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Economia
Investimentos
O colchão do crescimento
por Ricardo Carneiro e Guilherme Mello* — publicado 20/04/2017 14h22, última modificação
20/04/2017 14h25
https://www.cartacapital.com.br/economia/o-colchao-do-crescimento 1/7
13/09/2018 O colchão do crescimento — CartaCapital
A utilização das reservas internacionais para financiar investimentos no País tem despertado
controvérsias no debate econômico brasileiro. Este texto pretende contribuir para esta discussão,
explicitando e fundamentando uma postura favorável a sua utilização parcial. Para abordar o
problema, há três questões inter-relacionadas que precisam ser analisadas: a primeira diz respeito
a se o Brasil deve usar as reservas, ou ao menos parte delas; a segunda discute quanto das
reservas pode ser usado, sem acarretar riscos de escassez de divisas ou volatilidade cambial; a
terceira analisa como as reservas devem ser usadas, com o objetivo de maximizar seu impacto no
financiamento do desenvolvimento.
Para responder a esta pergunta é imprescindível discutir qual o papel cumprido por elas, e porque
são necessárias. Elas constituem uma espécie de “pedágio” para os países de moeda
inconversível se inserir na globalização financeira. São elas que garantem aos proprietários dos
capitais que adentram um país a segurança de que os seus investimentos podem ser retirados e
convertidos em moeda forte a qualquer momento. Ou seja, são uma espécie de seguro para os
investidores, tão mais importante quanto mais aberta a economia e piores os seus indicadores
econômicos.
Outro ponto que deve ser entendido é que, para cumprir sua função precaucional, elas devem ter
dois atributos: o da segurança ou baixo risco e o da liquidez, ambos implicando uma baixa
rentabilidade. Não é por outra razão que os títulos do Tesouro dos EUA são seu lastro privilegiado.
Aqui também é importante ressaltar que, normalmente, para países de moeda inconversível, as
taxas de juros pagas na dívida pública são sempre superiores àquelas das reservas.
É também uma forma de financiamento muito mais barata do que a emissão de nova dívida
doméstica, que possui custo em torno da Selic. Por fim, é uma operação neutra do ponto de vista
dos estoques de dívida – bruta e líquida –, pois implica tão somente uma mudança da composição
dos ativos do setor público: de títulos do tesouro americano para títulos domésticos, públicos ou
preferencialmente, privados.
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13/09/2018 O colchão do crescimento — CartaCapital
Como vimos, manter certo montante de reservas por razões precaucionais é necessário e ele é
idealmente tanto maior quanto mais ampla a abertura financeira de um país e mais fraca a sua
moeda na hierarquia monetária internacional. Assim, o valor adequado das reservas guarda uma
relação estreita e prioritária com o estoque de investimentos estrangeiros e com os eventuais
choques de comércio exterior.
A publicação recente pela Instituição Fiscal Independente (IFI) do Estudo “Reservas internacionais
do Brasil: evolução, nível adequado e custo de carregamento” , permite retomar com mais
informações e segurança a discussão de qual o nível adequado de reservas e se há ou não um
excesso das mesmas no caso brasileiro.
Este trabalho realiza um exame minucioso sobre qual seria o nível seguro do montante das
reservas. Utiliza critérios que vão dos menos restritivos, baseados apenas nos fluxos de comércio,
aos mais restritivos, que incorporam estoques de ativos financeiros com alta liquidez e capazes de
pressionar o mercado de divisas para além das operações correntes e regulares.
A conclusão é bastante sugestiva: mesmo utilizando-se os critérios mais restritivos, o dos Meios
de Pagamentos Ampliados, ou o Assessing Reserve Adequacy (ARA) do Fundo Monetário
Internacional, se chega à conclusão da existência de um excesso de reservas.
O Brasil possui cerca de 380 bilhões de dólares de reservas no conceito de liquidez. Excluindo-se
desse valor as linhas de curto prazo concedidas aos bancos que não possuem liquidez imediata,
no valor aproximado de 7 bilhões, chega-se as reservas no conceito de caixa, de 373 bilhões.
