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Processo: 01509/13
Data do Acordão: 18-11-2015
Tribunal: 2 SECÇÃO
Relator: PEDRO DELGADO
Descritores: REVISÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO
RECLAMAÇÃO
AUTOLIQUIDAÇÃO
CONTRIBUIÇÕES
CAIXA DE PREVIDÊNCIA
Sumário: I - A revisão do acto tributário com fundamento em erro imputável aos serviços deve ser efectuada pela
Administração tributária por sua própria iniciativa, mas, como se conclui do n.º 7 do art. 78º da L.G.T., o
contribuinte pode pedir que seja cumprido esse dever, dentro dos limites temporais em que Administração
tributária o pode exercer.
II - O alcance do nº 2 do art. 78º da LGT, ao estabelecer que, para efeitos de admissibilidade de revisão do
acto tributário, se consideram imputáveis à administração tributária os erros na autoliquidação, foi o de
alargar as possibilidades de revisão nestas situações de autoliquidação, em relação às que existiam no
domínio do CPT, solução esta que está em sintonia com a directriz primordial da autorização legislativa em
que se baseou o Governo para aprovar a LGT, que era de reforço das garantias dos contribuintes;
III - As dívidas por contribuições à Segurança Social assumem natureza tributária, sendo-lhes aplicável a
LGT (arts. 1º e 3º da LGT);
IV - Mesmo depois do decurso dos prazos de reclamação administrativa, designadamente do prazo para
reclamar a restituição ou reembolso de contribuições indevidamente pagas à caixa sindical de previdência,
previsto no artº 129º do DL nº 45266 de 23 de Setembro, a Administração tem o dever de efectuar a
revisão de actos tributários ilegais, nas condições e com os limites temporais referidos no art. 78.º da
L.G.T.
Nº Convencional: JSTA000P19723
Nº do Documento: SA22015111801509
Data de Entrada: 30-09-2013
Recorrente: INST DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P.
Recorrido 1: A....., S.A.
Votação: UNANIMIDADE
Aditamento:
1 – Vem o Instituto da Segurança Social recorrer da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou
procedente a impugnação deduzida pela A………, S.A. melhor identificada nos autos, contra a decisão de
indeferimento do pedido de revisão oficiosa de actos de autoliquidação de contribuições para a segurança
social relativas aos períodos de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008.
2 – Por sua vez a recorrida, A………, S.A. apresentou as suas contra alegações, concluindo da seguinte
forma:
A. A 8 de junho de 2011 foi a ora recorrida notificada do indeferimento do seu pedido de promoção da
revisão oficiosa de um conjunto de actos tributários de autoliquidação de contribuições para a referida
Caixa, referentes aos períodos de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008 e relativos a trabalhadores em
situação de pré-reforma.
B. Decisão que a ora recorrida impugnou, tendo, para o efeito, apresentado a competente impugnação
judicial, solicitando a sua revogação, fundamentando o seu pedido na ilegalidade dos actos de
autoliquidação cuja promoção da revisão oficiosa se peticionou derivada da incorrecção dos montantes
contributivos entregues, decorrente de erro manifesto na aplicação das taxas contributivas legais relativas
aos pré-reformados por desconhecimento da Requerente quanto à realidade da carreira contributiva de
alguns beneficiários.
C. Por sentença de 12/06/2013, o Tribunal Tributário de Lisboa entendeu que estavam reunidos os
requisitos de aplicação do disposto no art.º 78.º da LGT, reconhecendo o direito da impugnante à revisão
oficiosa dos actos de autoliquidação em causa com a consequente restituição do montante indevidamente
entregue.
D. Não se conformando com esta decisão, vem a impugnada, ora recorrente, apresentar recurso da
mesma, invocando a inaplicabilidade da LGT e da revisão oficiosa às contribuições indevidamente pagas à
segurança social e a caducidade do direito de reclamação das mesmas conforme previsto no artigo 129.º
do Decreto n.º 45266.
E. Ora, salvo o devido respeito, entende a recorrida que não existe qualquer fundamento ao recurso
apresentado e que andou bem o tribunal a quo, na douta decisão recorrida.
