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Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

 Relações Internacionais como Disciplina Autónoma. Vestefália e a sociedade


internacional

Evolução da disciplina de relações internacionais


o 1917 – 1º departamento de relações internacionais (Uni de Aberystwyth).
o Estudar a guerra e ajudar a evitar um novo conflito.
o Edward Carr (diplomático britânico)
Livro: “Vinte anos de crise” – 1939
Critica os primeiros académicos da área de RI (chamou-os de utópicos ou idealistas):
pensaram o mundo em termos do “dever ser”, e não tal como ele “realmente” funciona.
o A concentração desses teóricos em problemas ético morais, impediu-os de
elaborar instrumentos analíticos que permitissem perceber os sinais de
proximidade da II Guerra Mundial.
o Ao contrário dos idealistas, Carr definiu um segundo grupo a que chamou de
realistas, que estudava o mundo como realmente era e que defendia uma visão
menos utópica e mais sintonizada com as dimensões do poder e do interesse que
existe na política internacional.

1º debate – ontológico Confronto entre idealistas e realistas


o idealistas – estudam o mundo como ele ‘deve ser’, queriam tornar o
mundo mais pacífico;
o realistas – estudam o mundo ‘tal como ele é’, queriam estudar os meios à
disposição dos Estados para que pudessem garantir a sua sobrevivência.
o Com a II Guerra Mundial – o realismo é o vencedor do debate.
o Publicação do livro de Hans Morgenthau – ‘A Política entre as Nações’ (1948)

2º debate – metodológico debate deixa de ser sobre o que estudar e passa a ser sobre
‘como estudar’
o Realistas científicos defendiam maior rigor científico e maior influência dos
métodos das ciências exatas. Criticavam a falta de diálogo com outras áreas de
conhecimento científico, que tinham tido avanços na formulação de métodos
empíricos de observação e análise da realidade objetiva.
o Defendiam a importação de métodos e conceitos de outras áreas, das ciências
exatas em particular, e um uso mais intensivo de métodos quantitativos para o
estudo das RI.
o A disciplina de RI passou a aceitar um maior rigor científico e a adotar metodologias
transparentes.
o Final da década de 1960 e década 1970 vários desafios se impuseram ao realismo
como teoria dominante das RI: evolução da política internacional; evolução da
própria disciplina de RI.

o Novos Estados recém-independentes.


o Superpotências.
o Novos atores não governamentais: multinacionais, OIG e ONG.
o Surgem críticas à separação entre política interna e política internacional, bem
como à divisão entre high politics (alta política – relativa à segurança) e low politics
(baixa política – temas económicos, tecnológicos...), e à primazia da primeira
sobre a segunda.

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 Joseh Nye e Robert Keohane (1977) – ‘Power and Interdependence: world politics
in transition’: crítica ao excesso de ênfase no conflito em detrimento da
cooperação e da interdependência.

 Waltz – ‘Theory and International Politics’: trouxe o debate agente-estrutura assim


como a influência da microeconomia à teoria das RI, provocando um grande
impacto na disciplina e tornando-se objeto de inúmeros debates.

 Michael Banks – publica um capítulo numa obra coletiva na qual aponta para o
aparecimento de um novo debate nas RI – debate entre 3 paradigmas:
neorrealismo, neoliberalismo e neomarxismo. Debate interparadigmático, de
natureza epistemológica: várias perspetivas a competir entre si, sem possibilidade
de consenso ou de síntese entre as 3.

 Keohane (1988) procurou redefinir os termos do debate distinguindo entre duas


correntes: racionalistas e reflexivistas.
o Racionalistas (representados pelos realistas e liberais) possuíam um claro
programa de pesquisa, com hipóteses, metodologia e critérios de inclusão
e exclusão precisos e transparentes. Mas, esses instrumentos de análise
não permitiam lidar com assuntos como os conceitos de identidade e
cultura.
o Reflexivistas (feministas, teoria crítica, pós-modernos e pós-
estruturalistas) conseguiam estudar questões e conceitos muito
importantes, mas faltava-lhes rigor e dados empíricos para apoiar as suas
ideias.

 Yossef Lapid (1989), publica um artigo no qual fala da existência de um terceiro


debate a que chama de pós-positivista. Ao grupo que Keohane chama de
racionalista, Lapid chama de positivista. Ao grupo que Keohane chama de
reflexivista, Lapid chama de pós-positivista.

 Ole Waever – 1995 – divide o debate em duas partes:


o Debate entre realistas e liberais.
o Debate entre positivas e pós-positivistas.

o O estudo das RI adquiriu identidade própria com o des. da TRI no Século XXI.
o A TRI é o conjunto de proposições sobre como os Estados regulam as suas práticas e
procura descrever os fundamentos políticos relativos à estruturação da ordem
internacional. O objeto da TRI é a “política internacional”.
o Política internacional: expressão que se refere a uma forma específica de
institucionalização da política, que se tornou preponderante a partir do século XVII na
Europa, propagando-se para praticamente todo o mundo, e que hoje passa por
transformações importantes. Conjunto de práticas, envolvendo frequentemente o uso
da força efetiva ou ameaçada, através das quais os Estados se relacionam.
o Foi com a Paz de Westphalia que se fixou o sistema de Estados territoriais, ou “ordem
westphaliana”, constituída pelas relações estabelecidas entre Estados territoriais
soberanos, isto é, entre organizações políticas, cada qual com autoridade suprema
sobre um território.
o A Paz de Westphalia consagrou o princípio, adotado desde a Paz de Augsburgo (1555),
conhecido sob a fórmula cujus regio eius religio (quem tem a região tem a religião),

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pelo qual os príncipes adquiriram autonomia política para adotar um credo religioso da
sua preferência no seu território.
o A política que até então se estruturava por outros meios, essencialmente
independentes do território, tais como laços de sangue e comunhão de valores
religiosos passa a estar determinada pelo território, e portanto institucionalizada de
forma a ser possível distinguir entre a política “interna” (ao território), regida pelas leis
e pelos princípios religiosos autonomamente adotados pelo príncipe local, e a anarquia
“externa”, vigente nas relações entre os Estados.
o O resultado: a soberania é territorial. Não há autoridade suprema fora dos territórios,
e, portanto, tampouco existe qualquer autoridade superior para regulamentar as
relações entre os Estados territoriais.
o Esta era uma situação nova. Na Idade Média, não existia soberania territorial e,
portanto, não havia política internacional.

Held propõe como características do “modelo de Westphalia”:


1. O mundo consiste e é dividido em Estados soberanos que não reconhecem qualquer
autoridade superior.
2. O processo de elaboração de normas, a negociação de acordos e a manutenção da
ordem permanecem em grande parte a cargo dos Estados.
3. O direito internacional serve ao estabelecimento de regras mínimas de convívio; a
criação de relações duradouras entre estados e povos é um fim, mas apenas na medida
em que permitem a satisfação de objetivos políticos nacionais.
4. A responsabilidade por ilícitos transfronteiriços é um ‘assunto privado’, que diz respeito
apenas às partes afetadas.
5. Todos os Estados são considerados como iguais perante a lei: regras jurídicas não levam
em consideração assimetrias de poder.
6. As diferenças entre Estados são afinal resolvidas pela força; o princípio do poder eficaz
é válido. Praticamente não há limitações legais para conter o recurso ao uso da força;
os parâmetros do direito internacional oferecem proteção mínima.
7. A minimização de impedimentos à liberdade dos Estados é uma prioridade ‘coletiva’.”

o O “modelo westphaliano” estabelece condições de autonomia para as unidades


políticas, sem criar obrigações mútuas entre elas.
o Os juristas procuravam estabelecer estas obrigações mútuas com base na doutrina do
direito natural.
o De facto, na literatura jurídica surgem, desde a Guerra dos Trinta Anos, propostas de
criação de estruturas de cooperação internacional capazes de constituir a base de
processos políticos mundiais para se atingir a paz duradoura: projetos de paz perpétua
(Saint-Pierre-1658-1743; Immanuel Kant-1724-1804).
o Em tais projetos, e nos debates que eles suscitaram, começasse a focalizar, ainda que
de modo especulativo, as relações entre os tipos de governo (por exemplo, a república,
por oposição à monarquia absoluta) e a paz mundial.
o Mas, já no final do século XVIII e início do século XIX, a Revolução Francesa e a sua
exportação para outros territórios através de guerras –e não através da cooperação
pacífica –pôs em evidência a dificuldade em se conciliar a liberdade interna (república
ou democracia) com a externa (soberania).
o Na prática, a tensão entre a promoção da liberdade dos indivíduos, de um lado, e a paz
internacional, de outro, foi inicialmente resolvida por uma última tentativa de se dar à

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política como um todo um conteúdo ideológico ligado a valores pré-revolucionários


incompatíveis com a democracia.
o De facto, mediante um sistema de alianças evocativo do ideal de unidade cristã
europeia, o Congresso de Viena (1814 - 1815) e a Santa Aliança procuraram preservar o
mais possível, no plano doméstico, o estilo de governo autocrático típico do Antigo
Regime, enquanto tentavam sustentar a moderna autonomia no âmbito da política
internacional.
o Mas o jogo político e económico internacional, em interação com as lutas internas em
prol da democracia, acabou esvaziando a política deste conteúdo ideológico,
substituindo-o pelo pragmatismo diplomático articulado através do direito
internacional positivo.

O concerto europeu
o Foi um conjunto de práticas diplomáticas, instrumentalizadas pelo direito internacional
de orientação positivista, que pela 1ª vez expressava exemplarmente o modelo
westphaliano.
o Esse conjunto de práticas era governado por um consenso das elites aristocráticas
europeias, em cujas mãos haviam permanecido os assuntos de política internacional,
e, portanto, as decisões sobre os objetivos e oportunidades do uso da capacidade
militar e diplomática das grandes potências.
o O que se passou, portanto, foi a formação de um sistema de Estados territoriais
soberanos, que deu origem à “política internacional” como conjunto de fenómenos a
partir do declínio político do Sacro Império, documentado na celebração da Paz de
Westphalia.
o Contudo, a política internacional e sua dinâmica passaram a apoiar-se inicialmente
sobre o direito “internacional”, e não ainda sobre o estudo das Relações Internacionais
baseado numa Teoria das Relações Internacionais.
o Do ponto de vista político, o “concerto europeu” foi uma expressão do fenómeno
“equilíbrio de poder” (ou “balança de poder”), que pressupunha a “igualdade” entre
Estados cooperando sob o direito internacional.
o Contudo, na realidade, o “equilíbrio de poder” do concerto europeu sustentava um
programa de exploração colonial e formação de alianças secretas e rivalidades, num
complexo jogo de interesses políticos e económicos, frequentemente destrutivo das
sociedades colonizadas e instigador de tensões políticas entre os países europeus.

A evolução teórica das RI tem sido marcada por “Grandes debates”


o Registam o confronto das teorias emergentes com as teorias dominantes.
o O confronto entre novas e antigas teorias dá-se após mudanças significativas na
estrutura e no funcionamento do sistema internacional.
o Por entender que a teoria dominante não é capaz de dar conta de elementos novos, que
se destacam no curso das RI, os analistas procuram aprofundar as suas reflexões visando
obter formulações teóricas mais ricas, que abram caminho ao conhecimento mais
verdadeiro da realidade das RI.

1º Debate: Idealismo/Realismo (corrente dominante Liberal-idealista vs. corrente emergente


do Realismo)
o Deflagrada a guerra em 1914, os EUA permaneceram inicialmente afastados do conflito.

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o Mas os americanos, liderados pelo presidente Woodrow Wilson, mudaram de posição


em resposta à beligerância alemã sobre o tráfego comercial do seu país com as
Potências Aliadas.
o Justificando o seu pedido de declaração de guerra formulado ao Congresso em abril de
1917, Wilson argumentou: “A atual guerra submarina alemã contra o comércio é uma
guerra contra a humanidade”.
o Tais medidas incluíam a abolição da diplomacia secreta, a redução de armamentos, a
remoção de barreiras comerciais, reajustamentos de territórios.
o Porém, a mais ousada de todas essas iniciativas foi a do “ponto quatorze”: a criação de
uma associação de nações para o oferecimento de garantias mútuas de independência
política e integridade territorial: “Liga das Nações” (1920-1946), uma organização
política intraestatal permanente para a preservação da paz. A criação dessa organização
acabou por ser incorporada no Tratado de Versailles, de 1919, que pôs fim à I GM.
o As palavras de Wilson expressavam a sua convicção de que a sua política poderia
oferecer ao mundo “aquelas inspirações morais que estão na base de toda a liberdade”,
e prenunciavam como o seu estilo e pensamento iriam influenciar a prática da política
internacional no futuro próximo.
o No fim da guerra, Wilson patrocinou um plano para manutenção da paz, baseado numa
visão moralista e idealista do direito internacional expressa nos seus famosos “Quatorze
Pontos”, onde fez um conjunto de propostas para a adoção de várias iniciativas e
medidas cooperativas, p/ prevenir a guerra e manter a paz.

