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O que aconteceu neste último ano prova que as epidemias já não são forças
incontroláveis da Natureza. Na guerra entre humanos e patógenos, nunca
os humanos tinham sido tão poderosos
Porque é que houve tanta morte e sofrimento, então? Por causa de más
decisões políticas.
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Com a covid-19 foi muito diferente. Os primeiros sinais de alarme sobre
uma potencial nova epidemia começaram a ouvir-se no fim de dezembro
de 2019. A 10 de janeiro de 2020, cientistas tinham não só isolado o vírus
responsável como sequenciado o seu genoma e publicado a informação
online. Em poucos meses ficou claro que medidas podiam retardar e parar
as cadeias de infeção. Em menos de um ano, diversas vacinas eficazes
estavam a ser produzidas em massa. Na guerra entre humanos e
patógenos, nunca os humanos tinham sido tão poderosos.
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fome. Se se disser para virem e colherem, poderão infetar-se uns aos
outros. O que fazer?
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sem humanos mantêm a economia mundial a funcionar. Se o turismo
internacional caiu a pique em 2020, o volume do comércio marítimo global
desceu apenas 4%.
A INTERNET AGUENTA-SE
Claro que os humanos permanecem seres físicos e nem tudo pode ser
digitalizado. O ano covid pôs em relevo o papel crucial de muitas profissões
mal pagas na manutenção da civilização humana: enfermeiras,
trabalhadores do lixo, camionistas, funcionários de caixa, pessoal de
entregas... Diz-se frequentemente que cada civilização está só a três
refeições de distância da barbaridade. Em 2020, os trabalhadores de
entregas foram a barreira fina que segurou a civilização. Tornaram-se as
nossas ligações vitais ao mundo físico.
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Vacina Centro de vacinação improvisado na catedral de Salisbury, no Reino
Unido Finnbarr Webster/Getty Images
Mal paramos para pensar nisso, mas devíamos pensar. Depois de 2020,
sabemos que a vida pode continuar mesmo quando um país inteiro está em
confinamento físico. Agora tentem imaginar o que aconteceria se a nossa
infraestrutura digital colapsasse.
O QUE CONTA?
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devemos sempre perguntar: “O que é que contamos? Quem decide o que
contar? Como avaliamos uns números contra os outros?” Isto é uma tarefa
política, não científica. São os políticos que têm de equilibrar as
considerações médicas, económicas e sociais e produzir uma política
abrangente.
Isto é uma tarefa política, não científica. São os políticos que têm de
equilibrar as considerações médicas, económicas e sociais e produzir uma
política abrangente
Três regras básicas podem fazer muito para nos proteger de ditaduras
digitais, mesmo em tempo de praga. Primeiro, sempre que se recolherem
dados de pessoas — em especial sobre o que está a acontecer dentro dos
seus corpos —, esses dados devem ser usados para ajudar essas pessoas
e não para manipulá-las, controlá-las ou fazer-lhes mal. O meu médico
pessoal sabe muitas coisas extremamente privadas de mim, mas isso não
me incomoda, pois confio que só utilizará esses dados em meu benefício.
O meu médico não deve vender esses dados a nenhuma corporação ou a
um partido político. O mesmo se deve aplicar a qualquer tipo de “autoridade
de vigilância na pandemia” que possamos estabelecer.
Segundo, a vigilância deve ter sempre dois sentidos. Se for só de cima para
baixo, é um caminho aberto para a ditadura. Sempre que aumentar a
vigilância dos indivíduos, deve aumentar em simultâneo a vigilância dos
governos e também das grandes empresas. Por exemplo, na atual crise, os
governos estão a distribuir quantidades extraordinárias de dinheiro. O
processo de alocação de fundos deve tornar-se mais transparente.
Enquanto cidadão, quero ter facilidade em ver quem recebe o quê e quem
decidiu para onde vai o dinheiro. Quero garantir que ele vai realmente para
empresas que precisam e não para uma grande corporação cujos donos
são amigos de um ministro. Se o Governo disser que é demasiado
complicado estabelecer tal sistema de monitorização no meio de uma
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pandemia, não acreditem. Se não é demasiado complicado começar a
monitorizar o que você faz, também não é demasiado complicado começar
a monitorizar o que o Governo faz.
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No Reino Unido, o Governo ao início pareceu estar mais preocupado com o
‘Brexit’ do que com a covid-19. Não obstante todas as suas políticas
isolacionistas, a Administração Johnson não conseguiu isolar a Grã-
Bretanha da única coisa que realmente importava: o vírus. A minha terra
natal, Israel, também sofreu com a má gestão política. Tal como acontece
com Taiwan, Nova Zelândia e Chipre, Israel é efetivamente um “país ilha”,
com fronteiras fechadas e uma única porta principal de entrada — o Aero-
porto Ben Gurion. Porém, no auge da pandemia, o Governo de Netanyahu
deixou que os viajantes passassem pelo aeroporto sem fazer quarentena
ou mesmo testes adequados e negligenciou aplicar as suas próprias
políticas de confinamento.
ESTRANGEIROS EM SOCORRO
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chave que mostrou a eficácia de medidas de confinamento foi realizado em
conjunto por investigadores de nove instituições — uma no Reino Unido,
três na China e cinco nos Estados Unidos.
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de pessoas na Índia, no Brasil ou na África do Sul... Uma nova mutação
numa remota cidade brasileira poderá tornar ineficaz a vacina e resultar
em mais uma onda de infeções.
Segundo: cada país deve investir mais no seu sistema público de saúde;
isto parece evidente, mas os políticos e os eleitores às vezes conseguem
ignorar a lição mais óbvia.
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monitorizar riscos potenciais, emitir alertas e orientar a investigação e o
desenvolvimento.
Muitas pessoas acham que a covid-19 marca o início de uma onda de novas
pandemias. Mas, se as lições antes referidas forem implementadas, o
choque da covid-19 pode na verdade fazer com que as pandemias se
tornem menos comuns. A Humanidade não pode evitar o aparecimento de
patógenos novos. Este é um processo evolucionário natural que já tem
milhares de milhões de anos e que vai continuar no futuro. Mas a
Humanidade tem hoje o conhecimento e as ferramentas necessárias para
impedir que um novo patógeno se espalhe e se torne uma pandemia.
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