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A ANÁLISE DA TIPICIDADE: A IMPUTAÇÃO PENAL

® O tipo de ilícito penal contempla duas dimensões: (1) o tipo de ilícito objetivo; (2) o tipo de ilícito subjetivo;

® Tipo objetivo: engloba todos os aspetos que se têm de verificar independentemente da vontade do sujeito, ou seja, o sujeito, o objeto da ação, das
modalidades de execução do facto, o processo causal e o resultado.

® Tipo subjetivo: corresponde aos aspetos da direção da vontade do sujeito que revelem as espécies de dolo ou as especiais intencionalidades exigidas pelo
tipo legal de crime;

A RELEVÂNCIA DA IMPUTAÇÃO
Equiparar o facto concreto aos aspetos descritos no tipo penal não é, apenas, uma análise comparativa

A verificação da tipicidade implica um juízo de imputação: de atribuição, ao agente, do facto.

Esta atribuição é bidimensional (supra): implica uma imputação objetiva e uma imputação subjetiva.

O QUE É A IMPUTAÇÃO?
Consiste na atribuição do facto à esfera de controlo ou poder do agente [Fernanda Palma].
A IMPUTAÇÃO OBJETIVA
TEORIAS DA IMPUTAÇÃO CONTEÚDO PROBLEMAS

• Teoria da conditio sine quo non: para que haja causalidade é


• Não oferece uma solução para
preciso que a eliminação hipotética da conduta do agente tenha
determinados casos (1).
como consequência a não verificação do resultado.

• Excessivo apelo às leis da experiência/base


• Teoria da condição conforme às leis naturais: a causalidade
estatística ou probabilística (baseia-se
CAUSALIDADE está dependente de saber se uma ação é acompanhada por
numa comprovação probabilística da
Inicialmente, esgotava o modificações no mundo exterior que se encontram vinculadas a
causalidade).
conteúdo da imputação essa ação de acordo com as leis da natureza e são constitutivas
• Abrangência exagerada: não faz seleção
penal (Von Lizst e Belling). de um resultado típico. Remete para as leis da natureza
entre causas.
Justificação: a verificação (causalidade estabelecida segundo as leis da natureza).
• Plano puramente descritivo.
da tipicidade pressupõe
que o facto descrito na
norma estabeleça uma • Verdadeira teoria de imputação: pressupõe a causalidade, para • Oferece solução para as situações de
relação de causa e se analisar a imputação; não é tanto de causalidade mas sim de imputação imprevisibilidade, no entanto, não oferece
consequência entre a • Teoria da causalidade adequada (Von Kriz): procurou restringir solução para os casos de causalidade
conduta do agente o o âmbito da teoria da conditio sine quo non, tendo em conta os hipotética (1) e de causas paralelas (4).
resultado. casos de imprevisibilidade; a conduta que é conditio sine quo • Problemas de aplicação: (1) não identifica
non do resultado só tem relevância jurídica quando, colocada o concreto critério de previsibilidade
uma pessoa média no lugar do agente, antes da prática do crime, (previsibilidade abstrata ou previsibilidade
seja previsível aquele resultado. Juízo ex ante. concreta, tendo em conta os deveres
• São também tidos em conta os conhecimentos especiais do especiais do agente); (2) não resolve
agente: aqueles que o agente efetivamente detinha, apesar de a corretamente os casos de diminuição do
generalidade das pessoas deles não dispor. risco.
(1) CASOS EM QUE A TEORIA DA CONDITIO SINE QUO NON NÃO OFERECE UMA RESPOSTA CONCISA

1. Casos de causalidade hipotética: se a vitima vier a morrer na sequência de um disparo de A, embora estivesse condenada a morrer
envenenada, por ter ingerido o veneno, pouco tempo demais, a causalidade poderia ser afastada. Problema: o resultado morte deve-se à
conduta de A (outra solução seria atribuir relevância negativa/excluir a responsabilidade em virtude da causa virtual).

a. Só faz sentido excluir a responsabilidade em virtude de uma causa virtual quando a proibição se afigure como inútil.

2. Casos de interrupção do nexo causal: se a vítima morrer porque fica ferida e a caminho do hospital tem um desastre de ambulância, persiste
a causalidade. Problema: a morte deveu-se a uma circunstância imprevisível para o agente.

3. Casos de características especiais da vítima: se a vítima ao ser empurrada cai e morre por ter uma fragilidade óssea (e apenas por isso), a
teoria da conditio também afirmaria a causalidade. Problema: a doença é imprevisível para o agente.