F. A questão a decidir no presente recurso resume-se pois à questão de saber se “existindo
autoliquidações ilegais, as mesmas devem ou não ser objecto da revisão oficiosa prevista no art.º 78.º da
LGT ou se, pelo contrário, o facto de no art.º n.º 129.º do Decreto 45266, de 23 de Setembro se dispor que
o direito de reclamar o reembolso ou a restituição das contribuições extingue-se pelo prazo de um ano, a
contar (...) da data do pagamento das contribuições, no caso do artigo 128.º impede essa possibilidade”.
G. Sobre essa questão, entende a recorrida que apesar de existir um regime jurídico específico para
eventual aplicação a situações de reembolsos de contribuições pagas à Segurança Social — constante
dos artigos 128.º e 129.º do Decreto n.º 45.266, de 23 de Setembro de 1963 - tal não afasta a possibilidade
de aplicação de outro regime de carácter geral, no caso a revisão oficiosa prevista no art.º 78.º da LGT, a
qual pode e deve ser aplicada ao presente caso.
H. Com efeito, conforme decidiu o Supremo Tribunal Administrativo em Acórdão proferido em 6 de Outubro
de 2005, no âmbito do processo n.º 0653/05 ou em Acórdão de 21 de Janeiro de 2009, proferido no âmbito
do processo n.º 688/08, “o referido regime especial apenas pode subsistir como regime especial de revisão
oficiosa que não afasta a possibilidade de ela ser realizada nos termos previstos naquele art. 78.º [da lei
Geral Tributária], quer por iniciativa da administração tributária quer a pedido do contribuinte”.
I. Do mesmo modo, a hipotética caducidade do direito da ora Impugnante peticionar a devolução das
quantias pagas indevidamente não obstaria à possibilidade desta requerer a revisão.
J. Sendo que a Caixa de Previdência não pode, validamente, invocar a caducidade do direito de um
particular para o não cumprimento de um seu dever, no caso o de proceder à revisão oficiosa da
tributação.
K. “Ou seja, a existência de um prazo de caducidade para o requerimento do sujeito passivo, como
resulta previsto no art.º 129.º do Decreto n.º 45.266. de 26 de Setembro não é [...] incompatível com
a aplicação do disposto no art.º 78.º da LGT” (negrito e sublinhado nosso)
L. Demonstrado o erro na autoliquidação das contribuições por si efectuadas, bem como a imputabilidade
do mesmo aos serviços, isto é, verificando-se os pressupostos da revisão, a administração tributária não
poderá deixar de proceder à mesma, por imposição dos princípios da justiça e do respeito pelos direitos e
interesses legítimos dos cidadãos, que devem nortear a actividade administrativa.
M. Reconhecendo o direito da Impugnante, ora recorrida, à revisão oficiosa dos actos de autoliquidação
em causa, com a consequente restituição do montante indevidamente entregue.
N. Devendo em consequência ser negado provimento ao recurso e confirmada a douta sentença recorrida
nos seus precisos termos.
3 – O Ministério Público neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu fundamentado parecer que, na parte
relevante, se transcreve:
«2. A questão suscitada no recurso, como ali é referido, consiste em saber se, estando em causa
autoliquidações de contribuições para a segurança social, por erro na taxa de autoliquidação, estas
contribuições podem ser objecto do procedimento de revisão oficiosa previsto no artigo 78º da Lei Geral
Tributária, por iniciativa do IGFSS, sob impulso do contribuinte.
De acordo com a matéria de facto assente em 1ª instância, estão em causa autoliquidações referentes aos
períodos de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008, cuja revisão oficiosa foi suscitada por requerimento
apresentado em 15/01/2010.
Não oferece qualquer dúvida que a natureza jurídica das contribuições para a Segurança Social devidas
pelas entidades patronais tem sido, uniformemente, qualificada pela Jurisprudência do STA como sendo
tributária, por se entender que tais contribuições mais não são do que “prestações exigidas unilateralmente
pelo Estado, com carácter imperativo mas não sancionatório, que se destinam ao financiamento do
sistema da Segurança Social”, o qual se encontra constitucionalmente consagrado como um direito
fundamental - art. 63.º da CRP — cfr. acórdãos da 2.ª Secção do STA de 4/5/94 (rec. 17.958) e de 29/5/96
(rec. 18.986).