 14 Pontos de Wilson
1º Tratados de paz após negociações à luz do dia, a fim de acabar com a diplomacia
secreta;
2º Livre navegação em todos os oceanos, em tempo de paz e de guerra;
3ºTanto quanto possível, supressão de todas as barreiras alfandegárias (isto é, o livre
acesso das mercadorias americanas aos mercados até então protegidos);
4ºDesarmamento, sempre que possível, sem ameaçar a ordem interna;
5ºResolução dos problemas coloniais, respeitando o bem-estar dos colonizados tanto
como as exigências dos colonizadores;
6ºEvacuação dos territórios russos ocupados, direito das populações a disporem de si
próprias, com a assistência de outras nações;
7ºEvacuação e restabelecimento da Bélgica;
8ºEvacuação e restabelecimento dos territórios da Alsácia-Lorena à França;
9ºRectificação das fronteiras italianas numa base nacionalista;
10ºAutonomia dos povos que compõem o Império Austro-Húngaro;
11ºEvacuação e restabelecimento da Roménia, da Sérvia e do Montenegro; livre acesso
ao mar pela Sérvia; revisão das fronteiras nos Balcãs para satisfazer as aspirações nacionais
históricas;
12ºAutonomia para os povos não turcos do Império Otomano; independência da
Turquia; garantias para a livre passagem do Bósforo e pelos Dardanelos;
13ºFundação de um Estado polaco independente, com livre acesso ao mar;
14ºCriação de uma Sociedade das Nações que assegure a independência política e a
integridade dos Estados grandes e pequenos

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o A criação da Liga das Nações dava realidade a algumas das ideias veiculadas nos
“projetos de paz perpétua” do século XVIII e representou uma primeira tentativa
concreta de mudança das práticas políticas típicas do modelo westphaliano.
o A esperança de Wilson era que a cooperação internacional através do direito
internacional repassado de um moralismo idealista pudesse oferecer os meios para a
manutenção da paz duradoura.
o Do ponto de vista ideológico, o liberalismo democrático e idealista wilsoniano
contrastava com a visão leninista da política internacional, marcada pela sua denúncia
do imperialismo capitalista, sua ênfase no internacionalismo proletário e seu desejo de
uma revolução socialista internacional.
o O cenário foi assim descrito por Hoffmann: “Velhos sonhos normativos liberais estavam
a ser oferecidos pelo tratado da Liga das Nações, enquanto ao mesmo tempo a jovem
União Soviética estava a pregar o fim da própria diplomacia”.
o Entre esses dois polos posicionavam-se diversos autores como Woolf, Zimmern, Angell
e Mitrany –que acabaram rotulados de “idealistas” –impressionados com as
transformações sociais oriundas do rápido progresso industrial e convictos da
necessidade da cooperação internacional mediante instituições supranacionais.

II Guerra Mundial
o Precipitou reações por parte de intelectuais, condenando o “utopismo” da postura e
dos meios de ação típicos do wilsonianismo.
o Surgiu, então, o livro The Twenty Years’ Crisis, 1919-1939, de Edwad Carr, que se tornou
a referência que emblematiza o começo do estudo “científico” das RI, marcando assim
o início da tradição da TRI.
o Um dos pontos centrais da argumentação de Carr era que, embora o conhecimento
científico fosse um resultado tanto de “finalidades” práticas quanto de “análise”
abstrata, era possível adotar-se uma postura “realista” capaz de tirar do trabalho
intelectual as ideias visionárias de mudança da realidade.
o Portanto, a TRI surge como uma tomada de posição “realista” diante dos factos da
política internacional e da avaliação que diversos políticos e autores à época faziam
desses factos.
o Isto significa que o primeiro “debate” do estudo das RI como disciplina que se professava
“científica” foi o debate do “realismo” contra o “idealismo” do período entre guerras.
o Com o livro de Carr, começa a ganhar preponderância a visão teórica “realista” da
política internacional.
o O realismo caracteriza-se pela justificação do uso da força, seja como condição
inevitável da vida em sociedade, seja como meio de se atingir a paz no mundo.
o Com o advento da II Guerra Mundial, este argumento típico do realismo dirige-se contra
as esperanças liberais idealistas, de que a observância de princípios morais, em nome
da liberdade e da democracia, poderia oferecer a base do convívio internacional
pacífico.
o Para o realismo, as guerras não tinham sido o resultado casual de algumas circunstâncias
acidentais, ou do comportamento de alguns homens maus, e sim uma consequência das
condições inerentes à política e ao sistema internacional.
o O grande impulso da disciplina de política internacional ocorre nos EUA. Razões:
o Os EUA tornaram-se potência hegemónica: à pax Britannica do século XIX sucedia a
pax Americana do século XX.

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o Nos EUA havia condições institucionais favoráveis ao desenvolvimento da disciplina


(possuíam um sistema universitário mais flexível e variado do que os de países
europeus).
o Dada esta flexibilidade e variedade, diversas universidades americanas tinham grandes
departamentos de Ciência Política, com capacidade suficiente para dedicar recursos ao
estudo da política internacional.
o Por outro lado, os Estados Unidos não tinham uma carreira diplomática com um
programa de treino fechado, que tendesse a circunscrever ao seu âmbito institucional
as discussões de política externa.

O livro de Hans Morgenthau, Politics Among Nations (1947)


o Foi a obra de maior influência no início do debate académico sobre RI entre os
americanos.
o Imigrante, professor de direito internacional e influenciado por conceitos sobre o Estado
típicos de historiadores como von Treitschke e pela sociologia de Max Weber,
Morgenthau fixou-se nos EUA para criar uma ciência com um conteúdo normativo sobre
o tipo correto de ordem social para um mundo melhor, mas com as proposições
baseadas em factos reais, e não em utopias.
o A história do pensamento político resume-se ao debate entre 2 escolas:
o “A escola idealista acredita que uma ordem política racional e moral, deriva de
princípios abstratos, válidos universalmente… Ela pressupõe que a natureza humana
é boa e maleável sem limites [...]
o A escola realista acredita que o mundo, imperfeito como é de um ponto de vista
racional, é o resultado de forças inerentes à natureza humana. Para tornar o mundo
melhor, devemos agir com estas forças e não contra elas.” Morgenthau acrescenta:
“Sendo este mundo, por inerência, um mundo de interesses opostos e de conflitos
entre estes, não podem nunca os princípios morais serem realizados, mas devem o
mais possível, serem aproximados através do equilíbrio sempre provisório dos
interesses, e da solução sempre precária dos conflitos. Esta escola vê num sistema
de restrições e de equilíbrios um princípio universal para todas as sociedades
pluralistas. Ela invoca o precedente histórico, em vez dos princípios abstratos e
tende para a realização do mal menor em vez do bem absoluto.”

 “seis princípios fundamentais” do realismo político:


1. A política é governada por leis objetivas com raízes na natureza humana.
2. O marco indicador da política internacional deve ser o conceito de interesse definido
em termos de poder. A política externa deve minimizar os riscos e maximizar os benefícios.
3. O tipo de interesse que impulsiona a ação política e o conteúdo do conceito de poder
são determinados pelo ambiente político e cultural.
4. O realismo político é consciente da tensão entre o imperativo moral e as exigências
da ação política. Sendo animado pelo princípio moral da sobrevivência nacional, o Estado não
pode admitir que a reprovação moral prejudique o sucesso da ação política.
5. Identificar o nacionalismo particular e as intenções da providência divina é
moralmente indefensável. O conceito de interesse definido em termos de poder previne tal
demência política.
6. A esfera política é autónoma em relação às esferas da economia, da ética, do direito
e da religião. O objetivo do realismo político é contribuir para a autonomia da esfera política.

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o A formulação de Morgenthau sobre os fundamentos da política internacional era


baseada, portanto, sobre as noções de poder e de interesse nacional objetivo.
o Ao mesmo tempo, era livre de maiores sutilezas teóricas e sofisticações interpretativas,
presentes em obras como Paz e Guerra entre as Nações, de Raymond Aron.
o Assim, Morgenthau motivou o desenvolvimento do debate académico sobre a política
internacional.
o A teoria realista que floresceu nos EUA após a II GM em reação ao moralismo utópico
do estilo de política de Wilson rapidamente ganhou adeptos.
o O debate entre o realismo e o idealismo ocorreu entre o final da II GM e meados dos
anos 1950, sendo marcado pelo final da Guerra da Coreia (1953).
o A resultante ascendência ganha pelo realismo influenciou homens de estado como Dean
Acheson, George Kennan e Henry Kissinger.
o O realismo tornou-se assim uma importante referência teórica para a política externa
americana no período da Guerra Fria.
o Foi assim que a visão teórica do “realismo” veio a praticamente dominar as discussões
sobre a política internacional após a II GM, tornando, inclusive, o estudo da estratégia a
área preponderante da disciplina de meados dos anos 1950 a meados dos anos 1960.
o Os realistas viam o sistema internacional como “anárquico” (não há princípios
normativos superiores para ordenar o todo) e postulavam o Estado como único ator
relevante, excluindo atores não estatais do campo da política internacional.
o Os realistas entendiam, ainda, que o Estado é um ator “racional”, isto é, um ator capaz
de perseguir coerentemente fins escolhidos (interesse nacional).
o Além disso, o processo político era visto como uma luta pelo poder, e a primazia era
dada a assuntos relacionados ao uso da capacidade militar e sua influência sobre a
estruturação da ordem mundial.
o As chamadas “teorias parciais”, que investigam aspetos delimitados dos fenómenos
constitutivos da política internacional, começaram a desenvolver-se contra esse pano
de fundo.
o Tornou-se comum, enfim, tratar a política internacional como um conjunto de questões
de segurança nacional relacionadas ao uso da força militar.

Conclusão do 1º Debate
o A corrente idealista acredita na perfeição humana, no Direito Internacional e na
possibilidade de existência de paz entre os Estados.
o Para os Idealistas, a realização desses ideais depende do aperfeiçoamento das
instituições internacionais, o qual, por sua vez, deve resultar da cooperação entre os
Estados.
o Para os Realistas, por outro lado, as RI são determinadas pelas relações de poder.
o Os Realistas desdenham do Direito Internacional, por considerarem que o direito
prevalece somente enquanto não colidir com os interesses dos Estados que dispõem de
recursos para impor os seus interesses aos demais.
o Na realidade, acreditam que o direito e a ordem internacional decorrem diretamente,
da correlação de forças entre aqueles que detêm maior poder.
o As mudanças ocorridas na estrutura do SI após a II GM pareciam confirmar a validade
dessas teses realistas.
o A formação dos dois blocos de poder antagónicos e a rivalidade das duas superpotências
(norte-americana e soviética), hegemónicas nos seus respetivos blocos, demonstrou

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que as possibilidades de se alcançar a paz mundial, tal como pensavam os Idealistas, não
passava de uma grande ilusão.

 Conceitos: Relações Internacionais, Estado, Nação, Soberania, Ciência


Política, Poder, Anarquia, Comunidade e Sociedade Internacional,
Regimes Internacionais, Níveis de Análise

 Relações internacionais
o Conjunto das relações/interações/comunicações que se estabelecem entre os
vários atores das RI e que atravessam as fronteiras.
o As RI levadas a cabo pelos príncipes e pelos Estados foram, durante muito tempo,
quase exclusivamente motivadas por preocupações de segurança: das fronteiras,
dos abastecimentos dos mercados, dos sujeitos, e mais tarde dos cidadãos, no
estrangeiro. Todavia, desde o final do século XIX, a ideia de uma solidariedade da
comunidade dos homens e dos Estados acabaria por transformar as RI, levando à
criação de instituições coletivas permanentes (as OI), com objetivos de
cooperação, e até mesmo de unificação, no seio da sociedade internacional.
o Neste contexto, destacam-se as teorias de RI que procuram explicar de modo
rigoroso a dinâmica das RI, descobrir as forças e as estruturas que determinam as
relações entre os principais atores da cena mundial e eventualmente prever a sua
evolução. Não existe nas RI uma única teoria, mas um conjunto de abordagens,
com diferentes perspetivas quanto aos atores e seus objetivos. Têm a finalidade
de formular métodos e conceitos que permitam compreender a natureza e o
funcionamento do sistema internacional, bem como, explicar os fenómenos mais
importantes que moldam a política mundial (...ações, interações, conflitos,
negociações...)
o Os realistas concentram-se no Estado como ator fundamental, defendendo que o
seu principal objetivo é a procura de poder.
o Os pluralistas concordam com os realistas que para entender as RI temos de
compreender o comportamento dos atores, mas discordam da importância
atribuída ao Estado: um de muitos atores das RI.
o Os estruturalistas, ao invés de se concentrarem nos atores, olham a estrutura do
sistema e os constrangimentos que esta impõe aos atores. Assim, veem os Estados
e outros atores como severamente circunscritos nas suas ações e com menor
liberdade de ação. Para compreender o sistema internacional temos de nos
concentrar nestas estruturas mais do que no comportamento e escolhas dos
atores individuais.
o Existem diferentes olhares sobre a realidade que resultam em diferentes
formulações teóricas sobre a mesma em resultado da busca de uma explicação
teórica que permita um entendimento mais preciso do real.
o O estudo das RI é fundamental para compreendermos o mundo em que vivemos,
cada vez mais internacionalizado, integrado e globalizado.
 Estado
o Entidade político-social juridicamente organizada para executar os objetivos da
soberania nacional. O primeiro autor que introduziu o termo Estado, no sentido próximo
do atual, foi Maquiavel, na obra “O Príncipe”.
o Estado vs. Nação: O conceito de nação envolve a existência de vínculos comuns entre
os habitantes de determinado local, que se caracterizam, principalmente, por relações
qualificadas por fatores subjetivos que decorrem das mais diferentes origens (racial,
geográficas, religiosas, culturais). Conjunto homogéneo de pessoas que se consideram

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ligadas entre si por vínculos de ‘sangue’, idioma, religião, cultura, ideias, objetivos. A
Nação consiste numa comunidade que se caracteriza por sentimentos relativamente
uniformes. Já a definição de Estado envolve, necessariamente, o aspeto de organização
jurídica desse mesmo conjunto de pessoas (sociedade). Essa distinção explica por que
uma nação surge antes do próprio Estado e por que as nações podem subsistir sem o
Estado (como a nação judaica antes da criação do Estado de Israel). Também é possível
que várias nações estejam reunidas sob um mesmo Estado (Estado “multinacional”),
assim como o Reino Unido e como sucedia na antiga União Soviética. E há ainda nações
divididas entre dois ou mais Estados, como a nação alemã na época da GF (Alemanha
Ocidental e Alemanha Oriental); a nação coreana (Coreia do N e Coreia do S).

 Nação
o Conjunto de indivíduos ou povo de um país que habitam o mesmo território, falam a
mesma língua, têm a mesma religião, partilham os mesmos costumes e obedecem à
mesma lei. Um Estado pode conter uma ou mais nações, assim como podem existir
nações sem território (ex: povo curdo).

 Povo
o Conjunto das pessoas dotadas de capacidade jurídica para exercer os direitos políticos
assegurados pela organização estatal. Difere da população, cujo conceito envolve
aspetos meramente estatísticos do nº total de indivíduos que se sujeitam ao poder do
Estado, incluindo, por exemplo, os estrangeiros, apátridas e os visitantes temporários.
O conceito de nação contém um sentido político próprio: a nação é o povo que já
adquiriu a consciência de si mesmo.

