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INTENSIVO II

Marcelo Novelino
Direito Constitucional
Aula 5

ROTEIRO DE AULA

4. Ações constitucionais

4.1. “Habeas data”

O professor ressalta que o habeas data é uma ação constitucional que foi introduzida pela CF/1988 em reação ao
regime anterior (autoritário), no qual informações sobre a ideologia e convicções das pessoas eram obtidas e
armazenadas pelo governo de forma sigilosa. Para vedar esse tipo de conduta, a CF/1988 facultou o acesso às
informações pessoais, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público.

CF, art. 5º, LXXII – “conceder-se-á “habeas-data”:


a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos
de dados de entidades governamentais ou de caráter público;
b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo”.

✓ A Lei 9.507/97 regulamenta o habeas data e estabelece ainda uma terceira hipótese: complementação dos
dados existentes.

Legitimidade ativa:
A Lei 9.507/97 e a CF/1988 não fazem qualquer referência à legitimidade ativa nas ações de habeas data.
De acordo com a doutrina majoritária, a legitimidade ativa para a impetração do “habeas data” é ampla. Portanto,
podem impetrar o “habeas data” qualquer pessoa física ou jurídica, inclusive de direito público, nacional ou estrangeira
para a obtenção, retificação ou complementação de informações a seu respeito.

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A ação de “habeas data” é considerada personalíssima, ou seja, a tutela se restringe às informações relativas à pessoa
do impetrante. Portanto, em regra, ninguém pode impetrá-lo para ter acesso à informação de outras pessoas. No
entanto, existe uma única exceção, conforme a jurisprudência:

STF - HD 147/DF: “É parte legítima para impetrar habeas data o cônjuge sobrevivente na defesa de interesse do
falecido”.

Questão: O Ministério Público tem legitimação extraordinária para impetrar habeas data em nome de terceiros?
Por se tratar de ação personalíssima, o MP não tem legitimação extraordinária nesta situação. A legitimidade do
Ministério Público para impetrar “habeas data” somente seria possível para a obtenção de informações relacionadas ao
próprio órgão, como qualquer outro órgão ou pessoa jurídica.
✓ Em suma: o órgão ministerial não tem legitimidade ativa para impetrar o “habeas data” para ter acesso a
informações relacionadas a terceiros.

Legitimidade passiva:

Tem legitimidade passiva qualquer órgão ou entidade (pessoa jurídica) detentor da informação que se pretende obter,
retificar ou complementar.

Lei n. 9.507/97, art. 2º: “O requerimento será apresentado ao órgão ou entidade depositária do registro ou banco de
dados e será deferido ou indeferido no prazo de quarenta e oito horas”.

Questão: O órgão ou entidade que figurará no polo passivo deve ter caráter público ou pode ter natureza privada?

CF, art. 5º, LXXII – “(...) constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter
público;”.

A rigor, a natureza pública não é do órgão, mas sim da própria informação pretendida. Isso significa que a informação
deve poder ser transmissível a terceiros, ou seja, não deve ser de uso privativo da instituição.

Lei 9.507, art. 1º, § único: “Parágrafo único. Considera-se de caráter público todo registro ou banco de dados contendo
informações que sejam ou que possam ser transmitidas a terceiros ou que não sejam de uso privativo do órgão ou
entidade produtora ou depositária das informações.”

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✓ Portanto, o caráter público previsto na Constituição Federal é o da informação e não do órgão ou entidade que
detém a informação.
✓ Informação de caráter público é aquela que não fica restrita apenas ao órgão, sendo compartilhada com
terceiros (exemplo: informações do Serasa).

O “habeas data” visa tutelar dois direitos fundamentais (objeto):


• Privacidade.
• Acesso à informação.
✓ Somente informações de caráter pessoal podem ser objeto de habeas data.

CF, art. 5º, XXXIII – “Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de
interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo
sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.”

Questão: A ressalva constante no art. 5º, XXXIII da CF abrange também o interesse particular ou se refere tão somente
às informações de interesse coletivo ou geral?
Não. A ressalva constante no art. 5º, XXXIII da CF/1988 (trecho destacado em negrito) não pode ser oposta em relação a
informações de caráter pessoal.

STJ – REsp 781.969/RJ: “[...] o mesmo direito pode ser exercido de forma ampla, com ressalva para as informações ‘cujo
sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado’; essa restrição não se aplica no caso do habeas data,
que protege a própria intimidade da pessoa.”

