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DIABETES TIPO 2

Definição: Doença endócrina caracterizada por deficiência relativa ou absoluta


na produção de insulina, com graus variados de resistência periférica à ação da
insulina, sendo clinicamente manifestada por hiperglicemia e suas
consequências agudas e crônicas.

Apresentação Clínica

Anamnese

Quadro clínico: A maioria dos pacientes são assintomáticos, sendo a


hiperglicemia detectada em exames laboratoriais de rotina.
Sintomas clássicos:
• Poliúria;
• Polidipsia;
• Nocturia;
• Borramento visual;
• Menos frequentemente, emagrecimento.

Em casos raros, pacientes com diabetes mellitus tipo 2 podem abrir o quadro
com uma complicação aguda, como:
• Estado hiperosmolar hiperglicêmico;
• Cetoacidose diabética.

Fatores de risco:
• Idade > 45 anos;
• Obesidade;
• Dislipidemia;
• História familiar de diabetes em parente de primeiro grau;
• História de doença aterosclerótica;
• Hipertensão arterial;
• História de intolerância à glicose;
• Estigmas de resistência insulí-nica (acantose nigricans);
• Sedentarismo;
• História de parto de filho macrossômico;
• Uso crônico de corticoides;
• Síndrome dos ovários policísticos.
Exame Físico

No geral, pacientes não apresentam alterações ao exame fí-sico, exceto pela


presença de estigmas de resistência insulí-nica, como a acantose nigricans.

Rastreio de neuropatia diabética: Como muitos pacientes podem apresentar


complicações crônicas já no momento do diagnóstico, é recomendado o rastreio
dessas complicações na primeira consulta e a repetição anual.

A neuropatia diabética pode e deve ser rastreada pelo exame físico:


Avaliação da frequência cardí-aca em repouso e ortostase (frequência superior
a 100 bpm sugere disautonomia);
• Avaliação da pressão arterial em decúbito e em pé para rastreio de
hipotensão postural (queda de 20 mmHg ou mais na pressão sistólica e/ou
10 mmHg ou mais na pressão diastólica um minuto após assumir
ortostase);
• Avaliação da sensibilidade dolorosa, tátil (com uso de algodão ou
monofilamentos), térmica e vibratória (com uso de diapasão);
• Pesquisa de reflexos tendíneos (aquileu, patelar, bicipital, tricipital, radial).

Abordagem Diagnóstica

Considerações Iniciais

Sintomas clássicos: Diante de um paciente com sintomas clássicos de


diabetes, uma glicemia ao acaso ≥ 200 mg/dL confirma o diagnóstico, porém
uma glicemia < 200 mg/dL não o exclui.

Devendo ser solicitado qualquer teste diagnóstico: glicemia de jejum e/ou


hemoglobina glicada.

Assintomáticos: Pacientes assintomáticos são candidatos ao rastreio de


diabetes tipo 2 na presença de fatores de risco maiores (hipertensão e/ou
dislipidemia) ou em pacientes com múltiplos fatores de risco menores, histórico
de intolerância à glicose ou resistência insulínica.
Exames indicados para rastreio:
• Glicemia de jejum;
• Hemoglobina glicada;
• TOTG.

Interpretando o rastreio:
• Glicemia de jejum < 100 mg/dL ou hemoglobina glicada < 5,7 deve ser
considerado normal, e novo rastreio deve ser feito em três anos; duas
horas após ingestão de glicose: < 140 mg/dL;
• Exames limítrofes: glicemia de jejum 100-125 mg/dL ou hemoglobina
glicada 5,7-6,4% deve realizar novo rastreio em 1-2 anos; duas horas
após ingestão de glicose: ≥ 140 e < 200 mg/dL;
• Glicemia de jejum ≥ 126 mg/dL e hemoglobina glicada ≥ 6,5% e duas
horas após ingestão de glicose: ≥ 200 mg/dL (dois resultados alterados)
está confirmado o diagnóstico de diabetes;
• Se hemoglobina glicada e glicemia de jejum apresentam resultados
discordantes, o exame que indica diabetes deve ser repetido para
confirmação.

Exames indicados para acompanhamento:


• Glicemia de jejum;
• Hemoglobina glicada (reflete o controle glicêmico dos últimos 3 meses).

Complicações crônicas: Pacientes sem seguimento médico podem apresentar


complicações crônicas da doença já no momento do diagnóstico.

