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Resumos dos materiais da cadeira de O Estudo da Literatura, lecionada pela professora
Vanda Anastácio. Aqui são tratados a ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS, os conceitos de
LITERATURA, de CÂNONE, de PERÍODO LITERÁRIO, de GÉNERO e de AUTOR. Estão incluídas
algumas citações dos textos utilizados por esta professora, mas grande parte do conteúdo
encontra-se nos próprios resumos. Encontram-se igualmente apontamentos tirados durante
o decurso das aulas.
INTRODUÇÃO
Perguntas essenciais da Literatura:
Economia real
– Quem escreveu?
– O que escreve?
– Para quem escreve? Economia dos bens simbólicos
– Com que intenções? Se uma pessoa tiver uma sólida reputação,
– Sob que condicionalismos? poderá, eventualmente, trocar CAPITAL
SIMBÓLICO por CAPITAL REAL
Por exemplo, Luís de Camões, antes d’Os Lusíadas, não tinha CAPITAL SIMBÓLICO,
consequentemente, não tinha os fins para produzir uma edição apelativa1. A ECONOMIA DOS
BENS SIMBÓLICOS – de que a economia económica é apenas uma das dimensões – dá conta das
estratégias de acumulação, de reprodução e de reconversão das diferentes espécies de
CAPITAL por um indivíduo como objetivo de melhorar ou de conservar a sua posição no espaço
social. Enriquecimento ou transformação são:
Tanto mais fáceis quanto o agente ocupe uma posição dominante (e, portanto,
um capital já consequente que lhe abre numerosas possibilidades);
Tanto mais difíceis para os desprovidos de capital – os dominados;
Inexistentes no caso dos “homens sem futuro”;
Etc.
O CAPITAL nas suas diferentes espécies – SIMBÓLICO, CULTURAL e SOCIAL – é um
conjunto de direitos de preferência ou prioridade sobre o futuro; garante a alguns o monopólio
de certos possíveis, que são, contudo, oficialmente garantidos a todos (como o direito à
educação). Esta noção polimórfica de CAPITAL forjada por Pierre Bourdieu permite contruir um
modo de representação capaz de revelar a estrutura de todo o universo social.
Propriedades da economia das trocas simbólicas:
Existe uma dualidade , uma contradição entre a verdade subjetiva e a realidade
objetiva. Esta é tornada possível e sustentada por uma self-deception coletiva
que se inscreve nas estruturas objetivas e nas estruturas mentais.
Tabu da explicitação – censura do interesse económico
CAPITAL SIMBÓLICO:
De forma a que o ato simbólico seja eficaz é preciso que um trabalho
preliminar, muitas vezes invisível, e em todo o caso esquecido, tenha
1
A primeira edição d’Os Lusíadas vinha escrita com imensos erros ortográficos, em papel fanhoso e
esborratado e com as páginas mal seguras por um fio, sem capa.
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O Estudo da Literatura – A ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS, a LITERATURA, o CÂNONE, o
PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
Com tudo isto, é, então, imperativo falar do ESPAÇO SOCIAL e dos vários CAMPOS e
subcampos aí presentes. Diz-se CAMPOS pois a sociedade é feita de grupos e de indivíduos em
constante competição entre si para obter CAPITAL.
Um CAMPO é um espaço de atividades específicas e de possíveis, que tende a orientar
a busca dos agentes, cujas relações estruturam o CAMPO. O que configura um campo são as
posições sociais – distribuídas entre dominados e dominantes e que constituem o espaço social
–, as lutas concorrenciais – que ocorrem tanto no interior de um CAMPO como entre CAMPOS
– e os interesses. Dependendo da posição que ocupam na estrutura do CAMPO, os agentes
usam estratégias – tendência que passa pela mediação dos seus habitus– que podem ser de
conservação ou de subversão.
Dentro de um CAMPO podem existir vários outros. Por exemplo, dentro do CAMPO
CULTURAL temos o CAMPO LITERÁRIO. Certos CAMPOS (religioso, artístico, político,
universitário) têm por finalidade a produção de bens simbólicos específicos (ainda que sempre
potencialmente convertíveis).
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Habitus – diz respeito aos sistemas de perceção/gosto que orientam os agentes nas suas ações.
Constituem princípios de classificação incorporados pelos agentes a partir das estruturas sociais presentes
num dado momento, num dado lugar, que vão orientá-los nas suas ações.
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Dóxica – doxa [Filosofia] conjunto de ideias e juízos generalizados e tidos como naturais por uma maioria.