4. Casos de causas paralelas: se a vítima morre devido a ter bebido um copo de leite envenenado em que A e B introduziram doses letais de
veneno, esta fórmula afasta a causalidade de ambas as condutas. Problema: é uma solução absurda.

5. Casos de causas imprevisíveis ou não habituais: no convite para o passeio de mota em que se sofre de um acidente, a teoria levaria a
afirmar a causalidade de um comportamento integrado num contexto social irrelevante para a responsabilidade penal.

6. Casos de intervenção dolosa de outrem: se o agente fere a vítima, mas esta morre porque alguém impede o seu salvamento, a teoria da
conditio afirma a causalidade. Problema: registou-se um facto superveniente decisivo.
TEORIAS DA IMPUTAÇÃO CONTEÚDO PROBLEMAS

• A imputação objetiva é analisada em função do risco proibido


para os bens jurídicos realizado pela conduta concreta.
• Pressuposto: o Direito Penal tem uma função preventiva
• Não é suficientemente adequada para
relativamente aos bens jurídicos;
satisfazer uma exigência de ação
• Tese: a imputação objetiva só existe perante a perigosidade
controlável no plano normativo. A mera
TEORIA DO RISCO efetiva da conduta para o concreto resultado. O fator de decisão
criação/aumento do risco, sem que se exige
O objetivo desta teoria foi é a criação ou o aumento do risco proibido, sempre que se
uma conexão comprovada com o evento,
ultrapassar a causalidade verifique uma conexão entre a criação/aumento do risco e o
conduz a casos de imputação em
como critério. Alguns resultado.
processos causais acidentais.
teses dispensam a • Dois requisitos (*): 1) o agente tenha, com a sua ação,
• Conclusão: em casos de duvida, a solução
causalidade, outras não. criado/aumentado um risco; 2) o risco é proibido; 3) esse risco
deve ser a de não imputação; não se pode
tenha conduzido à produção do resultado concreto (conexão de
converter a dúvida num fundamento de
risco) -> o perigo que se concretizou no resultado foi um
responsabilidade penal.
daqueles em vista dos quais a ação foi proibida, ou seja, um
daqueles que corresponde ao fim de proteção da norma de
cuidado; (2)

(*) Roxin vem melhorar a teoria da causalidade adequada. Propõe uma teoria da imputação. Escrito de homenagem a Richard Ronnie (judeu – período de
proibida a citação a autores judeus). Não se procura rejeitar a causalidade – não se rejeita, sequer, a causalidade adequada. Acrescenta, no entanto, um novo
raciocínio noutro plano.

Caso da viagem de avião: o A que oferece a viagem terá realizado o tipo objetivo de proibição de matar?

Não faz sentido imputar, porque não é proibido oferecer viagens de avião. São casos em que não se verifica a violação da norma que proibida (a conduta em si não
é proibida).
CRITÉRIOS DA CONEXÃO DO RISCO
• (2) Tese do âmbito de proteção da norma;
1. Aos requisitos da teoria do risco, haveria que acrescer o requisito do âmbito do tipo (tendo em conta já a norma penal típica e não tão-somente a
norma de cuidado violada pelo agente);
2. Requisito adicional: se o fim de proteção da norma típica não cobre resultados da espécie daquele que efetivamente se verificou então, em última
instância, há que se negar a imputação objetiva.
3. Casos típicos propostos por Roxin (FD não demonstra total aderência à sistematização, em resultado do excessivo casuísmo):
a. Colaboração na autocolocação em risco dolosa: quando A e B se lançam, por aposta, numa corrida perigosíssima de motos na estrada e
B, em virtude de um erro de condução, perde o domínio do veículo e sofre lesões físicas graves.
b. Heterocolocação em perigo livremente aceite: quando C, a pedido do passageiro D, aumenta de forma proibida a velocidade do automóvel
e em consequência se despista, sofrendo D lesões físicas graves;
c. Imputação a um âmbito de responsabilidade alheio: quando E provoca um incêndio na sua habitação e F, um dos bombeiros chamados,
para salvar outro habitante da casa sofre lesões físicas graves.

