Você está na página 1de 6

Universidade de São Paulo

Faculdade de Educação
Departamento de Filosofia da Educação e Ciências da Educação

Sociologia da Educação I
Prof.ª Dra. Maria da Graça J. Setton

Fichamento 2
Socialização: como ser membro da sociedade, de Peter L. Berger e Brigitte Berger

Lara de Souza Melicio Rodrigues


Nº USP: 8975301

São Paulo
2020
O texto em questão, escolhido para a realização deste trabalho de fichamento foi
Socialização: como ser um membro da sociedade, escrito por Peter L. Berger e Brigitte
Berger, integrante do livro Sociologia e sociedade: leituras de introdução à sociologia, de
Marialice Mencarini Foracchi e José de Souza Martins, que organiza uma série de textos de
grande relevância e importância para o estudo dessa ciência, comumente usado em cursos
introdutórios das ciências sociais. Peter L. Berger e Brigitte Berger publicaram originalmente
suas ideias, posteriormente traduzidas para o português, no livro Sociologia – Uma
Abordagem Biográfica, lançado na cidade de Nova York, em 1975.
Os autores iniciam o texto falando como é importante entender que o início de tudo,
inclusive da socialização, se da a partir do nosso nascimento, e como é fundamental observar
que as crianças não só aprendem a viver em sociedade, mas que elas precisam entender e se
relacionar com elas mesmas, com o próprio corpo e com tudo ao seu redor. Ao decorrer de
sua infância, essas crianças vão tendo contato com infinitas experiências que o mundo tem a
oferecer para elas, podendo ter, também, um caráter social. Desde que o momento que
nascem, os bebês tem pessoas a redor, e sua biografia será sobre sua relação com outros seres
humanos, e até mesmo, outras experiências teoricamente não-sociais podem sofrer influência
e serem moldadas pela sociedade e pelo contato social, até mesmo na hora de se alimentar e
de brincar, haverá uma dependência de um individuo que não eles mesmos.
Na vida das crianças, não é possível isolar o que seria social, pois mesmo que outros
elementos façam parte da experiência, tudo vai estar ligado a alguém que não elas mesmas, e
essa relação se mostra como crucial de suas experiências como um todo. E aquilo que é
moldado pelos adultos leva características peculiares deles, não foi algo escolhido pelo bebê,
mas sim por aquele que está delineando seu contato com o mundo, e até mesmo seu
organismo aceita esses padrões socialmente impostos, atuando também na mudança de seu
comportamento e na formação de sua personalidade.
Ainda, é comum que as crianças passem a associar experiências à pessoas, mesmo não
se dando conta, por conta do padrão destas, e não percebe que por trás da decisão dessa
pessoa, está também sendo refletido um padrão da sociedade como um todo, como por
exemplo na alimentação, se a criança passará fome ou não, se a comida será servida à pedido
ou em horários determinados, qual seria o tamanho das porções e o que seria servido, entre
outros, tudo relacionado a condições de uma classe social e das normas da sociedade, que
difere muito se comparada a outras.
Há sociedades, como a ocidental de classe média, que seguem uma ideia de que as
crianças devem ser alimentadas em horários fixos, não podendo haver nada entre esses
horários, mesmo que a criança estiver pedindo, já, por outro lado, existem sociedades como as
da tribo gusii do Quênia, em que o bebê é alimentado pela assim que chora, o mais rápido
possível, tendo um complemento de mingau ao leite, que mesmo negado pelas crianças é
forçado nelas de forma brusca, o que chocaria se visto pelo olhar de uma sociedade ocidental.
Não se pode julgar uma sociedade com os olhos de outra.
Ademais, o uso do banheiro pode ser observado como exemplo de experiências
relacionadas a uma necessidade fisiológica que são submetidas a padrões sociais. Entre os
gusii, a partir dos dois anos, quando já sabem andas, as crianças são instruídas de maneira
simples, de defecar fora de casa, como normalmente não usam vestimentas na parte inferior
do corpo, não há também grande preocupação, e todo processo dura cerca de um mês.
Entretanto, para as sociedades ocidentais o processo de treinamento para ir ao banheiro é
fonte de grande preocupação, principalmente pela quantidade de roupas que usam, podendo
chegar a serias medidas punitivas caso não reagissem ao treinamento da forma pretendida,
algo que se fosse analisado pelos gusii pareceria algo extremamente rígido, mas mais uma
vez, não se pode medir o tamanho da experiência de uma sociedade com as réguas de outra.
Quando esses padrões são impostos nas crianças, e em seus corpos, pelos adultos, e
por consequência, pelas regras da sociedade, eles são sentidos de forma absoluta e não são
questionados, não existe alternativas para as crianças se não aquela. O poder que os adultos
tem sobre elas algo avassalador, eles que dão as esperadas recompensas e os temidos castigos,
são eles que apresentam o mundo, mas apresentam o seu próprio mundo, não os das crianças.
Apenas quando os indivíduos entenderem que existem padrões sociais, eles vão enxergar que
não é absoluto, que é relativo, que existem alternativas, e que podem adotar padrões
diferentes em suas próprias vidas.
Outrossim, a socialização, o contato com outras crianças, com outras pessoas, dá as
ferramentas para as crianças se desenvolverem e se expandirem a fim de criar um mundo só
seu, onde ela tem potencial, onde ela é detentora de poder, ela passa a entender o mundo e a
participar dele. Para essa socialização, o necessário é a linguagem, pois é a partir disso que ela
transmite e recebe tudo o que é feito em sociedade. Junto com a linguagem se adquire a
capacidade de pensar de forma abstrata, de refletir, de imaginar, de planejar. Mesmo que a
criança seja moldada pela sociedade, como já vimos, ela não é passiva, ela resiste à sociedade,
participa dela e também colabora com o molde dela, de forma reciproca. Essa capacidade da
criança de fazer algo individual e independente do mundo e das pessoas vem do seu uso da
linguagem, quando elas começam a responder os adultos.
A socialização das crianças com outras pessoas se da num processo de identificação e
interação, ela aprende a reconhecer e compreender atitudes, podendo tomar estas para si
mesma, se desenvolvendo como individuo e como se social. Nas brincadeiras de faz de conta,
no momento que elas imitam as ações, nesse processo de socialização, elas também podem
transmitir significados sociais, como por exemplo, o papel de um policial vai assumir a
imagem do ambiente social que a criança se encaixa, se ela for branca e morar num bairro
branco, ele representará a autoridade e segurança, se ela for negra e morar no centro da
cidade, ele carregará uma ideia de hostilidade, perigo e ameaça. Ainda, cada criança colocará
em uma posição de relevo e importância uma pessoa que para si é especial, de acordo com sua
experiência de socialização.
A partir disso tudo, a criança passará por um processo de interiorização, de
consciência e de autodescoberta, quando algo que existia somente fora dela existirá também
dentro. O mundo social será interiorizado e será parte da consciência da criança, que nada
mais é do que a internalização de ordens de sentido moral que ditará como ela mesma age em
relação com o mundo, as coisas para ela serão certas ou erradas, ela passara a pensar antes de
agir e a usufruir dessa consciência, não precisando ouvir outra pessoa além dela mesma na
hora de decidir sobre as coisas, levando, então a um autoconhecimento.
É só por meio da interiorização das vozes dos outros que podemos
falar a nós mesmos. Se ninguém nos tivesse dirigido uma mensagem
significativa vinda de fora, em nosso interior também reinaria o
silencio. É só através dos outros que podemos descovrir0mos a nós
mesmos. (BERGER e BERGER, 2012)

