Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
1) É cabível, no crime previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90, a criminalização da conduta do sócio-gerente
que deixou o quadro societário da empresa antes do lançamento definitivo do crédito tributário, mas que
efetivamente praticou o fato típico antes da sua saída.
Consumação
Os Incisos I, II, III e IV do art. 1º são crimes materiais, ou seja, exigem a produção do resultado consistente na
supressão ou redução do tributo:
Jurisprudência em Teses do STJ (ed. 90):
Tese 4: Os delitos tipificados no art. 1º, I a IV, da Lei nº 8.137/90 são materiais, dependendo, para a sua
consumação, da efetiva ocorrência do resultado.
Assim, para que se configurem é indispensável a constituição definitiva do crédito tributário, nos termos da
SV 24-STF:
Súmula vinculante 24-STF: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo 1º,
incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.
1
“Jurisprudência em Teses” é um serviço produzido e oferecido pelos servidores da Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal
de Justiça e disponível no endereço eletrônico: http://www.stj.jus.br/SCON/jt/
Minha atividade aqui foi apenas a de organizar as teses condensadas e divulgadas no site do STJ, elaborando ainda um breve resumo
da tese, que está no retângulo destacado. Recomendo a visita ao site do STJ para conhecer este e outros excelentes serviços
produzidos pela Secretaria de Jurisprudência do Tribunal.
Jurisprudência em Teses
EDIÇÃO N. 176:
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA,
ECONÔMICA E CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - IV
Sujeito ativo
No caso dos crimes contra a ordem tributária praticados por particular, há uma divergência na doutrina se eles se
classificariam como comuns ou próprios. Para compreensão da controvérsia, precisamos reconhecer quem pode
ser sujeito passivo de uma obrigação tributária. Segundo o art. 121, parágrafo único, do CTN considera-se:
Sujeito passivo da obrigação tributária (art. 121, parágrafo único, do CTN)
Contribuinte Aquele que tem relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo
(Inciso I) fato gerador.
Responsável Aquele que, sem ter a condição de contribuinte, se obrigue por disposição expressa
(Inciso II) de lei.
Pois bem. Voltando à divergência, de um lado, autores como Luiz Régis Prado defendem que o sujeito ativo
dos crimes contra a ordem tributária será, em regra, o contribuinte ou o responsável. Bem por isso,
especialmente o art. 1º e seus incisos da Lei nº 8.137/90, seriam definidos como delitos especiais próprios
(op. cit., p. 291).
De outro, Baltazar Jr. sustenta que o agente não precisa ser o contribuinte ou responsável. Isso porque, muitas
vezes, o delito “é cometido por intermédio da pessoa jurídica, sendo esta o contribuinte, e não o administrador,
que responderá pelo delito, uma vez que inexiste possibilidade de responsabilidade penal da pessoa jurídica
em matéria de crimes contra a ordem tributária” (op. cit., p. 799). A título ilustrativo, o autor cita o exemplo do
contador como possível autor do delito, embora não ostente a figura de contribuinte ou responsável.
2) A autoria e a participação no crime do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90 prescindem de que os agentes
integrem o quadro da pessoa jurídica ou o polo passivo do procedimento administrativo-fiscal, ou ainda,
que sejam responsáveis pelo cumprimento da obrigação tributária, desde que demonstrado o
envolvimento com a prática criminosa (art. 11 da Lei nº 8.137/90).
Jurisprudência em Teses
EDIÇÃO N. 176:
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA,
ECONÔMICA E CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - IV
Como visto acima, para que seja imputada a conduta do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90 não é necessário que o
Nesse sentido, a autoria pode ser determinada independentemente de quem tenha composto o polo passivo
do procedimento administrativo fiscal, podendo ser determinada, por exemplo, pelo fato de que o sujeito
ativo era administrador (de fato) da empresa, responsável pelas decisões gerenciais e pela condução das
atividades negociais desenvolvidas. Mas o fato de não ser o autor um dos responsáveis pelo cumprimento
da obrigação tributária, não ser sócio da empresa ou não ter figurado no procedimento administrativo fiscal
não o exime da responsabilização criminal.
Ao revés, a mesma lógica se aplica em defesa do sócio:
O simples fato de o acusado ser sócio e administrador da empresa constante da denúncia não pode levar a
crer, necessariamente, que ele tivesse participação nos fatos delituosos, a ponto de se ter dispensado ao
menos uma sinalização de sua conduta, ainda que breve, sob pena de restar configurada a repudiada
responsabilidade criminal objetiva.
STJ. 6ª Turma. HC 224728/PE, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 10/06/2014 (Info 543).
3) Nos crimes societários cometidos no âmbito de aplicação da Lei nº 8.137/90, admite-se a denúncia geral,
a qual, apesar de não individualizar pormenorizadamente as atuações de cada um dos denunciados,
demonstra, ainda que de maneira sutil, um liame entre o agir dos sócios ou administradores e a suposta
prática delituosa, o que estabelece a plausibilidade da imputação deduzida e permite o exercício da ampla
defesa com todos os recursos a ela inerentes.