Figueiredo Dias: perante esta proposta de Roxin, FD tece algumas críticas, em virtude do excessivo
formalismo e casuísmo; critica, em especial a pretensão aparente de Roxin de criar um novo critério de
imputação (eventualmente, desnecessário). Entende, em última instância, que estes casos podem ser
resolvidos através de várias dimensões: (1) como problemas da parte especial do Código Penal e não como
problemas da parte geral; (2) através do princípio da autorresponsabilidade, como tendo função delimitadora
e definidora dos âmbitos de responsabilidade; (3) Roxin resolve em termos de imputação objetiva questões
que deviam ser resolvidas por intermédio de comparticipação – confusão dos problemas.

• Comportamento lícito alternativo: procurando perceber se, nos casos de dúvida sobre a imputação, o comportamento lícito alternativo
(cumprimento do dever/motivação pela norma) teria sido inútil ou útil na produção do resultado – se fosse útil, então estaria verificada a imputação
objetiva;
o Em caso de dúvida (Roxin): mantém-se a imputação; só não se imputa em caso de certeza;
§ Funcionalismo teleológico: as normas tutelam diminuindo os riscos para os bens jurídicos; se se paralisa, a norma não cumpre a
finalidade de motivação; no limite, a nenhum dos casos de erro médico seria imputável o resultado;
§ Problema (argumentos MFP): viola o princípio in dúbio pro reu; o principio da legalidade – imputar significa dizer que ele matou,
ou seja, implica uma conexão, se não tenho a certeza que o comportamento licito alternativo evitava, então há base para sustentar
a conexão de risco; o principio do direito penal do facto, porque se não se consegue dizer que matou, nós não sabemos se a
imputação existia em termos normativos. Crítica final: está a transforma, Roxin, os casos de crime de homicídio, em caso de dúvida,
em crimes de perigo.
§ MFP: em caso de dúvida razoável afasta-se a imputação objetiva.

• Princípio da confiança: a confiança na conduta de outrem pode permitir negar a conexão do risco;
o Útil para o tráfico rodoviário
o O B não respeita o direito de prioridade, colidem e B morre: o A causou a morte ao B, mas não criou o risco; tendo o direito de prioridade,
pode partir do princípio que as pessoas vão cumprir as normas também. Só se tivesse indícios objetivos em contrário é que seria admissível
a imputação.

Distinguir comportamento lícito alternativo de causalidade hipotética: uma causa é virtual quando for comportamento de terceiro ou um evento da natureza.

NOTA: se não há conexão de risco, não significa que o agente não seja punível de todo.

® Caso da viagem de avião: não criou o risco, logo não é punido.


® Se o A dispara sobre o B e o B morre de um acidente na ambulância: criou o risco, não há imputação objetiva; já temos desvalor da ação, na criação do
risco proibido – ainda pode ser punido por tentativa de homicídio (se tiver dolo, não há tentativas negligentes);
® Se o risco diminui o risco ou o risco que cria não é proibido, não pode ser punido, ainda que a criação seja dolosa.

Casos de Causalidade Cumulativa: como se delimita a imputação objetiva nas situações em que uma pluralidade de causas concorre num evento?

São as situações em que se agir de determinada forma contribuo conjuntamente com vários outros para determinado resultado, mas o meu pequeno ato, isoladamente,
não provocará dano nenhum.

A responsabilidade, ou seja, a imputação, nestes casos, passa por uma restrição em função de algum critério de delimitação de esferas de responsabilidade ou de
repartição de competências na vida social.

Causalidade cumulativa ou princípio da confiança? Caso da mãe e do automobilista. Se o passeio era ingreme a mãe não pode dizer que confiava que os carros
iam andar devagar. A mãe teria de contar com o comportamento dos condutores.
Jurisprudência: através do critério de uma razoável previsibilidade pelo agente de uma das causas cumulativos do comportamento ilícito do terceiro. Sempre que o
comportamento ilícito e negligente seja previsível para o outro agente, a violação do dever de cuidado, ou seja, o comportamento negligente ilícito abrange a
potenciação causal do outro comportamento e é essa potenciação que se concretiza no resultado. A dimensão objetiva de uma potenciação de um perigo é articulada
com uma dimensão subjetiva de previsibilidade desse efeito.

Como fazer a articulação das teorias?

Grande princípio orientador: princípio da legalidade e princípio do direito penal do facto.

Partir das teorias da causalidade, nomeadamente, da causalidade adequada (pressuposta nos arts. 10º e 22º). As teorias do risco passam a funcionar como um
critério corretivo e limitativo dos resultados da causalidade adequada.

