Você está na página 1de 12

Capítulo VI JANTAR NO HOTEL CENTRAL

Neste capítulo dá-se um encontro à entrada do Hotel Central, em Lisboa, que parece sugerir a
chegada de alguma perturbação. Carlos e Craft deparam com a visão de uma lindíssima senhora
loira, servida por um preto de “ casaca e calção “ e com uma bonita cadelinha. Que estará esta
senhora a fazer em Lisboa, hospedada no Hotel Central e que estranho magnetismo explica o
fascínio que ela exerceu em Carlos?

Carlos decidiu ir visitar a Vila Balzac, a casa do Ega, alugada na Penha de França. Ninguém o veio
receber, embora lhe parecesse ter ouvido barulhos vindos do interior da casa.

Conforme sugestão do Ega, no dia seguinte Carlos voltou e Ega já o esperava, tendo-o recebido
com todas as cerimónias. A casa estava pobre de decoração, como convinha a um filósofo.

Entretanto Carlos tinha estado na casa de Madame Gouvarinho e os dois amigos falaram sobre
isso. Carlos tinha experimentado algum interesse por esta mulher, mas acabou por confessar a
Ega, que a Madame Gouvarinho logo perdeu para ele o encanto. Este era uma grande defeito de
Carlos, que o tornava incapaz de se fixar numa mulher, acabando apenas por ficar amigo de
todas.

Ega disse a Carlos que ele era como D. Juan, eternamente à procura do amor e, quando julgava
encontrá-lo, verificava que se tinha enganado, decidindo continuar à procura, aproximando-se de
outras mulheres. Ega lança aqui um prognóstico, dizendo a Carlos que ele pode vir a acabar
como D. Juan (outro indício de fatalidade).

Saíram e, no caminho, encontraram Craft, colecionador de bricabraque, que tinha uma bonita
casa nos Olivais. Ega ainda quis voltar a casa para oferecer uma bebida, mas Craft libertou-o,
dizendo que aproveitava o facto de estar ali para visitar um amigo.

Entretanto Ega convidou-os para um jantar no Hotel Central, no dia seguinte. Entretanto o jantar
foi sendo adiado, pois Ega foi incluindo mais pessoas e acabou por transformá-lo numa
homenagem ao seu amigo Cohen.

No dia do jantar, Carlos veio a encontrar Craft numa loja de um hebreu antiquário. Falaram sobre
a casa de Craft nos Olivais e do seu precioso bricabraque, mas Craft confessou que queria
desfazer-se de tudo aquilo.

Entraram então no Hotel Central e nesse momento viram chegar um coupée. De dentro saiu uma
senhora loira, muito bonita, que deixou Carlos e Craft num estado de atracção e admiração e
arrancou de Craft o elogio em Francês “ três chic “.

Em cima, Ega já estava presente, conversando com Dâmaso Salcede, representante do


novo-riquismo da época.

Craft comentou o facto de terem visto à entrada do hotel uma mulher bonita, com uma cadelinha
ao colo, e Dâmaso, que estava a conversar com Ega, decidiu vangloriar-se de a conhecer.
Tratava-se da família dos Castros Gomes com quem tinha viajado de comboio, vindos de
Bordéus. Dâmaso falou no seu interesse por Paris e referiu também o seu tio anarquista, que
vivia na capital francesa. Apareceu em seguida o poeta Alencar, a quem Ega também apresentou
Carlos. Alencar ficou emocionado, po conhecer o filho do seu grande amigo Pedro.

Alencar explicou a Carlos que ele tinha tido alguma influência na escolha do seu nome, pois a
mãe não tinha querido dar-lhe o nome Afonso, do avô, e então, como ela andava a ler um
romance cuja personagem principal era Carlos Eduardo, o último dos Stuarts, Alencar sugeriu-lhe
que desse esse nome ao filho. Apareceu por fim Cohen, o grande convidado do jantar.

Falou-se então de crimes na Mouraria, entre fadistas. Carlos achava que esses crimes mereciam
um romance, o que levou à discussão sobre o realismo. Alencar, poeta romântico, era contra o
realismo, por mostrar os aspetos feios da realidade. Alencar achava que não se devia mencionar
o “ excremento “, enquanto comiam. Craft estava do lado de Alencar, sendo contra o realismo e o
naturalismo. Achava que a arte devia ser uma idealização, mostrando as formas mais belas da
vida e não as feias. Carlos achava que o mais intolerável no realismo eram os “ ares científicos”,
a ideia do positivismo e do experimentalismo. Ega então achava que o realismo ainda devia ser
mais científico e dar-se menos à fantasia.