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PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
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As modalidades de consagração/instâncias de consagração são as escolas, as academias, os salões, as
associações científicas e culturais, agências de financiamento, etc. e localizam-se no CAMPO DO PODER.
O próprio Presidente da República pode funcionar como uma instância de consagração, por exemplo, ao
dar uma opinião positiva de um livro que leu ou tirar fotografias numa feira qualquer. Uma celebridade é
também uma instância de consagração ao permitir o uso da sua imagem para um anúncio de algo.
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A este desprezo Bourdieu atribui a designação de tabu da explicitação.
6
Um grupo bem organizado pode funcionar como uma classe social (move-se por objetivos comuns).
Um grupo pode também tentar associar-se a outro detentor de uma maior quantidade/qualidade de
CAPITAL SIMBÓLICO de forma a subir no espaço social e chegar ao CAMPO DO PODER.
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O Estudo da Literatura – A ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS, a LITERATURA, o CÂNONE, o
PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
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Classifica também a desigualdade nas performances das crianças oriundas de diferentes classes sociais,
ou seja, remete para o êxito escolar. Devido a isso, o sistema escolar acentua as desigualdades culturais
dos alunos, pois os mais ricos irão para uma escola privada com uma qualidade de ensino superior à de
uma escola público.
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Existe uma conversão, uma troca de moeda por outra.
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Rede de ligações - produto de estratégias de investimento social, [] a fim de criar relações das quais
pode retirar lucros materiais ou simbólicos
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PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
LITERATURA
– Origens e evolução –
O lexema literatura deriva do lexema latino literatura – derivado do radical littera (letra,
carácter alfabético) – que significa saber relativo à arte de escrever e ler, gramática, instrução,
erudição. Na segunda metade do século XV, os lexemas daqui derivados surgiram sob feições
muito semelhantes umas às outras nas principais línguas europeias. Até ao século XVIII,
Literatura designava de modo geral o que estava escrito e o seu conteúdo, o conhecimento.
No século XVIII, ocorreram profundas transformações socioculturais e evoluções no
campo da ciência que determinaram a evolução semântica deste termo. Isto abalou a ideia que
até então se tinha de Literatura e determinou a evolução semântica do conceito de maneiras
que ainda hoje são analisadas e tidas em conta. Este impacto demonstrou que a Literatura é
indissociável das circunstâncias culturais em que se desenvolve.
TRANSFORMAÇÕES SOCIOCULTURAIS
O alargamento do poder da burguesia expandiu de igual modo o público leitor, tanto
que, pela primeira vez na história, surgem os autores capazes de viver dos rendimentos
proporcionados pelos seus trabalhos. Para além disso, a vida cultural das cortes e dos
salões substitui o humanista, o erudito ou o letrado; agora, a cultura, impregnada pelo
gosto do lúdico do Barroco e do estilo mundano do homem de corte, adquire uma
tónica fortemente marcada pela necessidade de agradar, de dar prazer estético. A
Literatura passa a ter uma função pedagógica e de interveniente nos problemas
ideológico-políticos enfrentados na altura. Para além disso, nas primeiras décadas
deste século, surgiu o pré-romantismo e com ele produções como o romance e a novela,
ou seja, novos géneros literários do campo da prosa. O termo poesia deixou, então, de
ser aplicável a todos os textos literários, tonando-se, assim, específico daqueles que
tivessem determinadas características técnico-formais. Literatura era uma designação
genérica mais extensiva, que incluía tanto os textos escritos em verso como aqueles
em prosa.
EVOLUÇÕES NO CAMPO DA CIÊNCIA
Os progressos técnico-científicos, e a crescente dependência da observação e da
experiência, levaram a que o lexema ciência adquirisse um significado mais estrito, de
tal modo que frequentemente se opõem os conhecimentos por esta confirmados aos
que são apenas de origem livresca. Deste modo, tornou-se impossível associar os textos
científicos aos das belas-letras e o mesmo sucedeu com os de outras áreas como a
música, a arquitetura, etc., ou seja, mais técnicos. Na verdade, a Literatura fazia questão
de se demarcar dos valores da ciência, da técnica e da civilização burguesa, na
antinomia cultura linguística versus cultura científico-tecnológica. Esta teria a
capacidade de ser substituto de códigos éticos e credos religiosos.
