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Sempre de forma fundamentada, apresentem a “Constituição dos Estados Unidos do


Brasil”, de 1891, primeira Constituição Republicana. Quais suas principais
características e circunstâncias? Quais as razões pelas quais ela é relacionada à chave do
“constitucionalismo da inefetividade”?

Anteriormente a Proclamação da República brasileira, o país, era regido por um governo


imperial, sob o comando do imperador D. Pedro II. Governo esse que estava diante de uma
situação instável politicamente, sem grande parte do apoio da sociedade.

A Guerra do Paraguai, que ocorreu entre os anos de 1864 e 1870, marcou o declínio do
último governo imperial brasileiro, pois, os exorbitantes gastos bélicos no combate fizeram
com que a dívida externa brasileira atingisse níveis insustentáveis, causando uma forte crise
econômica que afetou diretamente a população. Além disso, as pessoas escravas que
integravam parte das tropas brasileiras no conflito, ao retornarem da guerra exigiam a sua
libertação, condição que foi anteriormente prometida pelo Imperador. Porém, pela grande
pressão de grupos escravocratas, a promessa não foi efetivada causando insatisfação e revolta
de grupos progressistas em favor da libertação das pessoas em situação de escravidão.

Havia também insatisfação por parte dos militares, esses reivindicavam maior
autonomia nas suas decisões, algum reconhecimento político, e também, melhores
remunerações. Ao participarem da Guerra do Paraguai, tiveram um crescente contato com
aspirações republicanas, e o conflito também evidenciou a desvalorização da classe.

Ao fim da guerra, no ano de 1870, foi publicado o Manifesto Republicano, liderado


por integrantes do Partido Liberal, que tinham como propósito maior a derrubada do regime
monárquico e o estabelecimento da República Federativa, no entanto, essa declaração tinha
aspirações mais federalistas do que propriamente republicanas. Após isso, houve também o
primeiro Congresso Republicano, no ano de 1873, que teve como resultante a criação do
primeiro partido republicano brasileiro.

Ao decorrer da intensa crise política, e após D. Pedro II perder seus últimos apoiantes,
tendo como estopim a abolição da escravatura decretada em 13 de maio de 1888 por meio da
Lei Áurea, houve então o chamado Golpe Republicano de 1889. O primeiro presidente, foi
um militar, Deodoro da Fonseca, que foi nomeado como um chefe de governo provisório.
Com isso, ocorreu diversas mudanças no Brasil, relações de produção, e especialmente
mudanças institucionais. Sobre esse momento importante da história brasileira, os autores
Cláudio Pereira de Souza Neto e Daniel Sarmento comentaram:
Foram os militares, sob a chefia de Deodoro da Fonseca, que promoveram
o movimento que resultou na Proclamação da República. Nesse movimento,
praticamente não houve participação popular. O povo não passou de mero
expectador atônito dos acontecimentos de novembro de 1889. Sem
embargo, parece um exagero equiparar o advento da República a um mero
pronunciamento militar, como sugerem alguns autores, haja vista as várias
outras forças que lhe deram suporte, bem como a sua correlação com
fenômenos mais profundos que se desenrolavam na sociedade, na cultura e
na economia do país. (NETO; SARMENTO, 2017, p.109)

Foi instaurado uma Comissão de ilustres, integrada por 5 membros, responsabilizada


de elaborar anteprojetos constitucionais. Logo, foi criado um pré projeto que continha 117
artigos e 9 disposições transitórias. Esse documento, era fortemente influenciado por um
cunho liberal e continha expressa inspiração da Constituição dos Estados Unidos da América,
mas também, refletia alguns aspectos da Constituição da Argentina.

Em quatro de novembro de 1890, esse documento foi aprovado pelo poder Executivo e
revisado pelo advogado, político e escritor Ruy Barbosa. Esse, que participou efetivamente
dos primeiros anos da república do Brasil, e foi responsável por anexar pela primeira vez o
habeas corpus como matéria constitucional. Considerada uma constituição provisória, foi
instituída por meio do decreto 510 22.06.1890, e alterada pelo decreto 914-A.

