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Problema 1 – Falência medular

Hematopoese

A hematopoiese (ou hemopoese) é processo pelo qual são formadas as células do sangue. Ela abrange todos
os fenômenos relacionados com a origem, a multiplicação e a maturação de células primordiais ou
precursoras das células sanguíneas. A porção celular do sangue é composta de eritrócitos, leucócitos e
plaquetas. Essas três linhagens celulares, apesar de serem distintas umas das outras, são oriundas de uma
célula-mãe única, denominada célula pluripotente, toipotente, stem–cell ou célula-tronco.

Hematopoiese no Período Intra-Uterino: Ainda durante a gestação, do quarto ao sexto mês de vida fetal,
as células tronco hematopoiéticas emigram do saco vitelínico para o fígado e as células do sangue são, então,
formadas no fígado e também no baço. É o período hepatoesplênico da hematopoiese. Nesse período, além
de haver eritropoiese, surgem outras linhagens hemopoiéticas, como granulócitos e megacariócitos. Após o
período hepatoesplênico, a hematopoiese passa a ser feita na porção esponjosa dos ossos, também
denominado período medular. A medula óssea é o sítio hematopoiético mais importante a partir de 6 a 7
meses de vida fetal, durante a infância e na vida adulta.

Hematopoiese no Período Extra-Uterino: Nos dois primeiros anos (fase criança), toda a medula óssea é
hematopoiética. Porém, durante o resto da infância, há substituição progressiva da medula dos ossos longos
por gordura, de modo que a medula hemopoética no adulto (fase adulta) é confinada ao esqueleto central
e às extremidades proximais do fêmur e do úmero (convergência troncular da hematopoiese). Mesmo
nessas regiões, aproximadamente 50% da medula é composta de gordura. Após os 50 anos há a produção
de medula cinza pela substituição do tecido adiposo medular pela proliferação de fibroblastos nos ossos
longos (fase senil).
Estrutura do eritrócito

O eritrócito é composto, essencialmente, por uma membrana envolvendo uma solução rica em eletrólitos
(principalmente o potássio) e Hb. É altamente dependente de glicose como fonte de energia (ATP), e, como
não existem organelas intracelulares como mitocôndrias, a produção de ATP é quase exclusiva por meio da
glicólise. A membrana eritrocitária é constituída por uma bicamada lipídica, na qual são inseridas proteínas
transmembrana de disposição vertical (proteínas integrais, banda 3 e glicoforina), que têm como base de
sustentação um citoesqueleto de proteínas de disposição horizontal (malha de alfa e betaespectrinas). A
integridade da membrana é responsável por propriedades importantes dos eritrócitos, que permitem sua
passagem pelos vasos sem haver lise celular. Essas propriedades são deformabilidade, elasticidade e
reestruturação do eritrócito, as quais se encontram alteradas nos defeitos de membrana (esferocitose).

Estrutura da Hemoglobina (Hb).

A Hb é a macromolécula presente no interior dos eritrócitos, responsável diretamente pelo transporte de


oxigênio até os tecidos. A cor vermelha das hemácias é dada por esse pigmento, e a sua concentração no
interior do corpúsculo se traduz em diferentes intensidades e padrões de pigmentação, que podem ser
armas propedêuticas importantes no diagnóstico da etiologia das anemias.

A concentração considerada normal de Hb para mulheres é de 12 a 16 g/dL e, para homens, de 14 a 18 g/dL.

Cada molécula da Hb é composta por 4 cadeias heme e 4 cadeias de polipeptídios de globina. As cadeias
globínicas, responsáveis pela caracterização do tipo de Hb, são formadas por 2 cadeias alfa e 2 cadeias não
alfa (beta, gama e delta). As formas predominantes no indivíduo normal após o nascimento são:

Hemoglobina A (HbA): 2 cadeias alfa e 2 cadeias beta;

Hemoglobina A2 (HbA2): 2 cadeias alfa e 2 cadeias delta;

Hemoglobina fetal (HbF): 2 cadeias alfa e 2 cadeias gama.