Os crimes contra a ordem tributária são comumente praticados mediante o concurso de agentes.
No oferecimento da denúncia de crimes, os Tribunais Superiores têm dispensado a descrição minuciosa das
condutas de cada acusado, já que o detalhamento ocorre ao longo da instrução processual. O fato principal
e as qualificadoras deverão ser narrados de forma a permitir a ampla defesa, sob pena de inépcia da inicial.
Mas permite-se a denúncia geral, ou seja, aquela que não realiza a descrição individualizada da ação de cada
um dos envolvidos, em casos excepcionais
Sobre os crimes societários (ou de gabinete, porque são praticados por pessoas físicas que se aproveitam do
manto protetor de uma pessoa jurídica) e de autoria coletiva, o STJ tem entendido que:
Embora não possa ser de todo genérica, a denúncia é válida quando demonstra um liame entre o agir dos
sócios ou administradores e a suposta prática delituosa, apesar de não individualizar pormenorizadamente
as atuações de cada um deles, o que estabelece a plausibilidade da imputação e possibilita o exercício da
ampla defesa, cumprindo o contido no artigo 41 do Código Penal.
STJ. 5ª Turma. AgRg no RHC 81.346/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 12/2/2019.
Jurisprudência em Teses
EDIÇÃO N. 176:
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA,
ECONÔMICA E CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - IV
5) O envio dos dados sigilosos pela Receita Federal à Polícia ou ao Ministério Público, após o esgotamento
da via administrativa, com a constituição definitiva de crédito tributário, decorre de mera obrigação legal
de se comunicar às autoridades competentes a possível prática de ilícito, o que não representa ofensa ao
princípio da reserva de jurisdição.
Vale ressaltar que a própria LC nº 105/2001 prevê que, diante da possível prática de crime, essa comunicação
não configura violação do dever de sigilo:
Art. 1º As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços
prestados.
(...)
§ 3º Não constitui violação do dever de sigilo:
(...)
IV – a comunicação, às autoridades competentes, da prática de ilícitos penais ou administrativos,
abrangendo o fornecimento de informações sobre operações que envolvam recursos
provenientes de qualquer prática criminosa;
Jurisprudência em Teses
EDIÇÃO N. 176:
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA,
ECONÔMICA E CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - IV
6) Nos crimes previstos no art. 1º, II e III, da Lei nº 8.137/90, o oferecimento de denúncias tratando de
condutas e fatos distintos, ocorridos sucessivamente, no âmbito de uma mesma empresa sonegadora, não
enseja litispendência nem bis in idem.
b) ne bis in idem processual: assegura-se ao réu o direito de não ser processado duas vezes pelo mesmo fato.
Nos delitos tributários, é comum que ocorram, num mesmo exercício financeiro, sucessivas sonegações
fiscais, praticadas pelos mesmos agentes, na mesma empresa e como mesmo modus operandi.
Por exemplo, se várias notas fiscais são falsificadas, a denúncia dessas condutas não configura bis in idem ou
litispendência. Da mesma forma, se uma ação penal inicia foi extinta por ausência de lançamento definitivo
do crédito tributário de crime material (falta de justa causa), uma vez consumado o crime com a constituição
definitiva do crédito tributário, nada impede que nova denúncia seja oferecida, ainda que pelos mesmos
fatos.
7) Após o lançamento definitivo do crédito tributário, eventual discussão na esfera cível, via de regra, não
obsta o prosseguimento da ação penal que apura a ocorrência de crime contra a ordem tributária, diante
da independência das instâncias de responsabilização cível e penal.
8) A omissão de receitas e a omissão do dever de prestar informações verdadeiras acerca da empresa são
condutas ínsitas ao tipo penal descrito no art. 1º, I, da Lei n. 8.137/1990, não se prestando para negativar
as circunstâncias do crime.
Dosimetria da pena
Estabelece o referido dispositivo da Lei nº 8.137/90:
Jurisprudência em Teses
EDIÇÃO N. 176:
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA,
ECONÔMICA E CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - IV
Art. 1º Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e
Na primeira fase da dosimetria da pena desse crime, ao analisar as circunstâncias do art. 59 do CP, o juiz
elevou a pena base de acordo com os seguintes fundamentos:
“Circunstâncias: a condição de representante e administrador "de fato" possibilitou a conduta omitindo
receitas e negligenciando o dever de declarar a real situação da empresa”
Segundo o STJ, a omissão de receitas e a omissão com o dever de prestar informações verdadeiras acerca da
empresa também são elementares do tipo penal do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/1990, não se prestando para
negativar as circunstâncias do crime.