Portanto, o rastreio dessas complicações deve ser iniciado no momento do


diagnóstico:
• Retinopatia diabética: Rastreio com fundo de olho anual no início do
rastreio;
• Nefropatia diabética: Rastreio anual com creatinina sérica e albuminúria
(em amostra ou urina de 24 horas) ou relação albumina/creatinina em
amostra urinária (spot urinário), sendo diagnóstica de nefropatia a
presença de microalbuminúria (30-299 mg/24 horas ou mg/g de
creatinina) ou macroalbuminúria (≥ 300 mg/24 h ou mg/g de creatinina).
Caso positivo para microalbuminúria, o exame deve ser confirmado em 3-
6 meses (pelo risco de falso positivo);
• Neuropatia diabética: Rastreio a partir do exame físico, com indicação
de testes de neurocondução em membros inferiores e/ou testes de
regulação autonômica em pacientes com dúvida diagnóstica ao exame
físico.

Comorbidades cardiovasculares: Pacientes com diabetes tipo 2 apresentam


risco aumentado de hipertensão arterial e dislipidemia, devendo manter um
rastreio regular a partir do diagnóstico:
• Hipertensão arterial: Deve ser medida em todas as consultas.
Considera-se hipertensão, em diabéticos, se pressão sistólica ≥ 130
mmHg ou pressão diastólica ≥ 80 mmHg;
• Dislipidemia: Solicitar perfil lipí-dico no momento do diagnóstico e
anualmente. Pacientes com alteração devem ter monitorização mais
frequente a cada 3-6 meses.

Critérios Diagnósticos

Critérios Diagnósticos - ADA 2019

Qualquer um dos critérios abaixo é diagnóstico para diabetes tipo 2:


• Hemoglobina glicada ≥ 6,5% (usando metodologia certificada NGSP);
• Glicemia de jejum ≥ 126 mg/dL (respeitadas oito horas de jejum);
• Glicose sérica ≥ 200 mg/dL no teste oral de tolerância à glicose (duas
horas após a ingestão de 75 gramas de dextrose);
• Pacientes sintomáticos com glicemia ao acaso ≥ 200 mg/dL.

Não há a necessidade de um segundo teste confirmatório em casos de


diagnóstico clínico claro (crise hiperglicêmica, sintomas clássicos de
hiperglicemia e glicemia ao acaso ≥ 200 mg/dL).

Para todos os outros, é necessária a confirmação com dois resultados anormais


de uma mesma amostra ou em duas amostras de teste separadas.

Diagnóstico Diferencial

O diagnóstico diferencial se estabelece com outras causas de hiperglicemia em


adultos:
• Diabetes mellitus tipo 1 (LADA);
• Pacientes graves/choque séptico.
Também se estabelece com causas secundárias de diabetes:
• Deficiência exócrina do pâncreas:
o Fibrose cística;
o Hemocromatose;
o Pancreatite crônica;

• Endocrinopatias:
o Síndrome de Cushing;
o Acromegalia;
o Tumor secretor de Glucagon;
o Feocromocitoma;

• Uso crônico de medicamentos hiperglicemiantes (corticoides, inibidores


de protease, ciclosporina, tacrolimus, antipsicóticos atí-picos).

Acompanhamento

Indicações de internação: A internação hospitalar em pacientes com diabetes


mellitus é indicada apenas diante de complicações agudas, como estado
hiperosmolar e cetoacidose diabética, ou em quadros de infecção complicados.

Seguimento ambulatorial: O diabetes mellitus tipo 2 deve ser acompanhado


regularmente com monitorização do tratamento hipoglicemiante e rastreio de
complicações crônicas segundo indicação.

Preconiza-se consultas a cada três a seis meses, ou até com maior frequência,
na dependência do controle glicêmico do paciente.

Hemoglobina glicada deve ser dosada, no mí-nimo, duas vezes por ano se
estiver no alvo, e a cada três meses se estiver fora do alvo ou se houver mudança
no esquema hipoglicemiante.

Medidas adicionais para redução do risco cardiovascular:


• Cessação do tabagismo;
• Controle de hipertensão arterial (alvo: PA <140/85 mmHg);
• Controle de dislipidemia (alvo: LDL <100 mg/dL);
• Considerar uso de IECA, independente dos ní-veis pressóricos;
• Uso de aspirina e estatina, se alto risco cardiovascular.

Abordagem Terapêutica

O manejo do diabetes tipo 2 inclui:


• Educação do paciente;
• Avaliação de complicações micro e macrovasculares;
• Tentativa de alcançar glicemia normal;
• Redução do risco cardiovascular;
• Suspensão de drogas que afetam glicemia e perfil lipídico.