 Soberania
o Nas RI é a qualidade do poder político de um Estado, que não está submetido a nenhuma
autoridade superior. É o atributo de um Estado que se refere aos seus direitos de
exercer, completamente, jurisdição sobre seu próprio território e sobre um
determinado povo. Os Estados, enquanto unidades soberanas, têm o direito de ser
autónomos e independentes internamente e de ser reconhecidos pelos demais Estados
do SI. Ainda que variem em poder, em termos de soberania todas as entidades são
iguais. É um conceito horizontal (nas relações entre iguais) e vertical (poder absoluto
sobre a sua jurisdição).
o Soberania vs. Autonomia
1. A soberania representa mais do que autonomia, no que diz respeito ao grau de
independência e desprendimento com que é exercido o poder.
2. Segundo Marcelo Caetano, a soberania é poder político supremo, porque não está
limitado por nenhum outro poder na ordem interna; e é poder político independente,
porque na sociedade internacional não tem de acatar regras que não sejam
voluntariamente aceites.
3. Segundo correntes positivistas, a soberania é juridicamente ilimitada no âmbito
territorial do Estado; segundo correntes jusnaturalistas, a soberania encontra barreiras:
no direito natural; na coexistência das nações; e nas próprias finalidades do Estado. Já a
autonomia observa limites mais severos: é limitada ainda pela capacidade de disposição
de poder conferido pelo ente soberano.
4. A autonomia apresenta-se como um círculo contido naquele que representa a
soberania.

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5. A soberania permite o exercício da autonomia, mas cuida de restringi-lo a certas


distribuições de competência.
6. O poder soberano, como fonte originária da ordem normativa, estabelece e regula os
termos do poder autónomo.
7. A soberania carateriza o Estado na ordem internacional, enquanto a autonomia
interessa à ordem interna somente.
o Princípio de autoridade suprema e inquestionável.
o Dimensão interna e externa: Um órgão com poder de tomar decisões que são impostas
a todos os agentes dentro do Estado.
o Capacidade do Estado de atuar de forma independente e autónoma no SI.
o Implica a igualdade legal e formal de todos os Estados e a inviolabilidade da sua
integridade territorial e da sua independência política.

 Ciência Política
o Teoria e prática da política e a descrição e análise dos sistemas políticos e do
comportamento político.
o Abrange diversos campos, como a teoria e a filosofia políticas, os sistemas políticos,
ideologia, teoria dos jogos, economia política, geopolítica, geografia política, análise de
políticas públicas, política comparada, relações internacionais, análise de relações
externas, política e direito internacionais, estudos de administração pública e governo,
processo legislativo, direito público (como o direito constitucional) e outros.
o As abordagens da disciplina incluem a filosofia política clássica, estruturalismo,
behaviorismo, racionalismo, realismo, pluralismo e institucionalismo. Enquanto ciência
social, a ciência política usa métodos e técnicas que podem envolver tanto fontes
primárias (documentos históricos, registros oficiais) quanto secundárias (artigos
académicos, pesquisas, análise estatística, estudos de caso e construção de modelos).
o Ciência Política e Política tem significados diferentes. A Ciência Política é o
conhecimento, a disciplina que estuda os acontecimentos, as instituições e as ideias
políticas, tanto em sentido teórico (doutrina) como em sentido prático (arte), referindo
ao passado, ao presente e a possibilidades futuras. Observa-se que o Estado é a matriz
do estudo da Política.
o Conceito operacional de Ciência Política: disciplina social e autónoma que engloba
atividades de observação, de análise, de descrição, comparação, de sistematização e
de explicação dos fenómenos políticos.

 Política
o Processos que determinam quem adquire algo, quando e como (Lasswell). Política pode
ser tanto a ciência dos fenómenos referentes ao Estado, a um sistema de regras
respeitantes à direção dos negócios públicos, a arte de bem governar os povos, quanto
um conjunto de objetivos que formam determinado programa de ação governamental
e condicionam uma ação. Para as RI, o mais importante é a ideia do conjunto de
objetivos que determinam as orientações e as ações dos atores, no caso os
internacionais.

 Poder
o Nas abordagens realistas poder é a variável predominante nas relações entre os atores
internacionais. Poder não só determina o comportamento dos atores estatais, que

Joana Natário, LRI 11


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

segundo os realistas é condicionado pela busca incessante de incremento de poder,


como também é uma característica inerente deles.
o ter a faculdade, possibilidade de ou autorização para realizar alguma coisa;
o ter ocasião, oportunidade, meio de dispor de força ou de autoridade;
o força física ou moral, capacidade de influência;
o o direito de deliberar, agir, mandar.
o Segundo Parsons, poder é a capacidade que pessoas ou coletividades têm de conseguir
que as coisas sejam feitas de acordo com a sua vontade. Para Weber, poder é a
possibilidade de impor a própria vontade ao comportamento alheio. Arendt acredita
que o poder é a faculdade de se alcançar um acordo quanto a uma ação comum, no
contexto da comunicação livre da violência. Para Viotti, poder são as capabilities ou
capacidades relativas de atores como os Estados.
o Capacidade de o Estado influenciar outros no sistema internacional.
o Hard Power - força (militar): utilização de todo o tipo de instrumentos ou
meios militares para acatar a sua vontade; utilização da força por parte do
estado (EUA)
o Soft Power – negociação (diplomacia): persuasão, situações que tentam
levar o estado a acatar a nossa vontade, mas que não seja pela força (União
Europeia)
o “Smart Power”: utilizado durante a administração Obama; o objetivo é
tentar ligar o hard power ao soft power, de forma a usar a força militar de
forma inteligente, conjugando os recursos militares com a diplomacia.
o Dentro o próprio Estado, há Estados que têm poder:
o Político: influenciam o comportamento dos estados: EUA/EU
o Económico: G20/EU
o Social: França (sociologia)/UE (a legislação europeia é a mais avançada e
serve de exemplo às demais)
o Cultural: UE/Grécia/Itália/Portugal/França/UK/Holanda (histórico); EUA
(American way of life)
o Financeiro: G20
o Comercial: China/EUA/EU
 Potencial: O estado tem recursos para os desenvolver e poder tornar-se real (Ex.:
O Japão possui recursos tecnológicos para se tornar numa grande potência militar,
mas não pode possuir armamento devido às cláusulas do tratado de paz pós 2GM,
tem poder potencial, mas não tem poder real.
 Real: os que têm porta-aviões e armamento nuclear; o facto de o terem faz com
que sejam um grupo privilegiado sobre os outros estados.
o Portugal não tem poder potencial nem poder real.

Natureza do poder em mudança


o Novos mecanismos:
o Do poder militar para o poder económico;
o Do poder duro (Hard)
 Capacidade de comandar a ação de outros, através de sanções ou incentivos;
 Recursos: força, sanções, dinheiro, subornos.
o Para o poder suave (Soft)
 Capacidade de moldar as preferências dos outros usando a atração em vez da
coação;
 Recursos: cultura, ideologia, política externa atrativa, legítima, com
autoridade moral.

Joana Natário, LRI 12


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o Poder inteligente (Smart): poder suave reforçado por poder duro.

 Divisão de poderes
o Também chamada de sistema de freios e contrapesos (checks and balances system) é
um princípio geral de direito constitucional. Foi sugerida por Aristóteles, John Locke e
Rousseau, mas é a Montesquieu que se deve a sua definição e divulgação. Foi afirmada,
primeiramente, nas Constituições das ex-colónias inglesas na América. Num sentido
técnico, visto que o Poder Político é uno, indivisível e indelegável, não se poderia falar
em “separação de poderes”, mas em distinção de funções ou divisão funcional de poder:
1. Função legislativa: consiste, principalmente:
a. na edição de normas gerais e abstratas, que inovem a ordem jurídica: as leis em
sentido material;
b. na fiscalização e controle dos atos praticados no exercício da função ex.
2. Função executiva: com atuação nos fins diretamente inerentes à administração do
Estado (em sentido amplo), incluindo a economia e a defesa. Possui três missões
básicas: intervenção, fomento e serviço público.
3. Função judicial: a aplicação ou a revisão da aplicação das normas jurídicas a casos
concretos, em caráter definitivo (garantia do monopólio judicial da última palavra), com
o objetivo de compor litígios ou de evitar que se propaguem.

 Anarquia e Ordem internacional


o Ausência de uma potência que estabeleça e garanta a ordem internacional. É atribuída
a Thomas Hobbes (século XVII), que descrevia o ‘estado de natureza’ de forma muito
negativa, como um estado de medo e de insegurança permanente, refletindo uma visão
particularmente pessimista da natureza humana. Num contexto de guerra de todos
contra todos não se pode excluir a possibilidade de recurso à violência, porque as
circunstâncias não permitem eliminar as desconfianças existentes, sendo a força e a
astúcia as qualidades que permitirão a sobrevivência num meio hostil. Daí Hobbes
defender a criação de uma entidade com o direito exclusivo do uso da força, trocando a
liberdade por segurança na criação do Estado, uma força superior, autoritária e
centralizada, a que Hobbes chama Leviatã. Contudo, este apenas regula as relações
dentro de um Estado. As RI não estão sujeitas à força ordenadora e controladora de
qualquer autoridade superior, sendo dominadas por preocupações de segurança e
sobrevivência e caracterizam-se por um estado de potencial guerra entre todas as
partes (pensamento realista).
o Para autores como Hans Morgenthau e Raymond Aron, a política internacional pode
ser caracterizada como relações entre Estados num clima de permanente desconfiança
e reserva, sem que nunca se possa excluir em absoluto a possibilidade de recorrer à
guerra para preservar interesses fundamentais. Quem assegura a sobrevivência das
pessoas são os Estados: impõem a ordem a nível interno, desarmando e punindo quem
transgredir, e procuram defender os cidadãos de um ataque externo, participando no
SI, podendo incluir uma política de alianças ou um conjunto de acordos defensivos, mas,
fundamentalmente, os Estados dependem de si próprios para a sua sobrevivência.
(Estado: único ator importante nas RI e depende de si próprio).
o Anarquia é uma característica definidora da política internacional e do sistema
vestefaliano de RI, onde não existe um poder soberano superior que regule as entidades
do sistema. A anarquia internacional, mesmo a ‘madura’ (Barry Buzan), do final do
século XX e início do século XXI, baseia-se num sistema de autoajuda e de alianças, onde

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uns Estados são mais fortes do que outros e onde estes podem ter a tentação de
subjugar os mais fracos à sua força sup.
o Na terminologia política, o termo anarquia não é equivalente ao de desordem no meio
do caos, mas tão somente de ausência de governo efetivo. Este sistema é caracterizado
pela “autoajuda”, em que os Estados são obrigados a salvaguardar eles mesmos a sua
segurança e outros interesses vitais, e por guerras intermitentes, umas de grande
alcance outras de pequeno alcance. Enquanto algumas das grandes potências mantêm
uma preocupação constante com a sua segurança e estão prontas, a todo o momento,
a recorrer à força se necessário, a maioria dos Estados da sociedade anárquica
prossegue uma cooperação pacífica por largos períodos de tempo e procura estabelecer
entre si uma ordem estável e equilibrada.
o O modelo do sistema político dos Estados não pode ser alargado ao domínio
internacional já que, a este nível, não existe qualquer forma de autoridade efetiva em
exercício. Têm-se tentado lançar pontes entre as ordens interna e externa, dando relevo
aos conceitos de interdependência e de regimes internacionais. O conceito de
interdependência traz consigo a ideia de que os Estados estão a tornar-se cada vez mais
sensíveis e vulneráveis às mudanças económicas e tecnológicas processadas em outros
Estados e no sistema global como um todo, e de que estão a adaptar as suas políticas a
esta realidade.

o “O sistema internacional é anárquico.”


o Na ausência dos estados, a vida no sistema internacional seria “solitária, pobre,
desagradável, brutal e curta” (Thomas Hobbes)
o Não há uma autoridade superior que imponha ordem (leis, regras) aos atores
o Dentro dos estados, a ordem interna é imposta pelos governos.
o Fora dos estados, nas suas relações entre si: “estado natureza”, sociedade pré-
política, autoajuda.
o A sobrevivência depende do meu poder.
o Há uma tendência competitiva entre estados, pela acumulação de poder.
o O conflito e a guerra serão inevitáveis.

Sociedade anárquica
o Os estados formam entre si uma sociedade anárquica:
o O sistema internacional é anárquico, mas… os estados podem cooperar e interagir
com base em regras mutuamente acordadas.
o Instituições internacionais eficazes e com autoridade/legitimidade são
importantes.
o Abre a possibilidade de ordem no sistema internacional.
o Contributo importante para o estudo da governação global.

Ordem internacional
 Definição: “distribuição de poder entre estados e outros atores internacionais, que
desenvolve padrões relativamente estáveis de comportamentos e relações.”
 Ordem pós-2ª GM:
o Bipolaridade na era das superpotências.
o Liderança (poder) militar e ideológica.
o Estabilidade no sistema internacional ou tensão e insegurança?
 Ordem pós-GF:

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 Unipolaridade?
 Multipolaridade?
 Uni-multipolaridade (Huntington)?
o Conjunto de regras e normas instituídas na esfera internacional.
o A ordem internacional é estabelecida pelo Direito Internacional e cria o sistema
internacional (as regras do jogo sobre as quais todos os estados do sistema
internacional têm de funcionar). Foi instituída depois da 2 GM.
 Política=ONU/UE: tem um conjunto de regras e normas que orientam os Estados
no seu relacionamento uns com os outros.
 Económico=estatutos do Banco Mundial (conjunto de 5 instituições que lidera em
termos de regras do sistema económico-financeiro; FMI; EU
 Comercial=OMC
 Social=OIT/UNICEF/ACNUR/PNUD/FAO (quase todas as das nações unidas)
 Cultural=UNESCO

 Comunidade Internacional

Comunidade Sociedade
Caracteriza-se por laços de afetividade os laços baseiam-se em interesses
comuns
associação espontânea e natural resulta de necessidades pragmáticas de
associação ou convivência
estabelece-se pela via dos valores estabelece-se pela via das regras de
comuns associação e de resolução de conflitos

o Os participantes na comunidade internacional são seres humanos, que, por várias


razões, se juntam em associações, incluindo os Estados. A existência de uma
comunidade pressupõe a existência de obrigações morais entre os membros dessa
comunidade. Frequentemente, a utilização do termo comunidade internacional afirma
uma visão normativa da disciplina de RI, onde se procura identificar como promover a
constituição de uma efetiva comunidade internacional, sublinhando ser aquilo que se
entende ser o caminho que a humanidade deve levar. No entanto, não significa que este
seja sempre o escolhido. Interdependência e cooperação chocam muitas vezes com
confronto e competição na ordem global, que, no entanto, não é sinónimo de
comunidade internacional.