Caso Particular da CAUSALIDADE VIRTUAL


® Doutrina em geral: nestes casos continua a fazer sentido manter a imputação objetiva - em todos estes casos, a proibição prevista na norma é legítima! A
causa virtual deve ser inoperante para efeitos do afastamento do resultado morte à conduta do autor da causa real.De acordo com o juízo ex ante, a norma
de proibição é relevante; ainda que, de acordo com um juízo ex post o objeto da regra já não possa ser salvo.
® SAMSON: Casos em que o agente modifica o processo causal sem todavia piorar a situação da vítima, faz sentido que haja, ainda assim imputação
objetiva?
o Ex: comboio circula na via 1; o condutor apercebe-se que uma barragem abriu as comportas de forma perigosa e o comboio pode ser levado pela
água; o condutor opta por mudar para a via 2, e acabam por todos morrer na via 2 devido a um desabamento de terras. Embora o agente seja
autor da causa real, não deve haver imputação!!!
§ Se o agente com a sua conduta aumenta/antecipa ou intensifica a produção do resultado: princípio da intensificação de Samson
o Ex: O agente que odeia B, vê B na iminência de ficar soterrado numa avalanche e dispara, matando-o. Neste caso, como o agente antecipa o
momento de verificação do resultado, deve haver sempre imputação do resultado à conduta do agente.
® KAUFFMAN: se no caso concreto o processo causal da causa virtual já está num estádio de evolução absolutamente irreversível, isso significa que o
objeto da ação já está condenado; assim, o desvalor do resultado da conduta da causa real, desapareceu. Fica apenas, o desvalor da ação.
o Ex: o avião que ia explodir com engenho explosivo estava preparado para detonar 30 min após a descolagem - se o engenho já estava num
processo evolutivo irreversível para o bem jurídico; esta conduta já não gera desvalor do resultado, pois esse resultado sempre aconteceria pela
causa virtual.
§ Assim, não se pode imputar o resultado à conduta do agente.
§ Resta o desvalor da ação: é proibido matar. Mas para haver desvalor de ação punível, é necessário estarmos perante um caso de dolo; a
tentativa não chega (art 22º/1) - tem que haver decisão/dolo.
o Ex: imaginando que estamos perante uma conduta negligente (ainda que grosseira), essa conduta fica impune. Porque não há desvalor do
resultado e nos crimes negligentes não pode haver desvalor da ação (é necessário dolo).
§ Ideia de força para estes casos (maioria da doutrina): retiramos do princípio da legalidade - sentido útil da proibição que permanece
sempre; objetivo de proteção de bens jurídicos.
§ DIMINUIÇÃO DO RISCO -> Não há imputação do resultado à conduta.
® Prof Paulo Sousa Mendes: teoria da diminuição do risco não tem entendimento; concorda com a doutrina germânica: era ao nível das causas de
justificação que o problema seria resolvido.
A IMPUTAÇÃO SUBJETIVA
NOÇÕES GERAIS
® Aspeto central na análise da imputação subjetiva: a existência ou inexistência de dolo. Este dolo é, no entanto, o dolo do tipo (dolo do facto, dolo
natural ou dolo do ilícito).
o Difere do dolo da culpa.
® O que é o dolo? Conhecimento e vontade de realização do tipo objetivo de ilicitude.
o Elementos do dolo: 1) o elemento intelectual, que corresponde ao conhecimento do agente;
o Elementos do dolo: 2) o elemento volitivo, que corresponde à vontade do agente;

Elemento Intelectual: o agente sabe, representa, tem consciência que preenche o tipo de ilícito objetivo
Porquê? Garantir que o agente conhece tudo quanto é necessário a orientar a sua consciência ética para o desvalor jurídico que concretamente se liga à ação
intentada.

• Se falta um destes elementos, não é possível afirmar o


• Conhecimento da factualidade típica, ou seja, dolo do tipo: a consequência, da falta de um destes
dos factos valorados negativamente pela norma elementos, é o erro sobre a factualidade típica (aplicação
penal (desvalor penal). do art. 16º/1).
Conhecimento das
Elementos circunstâncias de • Consiste na apreensão do sentido ou significado • Entende-se que o erro sobre a factualidade típica comporta
facto correspondente, no essencial e segundo o nível tanto a falsa representação como a falta de representação.
próprio das representações do agente, ao
resultado daquela subsunção (da valoração • Não fica afastada a possibilidade de prática do crime por
respetiva). negligência (art. 16º/3), contando que o próprio tipo de ilícito
o preveja e se negligência houver no caso concreto.
• Critério: co-consciência imanente à ação.
Atualização na
• A consciência, no dolo, é uma consciência atual. Admite-se alguns casos em que a consciência seja difusa ou
consciência
concomitante (p.e., crimes sexuais).
psicológica ou
intencional no • A representação do perigo concreto é bastante importante. É necessário que represente que o comportamento,
momento da ação naquelas circunstâncias, represente um perigo para o bem jurídico. O dolo exige uma representação efetiva do perigo
concreto.