O objetivo da ação de “habeas data” é assegurar o conhecimento, a retificação e/ou a complementação de informações
de caráter pessoal, constantes de bancos de dados de caráter público.

Hipóteses de cabimento

1ª hipótese: conhecimento de informações pessoais.

Lei n. 9.507/97, art. 7º: “Conceder-se-á habeas data:


I – para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registro ou banco de
dados de entidades governamentais ou de caráter público;
(...)”.

A hipótese art. 7º, I da Lei 9.507/97 está condicionada à natureza da informação pretendida (pessoal).

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✓ A solicitação independe de qualquer motivo a ser demonstrado, bastando a simples vontade do impetrante ter
conhecimento daquelas informações.
✓ O uso do habeas data só pode ser feito se a pessoa pretender ter o conhecimento, complementação ou
retificação de informações. Se, exemplificativamente, a pessoa quiser obter informações de seu tempo de
contribuição junto ao INSS, a ação adequada é o mandado de segurança, pois, ainda que as informações sejam
de caráter pessoal, elas serão utilizadas para outros fins que não apenas o conhecimento, a complementação ou
a retificação de dados.

STJ – REsp 781.969/RJ: “[...] A pretensão do impetrante, de obter certidão para o cômputo do adicional por tempo de
serviço, respeita ao direito de informação, cuja previsão encontra-se no art. 5.º, XXXIII, da Carta Magna de 1988,
devendo ser pleiteada via mandado de segurança.”

Em suma: Se houver a negativa de fornecimento de dados que contenham informações para outras finalidades (que não
sejam o conhecimento de informações pessoais), a ação cabível será o mandado de segurança.

2ª hipótese: retificação de dados.

Lei n. 9.507/97, art. 7º: “Conceder-se-á habeas data:


(...)
II – para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo;
(...)”.

Questão: É possível impetrar um Habeas Data para ter conhecimento da informação e, ao mesmo tempo, solicitar a
retificação dos dados?
Em razão do princípio da economia processual e da celeridade, deveria ser admitida a cumulação.
De acordo com o STJ, entretanto, não é possível admitir a cumulação de habeas data para conhecimento e retificação
de dados.
✓ O habeas data para a retificação de dados só é admitido se o indivíduo já tiver conhecimento da informação. Se
ele não tiver, primeiro ele deve impetrar um habeas data para conhecimento da informação e, posteriormente,
ele pode pedir a retificação.

STJ – HD 160/DF: “Em razão da necessidade de comprovação de plano do direito do demandante, mostra-se inviável a
pretensão de que, em um mesmo habeas data, se assegure o conhecimento de informações e se determine a sua
retificação. É logicamente impossível que o impetrante tenha, no momento da propositura da ação, demonstrado a
incorreção desses dados se nem ao menos sabia o seu teor. Por isso, não há como conhecer do habeas data no tocante
ao pedido de retificação de eventual incorreção existente na base de dados do Banco Central do Brasil”.

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3ª hipótese: complementação de dados - anotação nos assentamentos do interessado.

Lei n. 9.507/97, art. 7º: “Conceder-se-á habeas data:


(...)
III – para a anotação nos assentamentos do interessado, de contestação ou explicação sobre dado verdadeiro mas
justificável e que esteja sob pendência judicial ou amigável”.

Essa hipótese trata dois casos em que o Habeas Data for utilizado para complementar as informações do banco de
dados. Tais informações estão corretas, mas o impetrante pode solicitar que haja uma anotação adicional.
✓ Neste caso, exige-se a demonstração do interesse de agir, ou seja, é necessário demonstrar que a ausência da
anotação pode gerar algum dano concreto (de ordem material ou moral).
✓ Nesta situação, se o impetrante não demonstrar esse interesse em agir, não será julgado procedente o pedido.

Interesse de agir.
A Lei 9.507/97 exige que o indivíduo tenha tido uma recusa na obtenção da informação ou que haja demora na
obtenção da informação para que o habeas data seja admitido.
✓ O professor explica que, para que haja interesse de agir, deve haver uma pretensão resistida.