 Sociedade Internacional
o Para Hedley Bull (1977) “uma sociedade de Estados (ou sociedade internacional) existe
quando um grupo de Estados, que tem consciência de interesses e valores comuns,
formam uma sociedade, no sentido de se considerarem interligados por um conjunto
de regras comuns que orientam as suas relações e que partilham no trabalho das
instituições comuns. Se os Estados hoje formam uma sociedade, é porque reconhecem
certos interesses comuns e, possivelmente, alguns valores comuns e se consideram
obrigados a cumprir certas regras, por exemplo, o respeito mútuo pela independência
de cada um, pelos compromissos assumidos e por determinadas regras no uso da força
entre si. Simultaneamente, cooperam no funcionamento das instituições, como por
exemplo, os processos de direito internacional, o sistema de diplomacia e das OI e os
costumes e as convenções de guerra”.

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o É pluralista, no sentido de permitir a convivência de uma pluralidade de atores, cada


um com objetivos e lógicas alicerçados em tradições históricas próprias (podem ser
atores estatais ou não estatais, como as OI, multinacionais ou o indivíduo), é
diversificada, em termos da natureza das normas que orientam a convivência social e
em termos da forma como estas normas estão implantadas nas diferentes áreas
geográficas e temáticas (embora a obediência às normas possa não ser obrigatória, o
seu incumprimento tem um custo que resulta do impacto negativo sobre as expectativas
de outros, sob a forma de sanções ou mesmo reprovação moral e descrédito
internacional), e é evolutiva, porque a passagem do tempo reflete-se na distinção que
se vai fazendo entre as normas limitadas por lógicas particularistas ou imediatistas – que
acabam por cair em desuso quando as circunstâncias se alteram – e normas que
beneficiam de algum consenso e ganham espaço e legitimidade própria.

 Regimes Internacionais
o Instrumento para explicar o funcionamento e a evolução de processos de cooperação.
Nalguns casos mantiveram pressupostos estatocêntricos do neorrealismo (Krasner,
Stein), enquanto noutros casos (Kratochwil, Ruggie) os autores atribuem aos regimes
um grau de autonomia que entra em conflito com os pressupostos neorrealistas. Para
Krasner, “regimes são princípios, normas, regras e procedimentos de decisão em torno
dos quais convergem as expectativas dos atores. Princípios são um conjunto coerente
de afirmações teóricas sobre como funciona o mundo. Normas especificam padrões
gerais de comportamento. Regras e procedimentos de decisão são indicações
específicas de comportamento em áreas claramente definidas (...) Princípios e normas
definem o carácter essencial de qualquer regime. Embora se possam alterar regras e
procedimentos de decisão sem alterar a natureza fundamental de um regime, isto já
não é possível com princípios e normas. Regimes definem direitos básicos de
propriedade. Estabelecem padrões aceitáveis de comportamento. Coordenam tomadas
de decisão” (1985). Krasner nota que, por exemplo, um regime internacional liberal para
o comércio se baseia num contexto de princípios económicos neoclássicos que mostram
que a utilidade global é maximizada pelo livre fluxo de bens. A norma básica para um
regime liberal para o comércio é que as barreiras alfandegárias e não alfandegárias
devem ser reduzidas e, em última instância, eliminadas. Regras específicas e
procedimentos para a tomada de decisões estão identificados no GATT, ou atualmente
na OMC. Os regimes internacionais são aqueles conjuntos de disposições governativas
– processos, normas, regras e ainda, em alguns casos, instituições funcionais especiais
– instituídas para regular e controlar determinados tipos de atividades transnacionais
em que esta regulação e controlo aparecem como matérias de interesse comum a uma
série de Estados. Exemplo: os regimes internacionais instituídos para regular as taxas
de câmbio (no FMI), para eliminar obstáculos ao comércio internacional (nas várias
rondas do GATT, e hoje no âmbito da Organização Mundial de Comércio) e para impedir
a proliferação das armas nucleares através do Tratado de Não-Proliferação Nuclear e de
vários acordos entre Estados fornecedores de tecnologia nuclear e militar para
regularem as suas exportações.
o A ideia central da teoria dos regimes é que grande parte do relacionamento
internacional acontece segundo regras preconcebidas, que podem ou não ser escritas e
que são consideradas de benefício mútuo pelos participantes, ou pelo menos pelos
participantes mais importantes e influentes. São interessantes tanto para os
neorrealistas como para os estruturalistas, os institucionalistas ou os construtivistas.

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Para os estruturalistas é a ênfase sobre estruturas de poder menos visíveis que torna
atraente este conceito, bem como a promessa que oferece de desvendar os verdadeiros
interesses subjacentes. Para os institucionalistas, as teorias de regime recentram a
disciplina de modo a focar essencialmente questões e problemas de cooperação
internacional, mais do que a problemática da conflitualidade num contexto de anarquia.
Para os construtivistas, rótulo que pode incluir a Escola Inglesa, o que é essencial nas
teorias de regimes é o processo de desenvolvimento histórico de conhecimentos,
convicções e entendimentos partilhados.

 Níveis de Análise interestatal, transnacional, sistémico


o De acordo com Kenneth Waltz, os indivíduos, os Estados e o sistema global têm sido os
objetos mais comuns de análise em RI.
o De acordo com Barry Buzan, os níveis de análise têm 3 ideias fundamentais:
1. Capacidade de interação – os tipos e a intensidade de interação de que cada unidade
do sistema é capaz relativamente às outras;
2. Estrutura – as formas como as unidades se encontram dispostas umas em relação
às outras e como se diferenciam umas das outras;
3. Processo – a questão de saber até que ponto as unidades do sistema interagem
umas com as outras seguindo padrões recorrentes.
o No passado, era o nível interestatal que dominava, explicando o comportamento dos
Estados em termos das oportunidades e dos constrangimentos no palco internacional e
também das pressões e das necessidades económicas, sociais e políticas no interior do
Estado. Mas a partir de dada altura, os fenómenos transnacionais, isto é, fenómenos
que atravessam fronteiras sem serem necessariamente controlados pelos Estados,
passaram a assumir maior protagonismo na disciplina de RI. Obra de referência é a de
Robert Keohane e Joseph Nye, Transnational Relations and World Politics (1972). Houve
uma relativização da posição dos Estados no SI, chamando a atenção para a intervenção
de outro tipo de atores e para a forma como essa intervenção podia condicionar os
próprios Estados. A análise sistémica tem privilegiado a forma como a estrutura do S
constrange e é constrangida pelas unidades que participam no S, sejam Estados ou
outros intervenientes.
o Estes três níveis ajudam-nos a compreender políticas e processos internacionais no
mundo contemporâneo, mas não nos dão a chave para todas as circunstâncias, dado
que o mundo em que vivemos é demasiado complexo para poder ser reduzido a um
modelo. Contudo, algumas tendências vão-se tornando evidentes. Os adeptos de um
ponto de partida anárquico privilegiam a importância dos Estados e, portanto, tendem
a concentrar os seus esforços no nível interestatal (realismo clássico) ou no nível
sistémico (neorrealismo). Aqueles que pensam vislumbrar uma comunidade
internacional consideram muito importante estudar fenómenos a nível transnacional,
mas podem também adotar uma perspetiva mais sistémica. Os adeptos da ideia de
sociedade internacional tendem a desvalorizar as abordagens interestatais, preferindo
desenvolver os seus raciocínios nos outros níveis. Mas estas tendências são apenas isso,
e não consequências lógicas ou necessárias de opções anteriores a nível dos
pressupostos.
o No nível de análise sistémico, a atenção concentra-se no todo em vez de nas suas partes
constitutivas, ou seja, estamos perante uma análise sistémica ou holística. Parte-se
assim do princípio de que os padrões de conduta dos componentes do sistema são
determinados pelas estruturas que o compõem. Nesta conceção global, macro

Joana Natário, LRI 17


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comportamental, os Estados concretos e outros atores internacionais não se encontram


ausentes, mas aparecem como que em segundo plano.
o Em termos gerais, os partidários de uma abordagem que favoreça o nível do sistema
internacional estão convencidos de que este exerce uma influência mais profunda nas
partes que o compõem e não ao contrário. Uma abordagem sistémica ou holística
pressupõe não só que o todo é superior à soma das suas partes, mas, mais ainda, que a
estrutura do S determina a conduta das unidades que o compõem.
o O nível de análise representado pelo SI proporciona um modelo simples e claro, embora
abrangente, que faz corresponder objetivos homogéneos a todos os atores nacionais,
mas que também dá azo a imagens simplistas de Estados todos iguais, minimizando as
suas diferenças, os seus esforços de sobrevivência e independência dentro do S e
exagerando o grau em que o S determina a conduta das unidades que o constituem.
Dirigir a atenção para o Estado, pelo contrário, permite-nos constatar as características
peculiares e circunstâncias concretas dos atores, mas traz também o risco de uma
diferenciação excessiva que pode esconder os padrões gerais procurados pelo
teorizador.

 Neutralidade
o É um estatuto jurídico que confere aos seus titulares direitos (livre comércio com
os beligerantes) e obrigações (abstenção de qualquer ajuda militar aos
antagonistas).

Neutralidade permanente
o Consiste na eliminação do direito de fazer a guerra por um acordo internacional,
salvo em caso de legítima defesa.
o Ex: Bélgica–1831 a 1914; Luxemburgo–1867 a 1914; Suíça desde 1815

Neutralidade clássica
o Recusa em participar num conflito concreto. O Estado que a pratica é um Estado
neutral.

Neutralidade Colaborante
o Recusa dos Estados em participar militarmente e de forma direta num conflito
armado, embora colaborem com os beligerantes.

 Balança de Poder
o Situação de simetria de poder entre unidades estatais que lhes cria uma situação de
equilíbrio. Ele pode ser criado pelos atores internacionais de forma deliberada ou surgir
espontaneamente no S em virtude de combinações e arranjos políticos naturais que se
vão formando. Os Estados orientam as suas políticas externas em função do próprio
equilíbrio, nomeadamente, através de alianças, que podem ser de dois tipos: alianças a
priori, que se formam independentemente do tema/regime em questão; alianças a
posteriori, que se formam à medida do interesse dos atores em interação.

 Capabilities
o Capacidades internas de um Estado. Aquilo que no seu conjunto auxilia na determinação
do poder de um Estado. Como é um atributo do Estado, as capabilities são mais
importantes para as conceções cujo ator estatal é o ente mais relevante. Para Wendzel,

Joana Natário, LRI 18


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não basta que o ator tenha a posse de uma certa mistura de capacidades, é preciso
desenvolvê-las e articulá-las. São:
1. fatores geográficos;
2. população;
3. recursos naturais;
4. poder económico;
5. poder militar;
6. funções governamentais;
7. características da sociedade.

 Low Politics
o Temas considerados de menor importância pelos atores internacionais dentro da
agenda internacional. Associam-se a qualquer questão que não esteja ligada à
segurança e interesses estratégicos (ex.: meio-ambiente, direitos humanos,
desigualdades sociais). É considerada uma parte da agenda mais democrática e com
maior capacidade de formação de regimes internacionais.

 High Politics
o Temas considerados de maior importância pelos atores internacionais dentro da
agenda internacional. Associam-se às questões de segurança e interesses estratégicos.

 Dilema de Segurança
o Ideia desenvolvida por John Hertz, ocorre quando um Estado X começa a se armar tendo
em vista a sua própria proteção e, consequentemente, a sua autopreservação. Somente
um Estado poderoso militarmente poderá sobreviver no SI anárquico. Este armamento,
ainda que para fins defensivos, poderá fazer com que os demais Estados no SI adotem
uma postura agressiva em relação ao primeiro e também comecem a adquirir armas.
Esta reação por parte dos demais Estados gerará insegurança no 1º que reiniciará o
processo.

 Atores das relações internacionais


o Todos os agentes ou protagonistas com capacidade para decidir das relações de força
no SI, isto é, agentes com poder para intervir e decidir das RI aos seus mais variados
níveis, de forma a poderem atingir os seus objetivos. A política internacional depende,
em grande parte, do jogo dos atores. Podemos distinguir o ator principal (o Estado), os
atores públicos (OI) ou atores privados (indivíduos, empresas, ONG, etc.) ou, de outra
forma, atores principais, derivados e secundários.

 Estado
o Ator que tem poder para tomar decisão em tudo aquilo que tem a ver com o SI.
Atualmente, é difícil o Estado atuar individualmente, por isso, agrupa-se, coopera
em determinadas OI.
o Categoria política central nas relações entre povos e unidades políticas.
o É responsável pela organização e pelo controlo social, pois detém, segundo Max
Weber, o monopólio da violência legítima (coerção).
o Max Weber identificou três principais fontes de legitimidade política:

Joana Natário, LRI 19


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

 Com base em motivos tradicionais é derivado de uma crença de que as


coisas deveriam ser como foram no passado, e que aqueles que defendem
essas tradições têm um direito legítimo ao poder.
 Baseada em liderança carismática é a devoção a um líder ou grupo que é
visto como excecional heroico ou virtuoso.
 O terceiro é a autoridade racional-legal, no qual a legitimidade é derivada
da crença de que um determinado grupo tenha sido colocado no poder de
forma legal, e que seus atos são justificáveis de acordo com um código
específico de leis escritas.
o Weber acreditava que o Estado moderno se caracteriza, principalmente, apelando
para a autoridade racional-legal.
o Do ponto de vista interno, o Estado emite um conjunto de regras, normas que
regulam a nossa vida em sociedade, que têm q ter em conta instrumentos de que
o estado dispõe para nos obrigar a todos a cumprir (forças de segurança interna,
tribunais).
o Do ponto de vista externo, n tem nenhuma entidade acima de si que lhe limite a
sua ação.

