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Processo: 00644/12.8BEPRT
Secção: 1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão: 04/21/2016
Tribunal: TAF do Porto
Relator: Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores: PEDIDO DE CONDENAÇÃO À PRÁTICA DO ACTO DEVIDO;
PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE INVALIDADE DO ACTO PRATICADO; PEDIDO
CUMULATIVO; PEDIDO ALTERNATIVO; ARTIGO 66º, N.º 3, DO CÓDIGO DE PROCESSO
NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS; NULIDADE DE SENTENÇA; OMISSÃO DE
PRONÚNCIA; DEFICIÊNCIA DA DECISÃO; QUESTÕES AUTÓNOMAS;
CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL PRESCRITAS; SITUAÇÃO
REGULARIZADA PERANTE A SEGURANÇA SOCIAL; CONTAGEM DO TEMPO DE
SERVIÇO; RECÁLCULO DA PENSÃO; COMPENSAÇÃO; LIMITES CONSTITUCIONAIS;
SALÁRIO MÍNIMO NACIONAL; ARTIGO 220º E N.º2 DO ARTIGO 254.º, DO CÓDIGO DOS
REGIMES CONTRIBUTIVOS DO SISTEMA PREVIDENCIAL DE SEGURANÇA SOCIAL,
APROVADO PELA LEI 110/2009, DE 16 DE SETEMBRO; PRINCÍPIO DA DIGNIDADE
HUMANA; PRINCÍPIO DO ESTADO DE DIREITO; ARTIGO 1º, ALÍNEA A) DO Nº 2 DO
ARTIGO 59º E NºS 1 E 3 DO ARTIGO 63º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
PORTUGUESA.
Sumário: 1. Face ao disposto no artigo 66º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, tendo
sido deduzido pedido de condenação à prática do acto devido, não pode o Tribunal atender o pedido de
declaração de invalidade do acto praticado que, em vez de alternativo, foi formulado cumulativamente
com o primeiro pedido.
2. A unicidade de pedido não implica, contudo, unicidade de questões, pelo que tendo sido invocada a
nulidade de dois actos, a validade de cada um destes actos deve ser apreciada como questões
autónomas, pressupostas na decisão sobre o acto devido.
4. Decorre do disposto no n.º2 do artigo 254.º, do Código dos Regimes Contributivos do Sistema
Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei 110/2009, de 16 de Setembro, “a contrario sensu”,
que caso o beneficiário de uma pensão de velhice com contribuições por pagar à segurança social e já
prescritas as não regularize, ou declare não querer proceder ao seu pagamento, com fundamento no
facto de as mesmas se encontrarem prescritas, que o período de tempo a que as mesmas se reporta não
poderá ser reconhecido para efeitos da sua carreira contributiva.
5. Pelo que não se pode considerar como regularizada, para efeitos do disposto no artigo 220º do
mesmo Código, uma dívida que prescreveu. Sendo certo que os fundos que permitem pagar as pensões
e demais prestações regulares de segurança social são sustentados, essencialmente, pelas contribuições
dos futuros beneficiários.
7. A compensação entre as dívidas à segurança social e a pensão a pagar, consagrada no artigo 220º da
Lei 110/2009, de 15.09, só poderá ser admitida nos mesmos termos e com os limites
constitucionalmente estabelecidos para a penhora de rendimentos, salários e prestações periódicas,
onde se inclui obviamente a pensão de reforma, sob pena de violação do princípio da dignidade
humana, contido no princípio do Estado de Direito, e que resulta das disposições conjugadas do artigo
1º, da alínea a) do nº 2 do artigo 59º e dos nºs 1 e 3 do artigo 63º da Constituição.
8. Do mesmo modo, o recálculo de uma pensão por virtude de prestações que não foram pagas à
Segurança Social deve obedecer aos mesmos limites.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente: MJBF
Recorrido 1: Instituto de Segurança Social, I.P.
Votação: Unanimidade
Meio Processual: Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso
Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico: Emitiu parecer no sentido de não se verificarem as apontadas nulidades do
acórdão recorrido, mas proceder o recurso quanto ao mérito da acção.
1
Decisão Texto Integral: EM NOME DO POVO
Invocou para tanto, em síntese que a decisão é nula por não se ter
pronunciado sobre questões que foram suscitadas pelo autor; de mérito,
violou o disposto no artigo 95º, n.º 1, do Código de Processo nos
Tribunais Administrativos, no artigo 615º, n.º 1, al. d), do Código de
Processo Civil, nos artigos 1º e 63º, ambos da Constituição da República
Portuguesa, no artigo 133º, n.º 2, al. d), do Código de Procedimento
Administrativo e no artigo 158º, n.º 2, do Código de Processo nos
Tribunais Administrativos.
*
Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
*
6- Somos levados a questionar, afinal qual o acto em crise a que o Tribunal “a quo”
se refere?! Já que, para o recorrente, conforme configurou a sua acção, são dois, e
não um, os actos do recorrido que estão em crise.
7 - Deste modo, e ainda que fosse só por este motivo, o acórdão enfermaria de
nulidade, mas não só por este, mas também, não se ter pronunciado sobre mais
nenhum dos restantes pedidos deduzidos pelo recorrente.
12- Reportando-nos aos factos dados como provados, consta do ponto 4 daqueles:
“A pensão por velhice tem início em 2011-05-21 e é de €457,05”, e do ponto 10 dos
factos provados: “o valor da pensão por velhice, em resultado do novo cálculo, é de
381,00 Euros”.