A conversa desviou-se para uma pergunta feita a Cohen, a propósito de empréstimos e Cohem
disse mesmo que as grandes fontes de receitas no país eram os empréstimos e os impostos.
Carlos então achava que assim o país ia para a bancarrota e Cohen disse que essa bancarrota já
ninguém a podia evitar.

Então Ega achava que o melhor era a bancarrota e depois uma revolução que acabasse com a
monarquia. Portugal livrava-se depois da dívida e das velhas pessoas. Cohen dizia a Ega para não
ser tão radical, já que havia homens de talento no país. Cohen era o director do Banco Nacional e
não queria ver assim enxovalhados os homens de talento em Portugal, mas reconhecia que o
país precisava de reformas.

Ega então achava que era precisa a invasão espanhola e Dâmaso disse que fugiria logo para
Paris. Ega riu-se e criticou a cobardia de alguns portugueses, mas Alencar defendia o
patriotismo.

Os empregados serviram um prato à Cohen, que Ega tinha encomendado em honra do amigo. Por
fim serviu-se o café e levantaram-se da mesa. Começaram a falar outra vez sobre literatura e Ega
criticava o romantismo. Finalmente Ega discutia com Alencar e quase que haveria pancadaria se
os outros não os separassem. Aquele hotel tão chique estava a ganhar um ambiente de taverna, à
maneira portuguesa.

A discussão acabou com os dois a fazerem as pazes e a elogiarem-se um ao outro. No final, Ega
saiu com Cohen e Carlos foi com Dâmaso e Alencar a pé pelo Aterro. Dâmaso não parava de fazer
elogios a Carlos, que ao mesmo tempo ia sabendo informações sobre a tal senhora brasileira que
tinha visto à entrada do hotel e que Dâmaso disse que conhecia. Dâmaso partiu e Carlos
continuou acompanhado de Alencar, que lhe falava do tempo em que era amigo de Pedro.
Afastaram-se à porta do Ramalhete. Já no quarto, Carlos lembrou-se da história dos pais, que Ega
um dia lhe tinha contado, durante uma bebedeira, a mãe que tinha fugido com outro e o suicídio
do pai. Assim que adormeceu começou a sonhar com a senhora que tinha visto à entrada do
hotel. Ela passava e o Craft dizia “ Trés chic “.
Capítulo X CORRIDAS DE CAVALOS

Este capítulo contém o célebre episódio das corridas, um episódio crítico, onde se apresenta
a alta sociedade lisboeta, num evento social que se presume civilizado. Querendo parecer
chiques, os portugueses imitavam os costumes estrangeiros, importando as suas modas,
neste caso as corridas inglesas de cavalos. Verifica-se que seriam mais apropriadas as
touradas, tendo em conta a tradição portuguesa e também a facilidade com que afinal “
estalava o verniz “, mesmo nas pessoas da alta sociedade. Ocorre uma situação caricata e
ridícula, quando surge uma discussão, sob o pretexto de que tinha havido “ batota “ nas
apostas, havendo insultos e pancadaria. As mulheres fogem em gritos histéricos, perdendo
também a pose e os bons modos.

O capítulo X começa com a narração do desfecho de um encontro de Carlos com Gouvarinho


e revela que Carlos já se sente farto dela: “E nessa tarde, como não havia ainda outro
esconderijo, tinham abrigado os seus amores dentro daquela tipóia de praça. Mas Carlos
vinha de lá enervado, amolecido, sentindo já na alma os primeiros bocejos da saciedade.
Havia três semanas apenas que aqueles braços perfumados de verbena se tinham atirado ao
seu pescoço – e agora, pelo passeio de S. Pedro de Alcântara, sob o ligeiros chuvisco que
batia as folhagens da alameda, ele ia pensando como se poderia desembaraçar da sua
tenacidade, do seu ardor, do seu peso…”.

Quando, depois, Carlos ia a descer a rua de S. Roque, encontrou o marquês. Durante a


conversa, Carlos apercebeu-se que a corrida de cavalos tinha sido antecipada para o
Domingo seguinte. Maia ficou contente, pois daí a cinco dias iria, finalmente, conhecer a
mulher que ele vira à entrada do Hotel Central, pois certamente também iria estar nas
corridas, um acontecimento social tão divulgado.

Enquanto Carlos e o marquês vão falando das corridas, Maria Eduarda passa no seu coupé,
deixando Carlos ali estagnado a observá-la, enquanto Rose o aponta à mãe, explicando-lhe,
talvez, que fora ele o médico que a tinha consultado: “Carlos olhou, casualmente; e viu,
debruçado à portinhola, um rosto de criança, de uma brancura adorável, sorrindo-lhe, com
um belo sorriso que lhe punha duas covinhas na face. Reconheceu-a logo. Era Rosa, era
Rosicler: e ela não se contentou em sorrir, com o seu doce olhar azul fugindo todo para ele –
deitou a mãozinha de fora, atirou-lhe um grande adeus. No fundo do coupé, forrado de negro,
destacava um perfil claro de estátua, um tom ondeado de cabelo loiro. Carlos tirou
profundamente o chapéu, tão perturbado, que seus passos hesitaram. “Ela” abaixou a
cabeça, de leve;”.