Lei n. 9.507/97, art. 8º, parágrafo único: “A petição inicial deverá ser instruída com prova:
I – da recusa ao acesso às informações ou do decurso de mais de dez dias sem decisão;
II – da recusa em fazer-se a retificação ou do decurso de mais de quinze dias, sem decisão; ou
III – da recusa em fazer-se a anotação a que se refere o § 2.º do art. 4.º ou do decurso de mais de quinze dias sem
decisão”.

Questão: Essa exigência viola o princípio do acesso à justiça? Não. Segundo o professor, essa exigência se caracteriza
como interesse de agir.
✓ Esse raciocínio não se confunde com o princípio da inafastabilidade da função jurisdicional (princípio do acesso à
justiça), que impede a exigência do prévio esgotamento das instâncias administrativas.

Súmula 2 do STJ: “Não cabe o habeas data se não houve recusa de informações por parte da autoridade administrativa”.

No mesmo sentido: STF - RHD 22/DF e RHD 24/DF.

Observação: Se, exemplificativamente, houve a demora em retificar os dados, o indivíduo impetrou o HD e,


posteriormente, a retificação ocorreu administrativamente, há a perda do objeto.

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Liminar e decisão de mérito.

Questão: Admite-se liminar em Habeas Data?


A Lei 9.507/97 não prevê o cabimento de liminar, mas versa apenas sobre a decisão de mérito.
✓ O professor explica que o procedimento da lei é tão célere que não justifica a concessão de uma liminar.
✓ Entretanto, a doutrina majoritária entende que há possibilidade de concessão de medida liminar em situações
excepcionais.

Lei n. 9.507/97, art. 13: “Na decisão, se julgar procedente o pedido, o juiz marcará data e horário para que o coator:
I – apresente ao impetrante as informações a seu respeito, constantes de registros ou bancos de dadas; ou
II – apresente em juízo a prova da retificação ou da anotação feita nos assentamentos do impetrante”.

Natureza jurídica da decisão de mérito: há divergências na doutrina sobre esse tema.


• Natureza mandamental (Carreira Alvim, Barbosa Moreira, Daniel Neves). Esse é o entendimento da maioria da
doutrina.
• Natureza constitutiva (Rogério Tucci);
• "Habeas data” “cognitivo” (aquele impetrado para conhecimento de informações a respeito do impetrante):
natureza mandamental; “retificatório” e “completivo”: constitutiva (Vicente Greco Filho).
O professor considera que o posicionamento de Vicente Greco Filho é o mais correto.

4.2. Ação popular


A denominação “ação popular” advém da legitimação ativa, a qual costuma ser atribuída a qualquer pessoa do povo ou,
pelo menos, a uma parte do povo. Esta ação tem a finalidade de proteger a “coisa pública”.

✓ A ação popular é forma de exteriorização da democracia direta e da soberania popular.


✓ Por meio da ação popular, o cidadão fiscaliza diretamente a atuação dos poderes públicos.

CF, art. 5º, LXXIII: “qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao
patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao
patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da
sucumbência.”

Legitimidade ativa

“Cidadão”

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Na doutrina, há uma divergência sobre o sentido da palavra “cidadão”. Cidadão, em sentido estrito, é apenas aquele
indivíduo do povo que possui capacidade eleitoral. Entretanto, modernamente, passou-se a defender que cidadão deve
ser uma palavra interpretada em sentido amplo, abrangendo, inclusive, estrangeiros que residem em determinado país.

Em relação à ação popular, não houve uma decisão específica do STF sobre a abrangência do termo “cidadão” e,
portanto, o que está em lei permanece válido.

Lei 4.717/1965, art. 1º, §3º: “A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com
documento que a ele corresponda.”

Capacidade postulatória?
Ao ajuizar uma ação popular, o cidadão está atuando como uma espécie de substituto processual da coletividade, pois
está defendendo o interesse difuso de toda a coletividade. Neste caso, questiona-se: É necessária a capacidade
postulatória para o ajuizamento dessa ação?
O STF entende que o cidadão não possui capacidade postulatória para ajuizar uma ação popular.
✓ Legitimidade ativa não se confunde com capacidade postulatória. Qualquer cidadão tem legitimidade ativa, mas
capacidade postulatória não. Assim sendo, é necessário que a ação seja ajuizada por advogado.

