcia, a hipoteca
• De aquisição – tem uma visão doutrinária e não legal, ex. direito de preferência
legal
Como consequência de o direito real ter uma eficácia erga omnes, tanto no DP como
no DR, temos 2 princípios:
• A taxatividade – só existem os direitos reais que a lei prevê, não se podem criar
outros, não há liberdade em relação a estes; ao contrário dos direitos das
obrigações em que há liberdade contratual. 1306 CC
• A tipicidade: só existem nos termos que a lei prevê, as normas que a lei prevê
não podem ser alteradas pela vontade das partes
Ribeiro de Almeida
Os direitos reais são, como sabemos, direitos sobre coisas. O que são então as coisas
para o direito? São, coisas para o direito, segundo estas características:
• As que são exteriores ao sujeito; as pessoas não são uma coisa (no direito
romano já foram, ex. os escravos)
• Têm de ter valor económico
• Têm de ser um objeto em si mesmo – tem de ter autonomia, tem de ser
desintegrada de outra, tem de ser individual, tem de ser distinta das outras
coisas
• Têm de ser acessíveis
• Têm de ter utilidade
Há coisas hoje em dia que não eram coisas para o direito antigamente, mas passaram a
ser e outras novas surgiram. Por exemplo, em Roma não havia eletricidade, hoje em
dia há: é considerado uma coisa, pois tudo o que tem existência corpórea é
considerada res.
1. Direito de propriedade
Qual é o conteúdo do direito de propriedade? É usar, fruir e dispor duma res:
• Usar – retirar utilidade da coisa sem a destruir
• Fruir – colher frutos (naturais ou civis), retirar rendimentos da coisa
• Dispor – é a disposição material da res, é poder alienar e destruir a coisa
O que distingue o uso da fruição? A fruição implica obter os rendimentos da coisa.
O uso da coisa não permite obter rendimentos da coisa. Se eu for usuário, não posso
arrendar a coisa onde habito. Se for usufrutuário pode arrendar, porque a renda é o
fruto da coisa, os rendimentos da coisa. O usufrutuário pode vender o seu direito de
usufruto, e não a coisa da que usufrui. Só o proprietário da coisa é que pode vender ou
destruir a coisa.
O direito de usufruto é um direito real sob coisa alheia, e é o direito que mais
comprime o conteúdo do direito de propriedade.
Ribeiro de Almeida
Limitações do direito de propriedade
O conteúdo deste direito é exercido nos termos da lei: as suas restrições já vêm do
direito romano.
Karl Marx dizia que em Roma, o direito de propriedade não tinha limitações. Porém,
Marx equivocou-se pois já em Roma havia restrições a este direito. Destacamos
algumas impostas por:
• Interesses públicos
a) Expropriação por utilidade pública – a autoridade pública podia apoderar-se
de uma res alheia, mas duas condições tinham de ser cumpridas: a res
expropriada teria de ser destinada à satisfação de um interesse público e o
proprietário ser devidamente indemnizado
b) Limitações de prédios ribeirinhos – os proprietários de terrenos confinantes
com rios navegáveis eram obrigados a permitir a utilização das suas
margens aos navegantes para aí desenvolverem atividades relacionadas
com a navegação e a pesca, teriam de suportar os incómodos
c) Limitações provocadas pelo trânsito público – se uma via (estrada) fosse
deteriorada por inundação ou ruína, o proprietário do terreno mais
próximo devia permitir a circulação do trânsito sobre o seu terreno.