 Estados de Jure e de facto


o A maioria dos estados são estados soberanos de jure e de facto (ou seja, existem
tanto na lei como na realidade).
o No entanto, por vezes, existem apenas como Estados de jure em que uma
organização é reconhecida como tendo soberania e ser o governo legítimo de um
território sobre o qual eles não têm controle real.

 Estado no Direito Internacional


o Os critérios legais para a independência não são óbvios.
o No entanto, um dos documentos frequentemente citado na matéria é a Convenção
de Montevidéu de 1933, o primeiro artigo de que dispõe:
o O estado como uma pessoa de direito internacional, deve possuir as
seguintes qualificações:
 uma população permanente;
 um território definido;
 governo;
 a capacidade de entrar em relações com os outros estados.

 Estado Pária
o Nação cuja conduta é considerada fora das normas internacionais de
comportamento por parte ou por toda a comunidade internacional (como a ONU)
ou por alguns países.
o Um Estado pária poderá enfrentar o isolamento internacional, sanções por
países que vejam as suas políticas e ações como inaceitáveis.

 Estado Falhado (Failed State)


o Novos Estados emergentes, que se viram confrontados com sérias dificuldades no
seu desenvolvimento enquanto plenas democracias e no estabelecimento de
fortes infraestruturas estatais básicas, constituindo, desta forma, Estados fracos,
frágeis, falhados ou colapsados.
o Devido à variedade de definições deste conceito, pode-se concordar que a sua
definição incorpora as seguintes características:

Joana Natário, LRI 20


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

a) Fragilidade e/ou colapso das instituições estatais e consequente


incapacidade de assegurar os bens e serviços básicos aos cidadãos;
b) Instabilidade política e económica por vezes associada a forte contestação
social;
c) Perda do monopólio legítimo do uso da força e legitimidade do Poder, cujas
decisões políticas não têm grande aceitação por parte da população;
d) Incapacidade de controlo efetivo sobre o território nacional (incluindo
fronteiras, zonas costeiras e arquipélagos);
e) Inexistência de um clima de Segurança, obediência e de ordem interna,
derivado do aumento da violência e da criminalidade, e possibilidade de exploração
deste ambiente pelas organizações criminosas e/ou terroristas;

 Tipos de Estado
o Para um Estado ser soberano, ‘o poder de querer e o poder de comandar não
podem estar subordinados a nenhum outro’. (Roland Mane–1976).
o Há certos Estados que estão subordinados a outros.

Estados Soberanos: estados de “jur” (193)


o Aqueles que teoricamente detêm um poder sem igual na ordem interna, nem
superior na ordem externa.
o Têm o poder de querer e de comandar.
o No interior do seu território, não admitem que nenhum outro poder se
sobreponha ao seu, na comunidade internacional gozam de todos os mesmos
direitos:
o Direito de fazer a guerra (jus belli) –usar a força para defender o seu
território e proteger os seus cidadãos.
o Direito de legação (jus legationis) –direito de enviar e receber agentes
diplomáticos.
o Direito de celebrar tratados internacionais (jus tractum)
o Direito de reclamação internacional, direito de usar internacionalmente
certos meios para defender os seus interesses e fazer valer os seus direitos.

Estados Federais
o União de Estados membros num só Estado central que se rege por normas
constitucionais comuns a todos os membros.
o Forma de evitar conflitos entre países do mesmo continente ou região.
o Há dois tipos de federalismo:
o Federações propriamente ditas/perfeitas (EUA, RFA, Suíça, Canadá)
o Federações imperfeitas ou fictícias (Brasil, Austrália)
Estados Unitários
o Estado simples em que há um só poder político para todo o território.
o O poder do Estado pode estar concentrado e centralizado nos órgãos centrais
(Estados unitários centralizados - Portugal) ou estar repartido pelos órgãos das
coletividades territoriais, a quem são atribuídos poderes e competências
relativamente autónomos (Estados unitários descentralizados - Espanha, Itália,
Grã-Bretanha).

o No entanto, há Estados que não desfrutam de nenhuma destas prerrogativas


soberanas de ordem externa: Estados não soberanos (Estados federados).
o Alguns desfrutam apenas de algumas dessas prerrogativas: Estados
Semissoberanos (Estados protegidos, exíguos e neutralizados)

Joana Natário, LRI 21


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

Estados Semissoberanos: decidem voluntariamente abdicar de uma parte da sua


soberania ou de uma prerrogativa do estado)
o Exíguos: delegam a política externa no Estado em que estão inseridos.
(Liechtenstein; Andorra; San Marino; Mónaco)
o Neutrais: perante conflitos ficam de fora, abdicam do direito de fazer
guerra, mas possuem um exército mínimo para questões de defesa e não
de ataque. (Áustria, Suíça)

Estados Protegidos
 Protetorado
o “Associação de Estados criada por um tratado onde um Estado soberano (Estado
protetor) assume a obrigação de proteger outro (Estado protegido ou sob
protetorado), recebendo em contrapartida a faculdade de dirigir a gestão das RI
do 2º, e em alguns casos mesmo a sua política interna”.
o A situação de protetorado resulta de um acordo entre Estados soberanos e não
determina a perda total da soberania do Estado protegido, que sofre, no entanto,
importantes limitações na sua capacidade de agir na esfera internacional e,
eventualmente, na esfera interna.
o O Estado protegido mantém a faculdade de se constituir e de legislar e pode
denunciar o acordo que deu origem à situação de protetorado.
o Não perde totalmente a soberania.
o Não tem de respeitar a constituição do Estado protetor, mas o tratado que com
este celebrou (é semissoberano).
o Exemplos: Egito, protegido pela Grã-Bretanha de 1914-1936; Tunísia e Marrocos,
protegidos pela França.

Estados Exíguos
o São comunidades políticas que, pela sua pequena extensão territorial e escassa
população não estão em condições de exercer plenamente a soberania.
o São Estados independentes e sujeitos de Direito Internacional.
o Têm o direito de celebrar tratados internacionais e podem ser parte de OI de
carácter técnico.
o Têm direito de legação, embora normalmente não o exerçam, pois servem-se da
representação diplomática dos Estados limítrofes.
o Não têm direito de fazer a guerra.
o Mantém no domínio interno, a faculdade de fazer leis de acordo com as regras
constitucionais, e de criar os órgãos necessários para a sua execução.
o Exemplos: Principados do Mónaco, do Liechtenstein, República de San Marino,
Principado de Andorra.

Estados Neutralizados
o São aqueles que, por vontade própria e de acordo com a vontade manifestada
pelas principais potências internacionais, gozam de um estatuto de neutralidade
permanente.
o Abdicam do direito de fazer a guerra, exceto em legítima defesa.
o Normalmente é aceite o estatuto quando se pretende manter esse Estado fora das
lutas políticas e militares entre grupos de estados e dispor de zonas de paz em
períodos de conflito militar generalizado.

Estados Não Soberanos

 Estados Federados

Joana Natário, LRI 22


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

o Quando uns certos números de coletividades territoriais politicamente


organizadas decidem unir-se e aceitam, mediante a adoção de uma Constituição
comum, transferir para os órgãos da União as suas prerrogativas soberanas de
ordem externa, e reconhecem a estes órgãos competências para decidir sobre
alguns domínios da sua ordem interna.
o Não perdem a qualidade de Estados, mas não são soberanos, na medida em que
as prerrogativas soberanas no domínio das relações externas são transferidas para
o Estado federal, e os atos legislativos por eles adotados têm de respeitar a
Constituição federal.
o Os Estados federados continuam a ser Estados porque podem elaborar as suas
próprias constituições e fazer leis no domínio da sua competência, dispõem de
meios próprios (polícia e tribunais) para fazer respeitar as suas leis dentro do
território que lhes pertence.
o Mas não são soberanos, porque as suas constituições têm de respeitar a
Constituição federal.
o A suas leis têm de se subordinar às leis emanadas pelos órgãos da Federação e
podem ser anuladas pelos tribunais federais se forem contrárias à Constituição
federal ou se incidirem sob domínios reservados às leis federais.
o Não podem manter RI próprias, dado que perdem o direito de legação, de celebrar
tratados, de reclamação internacional e de fazer a guerra, a favor do Estado
federal (prerrogativas)
o Compete aos órgãos federais definir os objetivos sociais e políticos de toda a
federação e afirmar internacionalmente os interesses e a vontade desta como um
todo, é a federação que constitui o Estado soberano.

Estado-nação
Nacionalismo clássico: sobreposição entre fronteiras políticas e culturais.
o O mundo está dividido naturalmente em comunidades culturais distintas (nações).
o Essas comunidades devem ser a base da expressão política – ou seja, ter “soberania
popular” (Rousseau).
o Mas todos os Estados são em alguma medida multiculturais e multinacionais!
o Giuseppe Mazzini (séc. XIX): “Cada nação um Estado, um só Estado para toda a nação”).
o Woodrow Wilson (séc. XX): 14 pontos/Tratado de Versailles
Contexto histórico: fim dos impérios multinacionais na Europa – princípio da autodeterminação
dos povos
o Nacionalismo e conflito
 Ordem hierárquica de prioridades do Estado:
1. Segurança (como é que os estados salvaguardam esta segurança? Através das
forças armadas, da diplomacia, OIG=NATO art.5 segurança coletiva)
2. Bem-estar económico e social.
3. Imagem/ prestígio/ perceção (o património histórico ajuda a criar a imagem que
se tem do país)

 Elementos do Estado
o O Estado define-se pela reunião de três critérios: um território, um povo e um
governo (poder político soberano).
o Juridicamente, a unidade estatal distingue-se das outras coletividades territoriais
pelo critério da soberania.
o Os Estados diferem uns dos outros em função do seu tamanho, da sua potência,
da sua força militar e da forma do seu governo (regime político).

Joana Natário, LRI 23


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

 Povo
o Não é possível conceber um Estado sem povo.
o Todavia, nem toda a população que vive num território constitui o elemento
humano do Estado. Apenas os indivíduos que estão sujeitos às normas gerais
definidas pelos órgãos do poder fazem parte da população do Estado - os seus
nacionais.
o Conjunto de indivíduos que se constitui em sociedade política, para a prossecução
de interesses comuns, e se rege por leis próprias sob a direção de um mesmo poder
soberano.
o Vínculo jurídico que liga os indivíduos a uma sociedade política –chama-se
nacionalidade (qualidade a que correspondem certos direitos e certas obrigações
para com os outros nacionais e para com a própria coletividade).
o Ser nacional de um Estado significa estar sujeito às regras de conduta por ele
definidas e usufruir dos direitos políticos que as suas leis fundamentais prescrevem
e salvaguardam.
o Nação: Costumes, tradições, fisionomia, língua, passado comum (identidade da
história) - conjunto de elementos que caracteriza a nação.
o A população de um Estado é formada pelo conjunto dos indivíduos, nacionais ou
estrangeiros, que vivem sobre o seu território.
o O laço jurídico que liga um indivíduo a um Estado é o da nacionalidade,
relativamente ao qual cada Estado determina as condições da sua atribuição. É a
nacionalidade, laço exclusivo entre o Estado e os seus cidadãos, que distingue os
nacionais dos estrangeiros. Estes podem até ser mais numerosos que os primeiros,
como o caso dos Palestinianos no Koweit antes da guerra.
o Por outro lado, os nacionais podem residir sobre o território ou no estrangeiro,
todavia nem a ausência, nem o exílio podem romper automaticamente este laço
tão importante.
o Os estrangeiros residentes no território têm menos direitos no plano político e
muitas vezes sobre o plano económico também.
o A identidade jurídica pode ser contestada e por vezes rivalizada por uma
identidade ideológica, como é o caso dos chamados “cidadãos do Mundo”, que
recusam a ligação a uma pátria, ou ainda o caso de certos ideólogos árabes, que
desenvolveram a ideia de uma “nacionalidade árabe”, superior à nacionalidade
conferida por cada um dos países árabes.
o No entanto, o problema complica-se quando se aborda a questão chinesa, isto é,
Taiwan e a China continental reivindicam uma só nacionalidade para duas
entidades estatais.
o Porém, três princípios dominam o conjunto das legislações sobre a questão:
o nacionalidade por ascendência ou filiação (jus sanguinis);
o nacionalidade pelo lugar de nascimento ou residência (jus soli)
o a combinação das duas.

 Território
o Toda a coletividade que se constitui em Estado está fixada num determinado
território.
o É um elemento imprescindível do Estado (lutas constantes para conquista e
alargamento do território)
o Elemento aglutinador e unificador do povo.
o Espaço no qual os órgãos do Estado impõem a sua autoridade.
o É um espaço delimitado pelas fronteiras naturais/físicas ou convencionais.
o Não pode existir Estado sem um território próprio e efetivamente ocupado.