Já para a preparação da Constituição Brasileira oficial, foi eleito em maio de 1890 um


Congresso Constituinte, sendo esses representantes encarregados de elaborar o texto
constitucional, mas também, de integrar o congresso ordinário posteriormente. A Constituição
de 1891, continha 91 artigos e 8 disposições transitórias, sendo assim, a mais suscinta que o
Brasil já teve. Esse texto, assim como o projeto provisório, era influenciado pela Constituição
Americana, principalmente no âmbito da federalização dos estados e na difusão do poder,
anteriormente concentrado nas mãos de um rei.

Raul Machado Horta, sobre as características da Constituição Brasileira de 1891,


disse: “A constituição de 1891 é, fundamentalmente, uma Constituição de organização dos
Poderes e da garantia dos direitos individuais” (HORTA,2010, p.26). Como exemplo, pode-
se citar a criação de três poderes: executivo, legislativo e judiciário; extinguindo-se assim o
Poder Moderador. Além disso, outras medidas foram inovadas como : a separação entre
Estado e Igreja, fazendo com que houvesse a liberdade de culto para todas as religiões; o
direito ao voto passou a ser de cidadãos brasileiros maiores de 21 anos ( não havia nenhuma
parte do texto que privava as mulheres de exercer seus direitos políticos, no entanto a
discriminação era tão enraizada na sociedade que essa questão não era questionada) ; a
garantia de ensino primário obrigatório gratuito; a proibição de títulos ou brasões. O sistema
de governo estabelecido é o presidencialismo, que continha um bicameralismo federativo.

Outra particularidade desse texto, é sua rigidez. A alteração dessas normas detinha um
processo mais extenso e complexo do que outras leis ordinárias. Ademais, os estados, que no
período monárquico eram chamados de províncias, adquiriram maior autonomia, assim como
os municípios, mesmo que de forma menos significativa.

Em relação aos direitos individuais, eles são apresentados no artigo 72, em sua maioria
legislando sobre liberdades públicas. No parágrafo segundo, discorrendo sobre a igualdade
entre as pessoas, temos:

§ 2º - Todos são iguais perante a lei. A República não admite


privilégios de nascimento, desconhece foros de nobreza e extingue as ordens
honoríficas existentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos
nobiliárquicos e de conselho. (CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA 1891)

No entanto, mesmo diante dessas garantias previstas constitucionalmente, a maioria


das pautas ali escritas, não alcançaram efetividade no cenário brasileiro, principalmente, a
questão democrática. As oligarquias estaduais, exerciam um grande poder sobre as decisões
políticas da recente república, além disso, a prática do coronelismo era amplamente realizada,
fazendo com que as vontades dos “chefes” locais se expressassem de forma imposta aos seus
“subordinados”, essencialmente nas urnas, pois o voto não era realizado de forma secreta.

Neste quadro, os direitos individuais proclamados pela Constituição não


passavam de ficção. Sob o ângulo eleitoral, os coronéis controlavam
“rebanhos” de eleitores que deles dependiam, fenômeno potencializado pela
inexistência do voto secreto no Brasil, que retirava a liberdade do eleitor: as
eleições eram “a bico de pena”. (NETO; SARMENTO, 2017, p.114)

Portanto, ela é relacionada à chave do “constitucionalismo da inefetividade”, pois o


distanciamento entre o previsto em lei e a realidade vivida no Brasil daquela época fez com
que o texto constitucional se tornasse ineficaz. A pouca preocupação com questões sociais,
caracterizou a Constituição de 1891 como inefetiva para o apaziguamento ou resolução de
problemas enfrentados pela coletividade, como a desigualdade social, o analfabetismo e a
discriminação racial.

Em síntese, Cláudio Pereira de Souza Neto e Daniel Sarmento, concluíram sobre a


primeira Constituição do Brasil enquanto república:
Em suma, tratava-se de uma Constituição perfeitamente
liberal, bastante comprometida, no seu texto, com o Estado de Direito. Na
prática, porém, a vida constitucional na República Velha esteve muito
distante do liberalismo, marcada pelo coronelismo, pela fraude eleitoral e
pelo arbítrio dos governos. (NETO; SARMENTO, 2017, p.113)

E ainda:

Num balanço geral, pode-se dizer que a Constituição de


1891 teve pouquíssima efetividade. Entre o país constitucional - liberal e
democrático – e o país real – autoritário e oligárquico -, manteve-se sempre
um abismo intransponível. (NETO; SARMENTO, 2017, p.116)

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