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Caso prático n.

º 1

a) Teodora (A) é proprietária de uma garrafa antiga de vinho do Porto, a única que
sobra de certa colheita. Vendeu-a pelo telefone a Teodorico (B) , que ficou de vir buscá-
la no dia seguinte. De manhã, porém, vendeu-a de novo a Teodósio (C), que a levou.
Pode Teodorico (B) exigi-la a Teodósio (C)?

 Estamos perante um contrato de compra e venda (artigo 874 e seguinte do


CC)
 Como efeitos, presentes no artigo 879, vemos a transmissão da propriedade,
pagamento do preço e entrega da coisa
 Direito das obrigações segue princípio do consensualismo, bastando a
formação do contrato para transmissão da propriedade (artigo 408/1). Com
o consenso temos efeito da transmissão da propriedade
 A propriedade da garrafa transferiu-se de A para B no momento da
conclusão do contrato ou seja, no telefonema
 Então a compra e venda da garrafa de A para C no dia seguinte será nula,
sendo uma compra e venda de bem alheio, na medida que A já não detém
propriedade da garrafa (892)
 Resposta: Sim o B pode exigir a garrafa a C, pois detém direito de
propriedade sobre a garrafa

b) Teodora (A) é proprietária de duas garrafas antigas de vinho do Porto, as


únicas que sobram de certa colheita. Vendeu «uma delas» (sic) pelo telefone
a Teodorico (B), que ficou de vir buscá-la no dia seguinte. De manhã,
porém, vendeu ambas a Teodósio (C), que as levou. Pode Teodorico (B)
exigir uma delas a Teodósio (C) ?
 Estamos perante um contrato de compra e venda (artigo 874 e seguinte do
CC). Sendo o objeto deste contrato uma garrafa de vinho do Porto de uma
colheita em específico
 Há duas garrafas dessas, e B não especificou qual delas (uso do termo “uma
delas”, interpretar o termo e identificar no artigo indefinido uma
indeterminação do objeto), identificando só o género e a quantidade
requerida – estamos perante obrigações genéricas
 Obrigações genéricas (artigos 539 a 542)
 Perante prestação indeterminada, a propriedade só se transmite com a
determinação da coisa (artigo 408/2, exceção ao princípio do
consensualismo)
 Desta forma A tem um direito de crédito, e não de propriedade, sendo o seu
direito de crédito cumprido com a concentração/determinação do objeto do
contrato (para haver transmissão da propriedade)
 Na manhã realiza contrato de compra e venda (A e C) pelas duas garrafas.
Sendo que só havendo essas duas, a obrigação concentrou-se (preenche um
dos casos de concentração previstos no artigo 541º) e como tal determinou-
se e a propriedade transmite-se para C (artigo 408/2). NOTA QUE
PODEMOS ESTAR DESDE O INICIO PERANTE UMA CONTRATO DE
COMPRA E VENDA DE BENS MÓVEIS DETERMINADOS, teremos de
interpretar o negócio e as declarações negociais para determinar se a
obrigação é genérica ou não (mencionada pelo género e quantidade)
 B no dia a seguir não tem as garrafas. Ora A tem obrigação para o B, sendo
que o perecimento das mesmas coisas na sua esfera jurídica não resolve o
contrato (ele tem a obrigação de dar a garrafa). Não estamos perante
nenhum caso do 541 de concentração
 Então B terá de arranjar maneira de cumprir com a sua obrigação
(recompra uma garrafa a C, mesmo se o custo for mais elevado) sob pena
de entrar em incumprimento da obrigação
 Resposta : B não pode exigir a C, mas pode exigir a A o cumprimento da
sua obrigação

Caso prático nº3

Alípio Noronha, rico, mora num imponente palácio lisboeta. Ali perto, costuma
parar o indigente Belmiro, um sem-abrigo. Belmiro aceita todos os trabalhos que lhe
aparecem — mas que são poucos, porque Belmiro padece de uma deficiência física
incapacitante —, é sempre extremamente bem educado para com quem passa e, uma
vez, salvou a filha de Alípio de ser atropelada, puxando-a da estrada em que caíra.
Alípio nunca o auxiliou. Certo dia, Belmiro veio pedir dinheiro a Alípio para minorar a
fome que passava. Tem Alípio a obrigação natural — no sentido dado em direito civil
— de ajudar Belmiro? Suponha que Alípio entrega €1000 a Belmiro dizendo: «Toma!
Mereces isto ou mais!» Houve aqui uma doação?
o O regime das obrigações naturais está presente no artigo 402º a 404º
do CC, indicando que a obrigação natural é toda a obrigação que se funda
num mero dever de ordem moral ou social, cujo cumprimento não é
judicialmente exigível, correspondendo a um dever de justiça
o A característica fundamental é o facto de não ser judicialmente
exigível. Depois a doutrina procura desenvolver o conceito:
 Almeida Costa – dever de ordem moral deve-se aproximar de um
dever de justiça
 Antunes Varela – matriz seria constituída pelo dever de justiça,
sendo o dever moral ou social específico entre duas pessoas
 Menezes Cordeiro – a justiça envolve moralidade. Ou seja, combinar
ideia de moralidade a uma juridicidade fundada na justiça (afirma
haver assim uma coercibilidade diminuída)
o Ter em atenção regra do artigo 403º - não há a repetição do
individuo no caso de cumprimento (modalidade de enriquecimento sem
causa), exceto se o devedor não tiver capacidade para prestar
o Iremos aplicar às obrigações naturais, as regras civis (artigo 404º)
excetuando em caso de haver lei especial
o A doutrina indica-nos que os casos de obrigações naturais, estão
todos presentes na lei, sendo que a lista é a seguinte:
 Divida prescrita – é um dever moral por si duvidoso, pois
passados 20 anos o sentir social dirá que é justo não pagar ao
abrigo da prescrição
 Dividas de jogo – são obrigações desde que derivem de contrato
licito, válidos, não havendo fraude na sua execução e não haja
legislação especial em contrário.
 Prestação de alimentos (495/3) –
 Dever dos pais de darem aos filhos parte dos proventos por estes
angariados pelo trabalho autorizado (1895/2)
 Fiança dada a incapaz
 Cumprimento, pelo fiador, de divida prescrita – subcaso da divida
prescrita (636/3)
 Pagamento de dividas remitidas por credores concordatários
 O caso apresentado não nos remete para nenhum destes casos, então não
estamos perante uma obrigação natural (A não tem nenhuma obrigação
natural perante B). não sendo um obrigação natural, questionamos se
estamos perante uma doação:
 Há o enriquecido e um outro empobrecido
 Há transferência patrimonial de uma esfera para a outra
 Há espirito de liberalidade no ato (este é o requisito questionável,
teremos de interpretar o caso e as falas deles)

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