Joana Natário, LRI 24


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

o A extensão do território não pode ser um obstáculo à constituição de um Estado e


a sua proximidade não é essencial.
o Existem os chamados microestados, cujo tamanho é reduzido (por exemplo,
Antígua com 446 km quadrados e Singapura com 620, situando-se até entre os 50
mais ricos do Mundo) e os Estados arquipelágicos que podem até ser
extremamente descontínuos (como é o caso da República de Kiribati com uma
superfície de apenas 849 km quadrados, repartidos por cerca de 5000 km do
Oceano Pacífico), mas que nem por isso deixam de ser Estados.
o Todavia, sobre um território não pode existir mais que um Estado.
o O território de um Estado é delimitado pelas suas fronteiras. Daí a importância das
fronteiras reconhecidas e admitidas pelos seus vizinhos.
o Neste sentido, se compreendem os esforços de fazer triunfar o princípio da
inviolabilidade das fronteiras, uma vez que a história das RI demonstra que os
conflitos tiveram, na maioria dos casos, origem nas contestações fronteiriças.
o O Estado exerce a sua soberania sobre o conjunto do território delimitado pelas
suas fronteiras:
o Terrestre (engloba as propriedades privadas, bem como as dependências
do domínio público, os rios, os lagos, os mares interiores e os canais).
o Marítimo (zona adjacente às costas, que se estende às águas interiores,
tais como portos, enseadas e baías, bem como ao mar territorial, situado
entre estes últimos e o alto mar, compreendendo 12 milhas a partir da
costa).
o Aéreo (o território aéreo é composto pelo espaço aéreo sobrejacente ao
espaço terrestre e ao marítimo, enquanto que o espaço extra-atmosférico
é livre).
 Poder político/Governo
o Poder capaz de impor ao grupo as regras de conduta social e dotado de autoridade
para se fazer obedecer.
o O governo deverá ser entendido em sentido lato, englobando o poder político e
o aparelho administrativo. Isto pressupõe a presença de uma organização capaz
de assumir as principais funções estatais, ou seja: legislação, administração,
jurisdição; defesa da integridade do território, proteção da população;
funcionamento dos serviços públicos.
o No plano interno, dizer que o Estado é soberano significa simplesmente que ele
tem o poder de comandar e de decidir em última instância.
o No plano internacional, a soberania não quer dizer que o Estado não tenha que se
submeter a regras obrigatórias que lhe são superiores. Significa, em vez disso, que
o Estado não é submetido, sem o seu consentimento, a qualquer autoridade ou
organismo que lhe imponha um constrangimento.
o O conceito de “independência”, que mais não é do que a tradução política de
soberania, reflete bem esta situação original.
o Todos os Estados são juridicamente iguais e soberanos, todos têm os mesmos
direitos e os mesmos deveres fundamentais.
o Com efeito, a simples coexistência de várias entidades estatais sobre o globo
impõe-lhes regras minuciosas de repartição de competências. Se nenhum Estado
está subordinado a outro, mas somente ao Direito, é porque o Direito é a condição
de existência da Sociedade Internacional.

 Os princípios político-jurídicos das relações entre os Estados

• O princípio da igualdade soberana dos Estados (art.2º, nº1 da Carta da ONU)

Joana Natário, LRI 25


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

o Manifesta-se, por exemplo, sobre o plano diplomático e sobre o plano económico.


Diplomaticamente, a regra fundamental que governa a participação dos Estados
nas conferências internacionais é a da igualdade. Ela traduz-se pela fórmula: um
Estado, uma voz.
o Normalmente, as decisões serão tomadas por unanimidade ou por consenso. O
princípio aplica-se também por ocasião dos compromissos subscritos por tratados
(procedimento de elaboração e execução, escolha da língua, assinatura por ordem
alfabética, etc.) ou a propósito das relações diplomáticas e dos privilégios dos quais
beneficiam os representantes dos Estados.
o Economicamente, o princípio concretiza-se pela igualdade de tratamento no
domínio marítimo, fluvial, comercial.
o Todavia, também é verdade que a desigualdade de desenvolvimento dos Estados
coloca parcialmente em causa o princípio da igualdade económica.

• O princípio da não-intervenção (art.2º, nº7 da Carta da ONU)


o Se o princípio da igualdade é uma consequência da soberania, o princípio da não
intervenção (ou da não-ingerência) aparece, ele próprio, como um resultado do
princípio da soberania.
o Ele exprime a obrigação para um Estado de se abster e de interferir nas questões
interiores ou exteriores de outro Estado.
o A consequência direta deste princípio é que são ilícitas, não só as coações militares,
mas todas as pressões económicas, diplomáticas, ou quaisquer outras que um
Estado mais forte possa exercer sobre um Estado mais fraco.
• O princípio da independência política e do não-recurso à força (art.2º, nº4)
o O princípio da independência política interdita a subordinação de uma entidade
estatal a outra. É um princípio protetor, que tem por objeto garantir uma certa
segurança nas RI. Este princípio figura na Carta da ONU, no art.2º, nº4: “Os
membros da Organização deverão abster-se, nas suas relações internacionais, de
recorrer à ameaça ou ao uso da força, quer seja contra a integridade territorial ou
a independência política de um Estado, quer seja de qualquer outro modo
incompatível c/ os objetivos da ONU.”
o Por outro lado, a competência da guerra foi abolida, salvo em caso de legítima
defesa (art.51º).
o O resultado do não-recurso à força é naturalmente o princípio do regulamento
pacífico dos conflitos (art.2º, nº3) ou dos diferendos internacionais (capítulo VI da
Carta da ONU).
• O princípio coexistência pacífica entre Estados c/regimes sociopolíticos opostos
o Conceito de origem marxista e mais exatamente leninista, o princípio da
coexistência pacífica foi incorporado pela primeira vez num tratado em 1954
(tratado entre a Índia e a China, sobre o Tibete). Mais tarde foi retomado pelos
Estados socialistas e apresentado aos Estados capitalistas por Kruchtchev em 1956
(XX Congresso do PCUS).
o Tal como foi mencionada pelo tratado sino-indiano, a coexistência pacífica
compreendia quatro princípios, além do princípio em si mesmo, a saber:
o Respeito mútuo da integridade territorial e da soberania;
o Não-agressão mútua;
o Não-ingerência mútua nas questões internas;
o Igualdade e vantagens mútuas;
o Coexistência pacífica.
o Após um longo trabalho de codificação, a 24 de outubro de 1970, a Assembleia
Geral das Nações Unidas adotou, por ocasião do seu 25º aniversário, uma
Declaração relativa aos princípios do direito internacional respeitantes às relações

Joana Natário, LRI 26


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

amigáveis e à cooperação entre os Estados, conformes à Carta, que desenvolveu


sob uma nova denominação o conteúdo da política da coexistência pacífica entre
Estados com regimes políticos e sociais opostos.
o A Resolução-declaratória 2625 (XXV) proclamava solenemente que aquela política
repousaria sobre os sete princípios fundamentais seguintes:
o Não-recurso à força;
o Regulamento pacífico dos diferendos internacionais;
o Não-ingerência nos negócios internos de um Estado;
o Dever de os Estados cooperarem uns com os outros;
o Igualdade dos direitos dos povos e direito à autodeterminação;
o Igualdade soberana dos Estados;
o Princípio do cumprimento de boa-fé das obrigações assumidas em função
da Carta.
o A Ata final de Helsínquia, assinada pelos 35 Estados membros da CSCE
(Conferência de Segurança e Cooperação na Europa), acrescentou-lhes mais três:
o Inviolabilidade das fronteiras;
o Integridade territorial;
o Respeito pelos direitos do homem.

 Outros atores:

 Organizações Internacionais:
o Uma organização internacional é uma estrutura de cooperação interestatal, uma
associação de Estados soberanos perseguindo objetivos de interesse comum,
através de órgãos autónomos.
o Distinguem-se:
o OIG – têm poder e capacidade de tomar decisões; fontes de Direito
Internacional;
o ONG – não têm o mesmo estatuto das anteriores, visto não serem
compostas por Estados; se tiverem, pelo menos, uma filial sediada noutro
país já são internacionais; a sua ação tem de passar a fronteira do Estado.

Critérios:
 Uma OI é formada por um Tratado constitutivo ou Convenção.
 O que consta de um tratado constitutivo de uma OI?
o Princípios ou ideais partilhados entre todos os Estados fundadores;
o Órgãos constitutivos responsáveis pelo funcionamento da OI,
nomeadamente uma Assembleia onde estão representados todos os
Estados que fazem parte da Convenção; as suas funções ou poderes são
definidas no articulado jurídico do tratado.
o Objetivos da OI, nos quais está identificado o campo de ação da OI; podem
ser competências explícitas ou implícitas.
 Económicas;
 Financeiras;
 Social (ONU);
 Cultural.
 O tratado de Roma tem competências implícitas,
permitindo a expansão da OI.
o Normas/Direitos e deveres dos Estados-Membros.
o O processo de adesão;
o O processo de saída;

Joana Natário, LRI 27


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

o Fontes de financiamento, que dependem dos objetivos;


o Assinatura e ratificação.
 A lógica destas OIs assente numa base de voluntariado, ou seja, os Estados aderem
quando querem e saem quando querem. Nada obriga o Estado a pertencer ou a
sair de uma OI.
 O seu caráter voluntário e o facto de serem fontes de DI faz com que sejam sujeitos
de DI.
 Podem ser abertas ou fechadas.
o Abertas: admitem a adesão de um novo membro após a assinatura e
ratificação;
o Fechadas: não admitem a adesão de nenhum outro membro após a
assinatura e ratificação.
 O surgimento das OIs em grande número justifica-se pelo facto de estas
apresentarem benefícios e vantagens para os Estados.

Importância atual das OI:


 Interdependência crescente dos Estados e dos povos em diversos domínios da atividade
humana:
o Preservação da paz e da segurança (ONU)
o Liberalização do comércio internacional (OMC)
o Apoio financeiro (FMI, BIRD, BEI, BERD)
o Desenvolvimento de um setor da economia (FAO)
o Cooperação no domínio cultural (UNESCO)

Vantagens: O que leva os Estados a criar organizações internacionais?


 Promove a paz;
 Solidariedade/ apoio/ interajuda;
 Proteção (+segurança);
 Poder/Prestígio;
 Fóruns privilegiados de diálogo, cooperação e negociação (ao cooperarem
entre eles, estão a conceder benefícios e privilégios uns aos outros;
diversificada em várias áreas);
 Desenvolvimento económico, ou seja, se cooperamos mais, temos de produzir
mais para vender mais, o que desenvolve a economia (economia de escala);
 Desenvolvimento social (mais emprego, melhor nível de vida, maior
conforto...).

o São de caráter universal ou regional.


o Universal: estão diretamente ligadas às Nações Unidas.
 Exemplos: ONU; OMC.
o Regional: surgem para combater os efeitos negativos ou nefastos da
globalização.
 Exemplos: APEC; EU; NAFTA; MERCOSUL; UA;

o Definição: Agrupamento de 2 ou (+) Estados, com fins de cooperação a vários níveis.


o Em determinadas regiões do mundo, estas organizações não funcionam.
o Fatores:
 Regimes políticos ditatoriais;

Joana Natário, LRI 28


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

 Diferenças religiosas (por exemplo, no continente africano, com a


expansão do islamismo).
 Disparidades de desenvolvimento;
 instabilidade política constante.

o Segundo Sereni, uma OI é uma associação voluntária de sujeitos de DI, e que se


concretiza numa entidade de carácter estável, dotada de um ordenamento jurídico
interno próprio, e de órgãos e instituições próprias através das quais prossegue fins
comuns aos membros da organização, mediante a realização de certas funções e o
exercício dos poderes necessários que lhe tenham sido conferidos.
o Michel Virally define OI como uma associação de Estados estabelecida por acordo entre
os seus membros e dotada de um aparelho permanente de órgãos, encarregados de
prosseguir a realização de objetivos de interesse comum por uma cooperação entre
eles.
o Associação de Estados constituída por tratado, dotada de uma constituição e de órgãos
comuns e possuidora de personalidade jurídica distinta da dos Estados membros.
o Associação de sujeitos de direito internacional:
o Constituída com carácter de permanência
o Por um adequado ato jurídico internacional
o Com vista à realização de objetivos comuns aos seus membros
o Prosseguidos através de órgãos próprios
o Habilitados a exprimir a vontade própria – juridicamente distinta da dos seus
membros.
o 5 características específicas de uma OI:
o a base estadual;
o a base voluntarista;
o a existência de um aparelho de órgãos permanente;
o a autonomia;
o a função de cooperação.

Classificação das OI
o Em função do quadro territorial em que desenvolvem a sua ação (univ, regionais)
o Em função do seu objeto (com fins gerais ou de finalidades particulares)
o Em função da sua estrutura jurídica (de cooperação, de integração)
o Em função da facilidade ou dificuldade de ingresso (abertas ou fechadas)
o Organizações Universais (AID, BIRD, CNUCED, OMC, FAO, OMS, PNUD, UNESCO, UPU)
pelos seus objetivos e finalidades de ingresso têm vocação para associar todos os
Estados.
o Organizações Regionais (OEA, UA, UE, EFTA, BENELUX, ASEAN, C. da Europa)
o têm um âmbito geográfico limitado e os seus membros são, em regra, Estados
vizinhos.
o afinidades políticas, ideológicas, económicas, culturais, históricas, existindo
entre eles uma comunidade de interesses.
o muitas declaram-se tributárias das finalidades da ONU, propondo-se coordenar
ou mesmo subordinar a sua ação à ONU (OTAN e UEO)
o Juridicamente, as organizações internacionais, tal como os Estados, são sujeitos de
Direito Internacional, ou seja, possuem personalidade jurídica internacional. Contudo,
ao contrário dos Estados, não possuem território, necessitando de realizar um acordo

Joana Natário, LRI 29


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

(accord de siège) com o Estado anfitrião de forma a definir as condições, imunidades e


privilégios inerentes à parcela do território onde será instalada a sede da organização
internacional.

 OIG (grupo de Estados) - Direito Internacional (ordem internacional);


o Assumem particular relevo nas RI pelo papel que desempenham como instrumento de
aproximação pacífica e de cooperação entre os Estados.
o São atores permanentes, dinâmicos.
o Constituem um importante órgão de criação, de aplicação e de controlo da observância
do Direito Internacional.
o A OI é um conceito que exprime a tentativa de imprimir uma certa ordem às RI pelo
estabelecimento, para além das fronteiras de cada Estado, de vínculos duradouros entre
governos ou grupos sociais desejosos de defenderem interesses comuns, no quadro de
órgãos permanentes, com personalidade própria, distintos das instituições nacionais,
capazes de exprimir uma vontade própria, e tendo por objetivo desempenhar funções
de interesse internacional.
o O elemento organização implica permanência e vontade própria, o elemento
internacional resulta de os membros da organização serem sujeitos de direito
internacional. E, também porque a organização é criada por um instrumento de DI, que
é o tratado internacional.
 Na segunda metade do século XIX surgem as 1ª organizações internacionais de carácter
regional amplo e universal – Uniões Administrativas: União Telegráfica Internacional
1865 e União Postal Universal 1878.
 A maior parte foi instituída após a 2 GM.