É com a socialização que a criança vai se entender como pessoa e vai falar sobre si
mesma, na primeira pessoa, utilizando pronomes pessoais, como “eu”, “me”, “mim” e “meu”,
observando seu lugar e papel no mundo, assim como distinguir seu papel nas interações
sociais, tendo poder de decisão sobre si mesmos, agindo de forma individual.
A sociedade também vai designar as individualidades, no que é chamado de
identidade, nos papeis que são atribuídos aos indivíduos dela, tanto em uma família, quanto
em uma profissão, de acordo com suas características físicas ou traços de personalidade, e
isso vai mudando a cada fase da vida. As pessoas são identificadas pelo outros ao mesmo
tempo que elas se identificam, em uma auto-identificação, e essa a junção de uma com a outra
resulta na identidade. “É impossível ao individuo ser alguém ou alguma coisa por muito
tempo, exclusivamente por sua conta. Outros tem de nos dizer quem somos, outros têm de
confirmar nossa identidade.”
Berger e Berger finalizam o texto falando sobre como a socialização nunca chega ao
fim e que todos os processos acontecem na interação com outras pessoas, e que sempre
envolvem modificações no individuo, nas suas atitudes e em seus hábitos, assim como seu
papel em sociedade. A socialização liga a pessoa ao mundo, o interno e o externo, com um
grupo e com o universo social inteiro, sendo algo para a vida inteira.
Concluindo, a partir do texto, creio que devemos ter em mente também que não
podemos deliberadamente determinar uma sociedade inteira por identidades e por
personalidade de pessoas específicas. Isso é gerado por outras sociedades, de fora, sem
conhecimento real, a partir de sentimentos como medo, raiva, preconceito, que levam a uma
generalização e estereótipos, devido a uma relação entre as próprias sociedades, em histórias
de batalha, luta, sofrimento, competição, entre outras, e só aumentam a desigualdade entre as
pessoas e afastam o mundo. Quanto mais conhecemos, mais entendemos e refletimos sobre
nós mesmos, formando a nossa individualidade, encontrando-nos nas alternativas, crescendo,
melhorando e nos desenvolvendo.
Referências

BERGER, Peter e BERGER, Brigitte. Socialização: como ser um membro da sociedade.


In: Foracchi, Marialice Mencarini e Martins, José de Souza (Org.). Sociologia e sociedade:
leituras de introdução à sociologia. 30.ed. Rio de janeiro: livros técnicos e científicos, 2012.
p.169-181.

Você também pode gostar