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Psicopedagogia das Aprendizagens Escolares

1. Qual é a especificidade das aprendizagens escolares?


2. Enfase na leitura e escrita.
a. O que é leitura?
b. Como se aprende a ler?
c. Dificuldades na leituras
3. Leitura como meio para estudar/compreender
4. Matemática

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Justifica-se falar em aprendizagem escolar?


Há uma aprendizagem que seja específica da escola?

APRENDIZAGEM ESCOLAR EM CAUSA


• Reproduz e contribui para as desigualdades sociais
(Bordieu & Passeron, 1970; Giroux, 1992; Young, 1971)
• Não responde às necessidades da sociedade, nomeadamente às do mercado de trabalho
(OCDE; European Comission, 2015; Fasih, 2008)

  Está desligada dos seus usos no mundo, retirando o conhecimento dos seus
contextos de origem (Brown, Collins, & Duguid, 1989)

 Atualmente o seu papel está diluído, dada a facilidade de acesso a múltiplas formas
de informação e de conhecimento que se traduz na possibilidade de crianças e
jovens aprenderem em qualquer lugar, através da internet, de videojogos, etc.
(Veen & Vrakking, 2006).

AS CRÍTICAS ANTERIORES TÊM CONDUZIDO A:

 Introduzir o contexto/meio na escola – aprendizagem a partir da experiência dos


alunos e de situações “reais”, de problemas quotidianos, projetos
 Diluir o papel da escola, atribuindo ao contexto/meio a responsabilidade da
aprendizagem – sala de aula invertida/ flipped classroom*
 a aprendizagem faz-se, em grande parte, fora das sala de aula, através de meios
tecnológicos

QUESTÕES

 É possível ter uma escola transformadora e não meramente reprodutora de uma


ordem social injusta?
 A escola tem uma função que é única e que se distingue da de outros meios
educativos, ou seja, há aprendizagens que cabem especificamente à escola e que
não são partilhadas por outros meios educativos informais ou não formais?

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É POSSÍVEL TER UMA ESCOLA TRANSFORMADORA E NÃO MERAMENTE REPRODUTORA DE
UMA ORDEM SOCIAL INJUSTA?
Young (2010a; 2010b)

 Necessidade de se valorizar o conhecimento e de se deslocar uma pedagogia


centrada na experiência do aluno para uma alicerçada em conteúdos disciplinares.
 Só um currículo baseado no conhecimento consagrado pelas áreas disciplinares
permitirá a superação da condição dos alunos provenientes dos meios mais
desfavorecidos, porque os pode levar além das suas vivências pessoais e locais.

A ESCOLA TEM UMA FUNÇÃO QUE É ÚNICA ?

 Bruner (1960, 1968)


o A escola é considerada como um dos fatores de desenvolvimento cognitivo
que depende, em grande parte, de uma educação formal e organizada.
o Ao proporcionar uma instrução desligada das situações concretas da vida,
de forma abstrata, a escola permite que o/a aluno/a se liberte da ação
imediata e alcance a capacidade de reflexão.

Psicologia Evolucionista da Educação (Geary, 2007, 2008)


Considera que há dois tipos de conhecimento:

 o intuitivo ou biologicamente primário


o essencial para sobrevivência da nossa espécie na evolução biológica;
 o explícito ou biologicamente secundário

AQUISIÇÃO

Conhecimento:
1. Intuitivo Primário
a. Não intencional
b. Inacessível o controlo consciente
c. Requer Recursos cognitivos mínimos
2. Explícito Secundário
a. Envolve Intenção
b. Requer Esforço
c. Envolve Recursos Cognitivos dispendiosos (Memória de Trabalho)

Motivação – A motivação para aprender é válida para o conhecimento primário, aprende-se


a brincar, mas não para o secundário, precisamente porque requer esforço.

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Os processos envolvidos na aprendizagem e no uso dos dois tipos de conhecimento são,
assim, de natureza diferente:

• conhecimento primário pode ser adquirido e desenvolvido em ambientes do dia a dia,


onde crianças, jovens e qualquer um de nós se pode envolver e aprender com um esforço e
orientação mínimos

• conhecimento secundário requer um ambiente instrucional organizado, intencional e uma


aprendizagem com esforço cognitivo (principalmente ao nível da memória de trabalho) -
escola

Linguagem
 Conhecimento primário
o Aprende-se forma intuitiva desde que haja emersão num ambiente de
falantes
 Conhecimento Secundário
o Aprendem-se intencionalmente e com uma ação concertada nesse sentido

 Fala
 Leitura e Escrita

APRENDIZAGEM ESCOLAR E ENSINO

Assim, a ideia de que se aprende da mesma maneira dentro e fora da escola não está
comprovada.

Admitindo que há aprendizagens que requerem esforço e que cabem especificamente à
escola, temos que admitir a necessidade de algum tipo de instrução.

Isto contraria a ideia de que vivemos no paradigma da aprendizagem e que desvaloriza o


ensino.