Também os proprietários de terrenos confinantes com a via publica eram
obrigados a mantê-la em bom estado pois esta era fundamental para a
unificação do Império
d) Limitações urbanísticas – a Lei das 12 tábuas prescreveu que entre as casas
fosse deixado um certo espaço. Mais tarde também foi protegida a beleza
dos edifícios, proibindo os proprietários de arrancar as esculturas, as
estátuas e todos os elementos ornamentais. Ainda na época clássica, foram
regulamentadas a altura, a distância e a estética dos edifícios
• Interesses privados
a) A Lei das 12 tábuas proibiu o proprietário de um terreno de desviar o curso
natural das águas fluviais com prejuízo do vizinho (1351 CC). Esta limitação
ao direito de propriedade vem ao de cima quando o Império Romano chega
ao Norte de África, pois a água era escassa
b) A mesma Lei permitiu que um proprietário prejudicado pela sombra dos
ramos de uma árvore plantada num terreno vizinho (abuso de direito)
exigisse o corte dos ramos até a uma certa altura e os cortasse se o
proprietário da árvore recusasse (1366 CC). É um abuso de direito
c) Por força da mesma lei, o dono de uma árvore podia penetrar, no terreno
vizinho, para recolher os frutos aí caídos
d) Ao vizinho foi, também, concedido o poder de arrancar e de se apoderar
das árvores inclinadas sobre a sua casa se o proprietário destas não as
arrancasse
e) Na época justinianeia, impôs-se o princípio segundo o qual as águas que
excedessem as necessidades de um terreno deviam ser restituídas aos
outros terrenos e os proprietários de terrenos superiores foram proibidos
de diminuir artificialmente o afluxo de águas aos terrenos inferiores
Ribeiro de Almeida
f) Ainda no direito justinianeu, foi limitado o poder de o proprietário realizar,
no seu terreno, obras que constituíssem um obstáculo à ação do vento nas
eiras vizinhas
g) Deve ser tolerada a emissão, desde que não graves, de fumos, poeiras,
vapores, humidade, odores, etc. provenientes do uso ou exercício normal
da propriedade vizinha (1346 CC). O proprietário só não pode realizar
atividades que sem nenhuma (ou muito escassa) utilidade própria, se
destinem a causar dano a outros.
No direito romano a teoria do uso normal gera emissões lícitas que o
vizinho tem de suportar. A teoria do uso anormal gera emissões ilícitas.
No direito italiano distinguimos as influências diretas (os efeitos só se
produzem no prédio vizinho) e indiretas, as permitidas (começam no prédio
em questão e continuam para o vizinho, ex. fumo).
Surgiu ainda a teoria do abuso ou do excesso do direito (consagrado no
artigo 334 do nosso código civil) segundo a qual o proprietário está proibido
de usar dolosamente o seu direito, ou seja, tão excessivamente que não se
justifica.
Ribeiro de Almeida
Sou comproprietário de uma coisa e posso vender, mas só posso vender o que me
pertence, ou seja, a minha quota (%). Não posso vender nada de especificado do
prédio, que é algo comum (salvo se os comproprietários concordarem).
Em virtude de um comproprietário ser proprietário duma quota, independentemente
do tamanho desta, ele tem direito de exercer o seu direito de propriedade sobre a
coisa, em plenitude (1405 CC).
Se eu quiser vender a minha parte, os meus comproprietários têm direito de
preferência.
Os direitos dos comproprietários são os seguintes:
• Poder de disposição – pode dispor, ou seja, pode alienar a quota que lhe
pertence
• Poder de usufruto – pode usufruir da parte que lhe pertence
Porque é que o comproprietário pode sempre exigir a divisão da coisa? A
compropriedade gera limitações no uso da coisa e o exercício de direito fica
enfraquecido.
3. Posse
Na época clássica, a possessio foi considerada um poder de disposição, de facto, de
uma res que o possuidor exercia com intenção de lhe pertencer exclusivamente. Ou
seja, ter a posse de algo é agir como proprietário da coisa, sem o ser. Distingue-se da
detenção de algo– o comodatário detém a coisa, agindo sabendo que a coisa é de
outra pessoa.
A ordem jurídica assume que a pessoa que tem a posse da coisa e age como se fosse
dela, é proprietário, porque aquela pode provar facilmente que tem a posse desta,
mas não pode provar facilmente que é proprietário. À ordem jurídica basta-lhe a posse
para assumir a pessoa como proprietário da coisa em questão.
O exercício continuado da posse pode gerir a propriedade por via da figura da
usucapião.
A posse não é um direito – é um poder de facto. A pessoa que tem a coisa usa-a como
se fosse proprietário, mas não é.
Savigny distingue 2 elementos da posse:
• O corpus – elemento material, que se identifica com os atos (materiais)
praticados numa res, que traduz o poder de facto sobre a coisa, direto e
imediato
• O animus – elemento espiritual ou psicológico, que se traduz na intenção de o
possuidor atuar como se fosse proprietário; este elemento distingue a posse da
mera detenção (1253 CC)
Um locatário não pode alterar nada na casa sem a autorização do senhorio, por isso
não se comporta como proprietário e é, então, mero detentor.