Contudo, outros tipos de cadeias globínicas e de Hbs aparecem durante o desenvolvimento embrionário-
fetal ou por mutações específicas, como no caso das talassemias e da doença falciforme. Cada cadeia de
globina envolve 1 único núcleo contendo ferro, denominado “porção heme da molécula”. O heme contém
1 anel de protoporfirina e 1 átomo de ferro em seu estado ferroso, e pode ligar-se a 1 única molécula de
oxigênio. Portanto, cada molécula de Hb é capaz de ligar 4 moléculas de oxigênio. Em um adulto normal,
cerca de 98% da Hb circulante consiste em HbA; aproximadamente 2% da Hb restante aparece na forma A2.
Menos de 1% apresenta-se na forma fetal ou F, sendo esta de maior afinidade pelo oxigênio do que as formas
A.

Conceito de Anemia

A anemia é definida como o estado em que há diminuição da concentração de hemoglobina (Hb) por unidade
de sangue, abaixo da média considerada normal para a raça, o sexo, a idade do indivíduo e a altitude em que
ele se encontra. Essa condição caracteriza-se pela redução da capacidade de transporte de oxigênio,
resultando, nos quadros mais severos, em disfunções miocárdica e cerebral.

Segundo os critérios da Organização Mundial da Saúde, os limites mínimos ao nível do


mar são de 14 g/dL para homens, 12 g/dL para mulheres e 11 g/dL para gestantes.

Erroneamente, considera-se a anemia uma patologia, e não o sinal de uma doença de base. O raciocínio
simplista de considerar a anemia uma entidade individual leva a falhas graves na realização de diagnósticos
e no seu tratamento. Diagnosticar a etiologia é essencial, pois, se não corrigida ou controlada, a anemia
evolui de forma recorrente ou com piora progressiva. Alguns fatos devem ser citados no estudo da anemia:
a anemia congênita é sugerida pelas histórias pessoal e familiar. A causa mais comum de anemia é a
deficiência de ferro. Má alimentação pode resultar em deficiência de ácido fólico e contribuir para deficiência
de ferro, mas o sangramento é muito mais comumente a causa da deficiência de ferro em adultos. O exame
físico demonstra palidez. Deve-se ter atenção aos sinais físicos de doenças hematológicas primárias
(linfadenopatia, hepatoesplenomegalia ou sensibilidade óssea), sobretudo no esterno ou na região tibial
anterior. Alterações na mucosa, como língua lisa, podem sugerir anemia megaloblástica.

Anemia do ponto de vista semiológico – mecanismos adaptativos

Aumento do Para aumentar o aporte de oxigênio aos tecidos, o sangue circula em maior volume por
Débito cardíaco minuto “efeito hipercinético da anemia”, consequência da queda da resistência vascular
periférica e do aumento da frequência cardíaca.
Aumento do 2,3 Este metabólito reduz a afinidade da Hb pelo oxigênio, facilitando a liberação de O2 nos
DPG no interior tecidos e minimizando os sintomas.
da Hemácia
Aumento Tal aumento forma shunts, para melhorar a perfusão de órgãos vitais. Na perda aguda, as
perfusão órgão- maiores áreas de redistribuição são o leito vascular mesentérico e ilíaco; nas perdas crônicas,
seletiva pele e rim.
Aumento da
função pulmonar Este consiste no aumento da frequência respiratória para elevar a oxigenação sanguínea.
Aumenta a Tal aumento é mediado pela produção de EPO. A taxa da síntese desta é inversamente
produção de proporcional à concentração de Hb e estimulada pela hipóxia do tecido renal.
eritrócito

Quando o sistema de adaptação da anemia está preservado, a liberação tissular de oxigênio pode ser
mantida, em repouso, com valores de Hb de até 5 g/dL. Sintomas estabelecem-se com valores abaixo desse
no indivíduo em repouso, ao esforço físico ou, ainda, nos casos de falha no sistema de adaptação.