STF – AO 1.531 AgR: “A Constituição da República estabeleceu que o acesso à justiça e o direito de petição são direitos
fundamentais (art. 5º, XXXIV, a, e XXXV), porém esses não garantem a quem não tenha capacidade postulatória litigar
em juízo, ou seja, é vedado o exercício do direito de ação sem a presença de um advogado, considerado ‘indispensável à
administração da Justiça’ (...), com as ressalvas legais. (...) Incluem-se, ainda, no rol das exceções, as ações protocoladas
nos juizados especiais cíveis, nas causas de valor até vinte salários mínimos (art. 9º da Lei 9.099/1995) e as ações
trabalhistas (art. 791 da CLT), não fazendo parte dessa situação privilegiada a ação popular.”

Questão 1: Os portugueses têm legitimidade ativa no Brasil? Caso haja reciprocidade em Portugal, os portugueses terão
os mesmos direitos atribuídos aos brasileiros naturalizados. Trata-se da chamada “quase nacionalidade”.
✓ A “quase nacionalidade” é uma equiparação feita entre portugueses e brasileiros se houver reciprocidade por
parte de Portugal.
✓ Assim, se o português residir no Brasil e cumprir as exigências da lei, havendo reciprocidade por parte de
Portugal, ele poderá exercer aqui os mesmos direitos que os brasileiros podem exercer em Portugal. Desse
modo, se o brasileiro que vive em Portugal puder votar e puder receber votos, os portugueses terão os mesmos
direitos aqui no Brasil. Diante disso, os portugueses terão título de eleitor no Brasil e poderão ajuizar ação
popular.

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Questão 2: O Ministério Público tem legitimidade para ajuizar a ação popular? Como o Ministério Público não é cidadão,
a ele cabe apenas o acompanhamento da ação.

Lei 4.717/1965, art. 6º, §4º: “O Ministério Público acompanhará a ação, cabendo-lhe apressar a produção da prova e
promover a responsabilidade, civil ou criminal, dos que nela incidirem, sendo-lhe vedado, em qualquer hipótese,
assumir a defesa do ato impugnado ou dos seus autores”

Questão 3: Pessoa jurídica tem legitimidade ativa? Pessoa jurídica não é cidadão, logo, não tem legitimidade.
Súmula 365/STF: “Pessoa jurídica não tem legitimidade para propor ação popular.”

Legitimidade Passiva
A lei prevê um extenso rol de legitimados passivos, o qual abrange, de modo geral, entes da administração pública
direta e indireta, bem como qualquer pessoa jurídica que, de algum modo, administre verbas públicas.
O art. 1º da Lei 4.717/65 prevê um extenso rol de legitimados passivos, o qual é exemplificativo.

Lei 4.717/1965, art. 1º: “Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de
atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de entidades autárquicas, de
sociedades de economia mista (Constituição, art. 141, § 38), de sociedades mútuas de seguro nas quais a União
represente os segurados ausentes, de empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de instituições ou fundações
para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cinquenta por cento do
patrimônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e
dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas pelos cofres públicos.”

Lei 4.717/1965, art. 6º: “A ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas e as entidades referidas no art. 1º,
contra as autoridades, funcionários ou administradores que houverem autorizado, aprovado, ratificado ou praticado o
ato impugnado, ou que, por omissas, tiverem dado oportunidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo.”

O CNJ e o CNMP podem figurar no polo passivo?


Segundo o STF, CNMP e CNJ não podem figurar no polo passivo, pois eles são órgãos colegiados da União e não pessoas
jurídicas.

Questão: Um empresa binacional pode figurar no polo passivo? Sim. O STJ julgou um caso envolvendo a empresa Itaipu.

STJ – REsp 453.136/PR: “A Itaipu submete-se à lei brasileira, que regula as obrigações decorrentes dos contratos
celebrados com pessoas físicas ou jurídicas domiciliadas e residentes em território nacional. [...] Evidenciada a utilização

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de dinheiro público na criação, custeio ou manutenção de empresa, ou em qualquer outra forma de apoio, cabe Ação
Popular, pouco importando a natureza da pessoa jurídica em questão”.

Objeto
Os atos de caráter administrativo ou a ele equiparados constituem objeto da ação popular. Tais atos podem ser:
• Comissivos;
• Omissivos;
• Podem ser atos vinculados;
• Podem ser discricionários.