Utilizando-se ademais de um conceito ultra restritivo de reservas líquidas, do qual se exclui o valor
nocional dos swaps cambiais**, 26 bilhões, chega-se a um montante de reservas de 347 bilhões.
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Como apontado acima, usando-se uma média dos critérios mais duros de requisito de reservas,
(10% do M3 + dívida de curto prazo e o ARA 150% do FMI), chega-se a um valor de 320 bilhões
de dólares e a um excesso de reservas de 27 bilhões. Esses recursos seriam inteiramente
dispensáveis, podendo ter uso alternativo sem comprometer a função precaucional das reservas.
Se a conclusão obtida é a de que existe um excesso de reservas, o uso desse excedente é uma
questão relevante, desde logo, por conta do custo de carregamento das mesmas, cujo valor para
o total das reservas em 2017 estaria próximo a 2% do PIB, montante equivalente ao déficit
primário deste ano.
Na discussão de como usar esses recursos excedentes, o trabalho do IFI retoma o mito ortodoxo
que propõe uma dicotomia para o uso dos recursos: incorporar ao orçamento e gastá-lo ou pré-
pagar a dívida pública doméstica. Em princípio, o segundo uso seria mais racional, pois reduziria a
dívida bruta, mantendo a líquida constante, mas o seu impacto é relativamente pequeno. A
segunda alternativa, pensada com o uso em investimentos(excluindo, portanto, gastos correntes)
aparece como inferior, dadas as regras de contabilidade pública.
Ou seja, a não contabilização dos investimentos como ativos levaria a um aumento na dívida
líquida, mantendo a bruta constante, a despeito de estimular a economia de maneira muito mais
previsível do que a primeira alternativa.
Há outra opção para o uso do excedente de reservas que possui diversas vantagens sobre
aquelas discutidas acima: trata-se da constituição de um fundo para financiamento da
infraestrutura, em reais, com os recursos excedentes das reservas. Essa alternativa reduz o custo
total de carregamento das reservas, é neutra no que tange ao impacto sobre o montante das
dívidas, (bruta ou líquida) e, ademais, impulsiona o crescimento, permitindo uma ampliação
alavancada do financiamento.
O fundo proposto acima, de propriedade do Tesouro Nacional, como aliás são as reservas, seria
constituído incialmente pelas reservas excedentes, que seriam convertidas paulatinamente em
reais para subscrição de títulos emitidos pelo setor privado, as denominadas debêntures de
infraestrutura.
Esses títulos, emitidos pelo setor privado, no caso os concessionários dos serviços públicos,
constituiriam um ativo seguro, pois além de lastreados no fluxo de caixa dos projetos, devem
contar com garantia adicional de fundos garantidores. A sua taxa de retorno, por sua vez, poderia
estar ligeiramente acima da Selic. Inicialmente instituído com caráter fechado, este fundo poderia
ter, no futuro, suas cotas negociadas com o público, e receber funding do setor privado permitindo,
inclusive, a saída do Tesouro.
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b) Melhora das finanças públicas: o custo de rolagem da dívida pública como um todo seria
reduzido, em razão da substituição de parte das reservas internacionais pelos ativos do fundo,
com rentabilidade substancialmente maior, reduzindo a taxa implícita. Ademais, a saída do
Tesouro após a consolidação do fundo poderia gerar ganhos de capital substanciais.
Devido a este conjunto de vantagens, acreditamos que a constituição deste fundo é uma forma
adequada de financiar o investimento, gerando uma fonte de demanda autônoma que não
pressiona a dívida pública, e ao diminuir a carga líquida de juros, reduz o déficit público.
** É discutível excluir o montante correspondente ao valor nocional dos swaps cambiais das
reservas líquidas, como faz o documento da IFI. Isto porque a despeito dos swaps serem um
substituto das reservas, na medida em que atendem uma demanda por dólares, a liquidação de
seu resultado se faz em reais.
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