13- Tendo em conta que no acórdão o Tribunal “a quo”: “condenou o réu a praticar
novo acto, determinando que a compensação, a efectuar na pensão mensal a pagar
ao autor (457,05€), se opere através da redução em montante correspondente a um
máximo de 1/3 da mesma, até á regularização definitiva da divida contributiva.”
14- E sendo evidente que o recorrido irá efectuar o recálculo em conformidade com
o máximo de redução, ou seja, 1/3, contas feitas, constata-se que o valor
correspondente a 1/3 da pensão do recorrente ascende a €152,35.
15- Se reduzirmos este montante aos €457,05, o recorrente passará a auferir uma
pensão no montante de €304,70, sendo este um valor, inferior aos €381,00 que
recebe actualmente e que resulta do recalculo efectuado pelo próprio recorrido.
16- Resultando de forma inequívoca, que com a decisão proferida pelo Tribunal “ a
quo”, o recorrente ficará numa posição pior do que aquela em que passou a estar
com o segundo ato do recorrido, - o de recálculo da sua pensão, o que obviamente,
não se mostra admissível.
17- Além disso, o recorrente ficou também prejudicado porquanto como supra se
expôs, o Tribunal “a quo” não conheceu da prescrição das contribuições invocadas
pelo recorrente, respeitantes ao período de Agosto de 2002 a Maio de 2006, assim
como, não se pronunciou sobre os montantes peticionados a título de retroactivos.
18- Por outro lado, e reiterando, pese o Tribunal “ a quo” se tenha pronunciado
sobre os dois actos praticados pelo recorrido, cuja legalidade o recorrente pôs em
causa, acaba apenas por conhecer da legalidade de um deles, sem no entanto,
concretizar qual.
27- Raciocínio esse que o recorrente entende que se deve aplicar por analogia no
caso da penhora de reformas de valores inferiores ao salário mínimo nacional, como
é o caso da sua pensão de reforma e também no caso de prestações relativas ao
rendimento social de inserção.
28- Entendimento esse, que o recorrente considera, mais justo por se encontrar mais
de acordo com os princípios constitucionais, do que o proposto pelo Tribunal “a
quo”, e que terá necessariamente de se aplicar à compensação para regularização da
situação contributiva prevista no artigo 220º do Código Contributivo.
29 - Ou seja, a ser admitida tal compensação, terá sempre de ter lugar dentro de
determinados limites, considerando os princípios constitucionais de igualdade,
proporcionalidade e de justiça social, sob pena de estarmos perante uma norma
inconstitucional que subverte todo o sistema publico de segurança social,
permitindo ao Estado que dá, “tirar”, o que é inadmissível e ilegal, pois
32- Tanto mais que uma boa parte dessas contribuições e juros de mora não são
devidos por se encontrarem prescritas, pelo menos as respeitantes ao período de
Agosto de 2002 a Maio de 2006, prescrição essa de que o Tribunal “a quo” como se
disse não conheceu, como lhe cabia.
33- Para além de que, o Recorrente efectuou durante vários anos, descontos para a
segurança social, tendo cumprido com o pagamento das contribuições e
quotizações, tendo uma carreira contributiva de cerca de 51 anos, desde 1960 a
2011.
37 - Não significando com isso que o recorrido não possa e não deva tentar obter o
pagamento das contribuições em divida, só não o pode fazer é desta forma, pela
compensação e ou redução oficiosa da pensão de reforma do recorrente, tanto mais
que dispõe de mecanismos próprios, como sejam, a instauração da competente
execução por dívidas.
39- Em conclusão, dir-se-á que mal andou o Tribunal “a quo”, ao decidir como
decidiu, ao fazê-lo violou a lei, concretamente o artigo 95º, n.º 1, do Código de
Processo nos Tribunais Administrativos, artigo 615º, n.º 1, al. d), do Código de
Processo Civil, artigos 1º e 63º ambos da Constituição da República Portuguesa,
artigo 133º, n.º 2, al. d), do Código de Procedimento Administrativo e artigo 158º,
n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
*
II – Matéria de facto:
1. Nulidade do acórdão.
Vejamos.
O réu não alegou que tivesse instaurado execução fiscal contra o autor,
mas invocou no artigo 18º da contestação que não poderá estar prescrita
uma dívida que o autor, conforme refere nos artigos 34º e 35º da petição
inicial, reconhece existir.
Ou seja, a ser admitida tal compensação, terá sempre de ter lugar dentro
de determinados limites, considerando os princípios constitucionais de
dignidade, igualdade, proporcionalidade e de justiça social, sob pena de
estarmos perante uma norma inconstitucional que subverte todo o sistema
público de segurança social, permitindo ao Estado que dá, “tirar”, o que é
inadmissível e ilegal, pois é obrigação do Estado assegurar a todos, o
mínimo de subsistência condigna bem como, prevenir e erradicar
situações de pobreza e de exclusão social, tanto mais que o direito à
reforma foi liquidado e atribuído ao recorrente, naquele preciso montante
de € 457,05 euros.
Todas as compensações operadas pelo réu nas reformas do autor são nulas
e têm de ser devolvidas ao autor nos termos dos artigos 133º, nºs 1 e 2, alª
d) e 134º nºs 1 e 2 do Código de Procedimento Administrativo de 1991,
que correspondem aos artigos 161º nºs 1 e 2, alª d), e 162º nºs 1 e 2 do
Código de Procedimento Administrativo de 2015.
*
Porto, 21 de Abril de 2016
Ass.: Rogério Martins
Ass.: Luís Garcia
Ass.: Esperança Mealha