No fim de ver passar o coupé, Carlos e o marquês dirigem-se ao Ramalhete; Maia, pelo
caminho, vai traçando um plano para se encontrar com Maria Eduarda. Chegando ao
Ramalhete juntam-se todos, estando também presente o Dâmaso.

Durante o jantar Carlos vai contar a Dâmaso o seu plano para conhecer os Castro Gomes:
este levá-los-ia até aos Olivais para lhe mostrar a coleção de Craft e em seguida jantariam no
Ramalhete.
Depois do sarau no Ramalhete, chega o dia das corridas. Carlos vai ao hipódromo na
esperança de ver Maria Eduarda, mas fica desiludido, pois ela não aparece.

É Domingo, um dia quente, com o céu azul. No Hipódromo Carlos fala com a sua velha amiga
D. Maria da Cunha e conhece Clifford, que era o dono do cavalo que tinha mais expectativas
de ganhar e por causa de quem as corridas tinham sido antecipadas.

Entretanto, a Gouvarinho diz a Carlos que seu pai faz anos e ela tem de ir ao Norte.
Propõe-lhe então que se encontrem na estação e que sigam juntos no comboio até Santarém,
onde passarão a noite juntos; depois, ela seguirá até ao Porto e ele regressará a Lisboa.
Carlos hesita.

Houve algumas complicações durante a prova das corridas, que causaram uma desordem,
provando-se, assim, que as pessoas de sociedade que ali estavam, embora pretendessem
dar-se ares de civilizadas, facilmente perdiam a postura, deixando “ estalar o verniz “.

Carlos, para animar as corridas, decide apostar num cavalo que aparentemente não promete
sair vencedor, mas, surpreendentemente, o animal acaba por ser o primeiro a chegar à meta e
Carlos consegue ganhar muito dinheiro.

Aqui podemos aplicar o provérbio “Sorte no jogo, azar no amor ”. Este é o primeiro presságio
do capítulo: “- Ah, monsieur – exclamou a vasta ministra da Baviera, furiosa – mefiez-vous…
Vous connaissez le proverbe: heureux au jeu…”

Entretanto Carlos vai falar com Dâmaso e ele conta-lhe que Castro Gomes partira para o
Brasil e que Maria Eduarda está num apartamento no prédio do Cruges.

De regresso a casa, Carlos pensa na desculpa de querer falar com Cruges, só para poder
passar pelo prédio onde também está Maria Eduarda, alimentando assim a esperança de a
ver. No entanto, quando chega ao prédio, a criada diz que Cruges não está e Carlos acaba
também por não ver Maria Eduarda.

Carlos regressa ao Ramalhete, onde encontra Craft. Um criado entrega uma carta a Carlos. Ao
abri-la depara com uma agradável surpresa, pois a autora é a senhora Castro Gomes, que lhe
pede para ir consultar na manhã seguinte uma pessoa de família que se encontra doente.
Carlos resplandece de tal modo de felicidade que Craft percebe que lhe terá acontecido algo
de muito bom. Respondendo a Craft, dá-se então um segundo presságio, nas palavras de
Carlos:

“- A gente, Craft, nunca sabe se o que lhe sucede é, em definitivo, bom ou mau.

-Ordinariamente é mau.”
Capítulo XII JANTAR DOS GOUVARINHO

Neste capítulo os dois apaixonados assumem finalmente o seu amor um pelo outro. Entretanto,
para que este amor possa escapar à exposição pública, Carlos aluga ao Craft a sua quinta nos
Olivais e compra-lhe os móveis e as coleções, para lá instalar Mª Eduarda.

Carlos estava a regressar ao seu Ramalhete e encontrou Ega no seu quarto. Carlos e Ega
abraçaram-se, mas Ega disse que apenas vinha a Lisboa por uns dias. De seguida perguntou a
Carlos se tinha quarto para ele, ali no Ramalhete, apesar de estar instalado no Hotel Espanhol.
Claro que a resposta de Carlos foi positiva.

Ega tinha viajado de comboio, onde encontrara a Madame Gouvarinho. Ega começou a “picar”
Carlos por causa da senhora Gouvarinho, e Carlos disse que nunca tinha tido nada para além de
relações superficiais com essa senhora. Carlos também informou Ega sobre o regresso dos
Cohen, mas Ega já sabia da novidade, supondo-se que talvez fosse esse o motivo da sua vinda
para a capital.