A posse presume o direito de propriedade (1268 CC)
Em relação à tutela da posse, a figura da ação direta pode ser aplicada em casos
excecionais. Outros instrumentos de tutela da posse são também os interditos
possessórios, consagrados no CC
Ribeiro de Almeida
Direitos in re aliena
Os direitos sob coisa alheia contêm todas as características dos direitos reais.
Estes são direitos reais que vão onerar uma coisa que pertence a outra pessoa; vão
comprimir o direito de propriedade que pertence a outra pessoa.
A pode vender o seu prédio a quem quiser, mas B (locatário, usufrutuário etc.) estava
lá e permanece lá porque tem um direito real sob a coisa com eficácia erga omnes.
Características dos direitos reais sob coisa alheia:
• São direitos reais que vão onerar uma coisa que pertence a outra pessoa; vão
comprimir o direito de propriedade que pertence a outra pessoa
• Gozam do princípio da elasticidade – o conteúdo do direito de propriedade
pode ser comprimido
• Limitam, mais ou menos, o direito de propriedade
a) Servidões prediais
Poder-se-á considerar servidão (servitus) um direito real sobre uma res aliena
disciplinado por um conjunto de regras que lhe transmitem autonomia e
individualidade próprias.
As servidões prediais satisfaziam necessidades de um terreno (dito dominante),
permitindo ao seu proprietário realizar determinadas atividades no terreno vizinho
(dito serviente) ou impondo ao proprietário deste a abstenção de certas práticas ou
atuações: no primeiro caso, a servidão dizia-se positiva; no segundo, negativa.
Não se trata, porém, duma relação entre dois terrenos (o que seria juridicamente
inconcebível), mas dum direito sobre uma res aliena, cujo objeto consiste em
proporcionar uma determinada fruição ou vantagem ao terreno dominante, a que
corresponde uma limitação ou desvantagem imposta ao proprietário do terreno
serviente. Simplificando, é um direito sobre um prédio alheio: um dos prédios tem
uma desvantagem (prédio serviente) e o outro uma vantagem (prédio dominante), que
é o que tem direito de passagem no prédio serviente.
A servidão extingue-se por ex. quando A vende o prédio a B: B passa a ser proprietário
dos dois prédios. Também se extingue devido à demolição do edifício dominante, etc.
Ribeiro de Almeida
b) Usufruto
É o direito que mais restringe o direito de propriedade. Não há divergências entre o
regime português e romano.
O usufruto é o direito real de usar e desfrutar não abusivamente uma res aliena,
respeitando o seu estado atual, a sua consistência material e o seu destino económico
(um prédio de habitação não pode virar um hotel). A esta limitação, que exprime a
ideia de que a res não deve ser consumível, juntam-se outras relacionadas com o
carácter estritamente pessoal do ususfrutus: a sua duração não pode exceder a vida do
usufrutuário, ou seja, é temporário; e enquanto direito, nem é transmissível inter vivos
nem mortis causa, embora o seu exercício possa ser cedido a outra pessoa senão o
titular do direito de usufruto. O usufrutuário não pode transformar a res nem mesmo
torná-la economicamente mais rendível (não pode transformar um jardim numa
horta), embora (tratando-se de uma casa) possa ornamentá-la e fazer os restauros
necessários à sua conservação no estado em que a recebeu.
O usufrutuário pode locar a coisa, pois pode desfrutar dela. Quando o usufruto caduca,
a locação também caduca.
Quanto ao fruir, pertencem ao usufrutuário todos os ganhos que genericamente se
consideram frutos: os naturais e os civis.
O usufrutuário é responsável pelas despesas que oneram a res: limpeza, reparação de
condutas de água e de fossas, conservação de vias, etc. No entanto, só responde por
reparações destinadas à manutenção ordinária da res. Também é responsável pela
alimentação do escravo, segundo a sua dignidade, e pelas despesas de doença.
O usufruto aplica-se muito em situações de pessoas que têm poucos rendimentos, e a
única coisa que têm é a sua casa: vendem-na, mas reservam para si o usufruto vitalício
e continuam a viver na casa para assegurar o futuro.
c) Uso
Originariamente, o usus terá sido o direito de usar uma res aliena sem a perceção dos
seus frutos; por isso, terá incidido apenas sobre res não frutíferas, constituindo-se,
nomeadamente, sobre bibliotecas, escravos e casas que o usuário não podia arrendar.