Por seu lado o Tribunal Constitucional adoptou igual entendimento no sentido de que “as contribuições
para a segurança social que têm como sujeito passivo a entidade patronal - e são essas as únicas que
aqui importa considerar - quer sejam havidas como verdadeiros impostos, quer sejam consideradas como
uma figura contributiva de outra natureza, é seguro que sempre deverão estar sujeitas aos mesmos
requisitos a que aqueles se acham constitucionalmente obrigados” — acórdão nº 183/96 do TC.
Seja considerando as contribuições para a segurança social como impostos ou receitas parafiscais, certo é
que as mesmas constituem tributos cuja disciplina está sujeita à Lei Geral Tributária, como se depreende
dos artigos 1º e 3º desde diploma legal.
Por outro lado a Lei Geral Tributária, embora não seja uma lei de valor reforçado, na sua aplicação às
relações jurídico-tributárias, prevalece, como lei geral, sobre os demais diplomas legais, como se
depreende do disposto no seu artigo 2º - cfr. neste sentido Diogo Leite de Campos e outros (Lei Geral
Tributária anotada e Comentada, 4ª edição, pág. 65).
Importa, assim, perceber se as normas invocadas pela Segurança Social consagram uma disciplina
especial que derrogue nessa parte a disciplina prevista na Lei Geral Tributária.
Dispunham os artigos 128º e 129º do Dec.- Lei nº 45.266, de 23 de Setembro:
Art. 128.º — 1. As contribuições indevidamente pagas a uma caixa sindical de previdência serão restituídas
a pedido dos interessados na medida em que não sejam devidas a outra caixa sindical.
2. A restituição será feita às entidades patronais e aos beneficiários pela parte proporcional das respectivas
contribuições, depois de deduzido o valor de todos os benefícios que na sua base tenham sido concedidos.
3. Para os fins deste artigo, só se consideram indevidas as ‘contribuições cujo pagamento não tenha
resultado de aplicação directa de lei ou despacho não anulado contenciosamente.
Art. 129.º O direito de reclamar o reembolso ou a restituição das contribuições extingue-se pelo prazo de
um ano, a contar da data da morte, no caso do n.º 2 do artigo 127º, e da data do pagamento das
contribuições, no caso do artigo 128.º
Resulta dos transcritos normativos que o direito de reclamar o reembolso ou a restituição das contribuições
indevidamente pagas se extingue com o decurso do prazo de um ano, a contar da data do seu pagamento.
Ora, o que tais normativos prevêem é um prazo específico de reclamação administrativa, que como regra
especial afasta a aplicação de norma geral que consagre outro prazo de reclamação (designadamente o
disposto no art. 131º do CPPT).
Por sua vez, o art. 78º da LGT dispõe, no que aqui interessa:
«1. A revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efectuada por iniciativa do sujeito
passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por
iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o
tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços.
(…)»
Como igualmente referem Diogo Leite Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge de Sonsa, em Lei Geral
Tributária comentada e anotada, 4.ª edição, nota 3 ao artigo 78.º, p. 705, «o regime do art. 78º, quando o
pedido de revisão é formulado para além dos prazos de impugnação administrativa e contenciosa,
reconduz-se a um meio de restituição do indevidamente pago, com revogação e cessação para o futuro
dos efeitos do acto de liquidação, e não um meio anulatório, com efeito de destruição retroactiva dos
efeitos do acto».
Acrescentam aqueles autores: «A esta luz, o meio procedimental de revisão do acto tributário não pode ser
considerado como um meio excepcional para reagir contra as consequências de um acto de liquidação,
mas sim como um meio alternativo dos meios impugnatórios administrativos e contenciosos (quando for
usado em momento em que aqueles ainda podem ser utilizados) ou complementar deles (quando já
estiverem esgotados os prazos para utilização dos meios impugnatórios do acto de liquidação)».
E concluem: «trata-se de um regime reforçadamente garantístico, quando comparado com o regime de
impugnação de actos administrativos, mas esse reforço encontra explicação na natureza fortemente
agressiva da esfera jurídica dos particulares que têm os actos de liquidação de tributos».