Ega foi então cumprimentar Afonso, que o questionava sobre o facto de ele não concluir os seus
livros. Afonso incitava os dois jovens a fazerem algo pelo país, lamentando a inércia em que eles
se afundavam.

Numa segunda-feira chuvosa, Ega e Carlos foram ao jantar dos Gouvarinho. Enquanto estavam a
caminho, Ega perguntou a Carlos sobre uma tal brasileira, na companhia da qual Dâmaso dissera
que ele passava todas as manhãs. Dâmaso andava a espalhar no Grémio que Carlos se
interpusera entre ele e essa senhora, aproveitando a sua ausência para a conquistar e que ela
teria preferido Carlos por ele ser mais rico. Carlos percebeu então como a sua relação com a Mª
Eduarda começava a ser enxovalhada pela “ tagarelice “ e impertinência de Dâmaso.

Enquanto se dirigiam à mesa, à hora do jantar, madame Gouvarinho tomou o braço de Carlos e
aproveitou logo para lhe fazer alusões à “ brasileira “. Durante a refeição falou-se sobre viagens,
a propósito de países como a Rússia e a Holanda, e sobre um livro que censurava a colonização
portuguesa em África. Então debateram sobre a escravatura, defendida por Ega e condenada pelo
deputado Sousa Neto, representante da Administração Pública, que tinha a seu cargo a Instrução.
Falaram ainda de criados e do gosto por paradoxos. O conde Gouvarinho tentava lembrar-se de
um paradoxo brilhante, da autoria de um senhor Barros, ministro do reino, mas atraiçoava-o a sua
falta de memória. Comentou-se a sobremesa, que estava deliciosa, e falaram também de animais,
a propósito de um cão que pertencia a madame Gouvarinho e que já tinha morrido, causando-lhe
um enorme desgosto. Entretanto a condessa de Gouvarinho pertencia à Sociedade Protetora de
Animais e Ega declarou pertencer à Sociedade de Geografia.

O ambiente tornou-se mais descontraído e, no meio do clamor das conversas, Carlos explicou à
condessa que a razão para frequentar a casa da senhora de quem Dâmaso falava se devia aos
seus serviços de médico, uma vez que a governanta estava doente. Aliás até tinha sido o Dâmaso
que primeiro o levara à família, para tratar da filha dessa senhora. Assim, Carlos e a madame
Gouvarinho acabaram por se reconciliar e o pé da condessa já apertava o de Carlos, mostrando o
desejo de uma aproximação. A mulher de Sousa Neto continuava a falar da Rússia, tendo-se
depois percebido as razões da sua preocupação com esse país, porque o seu filho ia como
segundo-secretário para a legação de São Petersburgo. D. Maria da Cunha comentava entre
dentes que ele era um rapaz medíocre, que nem francês sabia falar. Ao café, Sousa Neto mostrou
a Carlos o seu prazer em tê-lo conhecido, falando-lhe também no avô e nos pais.

Abordou-se depois o tema das mulheres e Ega afirmou que a mulher não precisava de instrução,
tendo apenas o dever de ser bela, “ cozinhar e amar bem “. O conde concordava, dizendo que o
lugar da mulher era “ junto do berço, não na biblioteca “. Ega entretanto questionava Sousa Neto
a propósito de Proudhon, um filósofo francês muito lido na época, que tinha escrito sobre o amor.
Não querendo revelar a sua ignorância, Sousa Neto procurava fugir às perguntas e declarou não
querer discutir com Ega.

Sousa Neto entabulou depois conversa com Carlos, falando de Paris e de Londres e pedindo-lhe
as suas impressões sobre essas cidades. Mais tarde a condessa Gouvarinho justificou o pretexto
de o seu filho estar constipado para pedir a Carlos que o fosse ver. Quando se apanhou sozinha
com ele beijou-o e impôs-lhe um encontro para o dia seguinte em casa da sua tia. Entretanto
Charlie dormia tranquilamente no seu berço.

Chegaram por fim Teles da Gama e o conde Steinbroken. O resto da noite passou-se no salão, ao
som dos fados de Teles da Gama e de melodias da Finlândia.

No dia seguinte, depois do encontro com a condessa, Carlos correu a casa de Maria Eduarda, que
já o esperava, estranhando a sua demora. Carlos conversou animadamente com Rosa e
preparava-se para beber chá com Mª Eduarda, quando Domingos veio anunciar a visita de
Dâmaso. Então Mª Eduarda mandou responder que não recebia. Depois de o sentirem bater a
porta, Mª Eduarda comunicou os inconvenientes daquela casa, tão acessível a visitas importunas.