A sua prática estendeu-o, porém, aos terrenos rústicos e a iurisprudentia clássica foi
ampliando a esfera do “usar”: o usuário passou a poder fazer uma pequena horta,
recolher frutos, flores e lenha, com a reserva de serem consumidas no próprio local.
Também o usus concedido sobre um rebanho continha a faculdade de consumir o
leite, limitado, porém, ao necessário à satisfação das suas necessidades pessoais e
familiares.
Ribeiro de Almeida
Nas épocas seguintes avançou-se mais e, no direito justinianeu, o usuário de uma casa
podia arrendar as partes que excedessem as suas necessidades e, tratando-se de um
rebanho, era-lhe permitido utilizar o estrume para adubação do terreno.
O uso é um direito intransmissível, indivisível e sofria a mesma limitação imposta ao
usufruto: o respeito pela essência material e pelo destino económico-social da res. O
usuário era, também, obrigado a prestar uma caução, com que garantia ao
proprietário o uso diligente da res e a sua restituição no termo do uso.
d) Habitação
A habitatio é, no direito justinianeu, um direito real especial concedido a uma
determinada pessoa, de habitar ou arrendar uma casa alheia. É, também, um direito
indisponível e é vitalício.
® Qual a diferença entre o usufruto e o uso e habitação? Este direito é menos usado,
tanto no direito português como no direito romano.
O direito de uso é real, é a possibilidade de alguém usar uma coisa de outra, ex. usar a
casa de outra pessoa. O usuário só podia usar, não podia locar a coisa nem colher
frutos dela. Este regime só fazia sentido sobre uma habitação e não sobre um prédio
rústico por ex.
O direito romano diz, mais tarde, que o usuário não terá só os poderes de usar, mas
também de desfrutar um bocado, ou seja, tirar frutos, mas só aqueles estritamente
necessários para a satisfação das suas necessidades e das da sua família. Em Roma o
direito de uso não era transmissível; atualmente é transmissível.
O direito de uso e habitação não pode ser adquirido por usucapião (1293 CC) devido à
sua natureza pessoal, ao contrário do usufruto.
e) Direito de superfície
A superficies é um direito real transmissível mortis causa e inter vivos de
perpetuamente ou durante largo tempo (depende do acordo entre as partes), gozar,
plena e exclusivamente, de um edifício construído em solo alheio, mediante um
pagamento anual. Tanto pode ser oneroso como gratuito.
Enquanto direito real, surge no tempo do imperador Justiniano e está presente em
todos os ornamentos jurídicos que estudamos (italiano, francês, espanhol e alemão).
Um exemplo de direito de superfície: A é proprietário do prédio X. A permite que B
faça um edifício dentro do seu prédio. B é então proprietário desse novo prédio, Y. B
terá de ter, em princípio, a autorização de A. Há possibilidade, então, de haver uma
servidão predial. B tem um direito de superfície sobre o prédio de A. A pode vender o
prédio X a C, mas o prédio Y continua lá, ou seja, o direito de superfície mantém-se. O
mesmo acontece se a situação se inverter.
O imperador Justiniano considerou o direito de superfície com eficácia real, erga
omnes. A pode vender o prédio a C, mas o prédio Y está onerado com direito de
superfície que tem eficácia erga omnes; C sabe disso e tem de respeitar. Se for B a
vender o seu prédio Y a C, este vai beneficiar do direito de superfície com eficácia erga
omnes: A terá igualmente de suportar a situação.
Ribeiro de Almeida
Exemplos do direito de superfície na prática
B construiu uma edificação no prédio de A durante 50 anos. Durante esse tempo, o
imóvel é do B, mas ao fim desse tempo o direito de superfície extingue-se e B terá de
sair. Foi um negócio favorável para o B, pois se tiver corrido bem, ele obteve lucro.
As entidades públicas que não querem vender imóveis concedem então o direito de
superfície a outra pessoa para exploração.
A superfície constituía-se por contrato que tanto podia ser uma venda (se envolvesse
um preço pago só uma vez), uma locação (se houvesse uma renda, uma pensão) ou
uma doação.