ENSINO

A afirmação de uma especificidade da aprendizagem escolar conduz, assim, à necessidade


de se repensarem as críticas à diretividade

Como vimos, a aprendizagem escolar exige orientação

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LEITURA E ESCRITA
PERSPETIVA MATURACIONISTA (DOMINANTE NOS ANOS 60 DO SÉCULO XX)

MATURIDADE para a leitura

momento ótimo para aprender a ler, i.e., quando estão reunidas as condições necessárias a
essa aprendizagem

Admite-se, assim, a existência de PRÉ-REQUISITOS à leitura - Festas (1982).

PRÉ-REQUISITOS

1. Percetivo-motores
a. Perceção visual: distinção de formas...
b. Perceção auditiva: distinção de sons...
c. Aspetos motores: mobilidade do olhar, articulação....
2. Estruturação espácio-temporal
a. Estabelecimento de relações entre as partes e o todo
b. Apreensão da ordem temporal e espacial (antes e depois; em cima e em
baixo)

1. Lateralidade
o noções de esquerda e direita
2. Esquema corporal
3. Maturidade sócio- emocional e física

AVALIAÇÃO DA MATURIDADE PARA A LEITURA

• Testes ABC de Lourenço Filho

• Bateria Preditiva de Inizan

INTERVENÇÃO

Desenvolvimento dos pré-requisitos

 Ao nível pré- escolar


 Em alunos com dificuldades/ dislexia

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DECLÍNIO DA NOÇÃO DE MATURIDADE
Críticas às teorias maturacionistas

RAZÕES TEÓRICAS

RAZÕES PRÁTICAS

• Experiências de aprendizagem precoce da leitura


• Fracasso dos programas de recuperação das dificuldades leitoras, com base no
desenvolvimento dos pré-requisitos

Fatores importantes na aprendizagem da leitura

1. Interesse pela leitura


a. A criança gosta de ler?
b. Importância do meio familiar e dos hábitos de leitura
2. Informação acerca da leitura
a. Das suas funções e situações (e.g., ler para estudar, como lazer, para
informar)
b. Acerca das suas características (e.g., distinguir palavra de letra, texto de
imagem)
c. Como se relacionam as linguagens oral e escrita, i.e., como é que a escrita
representa a linguagem oral

COMO SE RELACIONAM AS LINGUAGENS ORAL E ESCRITA

Na leitura há uma transformação de uma representação linguística em outra representação


também de natureza linguística, ou seja:

Palavra Escrita

Palavra Oral

Daqui que a leitura seja uma atividade de natureza psicolinguística

MECANISMO LEITURA Festas & Castro (2013)

É de natureza cognitiva e envolve os processos que permitem a IDENTIFICAÇÃO DE


PALAVRAS

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LEITURA

1. FUNÇÃO

o Compreensão

2. MECANISMO

o Identificação de palavras

IDENTIFICAÇÃO DE PALAVRAS PODE SER FEITA ATRAVÉS DE DOIS PROCESSOS

1. Fonológico (conversão grafemas- fonemas)

2. Ortográfico (reconhecimento das formas das palavras)

MECANISMO DA LEITURA

Dizendo o mecanismo de leitura respeito aos processos que permitem a identificação de


palavras, uma primeira questão que se coloca é a de saber o que está envolvido nessa
identificação no nosso sistema de escrita

ALFABÉTICO

EVOLUÇÃO DOS SISTEMAS DE ESCRITA

Passaram de uma representação de OBJETOS e de CONCEITOS para uma

representação FONOGRÁFICA

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Uso de sinais gráficos para representar a estrutura fonológica das palavras

SISTEMAS DE ESCRITA ATUAIS

Sistemas Fonográficos O Que é Representado

 Logográficos  Palavra

 Silábicos  Sílaba

 Alfabéticos  Fonema

ASSIM

A criança que aprende a ler, num sistema de escrita alfabética deve compreender duas
coisas fundamentais

• Que os grafemas representam unidades da linguagem

• Que essas unidades representam fonemas

CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA

(Morais, 1997)

CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA: Defior (1998); Viana (2002)


Habilidade para manipular intencionalmente segmentos da fala

1. Sílabas

2. Unidades intra-silábicas

3. Fonemas

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CONSCIÊNCIA FONÉMICA E LEITURA
(Morais, 1997, 2007, 2013)

Para aprender a ler é preciso aprender a associar grafemas e representações


conscientes dos fonemas

CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA E LEITURA


Evidência empírica da importância da consciência fonológica

• Conhecimento fonológico é preditor da leitura

• Treino fonológico + ensino de correspondências grafema-fonema traduz-se em efeitos


benéficos na aprendizagem

• Disléxicos têm dificuldades fonológicas


(cf. Morais, 1997, 2007, 2013)