Mª Eduarda manifestou o desejo de arranjar uma casa de campo onde pudesse passa os meses
de verão com a filha e Carlos lembrou-se logo da casa do Craft, nos Olivais. Depois disso Carlos
declarou-se a Mª Eduarda. Maria Eduarda também amava Carlos, mas antes de tudo tinha uma
revelação a fazer-lhe.

Carlos interrompeu-a, dizendo-lhe que ela era a eleita do seu coração e que queria fugir com ela e
com Rose para um lugar onde pudessem viver tranquilamente o seu amor.

No dia seguinte Carlos procurou Craft nos Olivais, para lhe alugar a casa e a quinta e comprar-lhe
os seus móveis e decoração. Assim que pôde Carlos foi comunicar a novidade a Mª Eduarda. De
repente tudo correspondia a um conto de fadas e entravam naquela casa com luzes acesas e as
jarras cheias de flores, sem precisarem de transportar nada. Afonso da Maia aprovou a aquisição
do neto.

Entretanto Ega estranhava o facto de Carlos não lhe confidenciar nada sobre a sua paixão. Por
fim Carlos acabou por contar toda a sua história de amor ao amigo e Ega ficou impressionado,
percebendo que Carlos tinha encontrado o seu destino.
Capítulo XV A IMPRENSA

Este capítulo é marcado pela subjetividade, pois a Mª Eduarda conta a Carlos a sua
história, sendo usado o discurso de primeira pessoa.

É inevitável que o leitor se deixe conduzir pelas palavras de Mª Eduarda,


comovendo-se com os desaires da sua vida, resultantes do gosto de sua mãe por uma
vida de aventuras atribuladas.

Destacam-se ainda as seguintes peripécias:

Ega e Cruges jantam na “ Toca “, encantando-se com as maneiras de Mª Eduarda;

Dâmaso continua a pôr em prática as suas artimanhas para dificultar o romance de


Carlos e Mº Eduarda.

Maria Eduarda conta a Carlos todo o seu passado (em analepse): nascera em Viena;
não sabia nada do pai, apenas que era nobre e belo; tinha uma irmã que morrera;
lembrava-se do avô materno, que lhe contava histórias de navios; fora educada num
colégio de freiras. Maria Eduarda recorda a vida da mãe, que foi sempre decaindo,
terminando em pobreza e miséria, devido ao seu gosto exacerbado pela boémia e pelo
luxo. Querendo escapar à vida difícil que levava, juntou-se com Mac Gren, um irlandês
que depois morreu na guerra, e de quem teve uma filha chamada Rose. Após a morte
do companheiro, Maria Eduarda suportou muitas provações, juntamente com a mãe e
a filha. Mais tarde regressou a Paris onde, sem amor, se juntou a Castro Gomes.

Carlos conta a Ega a história de Maria Eduarda e sente-se apreensivo por saber que o
avô nunca irá compreender o passado da sua amada. Então Ega sugere que Carlos
case apenas com Maria Eduarda após a morte do avô.

Carlos convida Ega para um jantar na "Toca". Mais tarde começa a convidar outros
amigos que, aos poucos, frequentam a casa dos Olivais, nomeadamente Craft e o
marquês de Sousela.

A pedido de Maria, Carlos recomeça a sua actividade literária, compondo artigos de


medicina para a Gazeta Médica e rascunhos para o seu livro Medicina Antiga e
Moderna.

Uma manhã em que Carlos vai ver o correio, nos Olivais, depara com uma carta de
Ega, acompanhada de um artigo de jornal, no “ Corneta do Diabo “, que Ega lhe pede
para ler. Esse artigo, de teor difamatório, aludia, num tom infame e em calão, aos
amores de Carlos com Maria Eduarda. A troco de dinheiro, Ega conseguira suspender
a tiragem, com exceção de dois números, um para a Toca e outro para o Paço, que em
todo o caso não chegaria ao seu destino. Carlos percebeu que a publicação do artigo
só poderia ter sido encomendada por Dâmaso.
Carlos vai a Lisboa com Mª Eduarda e Ega, que entretanto se veio encontrar com ele
nos Olivais. No largo do Pelourinho, cruzam-se com o senhor Guimarães, o tio de
Dâmaso, um anarquista que morava em Paris e que estava de passagem por Lisboa. O
senhor Guimarães faz um aceno a Mª Eduarda, pois conhecia-a de Paris, e Mª Eduarda
revela a sua identidade a Carlos e a Ega.