O direito de superfície extinguia-se com a destruição do edifício, por renúncia,
confusão e prescrição. Não se extingue pela morte do proprietário desse direito,
transmite-se sucessoriamente como qualquer outro direito real.
a) Pignus
Na época clássica, o penhor é um direito real sobre uma coisa alheia, destinado a
garantir o cumprimento duma obligatio. Constituía-se, normalmente, através de um
contrato real, bilateral imperfeito e caracterizava-se pela cedência, ao credor, da mera
detenção de uma res e não duma datio, que se obrigava a conservar e a restituir após
a satisfação do seu crédito. Hoje versa apenas sob coisas móveis, mas em Roma incidia
sob qualquer coisa.
As características do penhor (que ainda hoje se mantêm) como contrato de garantia
são as seguintes:
Ribeiro de Almeida
• Acessoriedade – o contrato de penhor é acessório duma outra obrigação
principal, por exemplo do devedor paga a dívida. Se o contrato de mútuo for
inválido ou inexistente, o contrato de penhor também o é. Se o contrato de
mútuo foi realizado por coação física ou moral, o mútuo é inválido, ou seja, o
penhor também o é. A validade ou invalidade do penhor depende da validade
ou invalidade da obrigação principal.
• Indivisibilidade – a garantia mantém-se na integra até à extinção da obrigação
principal, ainda que essa obrigação seja extinta parcialmente e que o valor da
dívida seja menor ao correr do tempo.
Quanto ao objeto, na época clássica podia exigia-se que a res fosse corpórea, mas
podia ser futura (podiam ser empenhados os frutos que uma determinada res
produzisse).
O direito justinianeu permitiu igualmente a constituição de pignus sobre res não
corpóreas, mas suscetíveis de venda (o direito de usufruto, a superfície, etc.)
O penhor extinguia-se com a cessação da dívida garantida; a venda da res feita para
satisfação do credor; a destruição da res; por renúncia, mesmo tácita e por confusão
dos títulos de proprietário e de credor pignoratício.
b) Hypotheca
A hipoteca é um direito real sobre uma res aliena que se traduz na sua especial
afetação ao cumprimento duma obligatio. Constitui-se com base numa simples
conventio sem a traditio da res, nem a datio desta: se eu adquirir um imóvel, o
proprietário sou eu e o possuidor sou eu, não é o banco. Hoje incide sob móveis ou
imóveis sujeitos a registo, em Roma podia incidir sob qualquer coisa.
A sua origem remonta aos arrendamentos rústicos: o arrendatário afetava, na
convenção com o locador, os utensílios de lavoura e os animais e escravos, que
introduzia no seu terreno, ao pagamento da renda (merces), autorizando o dono do
terreno a apoderar-se destas res no caso de a renda não ser paga. A partir do século 1,
a hipoteca generalizou-se, passando a garantir qualquer obrigação e a constituir-se
sobre qualquer objeto suscetível de posse e de venda.
Os arrendamentos rústicos, por norma, são de longa duração, porque o agricultor vai
ter de fazer investimento, só ganha frutos anos depois, ou seja, vai necessitar de
tempo.
O locador vai querer, como já se referiu, uma garantia pois os agricultores, por norma,
têm poucas possibilidades financeiras. vão querer celebrar um contrato de penhor?
Não, o penhor implica uma traditio, mas o agricultor não quer ficar sem a coisa: nesse
caso, deixa de poder exercer a sua atividade. E um contrato de fidúcia? Não, porque o
locador perdia a garantia pois o arrendamento rústico é um contrato de longa duração,
e ao fim de 5 anos, o arrendatário pode readquirir o direito de propriedade, que antes
pertencia ao locador. Se fosse um contrato de curta duração, a fidúcia era o contrato
mais adequado para se celebrar.
A hipoteca extinguia-se:
1. Pelas mesmas causas comuns aos direitos sob coisa alheia: destruição da res,
renúncia (mesmo tácita) ou confusão
Ribeiro de Almeida
2. Com a extinção da dívida por qualquer forma
3. Pela venda da res hipotecada
Conclusão
O direito comum europeu é um direito de origem, de base romana, que chega até nós
no século 12 através do Corpus Iuris Civilis, que influencia e permanece, até hoje, nos
ordenamentos jurídicos do todo o ocidente. O direito que estudamos é um direito
romano vivo.
Fim da matéria
Ribeiro de Almeida