• Excecionalmente admitido (art. 16º/1);


• A verdadeira relevância está nos crimes com um pendor axiológico menor ou praticamente reduzido, na medida em
Conhecimento da
que nestes a proibição legal consome, quase na íntegra, o desvalor do ilícito.
proibição legal
• De acordo com Figueiredo Dias tem lugar em: (1) ilícitos de mera ordenação social; (2) crimes de perigo abstrato; (3)
direito penal secundário; (4) direito penal de justiça.
ELEMENTO INTELECTUAL OU COGNITIVO DO DOLO

Casos Específicos J. Figueiredo Dias Maria Fernanda Palma

• Tem de passar o pressuposto da


imputação objetiva.
• Problema: saber se nos crimes de resultado se
exige o conhecimento da conexão entre o • Caso passe o crivo da imputação
resultado e a ação. objetiva: o erro no processo causal
configura-se, à partida, como irrelevante,
• Tese da irrelevância do erro no processo uma vez que ainda se trata de uma
causal: o agente criar um risco imprevisível é • De acordo com Figueiredo Dias:
consequência imediata e normal da ação
irrelevante, interessando tão-somente essa exceto nos casos de crimes de
do agente – punição pelo crime
Crimes de criação de risco; há, por isso, que afirmar a execução vinculada/resultado
consumado;
Resultado e o congruência, exceto nos casos de crimes de cortado, é difícil concretizar uma
Erro sobre o execução vinculada/resultado cortado, uma situação concreta em que se chegue • Situações de risco altamente improvável
Processo vez que nesses o processo causal é um à análise do dolo do tipo sem que se mas única e exclusivamente imputável à
Causal elemento do tipo, logo uma circunstância de haja caído, em primeiro lugar, na conduta do agente (pág. 197 das
facto, cuja falta levaria a erro sobre a imputação objetiva (concretamente, Lições): a Prof., nestes casos, considera a
factualidade típica. no requisito da conexão). imputação por crime consumado,
mencionando que a conduta do agente é
• Tese da relevância do erro no processo uma espécie de caixa de pandora, já que
causal: a criação de um risco não previsto pelo só a ação do agente desencadeia
agente não permite afirmar a existência de consequências graves para a vítima,
congruência; produzindo um resultado semelhante ao
pretendido pelo agente, mas por outra via;

• Reporta a situações típicas de encobrimento, ou • Figueiredo Dias: perceber se o • Premissa: conceito de ação de final de
Erro Sobre Qual seja, o agente pratica o facto típico, no entanto, risco que se concretiza no resultado Welzel;
Dos Factos o resultado não se chega a verificar, julgado o pode ainda reconduzir-se ao
• Critério da unidade de ação: se a conduta
Gera o agente que sim; com o intuito de encobrir o esquema de riscos criados pela
do agente é composta por apenas uma
Resultado crime, pratica determinados atos que acabam primeira ação.
decisão (já projetava, de antemão, o
(dollus por gerar o resultado típico. • Se a resposta for afirmativa: encobrimento), deve ser punido por crime
generalis) • Alguma doutrina – solução: punição pela responsabilidade pelo crime consumado (há um dolo geral que engloba
tentativa (primeiro facto) e responsabilidade consumado. toda a conduta do agente);
penal por negligência (se existir para aquele • Se a resposta for negativa: • Se não houver unidade de ação: se a
crime, relativamente ao segundo facto). responsabilidade pela tentativa e, se conduta do agente é composta por duas
existir, negligência. decisões (não projetava, de antemão, o
• Doutrina dominante: entende que estamos
encobrimento/segunda conduta), deve ser
perante um crime consumando.
punido por tentativa + negligência
(relativamente à decisão de 2º ação não se
pode falar em dolo);