Acompanhado de Carlos, Ega vai falar com Palma Cavalão, diretor do jornal, e
propõe-lhe que, também a troco de dinheiro, identifique a pessoa que lhe encomendou
o artigo difamatório contra Carlos e lhe forneça as respetivas provas, confirmando-se,
então, que tinha sido o Dâmaso, com a cumplicidade de Eusebiozinho.

Carlos envia Ega e Cruges a casa do Dâmaso, a desafiá-lo ou para um duelo ou a


retratar-se.

Ega vai a casa de Dâmaso (casa que tem uma decoração espampanante, contrastante
com a baixeza moral do seu proprietário). Sentindo-se “encurralado” por Ega e por
Cruges, Dâmaso opta cobardemente, por assinar uma carta, redigida pelo próprio Ega,
afirmando que tudo o que fizera publicar na "Corneta" sobre Carlos e Maria Eduarda
fora invenção falsa e gratuita e se devia a um estado de embriaguez. Para se
salvaguardar relativamente à responsabilização por futuras maledicências que
pudesse proferir contra Carlos, Ega entendeu ainda fazer declarar a Dâmaso que não o
deviam levar a sério, devido à sua tendência para abusar na bebida, que aliás era
hereditária.

Afonso da Maia regressa de Santa Olávia e Carlos e Ega contam-lhe o episódio


comprometedor de Dâmaso, omitindo-lhe os amores de Carlos. Os dois amigos
comunicam também a Afonso os seus projetos de criação de uma revista.

Mais tarde, no teatro, Ega descobre Raquel Cohen, acompanhada do marido e de


Dâmaso, num camarote. Dâmaso acena a Ega com um ar de vaidade e é esse gesto
que o leva a dirigir-se à redação do jornal “ A Tarde “, com o objetivo de pedir que
publiquem a carta do Dâmaso. Ega demora-se ainda algum tempo na redação,
acompanhando as conversas sobre política. O assunto da carta é depressa esquecido
em Lisboa, porque surgem outros temas de interesse, como o da formação do
Ministério.

Mais tarde vem publicada, também no jornal “ A Tarde “, a notícia de que Dâmaso vai
fazer uma viagem de recreio por Itália.
Capítulo XVI SARAU DA TRINDADE

Neste capítulo dá-se o importante episódio do “ Sarau no Teatro da Trindade “. Aqui o enredo
atinge um ponto culminante, quando surge, à maneira da tragédia clássica, uma situação que
contribui para a mudança súbita dos acontecimentos. O senhor Guimarães, tio de Dâmaso que
vive em Paris, torna-se o instrumento da fatalidade que se abate sobre Carlos e Mª Eduarda,
quando entrega a Ega o cofre que Mª Monforte lhe confiara em Paris, onde se encontram
documentos com a revelação de que Carlos e Eduarda são irmãos.

Com Maria já instalada na Rua de S. Francisco, terminara aí o jantar, e Ega insistia com Carlos
para irem ao sarau de beneficência que se realizava no Teatro da Trindade, a favor das vítimas
das cheias.

Carlos, relutantemente a principio, rendeu-se à ideia de ir, já que o Cruges era um dos atuantes.
Juntamente com Ega, suportou estoicamente o discurso de um parlamentar arrebatado, ouviu a
atuação do Cruges, tocando ao piano a Sonata Patética de Bethoven, e assistiu ao triunfo do
Alencar, que recitou um poema da sua autoria, dedicado à Democracia, tudo intercalado com idas
ao botequim e conversas de corredor com os conhecidos.

No botequim, por intermédio de Alencar, Ega travou conhecimento com o Sr. Guimarães, o tio de
Dâmaso, que vivia em Paris. O senhor Guimarães tinha mostrado vontade de falar com Ega,
porque se sentia atingido pelas declarações do sobrinho, na carta que o Ega redigira e o fizera
assinar, fazendo-o confessar que tinha uma tendência hereditária para se entregar à bebida.

Dâmaso alegara que assinara a carta sob coação. Mas, sabendo-o mentiroso, o Sr. Guimarães (em
Paris no Rappel onde trabalhava, era conhecido por monsieur Guimaran) apenas desejava que o
Sr. Ega declarasse que não o considerava um bêbedo – coisa que Ega fez sem dificuldades, pois,
além do mais, simpatizara com aquele patriarca anarquista e republicano.

Carlos, tendo visto Eusebiozinho a sair do sarau, foi atrás dele e cobrou-lhe com uma tareia a
intervenção que tivera no caso do Jornal da Corneta. Mas, quando se tratou de regressarem a
casa, os dois amigos, Carlos e Ega, desencontraram-se, e Ega caminhava com o Cruges pela Rua
Nova da Trindade, quando ouviu o Sr. Guimarães a chamá-lo.