Partindo, assim, do pressuposto de que estamos perante “um meio alternativo dos meios impugnatórios
administrativos e contenciosos... ou complementar deles”, afigura-se-nos que nada impede a sua aplicação
em sede de impugnação do pagamento de contribuições à segurança social, desde que reunidos os
respectivos requisitos legais e sem prejuízo da prescrição dessas contribuições.
Com efeito, só o decurso do prazo de prescrição das contribuições é que preclude o direito à restituição do
indevido. Ora, no caso concreto dos autos, tendo o pedido sido apresentado em 15/01/2010 e sendo o
prazo de prescrição de cinco anos (art. 49º da Lei nº 32/2002, de 20 de Dezembro), conclui-se que ainda
não se encontrava esgotado o referido prazo.
Por outro lado o erro na autoliquidação considera-se imputável aos serviços — nº2 do artigo 78º da Lei
Geral Tributária.
Entendemos, assim, que se mostra admissível o recurso à revisão do acto tributário, ao abrigo do disposto
no artigo 78º da Lei Geral Tributária, para efeitos de apreciação do erro na autoliquidação de contribuições
para a segurança social por parte da entidade patronal, no prazo de quatro anos, ainda que sob impulso do
contribuinte.
Atento que as autoliquidações dizem respeito ao período de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008 e o
requerimento da Recorrida foi apresentado em 15/01/2010, mostra-se respeitado o prazo de 4 anos
previsto no nº1 do artigo 78º da Lei Geral Tributária, que fundamenta a actuação da Segurança Social.
Em face do exposto, entendemos que a sentença recorrida não padece do vício que lhe foi assacado pela
Recorrente, motivo pelo qual deve ser confirmada e o recurso ser julgado improcedente.»
(…)
9. Em 7 de Setembro de 2011 a PI da presente impugnação judicial deu entrada no tribunal de Lisboa (cf.
comprovativo de entrega de documento e carimbo aposto a fls. 2 dos autos.
6. Do objecto do recurso
Da análise do segmento decisório da sentença e dos fundamentos invocados pela entidade recorrente
para pedir a sua alteração, podemos concluir que a questão objecto do recurso consiste em saber se
padece de erro de julgamento a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa que julgou
procedente a impugnação deduzida pela A………., SA, no entendimento de que, estando em causa
autoliquidações de contribuições para a segurança social por erro na taxa de autoliquidação, estas
contribuições podem ser objecto do procedimento de revisão oficiosa previsto no artigo 78º da Lei Geral
Tributária, por iniciativa do IGFSS, sob impulso do contribuinte, e que a isso não obsta a existência de um
prazo de caducidade para o requerimento do sujeito passivo, como o que resulta previsto no artº 129º do
Decreto nº 45.266 e, mais tarde, no artº 271º, nº 2 do Código dos Regimes Contributivos.
A sentença do Tribunal Tributário de Lisboa perante a questão que lhe era proposta, de saber se existindo
autoliquidações ilegais de contribuições para Comissão Administrativa da Caixa de Previdência do Pessoal
dos …………, a que veio a suceder Instituto da Segurança Social, IP, as mesmas podiam ser objecto da
revisão oficiosa prevista no art. 78.º da LGT e se a tal obstava o disposto no 129.º do Decreto n.º 45.266,
de 23 de Setembro de 1963, concluiu que «por força do disposto no artigo 1º e no próprio art. 78.º da LGT,
que se refere à revisão dos “actos tributários”, nos quais têm necessariamente de se incluir as
contribuições para a segurança social, a revisão oficiosa ali prevista é aplicável às contribuições em
apreço».
Mais ponderou a sentença recorrida que «a existência de um prazo de caducidade para o requerimento do
sujeito passivo, como resulta previsto no art. 129.º do Decreto n.º 45.266 e mais tarde, no art. 271.º, n.º 2,
Código dos Regimes Contributivos, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro (entrado em vigor
a 1 de Janeiro de 2011 e aplicável com as necessárias adaptações, às instituições de previdência criadas
anteriormente à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 549/77, de 31 de Dezembro, nos termos do artigo 2.º
da Lei 110/2009) não é, sob pena de violação dos princípios constitucionais da justiça, da igualdade e da
legalidade (….), incompatível com a aplicação do disposto no art. 78.º da LGT no que diz respeito à revisão
oficiosa, ainda que a mesma seja accionada pelo próprio contribuinte».