• Mesma solução, para o caso do erro


sobre qual dos factos gera o
resultado.
• Se realizou o segundo facto: é
• Situações em que o agente planeia uma certa punido pelo crime consumado (tem
sucessão de acontecimentos, julgando causar o dolo do tipo, ainda que o segundo
resultado típico através da segunda conduta, ato seja irrelevante para a • Não é resolvido pela Professora, no
Inversão sendo a primeira meramente preparatória do verificação do resultado típico); entanto, presume-se que a lógica seja a
Temporal dos crime; mesma que a anterior e,
• Se não realizou o segundo facto –
Acontecimentos consequentemente, que o critério seja a
• Da análise póstuma dos factos compreende-se, três hipóteses: 1) responsabilidade
unidade de ação.
que afinal o facto gerador do resultado foi o por negligência, se a houver; 2)
primeiro facto e não o segundo; estamos perante verdadeiros atos
de execução e o agente é punido
pelo crime consumado; 3) não há
lugar a punição, porque estamos
ainda perante meros atos
preparatórios (não são puníveis);
• Aplica a teoria da concretização:
tentativa + (se existir) crime negligente,
uma vez que o agente apenas tem dolo
• Erro na execução: é atingido um objeto diverso relativamente a um dos objetos da
daquele que se projetava atingir, em virtude de ação e não relativamente ao outro;
fatores externos ao agente;
• Justificação da solução: 1 elemento
• Teoria da equivalência: o erro de trajetória é • Aplica a teoria da concretização: factual - o direito penal só pode intervir
Desvio da irrelevante, assim como o é o erro sobre o objeto quando tenham sido praticados factos;
tentativa + (se existir) crime
trajetória ou do da ação; o agente é punido pelo crime contudo deve tutelar todos os factos -
negligente, uma vez que o agente
Golpe (aberratio consumado (dolo do tipo); do ponto de vista dos acontecimentos,
apenas tem dolo relativamente a um
ictus vel podemos dizer que o agente cria
• Teoria da concretização: o erro de trajetória dos objetos da ação e não
impetus) perigo de lesão para um bem jurídico e
distingue-se do erro sobre o objeto da ação, relativamente ao outro;
lesa o outro bem jurídico; 2 elemento
• NOTA: José Veloso salienta que este não é um normativo: merecimento da pena – nos
erro de perceção, mas um erro de execução, que casos de erro sobre identidade do
cai necessariamente fora do âmbito do art. 16º; objeto a solução é muito distinta,
porque o agente nesses casos
representou o objeto de ação, coisa
que aqui não acontece.

• Quando haja uma identidade entre o projetado e o atingido (julgava ser uma pessoa e é outra): é irrelevante para efeitos de responsabilidade.
Erro sobre a No limite, pode servir para excluir o dolo do tipo qualificado, transferindo a responsabilidade nos termos do tipo de ilícito fundamental.
Identidade da
Pessoa a Atingir • Quando o agente erra sobre as qualidades tipicamente relevantes do objeto (exemplo: acha que é um animal mas é uma pessoa): é punido
pela tentativa e, cumulativamente se existir, por negligência;

• Para atingir uma qualquer finalidade, o


• O agente tem dolo do tipo em relação • O agente tem dolo do tipo em relação
agente tem de realizar o facto típico,
Dolo Alternativo aos dois objetos: é punido pela tentativa aos dois objetos: é punido pela tentativa
podendo atingir um ou outro objeto – não
e pelo crime doloso consumado; e pelo crime doloso consumado;
importa qual, desde que atinja um deles;
• CRÍTICA IFL: esta solução viola o princípio do ne bis in idem (dupla valoração do mesmo facto,
para efeitos de responsabilidade);
o Exemplo específico do cavalo: o agente tem três opções de resultado – acerta no cavalo,
acerta no cavaleiro ou não acerta; se se admitisse a punição pelo crime consumado nos dois
primeiros e a punição pela tentativa de homicídio no segundo (mas grave), chegaríamos a
uma solução injusta (punição mais grave daquele que não acerta do que daquele que acerta
no cavalo); assim, acertando no cavalo, deve ser punido por tentativa de homicídio;
• ANTÓNIO NEVES: estamos perante um crime continuado, verificando-se concurso ideal, logo, o
agente é punido pelo crime mais grave (tentativa de homicídio, caso se acerte no cavalo).