CONSCIÊNCIA FONÉMICA

Necessidade de uma instrução explícita

1. Treino fonológico e fonémico

2. Métodos de iniciação à leitura que incidam no conhecimento das


correspondências grafema-fonema

MÉTODOS DE INICIAÇÃO À LEITURA

 MÉTODOS SINTÉTICOS - OS QUE COMEÇAM COM ELEMENTOS DA PALAVRA

o Com LETRAS - métodos alfabéticos

o Com SÍLABAS - métodos silábicos

o Com FONEMAS – métodos fónicos

 MÉTODOS ANALÍTICOS/GLOBAIS / VISUAIS

o Os que partem da PALAVRA

o Os que partem da FRASE

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 MÉTODOS MISTOS

IMPORTÂNCIA DO TIPO DE CÓDIGO ORTOGRÁFICO

CÓDIGOS ORTOGRÁFICOS

Diferem quanto

 Grau de transparência das correspondências grafema-fonema (um-para- um/ um-


para-muitos)

 Regras contextuais [e.g., (z) em posição intervocálica: “s” e “z”]

 Complexidades grafémicas [dígrafos (nh, lh, ch)]

 Sinais auxiliaresdeescrita:acentos,hífen

O CÓDIGO ORTOGRÁFICO PORTUGUÊS EUROPEU

 MAIS TRANSPARENTE do que o inglês e o francês

 MENOS TRANSPARENTE do que o espanhol e o italiano

 MENOS TRANSPARENTE do que o português do Brasil

INFLUÊNCIA DO GRAU DE TRANSPARÊNCIA

Aprendizagem da leitura mais difícil nas ortografias opacas do que nas transparentes
(Seymour, Aro, & Erskine, 2003)

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Leitura de palavras no final do 1º ano:
• 100% língua alemã
• 80% língua portuguesa
• 70% língua francesa
• 40% língua inglesa

CONVERSÕES REGULARES E IRREGULARES (LEITURA)

 Regulares: relação grafema-fonema de um-para- um

o Ex.: [t] é sempre “t”

 Irregulares: relação grafema-fonema de um-para- muitos

IRREGULARIDADES NO PORTUGUÊS (Leitura)

 “x”
o [S*]caixa
o [s] máximo
o [z] exército
o [ks] complexidade
 “qu/gu” antes de “e” ou “i” que, umas vezes se lê [k/g] e, outras, [ku/gu]
o Ex.: guia vs. Arguido
 As vogais “o” e “e” que, uma vezes, são fechadas e, outras vezes, são abertas
o Ex.: rede vs. leque
 usa-se o sistema de anotação UNIBET (Castro & Gomes, 2000, p. 228)

REGRAS DE CONTEXTO (Leitura)

Exemplos

 “s” em posição intervocálica lê-se [z] (casa)


 “c” antes de “e” e de “i” lê-se [s] (cedo)

IDENTIFICAÇÃO DE PALAVRAS

1. Conversão grafemas/ fonemas - decodificação

2. Identificação das formas ortográficas das palavras – reconhecimento automátio

ERROS DE LEITURA - EVOLUÇÃO ESPERADA

Erros Exemplos

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Globais (as palavras são substituídas por gola em vez de gato
outras visualmente parecidas)

Fonológicos (conversões inadmissíveis) bise em vez de bife

De contexto kinto em vez de cinto

Conversões irregulares eSame em vez de ezame

(Castro & Gomes, 2000, pp.135-139)

ESCRITA
DIFERENTES EXIGÊNCIAS DA LEITURA E DA ESCRITA

LEITURA

1. Procedimento de reconhecimento

2. Maior consistência grafema-fonema

3. Síntese de fonemas

ESCRITA

1. Procedimento de procura e de tomada de decisão

2. Menor consistência fonema-grafema

3. Análise de fonemas

4. Execução motora

MENOR CONSISTÊNCIA NA ESCRITA DO QUE NA LEITURA

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CONVERSÕES REGULARES E IRREGULARES (ESCRITA)

 Regulares: relação fonema-grafema de um-para- um

o Ex.: [t] é sempre “t”

 Irregulares: relação fonema-grafema de um-para- muitos

IRREGULARIDADES NO PORTUGUÊS EUROPEU

ESCRITA

 [s] em posição intervocálica:

o “ss” (pressa),”ç” (taça), “x” (auxiliar)

 [s] em início de palavra antes de “e” e de “i”: “s” (selva) ou por “c” (cedo)

 [z] em posição intervocálica: “s” (caso), “z” (azo), “x” (exame)

 [S]: “x” (caixa), “ch” (chave)

 [Z]: “g” (gesto), “j” (jeito)

IRREGULARIDADES NO PORTUGUÊS ESCRITA

 Fonema mudo “h” (homem)

 [O] e [o] com ou sem acento (e.g., côdea, miolo)

 [E] e [e] com ou sem acento (e.g., grémio, congresso)

COMPLEXIDADES GRAFÉMICAS

ESCRITA Exemplo:
dígrafos (nh, lh, ch)

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SINAIS AUXILIARES DE ESCRITA

ESCRITA Exemplo:

 acentos, hífen

ERROS DE ESCRITA - EVOLUÇÃO ESPERADA

(Castro & Gomes, 2000, pp. 157-158)

Erros Exemplos

Globais (as palavras são substituídas por cem em vez de sangue


outras visualmente parecidas)

Fonológicos (conversões inadmissíveis) consenho em vez de conselho

De contexto chece em vez de cheque

Conversões irregulares geito em vez de jeito

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