Circunstâncias “são elementos acidentais que não participam da estrutura própria de cada tipo, mas que,
embora estranhas à configuração típica, influem sobre a quantidade punitiva para efeito de agravá-la ou
abrandá-la. [...] Entre tais circunstâncias, podem ser incluídos o lugar do crime, o tempo de sua duração, o
relacionamento existente entre o autor e a vítima, a atitude assumida pelo delinquente no decorrer da
realização do fato criminoso etc.” (SILVA FRANCO, Alberto. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial
— Parte Geral. v. I, t. I, São Paulo : RT, 1997, p. 900).
Aqui, o erro do magistrado foi utilizar como circunstância judicial (1ª fase da dosimetria) um elemento que
ele já considerou para enquadrar a conduta no tipo penal. Houve, portanto, bis in idem (dupla punição pelo
mesmo fato).
9) A majorante do grave dano à coletividade, prevista pelo art. 12, I, da Lei nº 8.137/90, restringe-se a
situações de relevante dano, valendo, analogamente, adotar-se para tributos federais o critério já
administrativamente aceito na definição de créditos prioritários.
Em outras palavras, para a incidência do art. 12, I, da Lei nº 8.137/90 em tributos federais, é necessário que
o valor da dívida seja igual ou superior a R$ 1 milhão.
E se a sonegação fiscal envolver tributos estaduais ou municipais, como deverá ser o parâmetro nesses casos?
Jurisprudência em Teses
EDIÇÃO N. 176:
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA,
ECONÔMICA E CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - IV
Em se tratando de tributos estaduais ou municipais, o critério deve ser, por equivalência, aquele definido
O STF comunga do mesmo entendimento e utiliza como parâmetro esses atos infralegais que definem
“grandes devedores”? Não. Existe julgado do STF no qual foi afastado esse critério:
“Quanto à Portaria 320/2008 da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, anoto que essa norma infralegal
apenas dispõe sobre o Projeto Grandes Devedores no âmbito da PGFN, conceituando, para os seus fins, os
“grandes devedores”, com o objetivo de estabelecer, na Secretaria da Receita Federal do Brasil, método de
cobrança prioritário a esses sujeitos passivos de vultosas obrigações tributárias, sem limitar ou definir, no
entanto, o grave dano à coletividade, ao contrário do que afirma o impetrante.” (STF. 2ª Turma. HC
129284/PE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 17/10/2017. Info 882).
10) É possível o reconhecimento simultâneo das causas de aumento de pena relativas à continuidade
delitiva (art. 71 do CP) e ao grave dano à coletividade (art. 12, I, da Lei nº 8.137/90), sem que se configure
bis in idem.
Nos crimes contra a ordem tributária, não se confundem continuidade delitiva (art. 71 do CP) e causa de
aumento da pena referente a grave dano à coletividade (art. 12, I, da Lei nº 8.137/90).
É possível o cometimento de apenas um crime dessa natureza e causar o grave dano, como também cometer
diversos desses delitos sem atentar contra a coletividade. Assim, não bis in idem pelo reconhecimento das
duas situações na fixação da pena (HC 36.804-RS, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em 21/9/2004).
11) É possível o deferimento de medida assecuratória contra pessoa jurídica utilizada para fins de
ocultação de bens provenientes da prática de crimes previstos na Lei nº 8.137/90.
Medidas assecuratórias
O Ministério Público pode utilizar o sequestro de bens previsto no Decreto-Lei nº 3.240/41, quando o crime
contra a ordem tributária resultar prejuízo para a fazenda pública. Para isso, basta que haja “indícios
veementes” da autoria, conforme o dispositivo a seguir:
Art. 3º Para a decretação do sequestro é necessário que haja indícios veementes da responsabilidade,
os quais serão comunicados ao juiz em segredo, por escrito ou por declarações orais reduzidas a
termo, e com indicação dos bens que devam ser objeto da medida.
Assim, mesmo que determinada empresa não faça parte do polo passivo da ação penal, é possível a contrição
de seus bens, se houver indícios de que a empresa foi utilizada para a prática, em tese, de delito contra a
ordem tributária. Com o sequestro de bens, objetiva-se salvaguardar eventual execução promovida pelo ente
que tenha tido seu patrimônio atingido.
Jurisprudência em Teses
EDIÇÃO N. 176:
CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA,
ECONÔMICA E CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - IV
12) Nos crimes do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90, é possível a exclusão da culpabilidade por inexigibilidade
Dificuldades financeiras. É comum haver a alegação de que o agente deixou de pagar os tributos em razão
de dificuldades financeiras da empresa. Tal circunstância possui relevância penal e poderá servir para
excluir o crime?
SIM. Essa tese tem sido aceita no crime previsto no art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90:
Art. 2º Constitui crime da mesma natureza:
(...)
II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou
cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;
A jurisprudência tem aceitado porque a apropriação indébita tributária não exige a fraude como elementar
do tipo. Assim, excepcionalmente se admite o reconhecimento de crise financeira para excluir a culpabilidade
a título de inexigibilidade de conduta diversa.