O conceito de Literatura foi associado com algumas ideias negativas. Por exemplo,
Voltaire fazia questão de distinguir o conceito de literatura e de literato do conceito de génio,
sendo o primeiro inferior à grandeza do última. A Literatura era classificada por ele como «uma
luz muitas vezes enganosa». Para além desta diferenciação, Voltaire procedeu a uma
comparação entre o conhecimento representado pela Literatura e aquele representado pela
filosofia e pela ciência, sendo este mais exigente. Assim, a Literatura dizia respeito a objetos
caracterizados pela beleza – belle littérature. Desta forma, a crítica e a cronologia, livros
técnicos sobre, por exemplo, a música ou a pintura, não poderiam ser considerados textos
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O Estudo da Literatura – A ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS, a LITERATURA, o CÂNONE, o
PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
literários por carecerem de valores estéticos. Diderot foi de uma opinião semelhante,
considerando a Literatura como sendo a arte e as manifestações dessa arte, tratando-se do
conjunto de textos que se singulariza pela presença de determinados valores estéticos.
Ao longo dos séculos XIX e XX, a Literatura foi adquirindo as seguintes aceções:
a) Conjunto de produção literária de uma época – literatura do século XVIII, literatura
vitoriana – ou de uma região – pense-se na famosa distinção de M.me de Staël entre
«literatura do norte» e «literatura do sul».
b) Conjunto de obras que se particularizam e ganham feição especial quer pela sua
origem, quer pela sua temática ou pela sua intenção: literatura feminina, literatura de
terror, literatura revolucionária, literatura de evasão, etc.
c) Bibliografia existente acerca de um determinado assunto.
d) Retórica, expressão artificial. Verlaine, no seu poema Art Poétique, escreveu: «Et tout
le reste est littérature», identificando pejorativamente literatura com expressão
retórica, falsa e artificial.
e) Por elipse, emprega-se simplesmente literatura em vez de história da literatura.
f) Por metonímia, literatura significa também manual de história da literatura.
g) Literatura pode significar ainda conhecimento sistematizado, científico do fenómeno
literário. Trata-se do significado caracteristicamente universitário do lexema e ocorre
em sintagmas como literatura comparada, literatura geral, etc.
– Literariedade –
O conceito de literariedade foi uma tentativa de definir a Literatura. Este seria o
conjunto de características que tornam um texto literário, pegando nos textos e procurando
qualquer qualidade intrínseca, mesmo antes de chegar ao leitor, que os torne literários. Este
termo foi fundado por Roman Jakobson em 1921, numa altura em que as teorias positivistas da
Literatura vigoravam. Foi uma contraproposta à resposta deste últimos que consideraram como
sendo Literatura «toda a obra que representasse a civilização de qualquer época e de qualquer
povo, independentemente de possuir ou não características estéticas, poderia ser aceite como
sendo literatura».
Segundo este teórico, a literariedade seria o verdadeiro objeto de estudo da Literatura,
ou seja, aquilo que faz de uma dada obra uma obra literária. Aquando da classificação de um
texto, é também rejeitada uma abordagem psicológica, filosófica ou sociológica, considerando
que uma obra não pode ser explicada a partir da biografia do seu autor, nem a partir de uma
análise da vida social contemporânea.
Jakobson criou um sistema que, supostamente, todos os textos verdadeiramente
literários, seguiriam. Num modelo de comunicação existiam seis fatores: um destinador (1) que
envia uma mensagem (2) a um destinatário (3), num dado contexto (4); a mensagem requer
um código (5), partilhado em maior ou menor grau pelos dois participantes da comunicação, e
um canal ou contacto (6) entre eles. Cada um desses fatores originaria uma função linguística
diferente «centrada sobre», ou «visando», um deles – emotiva (1), poética (2), conativa ou
apelativa (3), referencial (4), metalinguística (5) e fática (6).
No entanto, não existe qualquer qualidade comum a todos os textos literários, para
além de que estes só existem enquanto objeto através de um processo mental de quem os lê.
Já para não mencionar que este método de raciocínio nos levaria a excluir muitos textos que
considerámos como sendo literários. Para além disso, o contexto em que uma dada obra é
escrita é de extrema importância para a sua interpretação, pois dadas épocas vêm com mais
limitações/restrições ou liberdades de expressão, entre outros fatores.
