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Fichamento

Obra: Sobre a violência


Autora: Hannah Arendt
II CAPÍTULO
“Quando a cidade-Estado ateniense denominou sua Constituição uma isonomia, ou
quando os romanos falaram de uma civitas, tinham em mente um conceito de poder e de
lei cuja essência não se assentava na relação de mando -obediência e que não
identificava poder e domínio ou lei e mando” (ARENDT, 2010d,p.57).
“Foi para esses exemplos que os homens das revoluções se voltaram quando
vasculharam os arquivos da Antiquidade e constituíram uma forma de governo, uma
república, em que o domínio da lei, assentado no poder do povo, poria fim ao domínio
do homem sobre o homem, o qual eles pensavam ser um governo próprio a escravos”
(ARENDT, 2010d, p.57).
“É apoio do povo que confere poder às instituições de um país, e esse apoio não é mais
do que a continuação do consentimento que trouxe as leis à existência” (ARENDT,
2010d,p.57).
“Todas as instituições políticas são manifestações e materializações do poder; elas se
petrificam e decaem tão logo o poder vivo do povo deixa de sustentá-las. (ARENDT,
2010d,p.57). Isso quer dizer que um governo constitucional se assentam na opinião, no
discurso e na persuasão.
“De fato, uma das mais óbvias distinções entre poder e violência é que o poder sempre
depende dos números, enquanto a violência, até certo ponto, pode operar sem eles,
porque se assenta em implementos” (ARENDT, 2010d, p.58).
A violência se fundamenta no uso de instrumentos.
Poder e violência não são fenômenos idênticos, e equipará-los é um atestado de
desconhecimento das realidades políticas as quais eles correspondem.
“Somente quando os assuntos públicos deixam de ser reduzidos à questão do domínio é
que as informações originais no âmbito dos assuntos humanos aparecem, ou antes
reaparecem, em sua autêntica diversidade” (ARENDT, 2010d, p.60).
“O poder correspondente à habilidade humana não apenas para agir, mas também para
agir em concerto. O poder nunca é propriedade de um indivíduo; pertence a um grupo e
permanece em existência apenas enquanto o grupo se conserva unido. Quando dizemos
que alguém está ‘no poder’, na realidade nos referimos ao fato de que ele foi empossado
por um certo número de pessoas para agir em seu nome” (ARENDT, 2010d, p.60-61).
Essas distinções não correspondem a compartimentos estanques do mundo real.
“Onde os comandos não são mais obedecidos, os meios da violência são inúteis e a
questão dessa obediência não é decidida pela relação de mando e obediência, mas pela
opinião e, por certo, pelo número daqueles que a compartilham. Tudo depende do
poder por trás da violência. A ruptura súbita e dramática do poder que anuncia as
revoluções revela em um instante quanto a obediência civil – às leis, aos governantes, às
instituições – nada mais é do que a manifestação externa do apoio e do consentimento”
(ARENDT, 2010d, p.66).
“Jamais existiu governo exclusivamente baseado nos meios da violência. Mesmo o
domínio totalitário, cujo principal instrumento de dominação é a tortura, precisa de uma
base de poder – a polícia secreta e sua rede de informantes” (ARENDT, 2010d, p.67).
“Homens sozinhos, sem outros para apoiá-los, nunca tiveram poder suficiente para usar
da violência com sucesso” (ARENDT, 2010d, p.68).
“O poder é de fato a essência de todo governo, e não a violência. A violência é por
natureza instrumental; como todos os meios, ela sempre depende da orientação e da
justificação pelo fim que almeja. E aquilo que necessita de justificação por outra coisa
não pode ser a essência de nada” (ARENDT, 2010d, p.68).
O poder é um fim em si mesmo
“Mas a própria estrutura de poder precede e supera todas as metas, de sorte que o poder,
longe de ser o meio para um fim, é de fato a própria condição que capacita um grupo de
pessoas a pensar e a agir em termos das categorias de meios e fins” (ARENDT, 2010d,
p.69).
“O poder não precisa de justificação, sendo inerente à própria existência das
comunidades políticas; o de que ele realmente precisa é legitimidade” (ARENDT,
2010d, p.69).
“O poder existe onde quer que as pessoas se unam e ajam em concerto, mas sua
legitimidade deriva mais do estar junto inicial do que de qualquer ação que não se possa
seguir” (ARENDT, 2010d, p.69).
A violência pode ser justificada, mas nunca será legítima.
“A equação ordinária entre violência e poder se assenta na compreensão do governo
como a dominação do homem pelo homem por meio da violência” (ARENDT, 2010d,
p.70).
“Se um conquistador externo se confronta com um governo impotente e com uma nação
desacostumada ao exercício do poder político, é fácil para ele conseguir tal dominação”
(ARENDT, 2010d, p.70).
“A violência sempre pode destruir o poder; do cano de uma arma emerge o comando
mais efetivo, resultando na mais perfeita e instantânea obediência. O que nunca
emergirá daí é o poder” (ARENDT, 2010d, p.70).
“O domínio pela pura violência advém de onde o poder está sendo perdido” (ARENDT,
2010d, p.71).
“Onde a violência não mais está escorada e restringida pelo poder, a tão conhecida
inversão no calculo dos meios e fins faz-se presente. Os meios, os meios da destruição,
agora determinam o fim – com a consequência de que o fim será a destruição de todo o