O caso é que o Sr. Guimarães sabia que o Sr. Ega era íntimo do Sr. Carlos da Maia. E ele, Sr.
Guimarães, fora muito amigo, em Paris, da mãe de Carlos, que lhe confiara, antes de morrer, um
cofre onde estariam, segundo ele, papéis importantes. Como estava de partida, pedia ao Sr. Ega
que entregasse o cofre ou ao Sr. Carlos ou à irmã. E, perante a estupefação do Ega, o Sr.
Guimarães revela candidamente ao Ega que Maria Eduarda era irmã de Carlos – aliás, o Sr. Ega
devia estar ao corrente…Ega não estava ao corrente, mas, sem se dar por achado, arranca do Sr.
Guimarães a história que, em tudo e por tudo, condiz com a que Maria Eduarda contara a Carlos.
E, de posse do cofre, correndo para o Ramalhete, Ega realiza, atordoado, a enormidade da
situação: Carlos era amante da sua própria irmã. Indeciso, primeiro, toma depois a resolução de
não pactuar com essa situação hedionda e de contar tudo ao Vilaça, o procurador dos Maias, para
que seja este a dar a notícia a Carlos.
Capítulo XVIII EPÍLOGO

Passaram-se semanas após a partida de Mª Eduarda para França. Entretanto saiu na “


Gazeta Ilustrada “ a notícia acerca da partida de Carlos e Ega numa longa viagem pelo
mundo: Londres, Nova York, China, Japão. Ega regressou um ano e meio depois desta
viagem, informando que Carlos tinha ficado em Paris, onde alugara um apartamento e
de onde não desejava regressar, tendo perdido o interesse por Portugal. Entretanto
Ega revelou o seu propósito de escrever um livro com o título “ Jornadas de Ásia “.

Dez anos depois Carlos visita Lisboa, regressando da sua longa viagem. Carlos não
tem intenções de se demorar muito tempo, querendo apenas tratar de alguns assuntos
e matar saudades dos amigos.

Carlos almoça com Ega no hotel Bragança. Ega conta, então, as últimas novidades: a
sua mãe morrera, tendo-lhe deixado uma boa herança; madame Gouvarinho tinha
herdado uma fortuna de uma tia e tinha então melhores carruagens, continuando a
receber às terças-feiras. Apareceram então o poeta Alencar e o maestro Cruges.
Alencar tinha ao seu cuidado uma sobrinha que tinha ficado sem mãe e Cruges
escrevera uma ópera cómica, a “ Flor de Granada “, que lhe valera o merecido
reconhecimento. Por fim separaram-se, após Carlos os ter convidado para jantar,
combinando um encontro às seis horas.

Entretanto Carlos e Ega iam visitar o Ramalhete. Passaram pelo Largo do Loreto e
Carlos espantava-se com o facto de nada ter mudado. Ao descerem o Chiado, Carlos
teve também a mesma impressão, encontrado às portas dos cafés as mesmas
pessoas que por lá se detinham dez anos atrás, com o seu ar triste e apagado.

Pelo caminho cruzaram-se com o Dâmaso, que casara com a filha dos condes de
Águeda, uma gente arruinada. Dâmaso sustentava a família e além disso a mulher
traía-o, mas ele até parecia dar-se bem com isso, uma vez que até tinha engordado.
Passaram em frente do consultório de Carlos e reviveram momentos do passado,
quando se instalaram em Lisboa, cheios de projetos. Recordaram também alguns
amigos, como o Sequeira, o marquês de Sousela e a D. Maria da Cunha, que já tinham
morrido, D. Diogo, que tinha casado com a cozinheira, Craft, que se tinha mudado para
Londres, Steinbroken, que era ministro em Atenas, Taveira, que continuava igual.

Chegaram depois à avenida, que tinha sido renovada, mas Carlos espantava-se com o
aspeto molengão dos rapazes que por ali passeavam, vestindo segundo os figurinos
franceses, mas de um modo servil, exagerado e ridículo, sem nenhuma originalidade.

Os dois amigos concluíram então que o que se mantinha genuíno em Lisboa era o alto
da cidade, com o seu castelo, o casario, os palacetes, os conventos e as igrejas.
A certa altura viram passar uma vitória com duas éguas inglesas, que trazia uma rapaz
loiro, com um aspeto delicado. Carlos não o reconheceu e Ega lembrou-lhe que era
Charlie, o filho de madame Gouvarinho, seu antigo doente. Ele estava já um homem,
mas mantinha uma amizade com um velho, revelando tendências homossexuais.

Depararam ainda com Eusebiozinho, que subia a avenida, de braço dado com uma
mulher muito forte. Ele tinha sido obrigado a casar com essa mulher, porque o pai
dela, dono de um prego, os tinha apanhado num encontro. Eusebiozinho tinha um
aspeto ainda mais triste e molengão e dizia-se que a mulher lhe batia.