 ONG (complementam a ação do estado em determinadas áreas)


o São formadas por associações da sociedade civil, conjunto de cidadãos que se une
na defesa de uma determinada causa, de caráter ambiental (WWF, Green Peace);
humanitária (Cruz vermelha/crescente vermelho, médicos sem fronteiras); direitos
humanos (amnistia internacional, Freedom House, H.R.W, R.W.B.); cultura social.
o Aparecem como uma federação de organizações nacionais congéneres, cada uma
delas dependente da jurisdição do Estado em que se constituiu na conformidade
da respetiva lei interna.
o Dispõem de um estatuto internacional que lhes permite dialogar e estabelecer
formas diversas de relacionamento com os Estados e com as OIG, no desempenho
de missões que podem considerar-se de interesse público internacional. (ex: Cruz
Vermelha Internacional)
o “Todo o agrupamento, associação, ou movimento constituído com caráter
durável, por particulares de diferentes países, com vista à prossecução de
objetivos não lucrativos” (Marcel Merle)
o Características:
 Caráter internacional, quer da composição (membros de vários Estados)
quer da sua atividade (não se restringindo apenas ao território de um
Estado).
 Caráter privado, sendo constituída por indivíduos ou associações e não
por estados, não tendo, por isso, no ato da sua constituição um tratado
intergovernamental;

Joana Natário, LRI 30


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

 Caráter desinteressado das suas atividades, ou seja, não pode ter fins
lucrativos (o que a distingue das Empresas Multinacionais).
 Juridicamente, está vinculada ao Estado onde foi instalada a sede,
obrigando a um bom relacionamento com o Estado anfitrião dado que não
beneficiam, ainda, de personalidade jurídica internacional: qq que sejam
a sua importância política ou o seu orçamento, exercem as suas atividades
segundo as regras nacionais do estado no qual está fixada a sua sede. A
sua ação desenvolve-se inicialmente no quadro dos Estados, mas adquire
cada vez mais uma dimensão transnacional.
o A sua génese (finais do século XIX e século XX) só poderia estar ligada ao Mundo
Ocidental (Europa e EUA), democrático, pluralista, que permite um papel
internacional à iniciativa privada.
o O aumento do nº de ONG (existem + 25 mil) resulta de vários fenómenos: a
mundialização; a afirmação do papel dos indivíduos nas RI; a importância
crescente dos media na vida internacional.

Papel das ONG:


o Sensibilizar a opinião pública.
o Complementam a ação do estado.
o Alertar para determinados temas, assuntos, problemas.
o Atuam/desenvolvem ação concreta/específica, encontram soluções.
o Obtêm fundos e recursos humanos voluntários que os ajudam a defender a causa.
o Pressão/ influência das elites políticas.

 Opinião pública
o Massa anónima de cidadãos que compõem cada um dos estados do ponto de vista
internacional.
o A noção de “opinião pública”, nacional, ou internacional, é ambígua, porque é mais
frequentemente uma reconstrução intelectual, na qual os media desempenham um
papel decisivo, do que uma realidade incontestável.
o A opinião pública nacional pode pesar sobre o governo de um país democrático, dado
ser mtas vezes considerada como a prefiguração das orientações do voto.
o Uma mobilização da opinião pública ao nível internacional pode também ter influência
sobre outros países, se ela ameaçar os seus interesses económicos ou estratégicos.
o Podemos, contudo, definir opinião pública num país como a opinião expressa
publicamente (pela imprensa, sondagens) por um nº importante de pessoas (e não
apenas uma opinião individual), sobre uma questão de interesse geral (que diz respeito
a uma opção política, económica, social).
o Constitui uma aglomeração de opiniões individuais +/- convergentes.
o É, geralmente, efémera, porque se constitui em torno de assuntos de preocupação
imediata.
o Nos países democráticos, a evolução da opinião pública é observada pelos agentes
políticos (daí a importância das sondagens), procurando tirar partido de um certo apoio
popular e dele retirar, assim, uma legitimidade maior.
o A análise do seu papel não tem efetivamente sentido real, senão um regime
democrático, em que a legitimidade das decisões políticas provém da vontade popular
expressa nas urnas.
o É por isso que os valores defendidos, quando se fala de uma mobilização da opinião
pública, são os dos direitos do homem.

Joana Natário, LRI 31


Introdução às Relações Internacionais, FLUP 2018/2019

o Neste sentido, podemos considerar a opinião pública internacional como uma vasta
convergência de opiniões públicas nacionais dominantes, da qual se pode extrair uma
linha de conduta a seguir ou um objetivo a atingir: a promoção do desarmamento
mundial, a autodeterminação do povo timorense, etc.
o 3 traduções possíveis da opinião internacional:
o A opinião dos Estados (oficial);
o A opinião dos povos (espontânea);
o A opinião pública militante.

 Empresas Multinacionais
o Empresas cuja sede social se encontra num determinado país e que exercem as suas
atividades num ou mais países, por intermédio de sucursais ou filiais e em que a
estratégia e a gestão são concebidas ao nível de um centro de decisão único que
coordena e dirige o conjunto, com vista a maximizar o lucro do grupo.
o Impacto nos países de acolhimento:
o Económico, pelo desenvolvimento económico da área de implantação da
multinacional, bem como de uma série de empresas nacionais que lhe
garantem vários serviços (distribuição, apoio logístico, etc.).
o Social, pela promoção da formação profissional bem como aumento do nível
de vida dos seus funcionários;
o Político, quer pela corrupção dos dirigentes políticos dos países de
acolhimento, quer pela pressão (possível graças ao seu peso na economia
nacional) junto das autoridades no sentido de serem tomadas mediadas
administrativas favoráveis à empresa.
o Este impacto a nível político está condicionado quer pelo grau de
cumplicidade/hostilidade que existe entre a multinacional e o governo do país
onde está instalada a sociedade-mãe (absoluta ou relativa), quer entre a
multinacional e o território de acolhimento.

 Minorias
o Tem sido difícil uma definição consensual de minoria.
o Apesar da sua importância como ator das RI ser discutível, as minorias têm vindo
a constituir-se como um elemento de erosão dos Estados.
o Por outro lado, tem-se assistido (sobretudo a partir da 2 GM) a um esforço por
parte da Comunidade Internacional na defesa dos direitos das minorias.
o Após o fracasso do sistema de proteção das minorias, posto em prática pela SDN,
levou a que se relançasse a questão no pós-G.
o Inicialmente a questão da defesa das minorias foi incluída na defesa dos direitos
individuais do Homem.
o Em 1946, foi criada pela ONU uma Comissão para a luta contra medidas
discriminatórias e proteção das minorias.
o Atualmente, a defesa dos direitos das minorias tem sido feita no seio das OI
(questão Curda), nomeadamente na ONU.
o Reivindica-se o direito de as minorias conservarem as suas características próprias:
utilização e ensino nos dialetos, liberdade de prática religiosa.
o Ao mesmo tempo, defende-se a não discriminação relativamente à maioria.
o A exigência de uma maior autonomia por parte de algumas minorias tem dado
lugar ao desenvolvimento de movimentos separatistas e à destabilização de
numerosos Estados.

Joana Natário, LRI 32


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o A par dos mecanismos internacionais de proteção, o federalismo aparece como


uma das soluções para o problema das minorias.
o Definição: “grupo social incorporado num Estado onde a população é de raça,
língua ou religião diferente”. (Max Gounelle)
o Elementos comuns:
o Comunitário – os membros do grupo têm características comuns e
próprias (étnicas, linguísticas, religiosas) que os une e os distingue do
conjunto da comunicação internacional.
o Quantitativo – a dimensão do grupo deve ser significativa relativamente
ao resto da população nacional. A sua dimensão deve ser avaliada tendo
em consideração outras variáveis como a sua repartição no território.
o Psicológico – a consciência comum de pertença a uma minoria é essencial
(será reforçada se for partilhada pela maioria).
o Existência de uma opressão (discriminação/segregação), sem a qual a minoria é
apenas um grupo autónomo no seio do Estado.

 Movimentos de libertação Nacional


o Organizações políticas que lutam em nome da sua população, para a libertar de
uma tutela ou de uma ocupação legítima. Este conflito com o poder central
inscreve-se, a maior parte das vezes, no jogo de potências exteriores.
o A 2 GM favoreceu a criação de mov. de resistência contra o ocupante.
o Outros movimentos nasceram nos territórios coloniais dos Estados europeus, com
o objetivo de aceder à independência.
o Existem vários tipos que podem ser integrados em 2 grandes grupos:
o MLN representantes de povos sob dominação colonial, estrangeira ou
racial: o princípio do direito à autodeterminação dos povos é o
fundamento para a legitimação internacional destes movimentos, na
lógica de que os povos oprimidos têm direito à sua autodeterminação
política. O MLN tem uma função de unificação nacional e contribui para
fazer emergir uma consciência nacional contra o Estado opressor.
o MLN representantes de outros povos: um povo oprimido no seio de um
Estado soberano por um governo titânico; um povo exprimindo a sua
recusa de viver na qualidade de minoria no mesmo conjunto estatal que
um outro povo; um povo oprimido no seio de um Estado soberano por
uma elite despótica com o apoio económico, diplomático e militar de um
outro Estado; movimentos separatistas europeus (…).
o São entidades que não exercem autoridade legal sobre um território específico.
o O seu objetivo é a aquisição de um território e a formação de um Estado.
 Indivíduos
o Podem ser atores das RI como representantes de outros atores ou enquanto
membros das minorias.
o Podem ter algum papel no âmbito internacional, seja individualmente (Chefe de
Estado, líder de opinião), seja coletivamente (movimento de populações, fluxo
migratório).
o Figuras de destaque na opinião pública global (músicos, atores ou até mesmo
políticos). Visam alertar/ chamar a atenção e obter fundos para apoiar uma
determinada causa.

 Media;
o São os grandes canais de televisão; grupos económicos com ligações à
comunicação social; rádio; imprensa.
Papel dos media:

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o Fontes de informação;
o Disseminam informação;
o Promover a informação;
o “Chamar à atenção” para determinados aspetos, questões, desenvolvimentos
(agenda internacional) com destaque para influenciar as elites políticas.
o Sensibilizar a opinião pública e, por conseguinte, o poder político.
o Influenciar as elites políticas.

 Igreja/ Santa Sé (personificação internacional da Igreja Católica)


o Pode ser considerada como ator secundário pela sua influência na evolução das RI.
Pelas suas características tem sido confundida quer com um Estado (Vaticano),
quer com uma OI (carácter internacional, permanência, etc.).
o Apesar de não ser um Estado detém algumas características semelhantes:
o território (Cidade do Vaticano), porém, não goza das características de um
território de um Estado, sendo apenas um espaço concedido para “fins
especiais” da Igreja (sede da Santa Sé);
o população, contudo, sem vínculo de nacionalidade, sendo apenas cidadãos
ligados a uma função (Cardeal ou guarda suíço);
o poder público (Cúria Romana) mas que é constituído, simultaneamente,
pelos órgãos mais importantes da Igreja Católica.
o O estatuto da Santa Sé foi definitivamente estabelecido em 1929, pelos Acordos
de Latrão, ou seja, a Santa Sé tem personalidade jurídica internacional limitada,
nomeadamente, detém o poder de legação ativa (Núncios) e passiva, celebração
de tratados (Concordatas) e participação nas organizações internacionais
(geralmente como observador).

 Os quatro grandes debates


 1º debate (ontológico) – Idealismo vs. Realismo
 2º debate (metodológico) – Tradicionalismo vs. Behaviorismo
 3º debate (inter-paradigmático) – Neorrealismo vs. Neoliberalismo (pluralismo) vs.
Estruturalismo de origem marxista (neomarxismo)
 4º debate (meta-teórico) - Positivismo/racionalismo vs. Pós-positivismo
 O primeiro debate (período pós-Primeira Guerra Mundial e entre guerras) prende-se
com a divisão entre idealismo e realismo, característico do início do século XX quando
as RI se começam a assumir como disciplina autónoma. O idealismo acredita na
capacidade de cooperação e na possibilidade de minimizar as condições da guerra,
salientando a importância das OI, do direito internacional, do desarmamento, etc. O
presidente norte-americano Wilson é uma figura precursora do idealismo, defendendo
a criação a nível global de condições de partilha de valores e de princípios de segurança
coletiva, que pareciam evidentes no seio dos Estados democráticos. Mas fatores como
o nazismo de Hitler ou os fascismos crescentes pela Europa na década de 1930, ou ainda
a 2 GM, acabaram por colocar em causa esta linha idealista de cooperação entre os
Estados. O realismo surge num cenário onde a luta pelo poder parece imperar e persiste
dada a sua capacidade para explicar de uma forma racional a constante luta pelo poder
entre os Estados, a chamada Realpolitik ou as “power politics” (Bismarck e Morgenthau)
o O segundo debate surge nas décadas de 1960 e 1970 e trata-se essencialmente de uma
controvérsia metodológica (significado da teoria, requisitos para a sua formulação,
melhores métodos para testar proposições teóricas), que acaba por não envolver
aspetos substanciais no que diz respeito à política internacional. A grande questão
centra-se no facto de se deverão as RI constituir uma ciência. O tradicionalismo