STJ – REsp 889.766/SP: “A ação popular é o instrumento jurídico que deve ser utilizado para impugnar atos
administrativos omissivos ou comissivos que possam causar danos ao meio ambiente. 5. Pode ser proposta ação
popular ante a omissão do Estado em promover condições de melhoria na coleta do esgoto da Penitenciária Presidente
Bernardes, de modo a que cesse o despejo de elementos poluentes no Córrego Guarucaia (obrigação de não fazer), a
fim de evitar danos ao meio ambiente”

STF – AO 772 MC/SP: “[...]Nem porque, quando praticados no desempenho de poder discricionário, não se
assujeitem os atos administrativos a controle jurisdicional. É velha e aturada a jurisprudência desta Corte, no sentido de
que tais atos, quando insultem por via direta o ordenamento jurídico, contrariando, por exemplo, postulados
constitucionais, como o da moralidade, ou não atendam ao interesse público específico a que é predisposto o poder
jurídico, são passíveis de fiscalização judicial.”

Obs.: O professor destaca que qualquer ato administrativo (inclusive o ato discricionário) pode ser objeto de apreciação
judicial, sobretudo, com base no postulado da proporcionalidade.

Os atos de conteúdo jurisdicional podem ser objeto de uma ação popular? Uma decisão judicial, por exemplo,
pode ser objeto de ação popular?
Os atos de conteúdo jurisdicional não são abrangidos pela ação popular, já que possuem sistema específico de
impugnação, seja pela via recursal, seja mediante ação rescisória.

Cabe ação popular contra lei em tese?


A ação popular também não é o meio adequado para questionar lei em tese, pois não pode ser utilizada como
sucedâneo da ação direta de inconstitucionalidade. Só cabe ação popular em relação a ato administrativo de
efeitos concretos.

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STJ – REsp 1.081/SC: “Mérito – da impossibilidade jurídica do pedido da ação popular. Sob pena de usurpação de
competência do Supremo Tribunal Federal, a ação popular não se mostra a via adequada para a obtenção de declaração
de inconstitucionalidade de lei federal, devendo haver a comprovação da prática de aos administrativos que violem o
erário público. Precedentes.”

Objetivo
O objetivo é tutelar bens materiais (patrimônio público) e imateriais (moralidade administrativa, meio ambiente e
patrimônio histórico e cultural).
A ação popular tem por objetivo a defesa de interesses difusos pertencentes à sociedade.

A ação popular pode ser utilizada como instrumento de defesa de direitos do consumidor?
A jurisprudência do STJ não admite o ajuizamento da ação popular para tutelar direitos do consumidor.

STJ – REsp 818.725/SP: “[...] Instrumento flagrantemente inadequado mercê de evidente ilegitimatio ad causam (art. 1º,
da Lei 4.717/1965 c/c o art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal) do autor popular, o qual não pode atuar em prol da
coletividade nessas hipóteses”

Requisitos específicos
Lei 4.717/1965, art. 2º: “São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos
casos de:
a) incompetência;
b) vício de forma;
c) ilegalidade do objeto;
d) inexistência dos motivos;
e) desvio de finalidade.”
✓ Esse rol é exemplificativo.

Posicionamentos doutrinários:
Quando se fala desses requisitos específicos, surge o binômio lesividade x ilegalidade.
Questão: Para que seja cabível a ação popular, o ato deve ser ilegal e lesivo ao mesmo tempo?
Há três posicionamentos doutrinários diferentes:
i) lesividade, por si só, já é suficiente;
ii) lesividade contém ilegalidade; e
iii) necessidade de conjugação de lesividade e ilegalidade (jurisprudência dominante);

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STJ – EREsp 260.821/SP: “Ação popular. Cabimento. Ilegalidade do ato administrativo. Lesividade ao patrimônio
público. Comprovação do prejuízo. Necessidade. 1. O fato de a Constituição Federal de 1988 ter alargado as hipóteses
de cabimento da ação popular não tem o efeito de eximir o autor de comprovar a lesividade do ato, mesmo em se
tratando de lesão à moralidade administrativa, ao meio ambiente ou ao patrimônio histórico e cultural.”

Competência
No tocante à competência para julgar a ação popular, não existe qualquer tipo de foro de prerrogativa de função da
autoridade que se encontra no polo passivo.
A ação popular não tem natureza criminal. Assim sendo, o foro por prerrogativa de função previsto para as infrações
penais comuns não se aplica à ação popular.
✓ A competência será sempre do juízo de 1º grau.