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PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
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PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
CÂNONE
1º sentido: conjunto de regras eclesiásticas que regiam as primeiras igrejas cristãs
a) Há expressões com significados que derivam deste primeiro sentido
HORAS CANÓNICAS (momentos do dia destinados à oração)
CANONIZAÇÃO (reconhecimento póstumo da santidade de alguém)
NA MÚSICA (repetição regular de uma música)
O C. pode ser considerado como sendo a lista de autores de obras consideradas ótimas,
mas que sejam também modelos de comportamento. No entanto, isto é algo que parece variar
consoante o ponto de vista do crítico que estuda os textos. O Crítico A pode não considerar o
Escritor 1 como um autor literário, ao contrário do Crítico B que já é capaz de o fazer. De acordo
com aquilo que queremos consagrar, criamos um novo cânone – PERMANENTE
RECONFIGURAÇÃO.
«[…] quer pensemos nos cânones como condenáveis porque formados ao acaso ou para servirem certos
interesses em detrimento de outros, quer suponhamos que os conteúdos dos cânones são
providencialmente escolhidos, não pode haver dúvidas de que sem recurso a eles, não acharíamos
maneira de ordenar o nosso pensamento acerca da história da literatura e da arte.»
Por quanto mais tempo um dado autor estiver nesta lista de autores consagrados
maior será a dificuldade de o remover. Por exemplo, Sá de Miranda foi o primeiro escritor a
escrever sonetos em português, sendo, desta forma, algo para o qual se olha e se sente orgulho.
Outro exemplo, e quase desnecessário de tão obvio que é, são Os Lusíadas. Estes narram a
viagem de Vasco da Gama na época áurea de Portugal: os Descobrimentos: IDENTIDADE
NACIONAL.
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PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
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O Estudo da Literatura – A ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS, a LITERATURA, o CÂNONE, o
PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
PERÍODO LITERÁRIO
– O que é um Período Literário –
«O conceito de período literário constitui um instrumento indispensável adentro de uma compreensão
histórica do fenómeno literário, bem como das interações e relações que ele mantém com os restantes
fenómenos culturais e sociais.»
Para além disso, alguns críticos parecem ver a evolução dos géneros literários como
sendo universal, isto é, a evolução de um género de literário de um país é aplicável a outros,
mas lá porque houve pré-romantismo na França, não quer dizer que também o haja em Portugal.
A LITERATURA TEM A SUA PRÓPRIA LÓGICA: A LÓGICA DOS BENS SIMBÓLICOS
Retomando a afirmação “A Literatura é indissociável da História”, é quase impossível
falar do “poeta” sem falar do “historiador” e vice-versa. Esta associação é feita porque:
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Outra unidade de análise é a IDADE: pressupõe uma analogia entre a vida humana e a vida da
Humanidade.
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PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
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Nominalismo – conceito de período como uma simples etiqueta desligada de qualquer conteúdo real,
uma solução de tipo metafísico a qual os períodos literários são concebidos como entidades trans-
históricas. A atitude nominalista é uma atitude cética que reduz a histórica literária a um acervo
assignificativo de factos concretos e singulares, desconhecendo a existência de estruturas genéricas que
possibilitam a obra individualizada.
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Homeostase (= homeostasia) – processo de regulação pelo qual um organismo consegue a constância
do seu equilíbrio.
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Homeorrese – trata-se de uma "transformação", ou um equilíbrio dinâmico decorrente de novas
contingências impostas por alterações acentuadas do meio, as quais produzem desequilíbrios tais, que
somente uma reconstrução ou reestruturação podem reequilibrar.
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Semiótico – ciência dos modos de produção, de funcionamento e de receção dos diferentes sistemas
de sinais de comunicação entre indivíduos ou coletividades.
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PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
Algumas destas divisões chegam a ser extremamente confusas e sem qualquer razão
aparente. Por exemplo, Aubrey Bell, na sua Literatura Portuguesa – História e Crítica, dedica um
capítulo aos “seiscentistas”, mas delimita-o entre os anos de 1580 e 1706. Outro possível é o
capítulo supostamente dedicado à Literatura do século XVIII, mas que se encontra entre os anos
1706 e 1816, sendo que a escolha deste último se deve à morte de D. Maria I, “a Louca”. Esta
divisão passa a fazer ainda menos sentido quando se considera o facto de D. Maria já nem
ocupar o trono devido à sua “invalidez”.
Isto sem explorar a questão dos autores. Muitos autores são excluídos por não serem
considerados suficientemente relevantes ou representativos para terem o direito de ocupar
um lugar na História da Literatura do seu país. Pegando mais uma vez no exemplo de Portugal,
muitos escritores bilingues – que escreveram tanto em português como em castelhano – não
foram incluídos por violarem o caráter da NACIONALIDADE.