A CONTRAPOSIÇÃO ENTRE O ART. 16º E O ART. 17º


FIGUEIREDO DIAS
® Art. 16º: erro de perceção, ou seja, é um erro que impede o agente de tomar conhecimento sobre os elementos de facto e de direito que devem
orientar a sua conduta.
o Reconduz-se à oportunidade de motivação pela norma: o objetivo do conhecimento destes elementos é que o agente possa orientar a
sua consciência ética; se não conhece os elementos de facto e de direito, não tem o elemento emocional do dolo;
o Menção a proibições legais: de acordo com Figueiredo Dias, estas reportam-se a condutas axiologicamente neutras, pois que não são
apreensíveis pelo cidadão médio, logo, apenas o conhecimento da proibição legal pode orientar/motivar a conduta do agente.
o COLOCA-SE NO ÂMBITO DA IMPUTAÇÃO SUBJETIVA (DOLO DO TIPO)
® Art. 17º: erro de valoração, ou seja, trata-se de um desfasamento de valorações; não decorre de um não conhecimento dos elementos de facto/de
direito, mas de uma atribuição de sentido/valoração distinta;
o Reconduz-se a condutas axiologicamente relevantes: aquelas cujo significado social/axiológico da proibição o cidadão médio já tem
apreendido, razão pela qual não é necessário o conhecimento da proibição legal para se efetivar a punição;
o COLOCA-SE NO ÂMBITO DA CULPA: a falta de conhecimento apenas pode retirar a culpa, ou seja, pode configurar-se como sendo ou
não censurável;

TERESA BELEZA E FREDERICO LACERDA DA COSTA PINTO


® Propõem o critério setorial;
® Relativamente aos destinatários primaciais das normas, estes têm que ir buscar o conhecimento.
o Quando ignoram a lei - 17º.
Quando falamos em destinatários usuais das normas (profissionais que exercem estavelmente essa atividade profissional) esses têm
um dever acrescido de informação, salvo novos tipos penais (não se tratando de novos tipos penais, e, tendo esses destinatários a
obrigação de conhecer a lei, não a conhecendo, aplica-se o regime do art 17º).
o Já para aqueles que só ocasionalmente/transitoriamente contactam com a norma - 16º.
§ Se não são esses os destinatários normais das normas, e estamos por ex perante um individuo que pratica por novidade uma certa
atividade ou que começa no 1º dia a exercer uma determinada atividade, ainda estamos perante o regime do art 16º/1.

MARIA FERNANDA PALMA


® Ponto de Partida: conceção de Kindhauser, que distingue entre erro de verdade (art. 16º) e erro de sentido (art. 17º);
® Conclusões acerca da distinção entre 16º-17º: o art. 16º tem como fundamento garantir a oportunidade de motivação do agente pela norma,
assim, qualquer critério de distinção entre estes dois preceitos tem, naturalmente, de ter este fundamento em conta.
o MFP: não rejeita o ponto de vista de Figueiredo Dias, no entanto, tece-lhe algumas críticas: 1) subjetividade do critério (o conteúdo do que
seja axiologicamente neutro é subjetivo e manipulável); 2) não é o critério ideal, porque nem sempre resolve todos os problemas, como
sejam, os casos de pessoas que trabalham em certa e determinada área e às quais é exigido um conhecimento especial;
o CRITÉRIO: apreciar as condições efetivas de oportunidade de motivação pela norma penal, tendo em conta três aspetos – evidência das
regras; perigosidade previsível da conduta; nível de inserção profissional (situações em que há, ainda, uma decisão prévia de indiferença
pela norma – há oportunidade de motivação);
§ Aplicação do art. 16º: não teve oportunidade de se motivar pela norma;
§ Aplicação do art. 17º: teve oportunidade de se motivar pela norma, no entanto, o processo de motivação foi errado;
o NOTA: está em causa a oportunidade de motivação e não a verdadeiro motivação
ELEMENTO VOLITIVO

• A realização do facto típico é o verdeiro fim da conduta do agente (art. 14º/1). Figueiredo Dias fala em dolo direto
Dolo direto intencional ou de primeiro grau.
• A realização do facto típico surge como pressuposto ou estádio intermédio necessário para o agente atingir o seu fim
– meio necessário à realização do fim.

• Dolo necessário ou de segundo grau, no qual a realização do facto típico é uma consequência
Dolo
Dolo Necessário inultrapassável/necessária/inevitável da conduta do agente (art. 14º/2).
• É, por assim dizer, não um meio mas um efeito colateral.