Lei 4.717/1965, art. 5º: “Conforme a origem do ato impugnado, é competente para conhecer da ação, processá-la e
julgá-la o juiz que, de acordo com a organização judiciária de cada Estado, o for para as causas que interessem à União,
ao Distrito Federal, ao Estado ou ao Município.”

O professor destaca que, como não há foro por prerrogativa de função, é o juízo de 1º grau que será o órgão
competente.
Se, no polo passivo, figurar a União, autarquias ou empresas públicas federais, a competência será da justiça federal.

Quando a União figurar no polo passivo, o autor poderá optar entre a seção judiciária (CF, art. 109, § 2.º):
i) de seu domicílio;
ii) de onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda;
iii) de onde esteja situada a coisa objeto da demanda; ou, ainda,
iv) do Distrito Federal.

Questão: O STF tem competência originária para processar e julgar a ação popular em alguma circunstância?
Sim e isso ocorre nas seguintes situações:
1ª) Quando todos os membros da magistratura tiverem interesse na causa;
2ª) Quando mais da metade dos membros do tribunal de origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente
interessados; e
3º) Quando houver conflito federativo envolvendo União e estados.

(CF, art. 102, I, alíneas “f” e “n”)


i) Interesse, direto ou indireto, de todos os membros da magistratura;

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ii) Quando mais da metade dos membros do tribunal de origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente
interessados;
iii) Conflito entre a União e Estado-membro.

Liminar
Lei 4.717/1965, art. 5º, §4º: “Na defesa do patrimônio público caberá a suspensão liminar do ato lesivo impugnado.”

Em que pese uma parte da doutrina defender o não cabimento de tutela antecipada na ação popular, essa hipótese é
admitida pelo STJ.
À ação popular, são aplicáveis as vedações existentes para a concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública
(Lei 12.016/2009, art. 7º, §2º1).

Decisão de mérito
No caso da decisão de mérito proferida na ação popular, a lei trata de duas situações distintas:
Pedido procedente
✓ Se o pedido for julgado procedente, o efeito da decisão é a condenação dos responsáveis/beneficiários pelas
perdas e danos e a declaração da nulidade/anulação do ato.

Pedido improcedente:
✓ Se o pedido for julgado improcedente por ser a ação manifestamente infundada, a decisão faz coisa julgada e
produz efeitos erga omnes.
✓ Todavia, se o pedido for julgado improcedente por insuficiência probatória, é cabível nova ação popular.
Obs.: Neste caso, o objetivo é evitar que alguém proponha uma ação popular de forma inadequada apenas para
que ela transite em julgado e, posteriormente, não possa haver a responsabilização.

Não há condenação em custas judiciais e ônus de sucumbência, salvo se comprovada má-fé.

Tema 2: Direitos sociais

Temas a serem trabalhados:


1) Aspectos introdutórios;
2) Críticas à adjudicação;

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LMS, art. 7º, §2º: “Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a
entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a
concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza.”

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3) “Reserva do possível”;
4) “Mínimo existencial”;
5) O “princípio da vedação de retrocesso”.

1. Aspectos introdutórios

1.1. Previsão constitucional:

Embora o art. 6º elenque de forma sistematizada os direitos sociais, tais direitos estão densificados em vários outros
dispositivos da CF/1988.

CF, art. 6º: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta
Constituição”.

✓ O direito à alimentação foi introduzido pela EC 64/2010. O direito à moradia foi incluído pela EC 26/2000. O
direito ao transporte foi incluído pela EC 90/2015.
✓ Os direitos sociais são densificados no Capítulo II do Título II (arts. 6º ao 11) e no Título VIII (arts. 193 a 214).

1.2. Os direitos sociais são cláusulas pétreas?


O art. 60, §4º menciona o seguinte:

CF, art. 60, §4º: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.”

A interpretação do art. 60, §4º da CF revela que a CF coloca os direitos e garantias fundamentais como gênero. Dentro
desse gênero, há as seguintes espécies: direitos individuais, direitos coletivos, direitos sociais, direitos de nacionalidade
e direitos políticos.
Assim sendo, em princípio, os direitos sociais não seriam cláusulas pétreas. Todavia, uma parte considerável da doutrina
sustenta que os direitos sociais seriam cláusulas pétreas expressas.
✓ Para alguns autores, como Ingo Sarlet, Paulo Bonavides, todos os direitos fundamentais seriam cláusulas
pétreas.