O tratamento é individualizado, baseando-se em idade, expectativa de vida e


comorbidades do paciente.

Para normalizar a glicemia, são utilizados medicamentos que aumentam a


secreção de insulina ou a sensibilidade ao hormônio, atrasam a absorção
gastrointestinal de carboidratos ou estimulam a excreção urinária de glicose.

Objetivos: O principal objetivo é controlar a glicemia, reduzindo


consequentemente o risco de complicações microvasculares.

Em geral, objetivam-se ní-veis de hemoglobina glicada menores ou iguais a 7%.

No entanto, cada paciente deve ser avaliado individualmente, contrabalançando


a redução do risco de complicações com o aumento do risco de hipoglicemia.

Dessa forma, ní-veis maiores de hemoglobina glicada são aceitos em idosos e


pacientes com comorbidades ou expectativa de vida curta.

Educação: Os pacientes precisam ser instruí-dos em relação a nutrição,


atividade fí-sica, controle metabólico e prevenção de complicações a curto e
longo prazo.

A dieta deve ser adaptada às outras condições médicas e ao estilo de vida do


paciente.
Indivíduos com sobrepeso ou obesidade devem ser encorajados a reduzir o
consumo de alimentos muito calóricos e praticar exercí-cios físicos, a fim de
perder peso, o que contribui na melhora da resistência insulínica e da secreção
de insulina pelo pâncreas.

Recomendam-se 30-60 minutos de atividade aeróbica moderada na maioria dos


dias da semana (no mínimo, 150 minutos semanais).

O treinamento de resistência está indicado na ausência de contraindicações,


como doença arterial coronariana, e deve ser realizado, no mínimo, duas vezes
por semana.

Apoio psicológico também é importante, uma vez que os pacientes sentem o


estresse relacionado às responsabilidades impostas pela doença.

Terapia farmacológica inicial: Quanto mais cedo for a instituição de medidas


farmacológicas, mesmo com hemoglobina glicada não muito elevada, maior é a
possibilidade de atingir o alvo e reduzir as complicações a longo prazo.

Em pacientes com hemoglobina glicada menor que 7,5% ao diagnóstico e que


se mostrem comprometidos com o tratamento, é razoável tentar mudança nos
hábitos de vida por três a seis meses antes de iniciar o tratamento farmacológico.

Tal estratégia não é recomendada quando a hemoglobina glicada encontra-se


maior que 7,5%.

Escolha do Esquema Medicamentoso

Para pacientes assintomáticos com hemoglobina glicada entre 7,6 e 8,5% e que
não tenham contraindicação, recomenda-se iniciar Metformina 500 mg no jantar.

Se bem tolerada, outra dose de 500 mg no café da manhã é acrescentada.

Ajustes adicionais podem ser feitos a cada 1-2 semanas.


Opta-se por essa droga devido à eficácia, ausência de ganho de peso e de
hipoglicemia, boa tolerabilidade e ao menor custo.

Se o paciente for assintomático, mas tiver hemoglobina glicada maior que 8,5%
ao diagnóstico, também é recomendado iniciar o tratamento com Metformina,
porém insulina é uma opção, particularmente quando a hemoglobina glicada
estiver acima de 9%.

Insulina pode causar hipoglicemia e ganho de peso.

Em caso de contraindicação à Metformina, indica-se Sulfonilureia, que deve ser


administrada antes da refeição.

Nessas situações, estimular mudanças de hábito de vida é ainda mais


importante, visto que ganho de peso é um efeito indesejável dessa classe
medicamentosa.

Outro efeito adverso é o risco de hipoglicemia.

Se contraindicação ou intolerância à Metformina e Sulfonilureia, Pioglitazona é


uma opção relativamente barata (administrar uma vez ao dia a qualquer horário,
independentemente das refeições).

No entanto, há relato de associação da medicação com insuficiência cardíaca,


fraturas e maior risco de neoplasia maligna de bexiga.

Para pacientes sintomáticos ou com hiperglicemia severa (glicemia de jejum >


250 mg/dL, glicemia aleatória > 300 mg/dL ou hemoglobina glicada > 9,5%), a
insulina costuma ser o primeiro agente indicado.

Se o paciente relutar em usar insulina, uma alternativa é Sulfonilureia em altas


doses (exemplos: Glimepirida 4-8 mg/dia, Glipizida 10 mg duas vezes do dia).
Metformina em monoterapia não é eficaz nessas situações, mas a medicação
pode ser iniciada simultaneamente com a Sulfonilureia.