Carlos, recordando o artigo publicado no jornal “ A Corneta do Diabo “, a mando de


Dâmaso e de Eusebiozinho, perguntou então por Palma Cavalão e Ega esclareceu que
ele tinha deixado a literatura e se dedicava à política.

Apanharam depois uma tipóia para o Ramalhete. Viram Alencar ao longe e Ega
explicou a Carlos a sua amizade por ele, por ser um dos poucos homens que se
mantinha genuíno e com um sentido de honestidade, lealdade e generosidade.

O procurador Vilaça já os esperava à porta do Ramalhete e apresentou-lhes o


jardineiro que ali vivia com a mulher e o filho, guardando o casarão.

Os dois amigos percorreram então a casa, passando pelas diversas salas, onde se
guardavam os móveis e outros objetos trazidos da Toca. Entraram emocionados no
escritório de Afonso, onde romperam em espirros, devido a um pó que Vilaça colocara
sobre os móveis e os lençóis que os tapavam. Alguns móveis já estavam preparados
para serem levados para Paris, onde Carlos fixara a sua morada. Relembrando o
reverendo Bonifácio, o gato de estimação de Afonso, Carlos falou sobre a sua morte
em Santa Olávia e sobre o mausoléu que Vilaça lhe mandara fazer.

Sentaram-se no terraço e observaram o jardim, que tinha um aspeto melancólico,


simbolizando a decadência da família, com a estátua de Vénus coberta de alguma
ferrugem, o pranto da cascata e o cipreste e o cedro envelhecendo juntos, “ como dois
amigos num ermo “.

A propósito de Maria Eduarda, Carlos comunicou então ao amigo a notícia de que ela
ia casar, numa resolução de encarar a velhice com o apoio de um homem de bem e
que tinha afinidades com ela.

Já no quarto de Carlos, revendo a sua mocidade, os dois concluíram que ambos


tinham falhado na vida, não tendo levado por diante os seus projetos. Carlos refletiu
que só tinha vivido dois anos naquela casa, mas que era ali que estava toda a sua
vida. Ega não se admirou, porque fora nesses dois anos que Carlos viveu uma paixão.
Esta era uma ideia de românticos, mas Ega reconheceu que afinal todas as criaturas
são românticas, governando-se pelo sentimento mais do que pela razão.

Por fim decidiram fixar a sua teoria sobre a vida, o “ fatalismo muçulmano “, que
consistia em não ter ambições nem esperanças e tudo aceitar com resignação e com a
consciência acerca da impossibilidade de se ter qualquer controlo sobre a vida.

Em suma, qualquer esforço se tornava inútil e não valia a pena correr para nada, “
nem para o amor nem para a glória nem para o dinheiro nem para o poder “. Por fim, já
na rua, aperceberam-se do adiantado da hora e correram desesperadamente para
apanhar um americano. Afinal, tendo eles decidido que não valia a pena correr fosse
para o que fosse, apenas apressavam o passo para satisfazerem os apetites do
estômago, pois estavam atrasados para o jantar que Carlos tinha marcado no hotel
Bragança e Carlos tinha vontade de ainda mandar preparar um prato de paio com
ervilhas.

A intriga principal terminou com a descoberta dos laços de parentesco existentes


entre Carlos e Mª Eduarda, o que levou à morte de Afonso, à partida de Mª Eduarda
para França e à decisão de Carlos de viver no estrangeiro, mas podemos considerar
que a ação continua em aberto, surgindo as seguintes perguntas: Será que Carlos vai
continuar a levar uma vida fútil de homem rico, passeando por Paris, ou, quem sabe,
poderá até voltar a apaixonar-se, abandonando a ociosidade e entregando-se
finalmente aos seus projetos da mocidade? E Ega, virá enfim a escrever os sus livros?
Considerando o decadentismo da geração de 70, da qual fazia parte Eça de Queirós, o
leitor fica certamente desencantado com este desfecho que nos aponta para uma
situação de desistência nas personagens e de crise e estagnação no país, já tão
familiar aos portugueses. Os episódios da vida social não se esgotam no final desta
trama realista, sendo sempre fácil imaginar outros que poderiam dar sequência a este
romance. Quem sabe talvez até pudéssemos imaginar outros enredos nos quais nos
surgissem portugueses empenhados em “ arregaçar as mangas “, teimando em
vencer a decadência para onde de vez em quando nos conduzem as forças da inércia?

Neste capítulo final, percebemos como esta obra mantém ainda a sua atualidade,
justificando-se a sua leitura, pelas linhas de reflexão que nos propõe.

Você também pode gostar