- A LGT define os princípios e regras gerais que regem o direito fiscal português, pelo que se trata de uma
lei de aplicação geral que não pode derrogar uma lei especial de aplicação à Segurança Social pois,
apesar de a doutrina e a jurisprudência qualificarem as contribuições para a Segurança Social como
tributos, estas reconhecidamente têm especificidades relativamente aos demais, sendo por isso objecto de
legislação própria;
“É a esta luz que se tem de interpretar o artº 78º da LGT que estabelece o regime da revisão dos actos
tributários. (…) “Embora este artº 78º da LGT, no que concerne a revisão do acto tributário por iniciativa do
contribuinte, se refira apenas à que tem lugar dentro do «prazo de reclamação administrativa», no seu nº 6
(nº 7 na redacção actualmente vigente) faz-se referência a «pedido do contribuinte», para a realização
da revisão oficiosa, o que revela que esta, apesar da impropriedade da designação como «oficiosa», pode
ter subjacente também a iniciativa do contribuinte. Idêntica referência é feita no nº 1 do artº 49º da LGT,
que fala em «pedido de revisão oficiosa».
“Esta possibilidade de a revisão «oficiosa», que deve ser da iniciativa da administração tributária, ser
suscitada por um pedido do contribuinte veio a ser confirmada pela alínea a) do nº 4 do artº 86º do C.P.P.T.,
que refere a apresentação de «pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo, com fundamento em
erro imputável aos serviços».
“É, assim, inequívoco que se admite, a par da denominada revisão do acto tributário por iniciativa do
contribuinte (dentro do prazo de reclamação), que se faça, também na sequência de pedido seu, a
«revisão oficiosa» (que a Administração deve realizar por sua iniciativa).
“Por outro lado, a alínea d) do nº 2 do artº 95º da L.G.T. refere os actos de indeferimento de pedidos de
revisão entre os actos potencialmente lesivos, que são susceptíveis de serem impugnados
contenciosamente. Não se faz, aqui qualquer distinção entre actos de indeferimento praticados na
sequência de pedido do contribuinte efectuado no prazo da reclamação administrativa ou para além dele,
pelo que a impugnabilidade contenciosa a actos de indeferimento de pedidos de revisão praticados em
qualquer das situações, o que, aliás, é corolário do princípio constitucional da impugnabilidade contenciosa
de todos os actos que lesem direitos ou interesses legítimos dos administrados (artº 268º, nº 4, da C.R.P.).
“Também à face da LGT, não é indiferente para o contribuinte impugnar ou não os actos de liquidação
dentro dos respectivos prazos, pois em caso de anulação em processo impugnatório, judicial ou
administrativo, pode ser invocada qualquer ilegalidade e, no caso de erro imputável aos serviços, há direito
a juros indemnizatórios (artº 43º, nº 1, da LGT), enquanto nos casos de revisão oficiosa da liquidação
(quando não é feita a pedido do contribuinte, no prazo da reclamação administrativa, situação que é
equiparável à de reclamação graciosa) apenas há direito a juros indemnizatórios nos termos do artº 43º, nº
3, da LGT e a anulação apenas pode ter por fundamento erro imputável aos serviços e duplicação de
colecta (artº 78º, nºs 1 e 6, da LGT). “Assim, é de concluir que, o facto de ter transcorrido o prazo de
reclamação graciosa e de impugnação judicial do acto de liquidação, não impedia a impugnante de pedir a
revisão oficiosa e impugnar contenciosamente o acto de indeferimento desta (Cfr., entre outros, os Acórdão
do STA de 12/2/2001, rec nº 26233/2001; 19/2/2003, rec. nº 1461/02;9/4/2003, rec nº 422/03; e de
2/2/2005, rec nº 1171/04.). (…).
“Exposto este regime da revisão do acto tributário e impugnação das decisões proferidas (ou omitidas) no
seu âmbito, chega-se à conclusão que não obsta à possibilidade de impugnação contenciosa a falta da
reclamação prevista no artº 151º do CPT e, depois, no artº 131º do CPPT.