Muitas vezes são também incluídos autores e textos que não faz sentido algum
estarem lá. As Cartas da Religiosa Portuguesa é um bom exemplo. O estilo não corresponde ao
estilo português, já para não mencionar que a primeira edição veio escrita em francês, apesar
das referências serem de Portugal. É importante perceber a história por trás desta obra para
perceber a razão de eu a ter usado para ilustrar este meu ponto de vista. Em traços muito largos,
houve uma freira de Beja, Mariana Alcoforado, que se apaixonou por um soldado francês que lá
tinha passado. Ela ter-lhe-ia escrito várias cartas de amor que, de alguma forma, acabaram nas
mãos de alguém. O problema com esta “obra” é que o que foi publicado foi fruto de tantas
transformações e rescrições que é implausível que seja 100% original.
– Os critérios de avaliação –
Anteriormente, foram referidos os critérios da NACIONALIDADE, da ORIGINALIDADE e
da LÍNGUA. No caso português, a constante busca pelo respeito a estes valores condicionou
gravemente a História da Literatura do nosso país e estas repercussões duram até aos dias de
hoje. Os motivos invocados para essa desvalorização não foram sempre os mesmos, nem os
julgamentos negativos incidiram sempre sobre as mesmas épocas.
Por um lado, na busca das manifestações do génio, da originalidade e de condutas
exemplares, o centro de interesse da História Literária situou-se muito mais na biografia dos
autores e nas circunstâncias exteriores às obras, do que nos textos. Por outro, o facto de se
procurarem obras isentas de influências extra-nacionais numa literatura desde sempre
permeável às culturas das outras regiões peninsulares, e ideias “originais” em produções
resultantes em grade medida de interpretações locais de correntes de pensamento de
circulação europeia, levou a que grande parte da produção literária portuguesa dos séculos
XVI, XVII e XVIII fosse desprezada.
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O Estudo da Literatura – A ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS, a LITERATURA, o CÂNONE, o
PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
GÉNERO
É impossível estudar Literatura sem tropeçar na questão do género (tipologia) literário.
Independentemente do que escrevemos, inadvertidamente damos sempre uso a
características/elementos de vários géneros. Por exemplo, o fenómeno que corre atualmente
de celebridades “escreverem” – entre aspas pois falam por trás da voz de um “escritor
fantasma” que nunca é revelado – a sua autobiografia. O que todas têm em comum é que nunca
começam com o início, ou seja, com o momento em que nasceram. Este surge quando um
acontecimento no presente provoca uma evocação da infância. Sem estudos muito
aprofundados da área da Literatura, usam a clássica narração in media res.
O que é um GÉNERO? O termo GÉNERO ora se refere a categorias acrónicas e universais
– a lírica, a narrativa, etc. –, ora se refere a categorias históricas e socioculturais – o romance,
o romance histórico, a ode, a ode pindárica, o soneto, etc. Tem a função de estabelecer uma
classificação genérica dos géneros literários.
Um género caracteriza-se pela correlação sistémica dos seguintes fatores:
a) Um determinado MODELO DE SITUAÇÃO COMUNICATIVA que conexiona o género com
um modo literário (narrativo, lírico e dramático). Ao ato comunicativo correspondem a
ENUNCIÇÃO, o DESTINO e a FUNÇÃO, enquanto que ao texto correspondem o nível
sintático e o semântico. Desta forma, os nomes dos géneros não se referem ao texto ou
a um conjunto de propriedades suas, mas sim a uma das características anteriormente
referidas. Por isso, uma mesma obra pode ser classificada em diferentes géneros
segundo o aspeto em que se destaque.
a. Na ENUNCIAÇÃO terá de se ter em conta a posição do enunciador (sério ou
fictício), a da enunciação (oral ou escrita) e os modos de enunciação (narração
ou representação).
b. No DESTINO terá de se ter em conta se o destinatário é:
i. determinado ou indeterminado (por exemplo, para distinguir a carta
real da fictícia);
ii. reflexivo ou transitivo (por exemplo, para diferenciar o diário íntimo de
uma “constelação comunicacional normal”);
iii. real ou fictício (a novela por carta).
c. A FUNÇÃO poderá ser ilocutiva (a ilocutiva descritiva no lamento, etc.) ou lúdica
(o lamento, a oração ou os provérbios, etc).
b) Um determinado MODELO DE FORMA DO CONTEÚDO, configurado por elementos
semânticos e pragmáticos acrónicos e por elementos semânticos e pragmáticos
histórico-sociais. As marcas semânticas e pragmáticas de um género literário,
inextricavelmente ligadas às suas modalidades enunciativas, permitem estabelecer uma
analogia entre o género literário e o ato ilocutivo.
c) Um determinado MODELO DE FORMA DA EXPRESSÃO, resultante de normas e
convenções estilísticas que regulam a coerência textual de curto raio de ação – as
microestruturas formais do texto – e de normas e convenções retóricas e técnico-
compositivas que ordenam a coerência textual de longo raio de ação – as
macroestruturas formais do texto.
