Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
ISSN: 2525-8761
DOI:10.34117/bjdv7n7-601
RESUMO
O objetivo central deste estudo é apresentar o desenvolvimento das ações e os resultados
obtidos pelo projeto de Oficinas de Escrita Acadêmica para indígenas e quilombolas
inserido no Projeto de Apoio ao Indígena (PAIND), realizado em uma universidade
federal do sul e sudeste do Pará no ano de 2018. O projeto de Oficinas de Escrita
Acadêmica surgiu pelo interesse dos alunos nas aulas de Leitura e Produção Textual, no
curso de Letras/Português, cujo objetivo era o de desenvolver capacidades de linguagem,
nos alunos, para a escrita de textos da esfera acadêmica: artigo, TCC, resumo, resumo
expandido, resenha e outros. Após o período de aprendizagem destes alunos com base
nas sequências didáticas desses gêneros acadêmicos, surgiu o projeto das Oficinas de
Escrita Acadêmica com o interesse, pelos alunos veteranos em compartilhar experiências
e aprendizados. Hoje, o projeto de Oficinas de Escrita Acadêmica é uma das ações
desenvolvidas e ligadas ao Grupo de Pesquisa CNPq – GEA – Grupo de Pesquisa em
Metodologias Inovadoras de Ensino–aprendizagem, na linha de pesquisa: Práticas de
leitura e escrita dos gêneros acadêmicos e ensino-aprendizagem, criado e coordenado pela
Profa. Dra. Maria Christina da Silva Firmino Cervera, da FAEL-UNIFESSPA. O Grupo
GEA tem desenvolvido pesquisas e práticas em oficinas oferecidas com estudos de
gêneros científicos e das várias práticas de ensino-aprendizagem.
ABSTRACT
The main objective of this study is to present the development of actions and the results
obtained by the Academic Writing Workshops project for indigenous and quilombolas as
part of the Indigenous Support Project (PAIND), carried out at a federal university in the
south and southeast of Pará in the year of 2018. The Academic Writing Workshops project
arose out of the interest of students in Reading and Textual Production classes, in the
Literature/Portuguese course, whose objective was to develop students' language skills
for writing texts in the sphere academic: article, TCC, abstract, expanded abstract, review
and others. After the learning period of these students based on the didactic sequences of
these academic genres, the Academic Writing Workshops project emerged with the
interest of veteran students in sharing experiences and learning. Today, the Academic
Writing Workshops project is one of the actions developed and linked to the CNPq
Research Group – GEA – Research Group on Innovative Teaching-Learning
Methodologies, in the line of research: Reading and writing practices in academic genres
and teaching -learning, created and coordinated by Profa. Dr. Maria Christina da Silva
Firmino Cervera, from FAEL-UNIFESSPA. The GEA Group has developed research and
practices in workshops offered with studies of scientific genres and various teaching-
learning practices.
1 INTRODUÇÃO
O contexto amazônico sempre suscitou curiosidades por parte de pesquisadores
vindos de diversas partes do mundo. As aldeias indígenas, sobretudo aquelas localizadas
no estado do Pará recebem pesquisadores com objetivos diversos. São pesquisas
desenvolvidas na esteira temática da terra, da cultura, da botânica, dos costumes,
comportamento, enfim, a exuberância natural desta região, considerada o Portal da
Amazônia abre oportunidades para o desenvolvimento do saber científico.
Ao longo dos anos e, com cada vez mais as universidades se instalarem em
regiões, antes considerados não centrais, percebeu-se uma nova população alcançada e
jovem, interessada em aprender. São também os indígenas e quilombolas que formam o
público-alvo deste projeto. São calouros que iniciam cursos diversos em uma
universidade federal na região amazônica.
É importante ressaltar que o projeto Oficinas de Escrita Acadêmica, destinado aos
calouros indígenas e quilombolas foi oferecido por alunos veteranos, em sua maioria
voluntários, do curso de Letras/Português da faculdade desta universidade. O projeto de
apoio ao indígena - PAIND - ao qual o Projeto de Oficinas de Escrita Acadêmica foi
inserido, visava contribuir para o êxito acadêmico dos alunos indígenas através da
realização de projetos de ensino que promovessem espaços de integração, contribuindo
para a permanência dos estudantes indígenas na Universidade, por meio da intervenção
de discentes apoiadores nos processos de adaptação às atividades acadêmicas, bem como
contribuir para a compreensão, pelo estudante indígena, de seu novo ambiente de
vivência.