Após as mudanças adequadas na dieta e o ajuste da dose de Metformina, a


Sulfonilureia pode ser reduzida ou até mesmo suspensa.

Quando a monoterapia não for suficiente para controle glicêmico, devem ser
associadas drogas com diferentes mecanismos de ação.

Indicações para início de segundo agente medicamentoso:


• Hemoglobina glicada fora do alvo após três meses de mudança de estilo
de vida e uso de Metformina;
• Falha na manutenção do alvo da hemoglobina glicada (risco de 5-10% ao
ano).

Opções de tratamento para pacientes refratários à monoterapia ou com


falha terapêutica: Pacientes que usavam Metformina e não obtiveram a
resposta esperada podem associar outro hipoglicemiante oral (Sulfonilureia
preferencialmente), insulina ou, até mesmo, substituir a Metformina pela insulina.

A substituição é preferí-vel quando a hemoglobina glicada está muito acima do


desejado (> 8,5%) ou quando há sintomas de hiperglicemia.

Para pacientes que usavam Sulfonilureia e apresentam hemoglobina glicada


maior que 8,5%, recomenda-se trocar o esquema por insulina.

Se a hemoglobina glicada estiver abaixo de 8,5%, pode-se associar outro


hipoglicemiante oral (ex.: Pioglitazona) à classe inicial.

Essas associações aumentam o risco de hipoglicemia.

Prescrição Ambulatorial
Ambulatório

Orientações ao Prescritor

• Progredir o tratamento em etapas, iniciando com Mudança de Estilo de


Vida (MEV);
• Associar Insulina noturna e/ou plena (sem sulfonilureia) à MEV e aos
medicamentos. Manter sensibilizadores é opcional. Para início da
insulinoterapia, acesse Diabetes Mellitus: Insulinoterapia.

Tratamento Farmacológico

Escolher, no máximo, uma droga por classe entre as abaixo. Iniciar


preferencialmente com Metformina, associando com outras classes após dose
de 2000-2550 mg/dia.

Classe A: Biguanida: Metformina (geralmente disponível no SUS) 1-2,55 g/dia


VO de 24/24, 12/12 a 8/8 horas. Administrar junto ou imediatamente após as
refeições para minimizar os efeitos gastrointestinais.

Classe B: Sulfonilureias: Escolha uma das opções (administrar antes das


refeições):
• Glibenclamida (geralmente disponível no SUS) 2,5-20 mg/dia VO de
24/24 a 12/12 horas;
• Glimepirida 1-8 mg/dia VO de 24/24 a 12/12 horas;
• Gliclazida (geralmente disponível no SUS) 30-120 mg/dia VO de 24/24
horas;
• Glipizida 5-20 mg/dia VO de 24/24, 12/12 a 8/8 horas.

Classe C: Glinidas: Escolha uma das opções (administrar imediatamente antes


das refeições):
• Repaglinida 1-4 mg/dia VO de 24/24, 12/12 a 8/8 horas;
• Nateglinida 120 mg/dia VO de 24/24, 12/12 a 8/8 horas.

Classe D: Inibidor da alfaglicosidase: Administrar junto à primeira porção das


principais refeições: Acarbose 150-300 mg/dia VO de 24/24, 12/12 a 8/8 horas.
Classe E: Análogos do GLP1: Liraglutida 0,6-1,8 mg SC de 24/24 horas.
Administrar uma vez ao dia a qualquer horário, independentemente das
refeições.

Classe F: Glitazonas: Pioglitazona 15-30 mg VO de 24/24 horas. Administrar


uma vez ao dia a qualquer horário, independentemente das refeições.

Classe G: Inibidores DPP4: Escolha uma das opções (pode ser administrada
com ou sem alimentos):
• Vildagliptina 100 mg/dia VO de 24/24 horas;
• Sitagliptina 100 mg/dia VO de 24/24 horas;
• Saxagliptina 5 mg/dia VO de 24/24 horas;
• Linagliptina 5 mg/dia VO de 24/24 horas.

Classe H: Glifozinas: Escolha uma das opções (administrar uma vez ao dia a
qualquer horário, independentemente das refeições):
• Dapagliflozina 10 mg/dia VO;
• Empagliflozina 10-25 mg/dia VO (dose máxima: 25 mg/dia).

Tratamento Não Farmacológico

1. Dieta balanceada.
2. 150 minutos semanais de exercícios de intensidade moderada ou 75
minutos de intensidade alta.

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