“Na verdade, essa reclamação era necessária para a impugnação judicial do acto de autoliquidação, com o
regime geral da impugnação de actos anuláveis e com aos efeitos retroactivos próprios dos meios
anulatórios.
“Porém, a sua falta não obsta (como também não obsta a impugnação judicial dos actos que podem ser
impugnados contenciosamente por via directa), a que possa ser pedida a revisão oficiosa, com os efeitos
próprios desta, limitados à cessação dos efeitos do acto, traduzida na restituição do que foi recebido pela
administração tributária e que não deveria ter sido pago, à face do regime substantivo aplicável
(eventualmente acrescida de juros indemnizatórios nos termos do nº 3 do artº 43º da LGT, sem natureza
retroactiva)”.
Acresce dizer, regressando ao Acórdão que temos vindo a seguir, que “o nº 2 do referido artº 78º, ao
estabelecer que «sem prejuízo dos ónus legais de reclamação ou impugnação pelo contribuinte,
considera-se imputável aos serviços, para efeitos do número anterior, o erro na autoliquidação», poderia
sugerir uma interpretação no sentido de, nos casos de autoliquidação, sem reclamação ou impugnação
prévia não poder haver revisão. (É incompreensível a referência feita no início deste nº 2 ao «ónus legais
de reclamação ou impugnação», parecendo mesmo que se trata de um lapso, pois o que seria
compreensível e adequado seria referirem-se os «direitos legais de reclamação e impugnação», que,
naturalmente, como sucede relativamente a qualquer outra liquidação, não são prejudicados pelo facto de
haver possibilidade de revisão do acto tributário.)
“Porém, pelo que se disse sobre o sentido da autorização legislativa em que se baseou a aprovação da
LGT pelo Governo, assente que à face do CPT era possível a revisão oficiosa nos casos de autoliquidação
quando não tivesse sido apresentada reclamação graciosa e estivesse expirado o prazo para a apresentar,
se aquele nº 2 pudesse ser interpretado com o sentido de impedir a revisão oficiosa quando não tivesse
havido nem pudesse haver já reclamação graciosa, estar-se-ia perante uma situação em que a LGT
diminuiria as garantias dos contribuintes, o que implicaria a inconstitucionalidade orgânica daquela norma,
por ser uma iniciativa legislativa contrária à lei de autorização (artº 112º, nº 2, da CRP).
“No entanto, a interpretação referida não é forçosa, pois, embora a redacção do nº 2 do artº 78º seja infeliz,
pela falta de clareza, o seu perceptível alcance, ao ficcionar que todos os erros na autoliquidação, para
efeitos do nº 1, se consideram imputáveis aos serviços, é o de admitir a possibilidade de revisão oficiosa
em todos os casos.
“Na verdade, a imputação de todos os erros da autoliquidação à administração tributária é uma ficção que
está em manifesta dissonância com a realidade, pois, sendo o contribuinte quem faz a autoliquidação, o
que é normal é que os erros lhe sejam imputáveis a ele próprio, que a fez, e não à administração tributária,
que não a fez. “Apenas se entrevê a possibilidade de erros na autoliquidação serem imputáveis à
administração tributária nos casos em que esta procedeu a correcções ou em que o contribuinte incorreu
em erros seguindo instruções que aquela lhe forneceu. “Por outro lado, esta ficção de que todos os erros
da autoliquidação são imputáveis à administração tributária vale apenas «para efeitos do número
anterior», que estabelece as condições de admissibilidade da revisão oficiosa, fazendo depender a
revisão por iniciativa da administração tributária da existência de erro imputável aos serviços. Isto é, esta
ficção não vale para outros efeitos, designadamente para determinar direito a juros indemnizatórios.
“Por isso, é de concluir que o objectivo que se teve em vista com o nº 2, foi alargar as situações em que é
admissível a revisão em casos de autoliquidação, permitindo-a sempre (e não apenas nos caso em que
tivesse havido correcção dos elementos evidenciados pela declaração, como sucedia no regime do artº
94º, nº 2, do CPT), inclusivamente quando o erro é imputável ao contribuinte, que passou a ficcionar-se
como imputável à administração tributária.