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O Estudo da Literatura – A ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS, a LITERATURA, o CÂNONE, o
PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
educação, o romance epistolar, etc. Os subgéneros, embora possam exercer uma ação
fecundante como modelos, ao longo do tempo, na memória do sistema e na praxis literária,
possuem uma duração mais limitada do que os géneros, apresentando-se muito vulneráveis
às grandes transformações históricas do policódigo literário.
«[…] o género representa em relação ao modo e o subgénero representa em relação ao género um
fenómeno de hipercodificação, isto é, um fenómeno de especificação e de complexificação das normas
e convenções já existentes e atuantes no modo15 e no género.»
– As “fronteiras”/delimitação do género
Existem divisões muito claras. Basta faltar um elemento, por mais mísero que
seja, para impossibilitar a classificação daquela obra como sendo pertencente a
um género. Segundo Derrida, os géneros não devem ser misturados e há regras
que devem ser absolutamente seguidas.16
– Origens e História –
15
Os modos da ficção são categorias básicas articuláveis com as perspetivas históricas e as tradições
literárias.
16
REGRAS versus TRANSGRESSÃO – Quando numa dada época, existe um conjunto de regras – uma forma
e um tema – que são transgredidos, forma-se uma TENSÃO, que se trata de um violação de algumas regras
de um dado género para criar algo novo.
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PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
Esta história é reconfigurável, por exemplo, é possível escrever uma epopeia em épocas
diferentes, no entanto, é necessário adaptar a forma ao período em que se vive (não se pode
escrever um poema com o ritmo, estrutura, rima gregos). Trata-se de uma REESCRITA FORMAL
E TÉCNICA – ATUALIZAÇÃO: adaptam-se às formas de criação da sociedade na qual ressurgem.
Daí poder-se chegar à História a partir da LITERATURA.
O GÉNERO funciona, assim, como uma categoria de análise histórica. Durante séculos,
a LITERATURA estava associada à classe social (ser canonizado), raça, género, nível económico,
religião – CATEGORIAS DE ANÁLISE. No entanto, a classe social prevalecia sobre tudo o resto. A
pessoa que estivesse a escrever bem podia ser uma mulher negra e pobre que, em certas
épocas, não importaria desde que tivesse sangue azul. É quando cai a monarquia, no século XIX,
que a CATEGORIA DO GÉNERO começa a impor-se. A historiografia começou a fazer-se a partir
deste século, daí todas as figuras, nomeadamente femininas, que foram completamente
silenciadas.
O GÉNERO passa a interferir na perceção que se tem dos próprios géneros (h/m).
FORMA + TEMÁTICA – em sociedades em que os papéis de género estão bem definidos, certos
temas não são para homens e certos temas não são para mulheres. O problema não é bem
estarem lá, há muitas mulheres que foram excelentes estrategas e importantíssimas na era
Medieval, mas sim serem silenciadas. Desta forma, não se pode depender somente de
documentos oficias quando se trata de estudar a HISTÓRIA DA LITERATURA, uma vez que,
como se pode ver, estes nem sempre foram imparciais.
É, então, criada uma ligação entre GÉNERO e SEXO, também porque durante um longo
período de tempo ficava mal visto às mulheres escreverem, uma vez que se tratava de um ato
público, e isso costumava estar associado com a prostituição. A sociedade é UM DOS
CONDICIONALISMOS REFERIDOS NAS CINCO PERGUNTAS DO INÍCIO. A isto dá-se o nome de
GENDERIZAÇÃO, que constitui exatamente no fenómeno de atribuir um género a coisas que
são relativamente neutras/identificação entre certas GÉNEROS LITERÁRIOS e determinados
géneros. OS PAPÉIS DE GÉNERO IMPOSTOS SOBRE O ESCRITOR DETERMINAM A FORMA COMO
ESTE SE DEVE EXPRIMIR. No entanto, a matéria nunca é realmente neutra, uma vez que se
trata de uma PRODUÇÃO HUMANA.