Os objetivos principais a serem alcançados pelo projeto PAIND iam, desde
contribuir para o sucesso da Política de Ações Afirmativas na universidade, assegurando
2 DESENVOLVIMENTO
Apaixonar-se por determinadas teorias apresentadas na universidade é natural,
pois os alunos universitários passam pela tomada de conhecimentos teórico-
metodológicos iniciais e em toda a fase acadêmica. Um dos conhecimentos teóricos que
foi propulsor da forma com que os alunos se posicionaram de forma teórica , diante do
projeto com as oficinas foi, sem dúvida, a partir das discussões teóricas prévias sobre o
Interacionismo Sociodiscursivo (ISD), Bronckart (2006). Dessa forma, foi através do
conhecimento dessa base teórica que os alunos se identificaram como interacionistas:
interagindo em um meio social com ferramentas adequadas para a interação e o desejo de
mudança do meio social. Neste sentido, identificou-se e atingiu-se rapidamente a
necessidade de promover conhecimentos e saberes voltados à esfera acadêmica, por meio
de atividades planejadas com base nas sequências didáticas (Dolz, Noverraz, Schneuwly,
2004) como instrumento da interação didática, estudos estes que alicerçaram a formação
das oficinas que viriam a ser construídas, criando movimento que faz parte do processo
de ensino-aprendizagem, na qual, aborda a complexidade do pensamento humano
abrangente e multidimensional (MORAES, 2002), abrindo espaço para a participação de
ingressantes das mais diversas áreas de conhecimento utilizando ferramentas
tecnológicas.
Ressalta-se que o Interacionismo sociodiscursivo considera que a linguagem é o
fator principal de desenvolvimento humano, podendo ser apresentadas como
instrumentos de comunicação, construção de conhecimentos e saberes, ligada à
identidade social e cultural de uma comunidade e a formação do indivíduo. Dessa
maneira, para Cervera (2008), a relação didática entre o social e o individual acontece
através da apropriação de atividades sociais, por meio da linguagem e da interação entre
os sujeitos envolvidos.
Foi neste contexto acadêmico que se reconheceu como um desafio o trabalho com
novos gêneros discursivos que iniciariam convivência com a realidade dos discentes
ingressantes de quaisquer áreas, e que se tornou o ponto de partida para a elaboração de
sequências didáticas como meio de intervenção e apropriação de novos instrumentos de
comunicação e produção, a partir da interação entre os sujeitos envolvidos a partir da
Interdisciplinaridade, principalmente do elo entre professor e aluno, para que assim, tal
adversidade seja sanada mediante a mobilização dos conhecimentos pelos discentes.
O ensino em sala de aula tem se voltado fortemente para as práticas de
aprendizagem em grupo, tais comportamentos didáticos modificaram,
futuro promissor dentro de suas reais escolhas possíveis. Portanto, o professor deve estar
atendo a essas mudanças sociais e compreender que é possível proporcionar aos seus
alunos uma aprendizagem plena.
Pode-se dizer que o preparo para as novas práticas de ensino interativas consiste
em, antes, detectar as fontes das dificuldades dos alunos quanto à escrita para, dessa
forma, orientar e organizar as atividades de ensino em sequências didáticas.
Algumas fontes das dificuldades de escrita dos alunos foram descritas por Dolz,
Gagnon e Decândio (2010), em um estudo em que expuseram as bases dessas
dificuldades. Para Cervera (2015) “Os autores defendem a ideia de que, para se organizar
as atividades de ensino, é necessário conhecer as bases das dificuldades. As mais
concorrentes são, de acordo com eles, as motivacionais” (CERVERA, 2015, p. 21) : “[...]
trata-se de fontes associadas à canalização das necessidades do aprendiz, à qualidade e à
intensidade do investimento da escrita e à relação entre o esforço feito e os resultados
obtidos” (DOLZ, GAGNON e DECÂNDIO, 2010, p.33).