Semelhança entre o art. 14º/3 e o art. 15º/a)


• A realização do tipo objetivo de ilícito é representada pelo
Dolo Figueiredo Dias fala, a este propósito de uma
Eventual agente como consequência possível da sua conduta
sobreposição inevitável entre o dolo eventual e
(art. 14º/3).
a negligência consciente.
Maria Fernanda Palma, concordando, refere que
a distinção já ultrapassa a pura tipicidade. Há,
• A realização do tipo objetivo de ilícito é representada pelo assim, que procurar a ratio da distinção dolo-
Negligência
agente como consequência possível da sua conduta negligência e procurar, a partir desse um ponto,
Consciente
(art. 15º/b). um critério objetivo de distinção.

Negligência
Negligência
• A realização do tipo objetivo de ilícito não é nem representada pelo agente (art. 15º/b).
Inconsciente
TEORIAS QUE DISTINGUEM O DOLO EVENTUAL DA NEGLIGÊNCIA CONSCIENTE
MARIA FERNANDA PALMA – CONCEÇÃO EXTROVERTIDA DA VONTADE
® Premissa – filosofia da ação: rejeita a teoria causal naturalista de ação, aderindo à teoria da unidade de ação.
o A teoria causal naturalista de ação reconhece que deve sempre existir um impulso para a ação através de um momento de consciência
cronologicamente anterior à ação. Assim, e sendo a identificação deste impulso crucial para a análise do momento volitivo, esta teoria preconiza uma
separação entre a consciência e a mente.
o Adere à teoria da unidade da ação (filosofia contemporânea), entendendo os comportamentos voluntários e intencionais como uma unidade incindível
entre o comportamento exterior e o processo causal. Assim, a identificação dos estados mentais deixa de exigir uma separação/identificação de um
momento anterior ao comportamento exterior, para se deslocar para um problema concetual, linguístico e comunicacional. A intenção corresponderá
assim a um modo de atribuição e compreensão do significado dos atos.
® A partir desta premissa, o objetivo é criar uma espécie de analogia entre o Dolo Eventual e as outras espécies de Dolo.
o Entre o dolo direto e o dolo necessário há algo em comum, que respeita à aceitação do resultado como inultrapassável.
o No caso do dolo eventual a proximidade é relativamente distinta: está em causa a aceitação inevitável do risco, numa lógica de homem de negócio,
ou seja, aceita ganhar, quer o risco se efetive, quer o risco se não efetive.
o Distinção: no dolo eventual, o agente apenas aceita a inevitabilidade dos riscos.
® Critério: implica a apreciação objetiva da inevitabilidade de um risco intenso, próxima de um juízo de causalidade adequada. Conforme entende a Sr. Prof.,
a inevitabilidade do risco implicará, interna e necessariamente, a consideração séria pelo agente.
o A pergunta que deve ser feita: podia ou não podia não ter considerado a inevitabilidade dos riscos que decorriam da sua conduta?
o Observar a vontade do agente numa perspetiva de linguagem social: ou seja, como se percepciona socialmente a vontade do agente. Mas é a
linguagem social em que o agente se insere. Procurar situações em que o interesse sobrevaloriza o seu interessa ao interesse de tutela do bem
jurídico.
o Alguns critérios:
§ Perceber se o agente é um verdadeiro homem de negócios (sobreposição do interesse aos riscos – lógica empresarial, lógica de
jogo) ou um jogador amador;
§ Apreender o contexto motivacional do agente, que implica já uma antecipação do juízo de culpa – pistas: contexto de leviandade, festejo,
glória, etc, que comprove uma incongruência entre a conduta do agente e o resultado.
® Professor João Matos Viana
o Primeiro - aferição do grau de probabilidade de um ponto de vista objetivo. Analisar se naquela situação era provável que tal efeito se
desencadeasse.
o Segundo - medidas de precaução que o agente tomou para evitar o resultado
o Terceiro - perceber se mesmo assim, num contexto de controlo motivacional, o agente sobrevalorizou os seus interesses pessoais acima da tutela
dos bens jurídicos.
O PROBLEMA DA RESPONSABILIDADE POR NEGLIGÊNCIA – REQUISITOS
Concluída a não existência de dolo do tipo, haverá que equacionar a verificação da negligência:
® Previsão da punibilidade por negligência: art. 13º.
® Punibilidade, concreta, na Parte Especial, da negligência: menção à norma que sustenta a punição por negligência.
® Violação de um dever de cuidado que deveria ter sido observado pelo agente, tendo havido condições para observar o respetivo dever – verificação in casu.

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