Por exemplo, numa dada altura do século XVII, o GÉNERO favorito das mulheres era a
carta. Madame de Sévigné foi uma exemplar, tendo escrito muitas cartas à filha a contar todas
as coisas que aconteciam na corte de D. Luís XIV. Este é um tema que casa bem com a ideia dos
papéis de género da mulher que se tinha então.
NO ENTANTO
Há mulheres que usaram a carta para dizer outras coisas, como foi o caso da Condessa
da Somar. Esta mandou uma carta ao seu filho recentemente endereçado ao exército, na qual
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O Estudo da Literatura – A ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS, a LITERATURA, o CÂNONE, o
PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
fala sobre como este se deve comportar, várias estratégias de batalha, etc. A CARTA é um
GÉNERO que passa facilmente e, como se pode ver, não tem muito que ver com TEMÁTICA.
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O Estudo da Literatura – A ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS, a LITERATURA, o CÂNONE, o
PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
AUTOR
A questão de definição do AUTOR é uma situação tão complicada como a de definir o
que é a LITERATURA. A necessidade de atribuir um autor a um texto começou nos tempos da
Inquisição, em que a AUTORIA fica conotada com um sentido de responsabilidade. No século
XIX, surge a ideia de que cada indivíduo deixa uma marca própria. Desde então, nunca mais
conseguimos largar esta convenção de que um texto deve ter um autor. O NOME DE AUTOR
surge, assim, para agrupar uma série de textos e tentar explicá-los através da voz biográfica
que os escreveu. Como se pode ver, a ideia de AUTOR é uma “CONSTRUÇÃO SOCIAL”.
Para além disto, há a questão da REPUTAÇÃO, também ligada com a CONSTRUÇÃO
SOCIAL. Todos os escritores esforçam-se por manter uma boa REPUTAÇÃO, pois esta
influenciará a forma como os seus textos serão percecionados e interpretados, por isso os
autores são muito meticulosos com os meios de transmissão a que se associam (i.e. editoras,
programas de TV, etc).
Isto revela que os livros (os objetos) não são a mesma coisa que os textos. Os textos
encontram-se no campo da AUTORIA e foram escritos pelo autor. No entanto, o livro é o
resultado de uma COLABORAÇÃO. Por exemplo, o fenómeno dos ghost writers: a pessoa A tem
a história, mas não tem o texto, e o ghost writer tem o texto, mas não tem a história. Outro
exemplo era de quando os trovadores procuravam o apreço do Rei para que este divulgasse os
textos na Corte ou lhes desse uma tença. Assim, os livros, as páginas encadernadas e as imagens
que constituem a capa, pertencem ao plano da REALIDADE.
No entanto, um texto tem vida própria, sendo desrespeitoso reduzir a voz que fala no
texto a uma voz biográfica, para além de que muitos são os casos em que as duas vozes não
coincidem. Quando o autor escreve, este desprende-se de tudo o que é seu, desde as suas
convenções à sua própria identidade. A voz no texto pode dizer coisas que o outro nunca diria,
falar numa entidade que não lhe pertence (i.e. heterónimos; pessoas que escrevem sob um
outro nome de forma a que as suas obras sejam olhadas de forma diferente; homens que
escreviam as cantigas de amigo).
Este desprendimento consiste no apagamento da identidade do AUTOR enquanto
pessoa que escreve para que as suas palavras possam ser entendidas por quem lê. A este
fenómeno dá-se o nome de MORTE DO AUTOR. O AUTOR enquanto ser exterior e anterior ao
texto afasta-se, sendo aquilo que mantem uma ideia da sua presença o “efeito textual” da
INSTÂNCIA DE ENUNCIAÇÃO17, por outras palavras, a voz que fala no texto.
«a escrita está agora ligada ao sacrifício, ao sacrifício da própria vida»
«parentesco da escrita com a morte»
– O AUTOR SACRIFICA-SE EM PROL DA EXISTÊNCIA DA SUA OBRA
(o autor morre no sentido de que desiste das várias componentes da sua identidade durante o processo da escrita
para criar uma voz que não lhe pertence mas que será aquela que falará no texto)
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Esta INSTÂNCIA DE ENUNCIAÇÃO é o RESULTADO DE ASSOCIAÇÕES DO LEITOR + ESCRITOR + EDITOR +
EDITOR + IMPRESSOR + TIPOGRAFO-COMPOSITOR + REVISOR – Elementos da cadeia de transmissão.
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O Estudo da Literatura – A ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS, a LITERATURA, o CÂNONE, o
PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
São estas projeções do LEITOR e as expectativas que este cria quando associa um
determinado grau a um escritor que criam a FUNÇÃO DE AUTOR.