Outra fonte relaciona-se às dificuldades enunciativas. Para os autores, “[...] a fonte
da dificuldade é a entrada do sujeito no texto, o modo como leva em conta e implica o
outro no texto [...]”; assim, de forma geral “[...] a gestão dialógica (a quem responde o
texto?) e polifônica do texto (quais são as vozes que são citadas e como?)” (DOLZ,
GAGNON e DECÂNDIO, 2010, p.33). Há também as procedimentais: estas “[...]
envolvem os procedimentos, as estratégias convocadas durante a escrita, bem como as
operações aplicadas para ultrapassar os obstáculos” (DOLZ, GAGNON e DECÂNDIO,
2010, p.33).
No percurso do mesmo estudo, vamos encontrar outra fonte da dificuldade de
escrita dos alunos: as textuais, que “[...] envolvem, principalmente, os conhecimentos
insuficientes em relação ao gênero textual a ser produzido e a não-conformidade com as
convenções e as regularidades que os caracterizam” (DOLZ, GAGNON e DECÂNDIO,
2010, p.33).
As questões sobre leitura e escrita se relacionam às questões sobre gêneros
textuais. Para Cervera (2008), “Gêneros são produtos das atividades sociais de linguagem
e reguladores dessas atividades.”(CERVERA, 2008, p. 37). Para a autora, a “Apropriar-
se de um gênero parece ser adequado em diferentes situações de ensino-aprendizagem.”
(CERVERA, 2008, p. 37)
O ensino-aprendizagem com gêneros textuais com atividades pensadas dentro de
uma sequência didática é, segundo Cervera (2018) ponto central para o desenvolvimento
3 METODOLOGIA
As Oficinas foram ministradas no laboratório de informática da universidade. Os
alunos se inscreveram optando dentre as várias oficinas oferecidas aos calouros. As
Oficinas de Escrita Acadêmica receberam inúmeras inscrições e contou com lista de
espera, era, assim, uma das mais concorridas. Os alunos eram informados, no momento
da inscrição que poderiam trazer seus notebooks, mas teriam um computador à disposição
para cada participante.
Os alunos veteranos que ministrariam as oficinas estavam incumbidos de:
1. Selecionar leituras para o conhecimento prévio sobre Metodologias Ativas;
2. Identificar, com base no levantamento das próprias dificuldades e experiências os
temas a serem trabalhados nas oficinas e a divisão deles;
3. Levantamento de material didático a ser utilizado nas oficinas de forma que
obtivessem teoria aplicada;
4. Construção das Oficinas a partir de sequências didáticas pré-definidas.
5. Elaboração de um material de apoio para o aluno ingressante e comunidade acadêmica
da graduação postado na web.
Foi gratificante constatar as habilidades alcançadas pelos alunos que ministraram
as oficinas, alunos veteranos, no que tange: 1) ao trabalho em grupo; 2) momento de
ensino-aprendizagem; 3) Contato direto com alunos de outras áreas e a verificação das
suas necessidades no que se refere às práticas de escrita acadêmica, tornaram-se o motivo
central do incentivo destes alunos a continuarem, mesmo que e forma voluntária no
projeto nos anos subsequentes, que finalizou em 2020.
Os alunos veteranos desenvolveram uma organização interna de trabalho em
grupo com papéis definidos por eles: a equipe que gerencia os conteúdos para serem
ministrados nas oficinas, o aluno que cria os slides para as oficinas, o que gerencia os
trabalhos, o que fica com a lista de presença, o que organiza a entrada dos alunos no
laboratório, os monitores de sala de aula que auxiliam o aluno que está diante do
computador em algum detalhe que ele perdeu, o aluno que é o ministrante do curso, enfim,
há uma organização interna de trabalhos que foi se estabelecendo, naturalmente, e
observada e suprida pelos alunos veteranos. A coordenadora do projeto passou a ser
acompanhar o desenvolvimento das oficinas.
4 RESULTADOS
Foram mais de 120 alunos inscritos, distribuídos em três dias, entre calouros da
cidade (como chamaremos os não indígenas e não quilombolas), quilombolas e indígenas,
pois estes vivem em comunidades e em aldeias. Só não houve mais alunos, pois o
laboratório de informática comportava até 40 alunos por oficina. Chegou-se a ter o mesmo
número de inscritos para o mesmo número na lista de espera, tal foi a demanda.