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Entretanto, na opinião do professor, os direitos sociais não são cláusulas pétreas expressas, o que não significa que eles
não sejam cláusulas pétreas (implícitas).
✓ A diferença entre cláusulas pétreas expressas e implícitas está, segundo o professor, no ônus argumentativo.
✓ Muitos direitos sociais são pressupostos para que o indivíduo possa usufruir dos direitos e garantias individuais.
✓ Sem direitos sociais como a educação, a saúde e a moradia (por exemplo), o indivíduo não pode usufruir de sua
liberdade de forma plena.

Os dois trechos a seguir ilustram a íntima relação entre determinados direitos sociais que são pressupostos para o
usufruto dos direitos individuais e as cláusulas pétreas.

“A liberdade é esvaziada quando não são asseguradas as condições materiais mínimas para que as pessoas possam
desfrutá-la de forma consciente.” (Daniel Sarmento)

“Oferecer direitos políticos ou salvaguardas contra o Estado a homens seminus, analfabetos, subnutridos, doentes é
zombar de sua condição: eles precisam de ajuda médica ou de educação antes de poderem compreender ou aproveitar
um aumento em sua liberdade” (Isaiah Berlin).

1.3. O problema quanto à efetividade

O professor destaca a diferença entre a eficácia e a efetividade das normas:


• Eficácia é a aptidão da norma para produzir os efeitos que lhe são próprios.
• Efetividade é a aptidão para que a norma cumpra a função para a qual foi criada (aplicação ao caso concreto).

Fatores que contribuem para a falta de efetividade de alguns direitos sociais:


1º) Textura aberta > Princípios > concretização > políticas públicas
Os dispositivos que versam sobre direitos sociais possuem textura aberta, ou seja, não possuem termos muito precisos
(exemplo: direito à saúde).
A maioria dos direitos sociais está consagrada em princípios, ou seja, em normas de otimização. Trata-se da lógica de
aplicação em maior ou menor grau, de acordo com as possibilidades fáticas (dentre elas os recursos orçamentários) e
jurídicas existentes.
A concretização dos princípios ocorre, sobretudo, por meio de políticas públicas. Tais políticas públicas irão priorizar
determinados direitos sociais em detrimento de outros, pois o orçamento do Estado é limitado.

2º) Direitos prestacionais > alto custo x limitações orçamentárias


A grande maioria dos direitos sociais possui caráter prestacional, ou seja, os direitos sociais exigem não uma abstenção,
mas prestações. Tais prestações têm um alto custo e o Estado possui limitações orçamentárias.

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✓ Pelas razões expostas, os direitos sociais possuem menor efetividade quando comparados aos direitos de defesa
pois estes, em regra, exigem uma atuação negativa do Estado.

2. Críticas à adjudicação

2.1. Separação dos poderes/legislador positivo

I - Intervenção do PJ = usurpação de competências do PL e PE.


Aqueles que alegam que há uma violação à separação de poderes sustentam que a intervenção do Poder Judiciário nos
direitos sociais acaba usurpando as competências dos poderes cujos membros foram eleitos democraticamente
(Executivo e Legislativo).
✓ Esta é uma crítica baseada em uma premissa antiga do que significava a separação de Poderes, na qual o juiz
atuaria como “boca da lei” (apenas revelaria o sentido contido na norma). No entanto, esta visão, tal qual
formulada por Montesquieu, foi construída em meados do Século XVIII e por outra sociedade completamente
distinta da contemporânea.

II- “Legislador negativo” (Hans Kelsen)


Em relação ao dogma do “legislador negativo”, é importante lembrar que, quando Kelsen surgiu com essa ideia, ele
sustentava que o Tribunal Constitucional poderia declarar a inconstitucionalidade de leis, algo que, na época, era
inimaginável.
✓ Para o estudioso, quando o Tribunal Constitucional declarava a inconstitucionalidade de leis, ele agia como uma
espécie de legislador negativo, ou seja, era como se ele estivesse revogando a lei.
✓ De acordo com Kelsen, o Tribunal Constitucional poderia atuar como legislador negativo, mas nunca poderia
atuar como legislador positivo (criando normas).

Essa ideia está superada, pois, na época, vigiam constituições liberais.