FUNÇÃO DE AUTOR
Ligada ao sistema jurídico e institucional Não se exerce de forma universal e
que encerra, determina, articula o universo constante em todos os discursos
dos discursos
A questão de a noção do anonimato ser tolerável num
A questão de o ÃUTOR ser passível de ser punido pelo texto científico, mas ser intolerável num texto literário
que escreve, uma noção de responsabilidade para com (segundo Foucault).
o campo em que produz.
Não se define pela atribuição espontânea Não reenvia pura e simplesmente para
de um discurso ao seu produtor um indivíduo real
É antes o resultado de uma operação complexa, a qual O AUTOR interpreta três eus que trabalham em
varia consoante a época e o tipo de discurso. O AUTOR conjunto e nenhum é mais relevante que o outro.
é apenas a projeção do tratamento a que submetemos Todos os discursos que são providos da FUNÇÃO DE
os textos, os traços que estabelecemos como AUTOR comportam uma pluralidade de eus sob os
pertinentes. quais o escritor escreve.18
«num romance […] os signos […] reenviam […]
para um “alter-ego” cuja distância relativamente
ao escritor pode ser maior ou menor e variar ao
longo da própria obra»
Um autor pode ser o autor de mais do que uma coisa, de textos de várias disciplinas.
Quando assim é, diz-se que o autor se encontra numa posição “transdicsursiva”. Com isto, é
introduzida a importância dos FUNDADORES DE DISCURSIVIDADE, os quais produziram mais do
que um texto ou uma teoria. Criaram um modelo que textos futuros poderiam vir a seguir.
«eles abriram o espaço para outra coisa diferente deles e que, no entanto, pertence ao que eles
fundaram»
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O melhor exemplo disto, no caso português são Os Lusíadas. Durante a obra, são muitas as vozes que
falam nos três planos narrativos: temos a voz que fala no plano da Viagem; as vozes (Vasco da Gama num
momento e Paulo da Gama noutro) do plano da História de Portugal. E temos ainda, fora dos planos
narrativos, a voz das Considerações do Poeta e aquela que fala na Dedicatória.
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O Estudo da Literatura – A ECONOMIA DOS BENS SIMBÓLICOS, a LITERATURA, o CÂNONE, o
PERÍODO LITERÁRIO, o GÉNERO e o AUTOR
«Se o erro pode, assim, ter uma verdadeira função de descoberta, é porque permite, o que é mais difícil
quando reflectimos sobre o real, uma mudança de paradigma.»
Desta forma, o erro não é necessariamente algo negativo. Tal como Cristóvão Colombo
pensou que tinha chegado à Índia quando, na verdade, tinha atracado nas Américas, pois tinha-
-se enganado na trajetória, certos erros na literatura permitem ingressar por vias que, de outra
maneira, seriam impossíveis de encontrar, quanto mais seguir.
Não são só os críticos que fazem isto. Também os próprios escritores escrevem sob
nomes diferentes muitas vezes porque intendem que o seu texto seja lido sob uma luz
diferente da do costume. Exemplo disto são aqueles que escrevem sob um pseudónimo, como
foi o caso da J. K. Rollins quando quis escrever um livro “sério”, procurando que este não fosse
interpretado como uma das suas histórias do mundo do Harry Potter. Outro caso são os
heterónimos, dos quais é impossível não referir Fernando Pessoa. Não analisamos um poema
do heterónimo Alberto Caeiro ou Álvaro de Campos da mesma forma que analisamos um do
ortónimo.
É importante referir aqui a distinção que Foucault faz entre o nome próprio e o NOME
DE AUTOR. O nome próprio refere-se à pessoa real, a um conceito abstrato que nos permite
transitar para o indivíduo exterior. Neste caso, é possível descobrir factos contraditórios com
aqueles que antes detínhamos sem que, no entanto, isso alguma vez prejudique a ideia da
entidade a que nos referimos. O mesmo não sucede com o NOME DE AUTOR. Se se descobrir
que, por exemplo, Shakespeare não escreveu os Sonetos, esse facto perturbará permanente e
irremediavelmente o funcionamento desse nome, pois este exerce uma FUNÇÃO
CLASSIFICATIVA, permitindo agrupar um conjunto de textos e que estes se relacionem entre
si, como já foi referido anteriormente.
«[…] o nome próprio e o nome de autor encontram-se situados entre os polos da descrição e da
designação»
Para além disso, nem todos os textos são passíveis de ter um AUTOR, exemplos disso
são cartas privadas ou listas de compras.
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