Os alunos provinham de vários cursos, dentre eles: Ciências Econômicas,
Geologia, Engenharia de Minas, Engenharia da Computação, História, Ciências Sociais,
Engenharia Mecânica, Matemática, Ciências Biológicas, Física, Sistema de Informação,
Letras – Inglês, Saúde coletiva, Engenharia Civil e Direito
Como orientadora, hoje tenho três orientandas desta sala, dentre elas, uma cuja
pesquisa é, exatamente, sobre a experiência com as oficinas de escrita acadêmica em que
um aluno ensina o outro aluno em uma interação que buscou promover o despertar para
o mundo científico, aqui, nesta região que se abre para a vida, que se abre para o mundo
e que, cada vez mais tem sido valorizada pelos nativos dessas terras, agora, com um novo
olhar, o olhar da ciência.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho inicial desenvolvido com base nas dificuldades que os alunos
apresentam ao adentrarem uma universidade , ao se depararem com textos da esfera
acadêmica e, em pouco tempo precisar escrevê-los, mais as dificuldades no manejo das
ferramentas tecnológicas, ainda que bastante iniciais, como o uso da internet e outras
ferramentas que passaram pela orientação como as bases de busca por periódicos, google
acadêmico, entre outros recursos e, mais as habilidades desenvolvidas para o
aprender/ensinar que se desenvolveu ao longo do percurso do projeto, deram as condições
primeiras para que este projeto se entendesse na esteira do estudo com gêneros textuais,
na abordagem das sequências didáticas e na abordagem das metodologias ativas e que
veio a repercutir e se desdobrar em um novo projeto que é o Laboratório Experimental de
metodologias ativas aplicadas à formação continuada e ao ensino de línguas, sob a mesma
coordenação do projeto inicial e que se originou do projeto com as Oficinas de Escrita
Acadêmica, a partir das necessidades observadas pela demanda de os professores
conhecerem tecnologias que pudessem aplicar em suas aulas, em virtude do cenário
pandêmico pelo qual o mundo tem passado. Assim, o ensino de línguas a que o novo
projeto se refere são as línguas indígena e a língua portuguesa como segunda língua,
estudo decorrente na interação com os alunos indígenas.
É perceptível que nos encaminhamos para termos, nesta região, uma universidade
“morena”, como dizemos aqui, preparada para criar oportunidades trazidos pelos projetos
produzidos pelo homem daqui da terra levado a investigar e propor soluções para os
problemas nativos da região. As propostas científicas abrirão caminhos para, quer sejam
alunos “da cidade”, alunos quilombolas ou alunos indígenas poderem somar experiências,
construir novos projetos significativos. Que a realidade do fazer científico seja acessível
a todos, pois foi pelas mãos dos alunos que conseguiram dar significado a um tema tão
árduo, em qualquer região do Brasil, como é a escrita acadêmica que alcançamos outros
cenários para a mobilização dos conhecimentos para um fazer científico significante.
Projetos dessa natureza abrem portas para a consciência humana de qualquer etnia
e classe social se posicionarem diante da sua realidade e buscar modificar o que precisa
ser modificado.
Estabeleceu-se um elo entre culturas nativas da mesma região, aldeia e cidade e,
definitivamente, o que se sobrepôs foi o mais cativante para qualquer ser humano: A
curiosidade de conhecer, saber explicar e a vontade de aprender!
REFERÊNCIAS
DOLZ, J.; GAGNON, R.; DECÂNDIO, F.R. Uma disciplina emergente: A Didática das
Línguas. In: NASCIMENTO, E.L.(org.) Gêneros textuais: da didática das línguas aos
objetos de ensino. São Carlos: Editora Claraluz, 2010.
DOLZ J.; NOVERRAZ, M.; SCHNEUWLY, B. 2004. Sequências didáticas para o oral e
escrita: apresentação de um procedimento. In: Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e
(Org.). de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas-SP: Mercado de Letras, p. 95-
128.
SILVA, Josimar Santana: Aprendizagem nas redes sociais: o facebook como recurso
pedagógico para a aprendizagem da leitura e da escrita. UNEB – Bahia, 2013.
Disponívelem:http://nehte.com.br/simposio/anais/AnaisHipertexto2013/APRENDIZAG
EM%20NAS%20REDES%20SOCIAIS%20%20O%20FACEBOOK%20COMO%20R
ECURSO%20PEDAG%C3%93GICO%20PARA%20A%20APRENDIZAGEM%20D
A%20LEITURA%20E%20DA%20ESCRITA.pdf Acesso em: 06/10/2020.