Concordando com a fundamentação desta jurisprudência (Que foi seguida por muitos outros arestos desta
Secção, nomeadamente os que abaixo se citam, sem pretensões de exaustão: de 29.10.2014, recurso 1540/13, de
29.05.2013, recurso 140/13, de 12.09.2012, recurso 476/12, de 14.06.2012, recurso 259/12, de 14.03.2012, recurso
1007/11, de 14.12.2011, recurso 366/11, de 20.11.2007, recurso 536/07, de 2-2-2005, recurso nº 1171/04, todos in
www.dgsi.pt.) entendemos que deve a mesma ser reiterada e aplicada no caso vertente, havendo de
concluir-se que se mostram reunidos os requisitos legais para que a Impugnante pudesse pedir a revisão
oficiosa, nos temos do artº 78º da LGT e dentro do prazo legal em que a Administração a podia efectuar.
Com efeito, no caso em apreço estão em causa contribuições para Comissão Administrativa da Caixa de
Previdência do Pessoal dos ……………, a que veio a suceder Instituto da Segurança Social, IP.
Como é sabido a natureza jurídica das contribuições para a Segurança Social devidas pelas entidades
patronais tem sido doutrinaria e jurisprudencialmente qualificada como tributária, sendo tais contribuições
consideradas como impostos, ou pelo menos como equiparadas a impostos (Neste sentido, e sobre a natureza
das contribuições para a Segurança Social vide, Casalta Nabais, Direito Fiscal, 6ª edição, Almedina, pags. 662 e segs.,
Nazaré da Costa Cabral, Contribuições para a Segurança Social - Natureza de Regime e de Técnicas e Perspectivas de
Evolução num Contexto de Incerteza, Cadernos do IDEFF, nº 12, ed. Almedina, J.J.Teixeira Ribeiro, anotações ao
Acórdão de 24 de Janeiro de 1996, revista de Legislação e Jurisprudência, 1 de Junho de 1996, Ano 129º, nº 3863, e
Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, vol. I, ed. Rei dos Livros, pag. 322.).
Como refere Casalta Nabais (ob. citada, pag. 663) trata-se de uma acepção que vem sendo admitida um
pouco por toda a parte e que, no nosso regime jurídico, tem manifestações importantes traduzidas no
seguinte : «1) na integração das contribuições para a segurança social no nível de fiscalidade ou carga
fiscal, nomeadamente para efeitos da sua comparação internacional ; 2) na equiparação das contribuições
para a segurança social aos impostos, ao menos para efeitos jurídico-constitucionais, que o mesmo é dizer
em sede da constituição fiscal ; 3) na aplicação às contribuições para a segurança social das normas do
procedimento e processo tributários e do regime das infracções tributárias (v. o art. 1.º do CPPT e os arts.
1.º, n.º 1, al. d) e 106.º e 107 .º do RGIT)”
Também a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem considerado as contribuições para a Segurança
Social como impostos, desde a Constituição de 1976, e como tal sujeitas ao princípio da legalidade
tributária (cfr., entre outros, os Acórdãos nºs 183/96 e 621/99, publicados, respectivamente, no Diário da
República, II Série, de 23/05/1996 e 23/02/2000) .
E no mesmo sentido se tem pronunciado a jurisprudência desta secção, de que destacamos, os Acórdãos
de 16.06.1999, recurso 23889 e de 23.05.2007, recurso 63/07, e o Acórdão do Pleno da Secção de
26.02.2014, recurso 1481/13, todos in www.dgsi.pt.
Temos, pois, por seguro que, em temos doutrinais e jurisprudenciais, as contribuições para a Segurança
Social são consideradas, à luz do actual quadro legislativo, como impostos (pese embora com algumas
peculiaridades).
E, assim sendo, assumem natureza tributária, sendo-lhes aplicável a LGT (arts. 1º e 3º da LGT).
Por outro lado resulta do probatório, e foi consignado na sentença recorrida, que a entidade impugnada e
ora recorrente aceita que as autoliquidações em causa são ilegais (cf. artº 35.º da contestação e pontos 3 e
4 da fundamentação de facto), e que a impugnante entregou indevidamente a quantia de EUR
3.304.531,73, circunstância que se ficou a dever a um erro no apuramento das taxas aplicáveis nos termos
do disposto no n.º 2 do art. 9º, do Decreto-Lei n.º 261/91, de 25/07, por sua vez motivado pelo
desconhecimento da realidade contributiva de alguns dos beneficiários do esquema prestacional e
contributivo da Caixa de Previdência.