poder” (ARENDT, 2010d, p.72).
“O terror não é o mesmo que a violência; ele é, antes, a forma de governo que advém
quando a violência, tendo destruído todo o poder, em vez de abdicar, permanece com
controle total. Tem sido observado que a eficiência do terror depende quase totalmente
do grau de atomização social. Toda forma de oposição organizada deve desaparecer
antes que possa ser liberada a plena força do terror” (ARENDT, 2010d, p.72).
“A diferença decisiva entre a dominação totalitária, baseada no terror, e as tiranias e as
ditaduras, estabelecidas pela violência, é que a primeira investe não apenas contra seus
inimigos, mas também contra seus amigos e apoiadores, temendo todo poder, mesmo o
poder de seus amigos. O ápice do terror é alcançado quando o Estado policial inicia a
devorarão de suas próprias crias, quando o executante de ontem se torna a vítima de
hoje. E esse é também o momento em que o poder desaparece completamente”
(ARENDT, 2010d, p.73).
“Poder e violência são opostos; onde um domina absolutamente, o outro está ausente. A
violência aparece onde o poder está em risco, mas deixada a seu próprio curso, conduz à
desaparição do poder” (ARENDT, 2010d, p.73).
III CAPÍTULO
“Embora a mortalidade humana- o fato de que os homens são ‘mortais’, como os
gregos o diziam – fosse compreendida como o mais forte motivo para a ação política no
pensamento político pré-filosófico. Era a certeza da morte que fazia que os homens
procurassem a fama imortal em feitos e palavras e os instigava a estabelecer um corpo
político potencialmente imortal. Desse modo, a política era precisamente um meio de
escapar da igualdade diante da morte para uma distinção que assegurasse alguma
medida de imortalidade” (ARENDT, 2010d, p.87).
O perigo da violência é de que os meios se sobrepõem ao fim. “Se os objetivos não são
alcançados rapidamente, o resultado será não apenas a derrota, mas a introdução da
prática da violência na totalidade do corpo político. A ação é irreversível, e um retorno
ao status quo em caso de derrota é sempre improvável. A prática da violência, como
toda ação, muda o mundo, mas a mudança mais provável é para um mundo mais
violento” (ARENDT, 2010d, p.101).
“Quanto maior é a burocratização da vida pública, maior será a atração pela violência”
(ARENDT, 2010d, p.101).
“Em uma burocracia plenamente desenvolvida não há ninguém a quem se possa
inquirir, a quem se possam apresentar queixas, sobre quem exercer as pressões do
poder. A burocracia é a forma de governo na qual todas as pessoas estão privadas da
liberdade política, do poder de agir; pois o domínio de ninguém não é um não domínio,
e onde todos são igualmente impotentes temos uma tirania sem tirano” (ARENDT,
2010d, p.101).
“A transformação do governo em administração, ou das repúblicas em burocracias, e o
desastroso encolhimento da esfera pública que as acompanhou têm uma longa e
complicada história ao longo da época moderna; e esse processo tem sido
consideravelmente acelerado durante os últimos cem anos por meio do surgimento das
burocracias partidárias”. (ARENDT, 2010d, p.102).
“O que faz do homem o homem um ser político é sua faculdade para ação; ela o
capacita a reunir-se com seus pares, a agir em concerto e a almejar objetivos e
empreendimentos que jamais passariam por sua mente, para não falar nos desejos de seu
coração, se a ele não tivesse sido concedido esse dom – o de aventurar-se em algo
novo” (ARENDT, 2010d, p.102).
“Filosoficamente falando, agir é a resposta humana para a condição da natalidade. Posto
que todos adentramos o mundo em virtude do nascimento, como recém-chegados e
iniciadores, somos aptos a começar algo novo; sem o fato do nascimento jamais
saberíamos o que é a novidade e toda ‘ação’ seria ou mero comportamento ou
preservação. Nenhuma outra faculdade, a não ser a linguagem – e não a razão ou a
consciência –, distingue-nos tão radicalmente de todas as espécies animais. Agir e
começar não são o mesmo, mas são intimamente conexos” (ARENDT, 2010d, p.102).
“Nem a violência nem o poder são fenômenos naturais, isto é, uma manifestação do
processo vital; eles pertencem ao âmbito político dos negócios humanos, cuja qualidade
essencialmente humana é garantida pela faculdade do homem para agir, a habilidade
para começar algo novo” (ARENDT, 2010d, p.103).
“E penso que pode ser demonstrado que nenhuma outra habilidade humana sofreu tanto
com o progresso da época moderna, pois o progresso, como viemos a entendê-lo,
significa crescimento, o processo implacável de ser mais e mais, maior e maior. Quanto
maior torna-se um país em termos populacionais, de objetivos e de posses, tanto maior
será a necessidade de administração e, com ela, o poder anônimo dos administradores”
(ARENDT, 2010d, p. 103).
Para Arendt, a “presente glorificação da violência é causada pela severa frustração da
faculdade de ação mo mundo” (ARENDT, 2010d, p.1014).
“Qualquer que sejam as vantagens e desvantagens administrativas da centralização, seu
resultado político é sempre o mesmo: a monopolização do poder causa o ressecamento
ou o esgotamento de todas as fontes autenticas de poder no país” (ARENDT, 2010d,
p.1014).

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