✓ Assim, em relação à crítica relativa ao dogma do legislador negativo, é necessário entender que, na época da
construção desse entendimento, as constituições eram essencialmente liberais, ao contrário das atuais, nas
quais são previstos inúmeros deveres aos Poderes Públicos.

Se a Constituição exige ações positivas do Estado (prestações materiais e jurídicas) e o poder público se omite, o Poder
Judiciário precisa intervir de diferentes formas, não somente invalidando o ato.

III - Contracrítica: Normatividade e supremacia da Constituição => papel do PJ.

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A normatividade e a supremacia da Constituição exigem do Poder Judiciário uma atuação no sentido de assegurar o
cumprimento das normas.
✓ Quando o Poder Judiciário determina que um determinado direito social seja implementado, ele está impondo o
cumprimento de uma norma suprema, que é a Constituição.
✓ Em um Estado Democrático de Direito, o papel do Poder Judiciário é interpretar e aplicar tanto a Constituição
quanto as leis, resguardando os direitos e assegurando o respeito ao ordenamento jurídico.

A Constituição é um conjunto de normas, as quais são dotadas de supremacia, logo, trata-se de normas que subordinam
o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
✓ Quando o Legislativo e o Executivo descumprem a constituição, é papel do Poder Judiciário aplicar a
constituição e as leis.

2.2. Ausência de legitimidade democrática do Poder Judiciário

I - Argumento: Os membros do Poder Judiciário não são eleitos pelo povo. Assim sendo, seria impróprio retirar dos
poderes legitimados pelo voto popular a prerrogativa de decidir de que modo os recursos públicos devem ser gastos.
Além disso, os recursos que custeiam os direitos sociais são públicos, ou seja, são provenientes, em sua maioria, dos
tributos pagos pelo povo. Logo, cabe ao povo decidir onde os recursos serão aplicados e não ao Poder Judiciário.

II - Contracrítica: A contracrítica se baseia na ideia de democracia substancial.


✓ O professor explica que a democracia tradicionalmente foi vista como sinônimo de premissa majoritária, ou
seja, equivalente à vontade da maioria. Entretanto, tal visão é meramente formal.
Atualmente, a democracia não é vista apenas como uma democracia meramente formal, mas também como
substancial.

✓ A democracia substancial preceitua que não basta analisar apenas a vontade da maioria, deve-se indagar o
conteúdo da vontade.
✓ A democracia substancial envolve a vontade da maioria, mas também abrange o respeito aos direitos básicos de
todos, inclusive das minorias.
✓ Cabe ao Poder Judiciário exercer esse papel contramajoritário, pois seus membros são vitalícios e, por esse
motivo, não precisam se preocupar com a opinião popular (em tese).
Exemplo: o Poder Judiciário defende o direito de presidiários, o que não é feito, em regra, por políticos, pois o
presidiário não vota e defendê-los é algo impopular.

2.3. Desenho e capacidades institucionais

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Em relação ao desenho institucional, no caso específico do direito à saúde (por exemplo), entende-se que foi uma opção
do Poder Constituinte Originário atribuir aos Poderes Públicos a definição de como ele seria efetivado:

CF, art. 196: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem
à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação”.

Em relação às capacidades institucionais, a ideia é que a melhor forma de otimizar a eficiência dos gastos públicos é
deixando essa função para o Poder Executivo.
✓ O Poder Executivo possui uma visão global, ou seja, uma visão de macro justiça. O Poder Judiciário, por sua vez,
possui uma visão de micro justiça, pois limita a sua visão à lide existente (autor e réu).
✓ O Poder Judiciário não possui expertise para definir a alocação de recursos.
✓ A CF/1988 assegura o acesso universal e igualitário à saúde e isso acaba não ocorrendo diante de decisões
judiciais proferidas individualmente.
✓ O professor destaca que o orçamento público é um valor importante, pois a escolha dos gastos orçamentários é
feita pelos representantes do povo.

Para uma otimização dos gastos públicos, é necessária uma visão mais ampla dos problemas. Assim, a intervenção
judicial deve ser comedida e parcimoniosa (e não proativa).

Em suma: As cinco críticas apresentadas não são obstáculos instransponíveis para que haja uma intervenção judicial nos
direitos sociais, ou seja, para que haja a adjudicação dos direitos sociais.

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