Ora como vimos o nº 2 do artº 78º da LGT prevê um alargamento situações em que é admissível a revisão
em casos de autoliquidação, permitindo-a sempre, inclusivamente quando o erro é imputável ao
contribuinte, que passou a ficcionar-se como imputável à administração tributária.
Por outro lado, e tendo em conta que as autoliquidações dizem respeito ao período de Dezembro de 2005
a Novembro de 2008 e o requerimento da Recorrida foi apresentado em 15/01/2010, mostra-se respeitado
o prazo de 4 anos previsto no nº1 do artigo 78º da Lei Geral Tributária,
Neste particular aspecto recorrente sustenta que não será aplicável o a disposição geral prevista no artigo
78.º da LGT, mas o disposto nos artigos 128.º e 129.º do Decreto n.º 45266, que estabelece um prazo de
caducidade de um ano para o exercício do direito de reclamar o reembolso ou a restituição das
contribuições indevidamente pagas a uma caixa sindical de previdência, argumentando com a pretensa
especialidade deste regime legal em relação à LGT.
Mas não lhe assiste razão.
É certo que, nos termos do disposto nos arts. 129º do DL nº 45266, de 23 de Setembro de 1963, o direito
de reclamar o reembolso ou a restituição das contribuições se extingue pelo prazo de um ano, a contar da
data da morte, no caso do n.º 2 do artigo 127º, e da data do pagamento das contribuições, no caso do
artigo 128.º(as contribuições indevidamente pagas a uma caixa sindical de previdência).
Porém, como bem nota o Exmº Magistrado do Ministério Público no seu parecer, o que tais normativos
prevêem é um prazo específico de reclamação administrativa, que como regra especial afasta a aplicação
de norma geral que consagre outro prazo de reclamação (designadamente o disposto no art. 131º do
CPPT).
Esse prazo específico de reclamação administrativa não contende assim, com o prazo para dedução do
pedido de revisão do acto tributário previsto no artº 78º da LGT o qual constitui um meio alternativo dos
meios impugnatórios administrativos e contenciosos (quando for usado em momento em que aqueles
ainda podem ser utilizados) ou complementar deles (quando já estiverem esgotados os prazos para
utilização dos meios impugnatórios do acto de liquidação) e tem em vista possibilitar sanar injustiças de
tributação tanto a favor do contribuinte como a favor da administração.
De facto não está apenas em causa o direito do contribuinte solicitar o reembolso das contribuições pagas
indevidamente, mas o dever de revogar actos ilegais, constituindo a revisão do acto tributário um meio
complementar dos meios impugnatórios administrativos tendo em vista a correcção de erros de actos de
liquidação de tributos.
Por isso não há qualquer relação de especialidade entre o regime previsto nos arts. 128 e 129 do DL nº
45266 e o regime de revisão do acto tributário previsto no artº 78º da LGT.
É que a Lei Geral Tributária, pela sua própria natureza, tem subjacente uma intenção legislativa de
aplicabilidade à generalidade das relações tributárias e prevalece, como lei geral, sobre os demais
diplomas legais, como se depreende do disposto no seu artigo 2º (Neste sentido Acórdão desta secção de
6.10.2005, recurso 653/05 e Lei Geral Tributária Anotada, Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge
Lopes de Sousa, 4ª edição, Encontro da Escrita, pag. 65. ).
Assim, em face de tudo o exposto, forçoso é concluir que, apesar de não ter sido deduzida reclamação
administrativa no prazo do artº 129º do DL nº 45266, no caso estavam reunidos todos os requisitos legais
para que a Impugnante pudesse pedir a revisão do acto tributário, dentro do prazo legal em que a
Administração a podia efectuar.
A sentença recorrida, que assim decidiu não incorre no erro de julgamento que lhe é imputado pela
recorrente, pelo que improcederá o recurso.
7. Decisão:
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo
Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente (tendo em atenção o valor da causa fixado a fls. 274).
Lisboa, 18 de Novembro de 2015. - Pedro Delgado (relator) - Casimiro Gonçalves - Dulce Neto.
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