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defende a importância da história, do direito e da filosofia como métodos de inquérito,


defendendo o estudo das RI sob uma perspetiva legal, filosófica e histórica. O
behaviorismo parte de um movimento das ciências sociais em geral, que consiste na
utilização do método científico na procura de leis gerais para a explicação dos
acontecimentos. A análise do SI não encara a ação diplomática do Estado como tal, mas
apenas a rede de interações que sustentam um SI. No entanto, a estrutura do SI pode
ser concebida como determinando o campo de ação das políticas externas dos Estados:
uma série de hipóteses liga, neste caso, a estrutura de cada sistema possível aos
comportamentos de política externa que dela se podem deduzir. Morton Kaplan
(Modelos) imaginou vários sistemas internacionais possíveis, dos quais só os dois
primeiros correspondem a experiências históricas:
o o sistema de equilíbrio das potências, que evoca a sociedade internacional dos
séculos XVIII e XIX;
o o sistema bipolar flexível que caracteriza as relações internacionais após o
termo da segunda guerra mundial;
Deutsch (Teoria da Integração) distingue entre dois tipos de integração:
o Comunidades amalgamadas acontecem quando as entidades políticas
preexistentes se fundem, passando a constituir um só Estado (ex. EUA;
Alemanha, etc.).
o Comunidades pluralistas mantém as suas próprias soberanias, mas não têm
total liberdade de opção nas suas escolhas políticas. Os membros de uma
comunidade pluralista, no mínimo, recusam o recurso à guerra como método
de resolução de conflitos (ex. UE). O nível de transações entre Estados é uma
das características mais importantes para o desenvolvimento de comunidades.
 O terceiro debate, também chamado debate inter-paradigmático surge na década de
1980 contrapondo o realismo, o pluralismo (liberalismo) e o estruturalismo
(globalismo).
o Para o realismo, o Estado é o principal ator das RI, constituindo a sua unidade de análise.
O Estado é entendido como ator unitário que se comporta de forma racional, sendo a
segurança nacional a sua preocupação fundamental.
o Com os desenvolvimentos internacionais vão surgir, no entanto, críticas ao centralismo
do Estado (novos atores). Além do mais, acontecimentos como a reconciliação franco-
alemã no seio do processo de construção europeu vão pôr em questão alguns dos
pressupostos fundamentais realistas.
o Como reação surge em finais dos anos 1980 o chamado neorrealismo que estrutura a
sua abordagem em três níveis de análise: o indivíduo, o Estado e o SI, fugindo assim ao
centralismo do Estado. Considera que o SI emerge da interação dos Estados,
constrangendo-os a tomarem determinada ação enquanto os incentivam a outras. São
as capacidades que definem a posição dos Estados no SI, e a distribuição destas
capacidades define a estrutura do S (bipolar, multipolar). O poder é visto como
instrumento de sobrevivência, num mundo onde prevalece o medo e a necessidade de
proteção e o receio de dependência e onde não há lugar à cooperação internacional.
o O pluralismo (liberalismo), diferentemente do realismo, acredita na importância de
atores não-estatais, e considera que o Estado não é um ator unitário, pois é composto
por grupos de interesse, burocracias, etc., e está sujeito a influências externas, além de
assumir uma dimensão transnacional: a agenda das RI é alargada e não confinada a
questões de segurança e militares.

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o Como resposta ao neorrealismo surge o neoliberalismo que assenta nos pressupostos


tradicionais da paz, prosperidade, progresso e cooperação, considerando o realismo
incapaz de explicar o fim pacífico da GF e reforçado pelo processo de integração
europeu e pela crescente colaboração transnac.
o O estruturalismo traduz uma visão marxista do contexto global onde as interações
ocorrem. Vê as RI sob uma perspetiva histórica, onde o SI capitalista, bem como os
atores, atuam ou não como mecanismos de dominação contribuindo para as relações
de dependência, particularmente na relação desigual norte/sul. Esta teoria enfatiza a
importância dos fatores económicos na explicação das dinâmicas do SI.
Realismo
o Poder: representa um fim em si mesmo (responsável pela rivalidade constante dentro
do sistema internacional)
o Estado procura sempre maximizar o seu poder em busca do interesse nacional (situação
de soma-zero)
Neorrealismo
o Reinterpretação da teoria realista
o O foco continua a ser o Estado
o Sistema internacional é anárquico (guerra de todos contra todos)
o Só sobrevivem os Estados que conseguem recursos para a manutenção do seu status
quo.
o O poder é um meio, um instrumento para garantir a sobrevivência.
o O Sistema pressupõe Estados, conjunto de unidades em interação criando uma
estrutura, mecanismo de regras que guiam o comportamento dos Estados.
o Interação–comunicação entre os atores
o Socialização –interação das unidades
o Competição –disputa entre os Estados
o Estrutura é definida por 3 caraterísticas:
o Princípio da ordenação (funções das unidades)
o Princípio da subordinação (hierarquia)
o Princípio da coordenação (hegemonias que influenciam o sistema)
o Sistema internacional:
o Estados são menos relevantes que estrutura
o Ignora questões de ética e avaliações subjetivas como a natureza humana
o Ganhos relativos da cooperação pode afetar a capacidade de sobrevivência (um
ganha o outro perde); ganhos absolutos ocorrem quando todos ganham
(cooperação), que só deve ser usada quando estritamente necessária.
Neoliberalismo (Robert Keohane)
o Compreender o comportamento dos Estados (cooperação e conflito) por via das
instituições.
o Instituições-condicionam comportamento dos Estados (nível dos fluxos de informação,
capacidade de verificar o cumprimento de compromissos assumidos, a nível do grau de
expetativa quanto à solidez de acordos internacionais.
o Instituições –conjunto de regras (formais e informais) ligadas entre si e persistentes no
tempo.
o 3 tipos de instituições:
o Organizações –objetivos, burocracia, regras
o Regimes –ordens negociadas para a resolução de problemas comuns
o Convenções (regras e entendimentos implícitos)

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o Prevalência de estratégias de cooperação sobre as de conflito


o Estado –ator racional –interessado em maximizar o seu bem-estar
o Instituições desempenham 3 funções:
o Aumentam o fluxo de informações (maior transparência de intenções,
interesses e preferências)
o Permite controlar o cumprimento de compromissos
o Mudam as expectativas dos atores em relação à solidez dos acordos ao longo
do tempo (maior certeza quanto ao futuro)

Realismo Neorrealismo
Explicam as RI com base nas caraterísticas Explicam as RI com base no SI
dos Estados
Explicam comportamento dos Estados com
Explicam comportamento dos Estados com base na natureza do SI (não faz considerações
referência à natureza humana sobre a natureza humana)
Poder é visto simultaneamente como Poder é visto apenas como meio para atingir
objetivo e como meio para atingir outros outros objetivos
objetivos
Quanto mais poder, melhor (luta Excesso de poder pode atrair coligações rivais
interminável pelo poder)
Estado que acumula poder deve distribui-lo
Estado procura ter mais poder que os outros entre os aliados para assegurar a sua posição
de liderança
Sistema internacional anárquico (incerto e Sistema internacional anárquico –a
inseguro) cooperação e a interdependência são fatores
conjunturais, temporários
Poder militar –predominância das questões Poder militar, poder económico....
de segurança

o Realismo defensivo - Estados procuram manter o status quo.


o Realismo ofensivo - a lógica de ação dos atores não é o equilíbrio e ação defensiva, mas
a procura em aumentar o poder (procura pela hegemonia).

Neorrealismo Neoliberalismo
Política internacional –anarquia internacional Política internacional –a cooperação e a
interdependência atenuam a natureza
anárquica do sistema
Cooperação internacional é difícil de obter e Cooperação é essencial
manter
Estados procuram ganhos relativos Estados procuram ganhos absolutos
Questões de segurança são prioritárias Progresso económico é prioritário
Capacidade do Estado (poder) Objetivos e preferências dos Estados
Instituições não alteram a essência da política Instituições atenuam a anarquia
internacional internacional

Semelhanças
o Estado: ator unitário (coerente) e racional (analisa custos, benefícios e riscos)

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o Estados com interesses comuns, criam instituições para a prossecução desses interesses
comuns (instituições são úteis)
o Anarquia gera incertezas e insegurança (neorrealistas –adoção de estratégias de
sobrevivência –competição pelo poder) (neoliberais –é possível cooperar num ambiente
de anarquia –dilema do prisioneiro)
o Estados são soberanos, mas têm de interagir.
o Nenhum Estado, sozinho, consegue concretizar os seus objetivos.
o Atualmente questiona-se o possível esboço de um 4º debate, onde visões alternativas
pretendem abalar as fundações tradicionais e abraçar uma perspetiva mais radical que
permita múltiplas vozes e perspetivas. Trata-se do debate pós-positivista que inclui a
teoria crítica (reestruturar a teoria social e política), o pós-modernismo (não existe uma
realidade internacional objetiva), o construtivismo (conceitos construídos socialmente,
influência das identidades, culturas e ideias: não há uma realidade permanente e certa).

 Construtivismo
o O mundo não é predeterminado, mas sim construído à medida que os atores agem,
ou seja, é uma construção social. Vivemos num mundo que construímos, no qual somos
os principais protagonistas e agentes, e que é produto das nossas escolhas, que são
racionais, ponderando perdas e ganhos. Não se trata de um mundo que nos é imposto,
que é predeterminado, e que não podemos modificar. Podemos mudá-lo, transformá-
lo, ainda que dentro de certos limites. Ou seja, o mundo é socialmente construído.
o Agentes e estrutura são co construídos. O construtivismo reflete o debate
agentes/estrutura, que se refere a quem constrange e limita as opções do outro, os
agentes ou a estrutura. Afirmam que ambos são co construídos, ou seja, os atores e a
estrutura influenciam-se mutuamente, e nenhum precede o outro nem no tempo, nem
na capacidade de influenciar o outro.
o Não se pode falar em sociedade sem falar em indivíduos que a compõem, nem se pode
falar de indivíduos sem falar da sociedade que eles constituem. Ambos são co
constituídos, ou seja, influenciam-se mutuamente.
o As ideias e os valores são importantes na análise dos acontecimentos internacionais.
Se, por um lado, os construtivistas, não descartam as causas materiais, por outro,
consideram que as ideias e os valores que influenciam a relação do agente com o
mundo material desempenham uma função central na formulação do conhecimento
sobre este mundo, considerando que o mundo só faz sentido a partir do momento que
nos referimos a ele, e mediante os meios que usamos para esse fim.
o A anarquia internacional é socialmente construída, o que significa que o SI pode variar
entre o conflito e a cooperação, que resultam das nossas escolhas. Os processos de
construção e reconstrução são permanentes e abrem espaço para a contínua
possibilidade de mudança.
o Conceito de identidade: podem transformar-se e adaptar-se aos processos e
necessidades da política internacional. As identidades precedem os interesses e
formam-se em processos relacionais entre identidade e a diferença.
o Análise de discurso (daqueles com responsabilidade no SI): as normas e regras
regem/constroem o discurso que se refere ao mundo social. É nesse sentido que
consideram que a realidade é socialmente construída.
o As normas influenciam o discurso, que não é apenas um instrumento para a ação
política, mas a própria ação política.

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o As normas não são apenas instrumentos de organização e restrição, elas justificam,


legitimam e tornam certos atos possíveis.
o Os atos são a expressão dos discursos e dos significados, e não podem ser entendidos
fora ou independente deles (dizer é fazer).

Hans Morgenthau
o Morgenthau procurava delinear como seria a política externa dos EUA no pós-G:
I) Substituição do multipolarismo pelo bipolarismo, cujos centros estão fora da Europa
Ocidental.
II) Divisão da ‘unidade moral’ em dois sistemas antagónicos de
pensamento que disputam entre si a lealdade dos homens.
III) Desenvolvimento da tecnologia nuclear que poderia levar à destruição
da humanidade.

o Morgenthau foi o autor mais influente nos anos 1940 (Politics Among Nations). Sugere
seis princípios fundamentais que regem o S político internacional:
1. a política obedece a princípios que são constantes e iguais em toda a parte porque têm
as suas raízes na natureza humana, que é para Morgenthau egoísta e comandada pela
vontade de poder;
2. a política distingue-se de outras áreas de intervenção humana pela procura de poder. É
esta característica que nos permite classificar factos como políticos ou não e a partir
desta classificação elaborar uma teoria sobre a esfera política. A política internacional
fundamenta-se no interesse dos Estados, definido como procura de poder, e o exercício
racional levado a cabo por estadistas produz continuidade nas políticas externas dos
países para além da vida política dos seus governantes;
3. os interesses são uma função de fatores culturais, históricos, materiais e conjunturais,
podendo sofrer alterações ao longo dos tempos. O que é imutável é simplesmente a
caracterização da política como a defesa de interesses através dos mecanismos que
estiverem ao alcance (poder). Morgenthau desmistifica o papel do Estado, dizendo que
no futuro outro tipo de entidade o poderá substituir, mas o que importa é a identificação
dos interesses, que variam consoante o contexto, e da forma como estes interesses
podem ser servidos mediante a aplicação de poder;
4. a principal obrigação moral do Estado é a sobrevivência nacional, e outras considerações
morais devem ser consideradas secundárias a esta. Morgenthau distingue entre a
moralidade do Estado e dos indivíduos;
5. ao definir o interesse em termos de poder, o realismo deixa as insondáveis motivações
de Deus fora da equação e trata em termos equitativos todos os Es;
6. o realismo defende a autonomia e a especificidade da esfera política em relação a outras
esferas, como a económica ou a jurídica.

 Poder
o É definido como as mútuas relações de controle estabelecidas entre os titulares da
autoridade pública e entre estes e as pessoas em geral.
o A política internacional consiste numa luta pelo poder.
o O poder é entendido como fim e não como meio da política.

Equilíbrio de Poder

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o A aspiração de poder por parte de várias nações, em que cada uma tenta manter ou
alterar o status quo, leva necessariamente a uma configuração que é chamada
de equilíbrio de poder, bem como a políticas que se destinam a preservar esse
equilíbrio.
o Equilíbrio significa estabilidade dentro de um sistema composto por uma variedade
de forças autónomas.
o Sempre que tal equilíbrio é perturbado por uma força externa ou por uma mudança
ocorrida num dos elementos componentes do sistema, este último mostra uma
tendência para restabelecer o equilíbrio original ou um novo equilíbrio.
o O meio utilizado para manter o equilíbrio consiste em permitir que os diferentes
elementos sigam normalmente as suas tendências conflitantes, até ao ponto em que a
tendência de cada um deixa de ser suficientemente forte para superar a tendência dos
demais, mas bastante vigorosa para impedir que as dos demais a subjuguem.

Joana Natário, LRI 40

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