Quadro clínico da anemia


Os sintomas mais habitualmente associados à síndrome anêmica, independentemente de sua etiologia, são
dispneia aos esforços, de forma progressiva – até dispneia em repouso, tontura postural, vertigem, cefaleia,
palpitação, síncope, astenia, diminuição dos rendimentos físico e intelectual, alteração do sono, diminuição
da libido, alteração do humor, anorexia, dor torácica e descompensação de patologias cardiovasculares,
cerebrais ou respiratórias de base. No exame físico, encontram-se palidez da pele e das mucosas,
taquicardia, aumento da pressão do pulso, sopros de ejeção sistólicos, diminuição da pressão diastólica e
edema periférico leve. Nos casos mais graves, letargia, confusão mental, hipotensão arterial e arritmia
cardíaca. A anemia causada por perda sanguínea aguda é acompanhada de sintomas de hipovolemia. De
acordo com o volume de sangue perdido, a intensidade do sintoma muda e pode variar desde taquicardia
até choque hipovolêmico e perda de consciência. Além disso, os reflexos de adaptação vascular à perda
volumétrica aguda são mais intensos, e o quadro pode regredir apenas com reposição de volume. É
importante reconhecer a diferença entre sintoma de anemia e hipovolemia, a fim de evitar transfusões de
sangue desnecessárias. A transfusão de concentrado de hemácias deve ser considerada aos pacientes das
classes III e IV, pois, nos de classes I e II, pode ser feita apenas a reposição volêmica com cristaloides. O cor
anêmico é possível em indivíduos previamente hígidos e acontece em razão da insuficiência cardíaca de alto
débito.

Anemia do ponto de vista laboratorial

O número de reticulócitos (precursores das hemácias) ajuda a estimar a função medular e deve ser pedido
na avaliação das anemias. A contagem normal de reticulócitos varia de 0,5 a 2%, e sua contagem absoluta
de 25.000 a 75.000 µL, podendo ser utilizada como marcador da eritropoese eficaz, pois eles são formas
jovens da hemácia recentemente liberados pela medula óssea. Diante do quadro de anemia, se a EPO e a
função medular estiverem preservadas, a produção eritroide aumentará em 2 a 3 vezes o valor normal
dentro de 10 dias do início da anemia. Desta forma, se o valor normal da contagem não for ampliado dessa
maneira, será indício de resposta medular inadequada. O valor do reticulócito pode ser expresso em número
absoluto ou relativo (em porcentagem). Quanto mais intensa for a anemia, mais precocemente o reticulócito cairá
na circulação e ali ficará por maior tempo.

MEDULA HIPOPROLIFERATIVA: APRESENTA CONTAGEM DE RETICULÓCITO CORRIGIDA < 2% OU < 100.000/MM3;


MEDULA HIPERPROLIFERATIVA: QUANDO A CONTAGEM ATINGE VALORES ≥ 2% OU ≥ 100.000/MM3, INDICANDO RESPOSTA
MEDULAR NORMAL À PERDA DE SANGUE OU À DESTRUIÇÃO EXCESSIVA DOS ERITRÓCITOS.

A avaliação morfológica das anemias baseia-se, principalmente, na hemoglobina corpuscular média, no


volume corpuscular médio e no red cell distribution width (RDW). O VCM (que mostra o tamanho médio dos
eritrócitos) e a HCM (que mostra o valor médio de Hb nas hemácias – representado morfologicamente pela
cor do eritrócito) podem ser calculados com base nos valores de hematócrito, número de eritrócitos e Hb.
Diagnóstico diferencial

A síndrome mielodisplásica (SMD), ou mielodisplasia, é uma doença que acontece quando a célula-tronco
hematopoiética, responsável pela produção das células do sangue, sofre uma série de mutações genéticas.
Com isso, ela passa a ter problemas para fabricar células do sangue maduras. Essa doença pode se apresentar
com características mais indolentes, ou seja, ter uma evolução mais lenta, ou mais agressivas. Entretanto,
em ambas as situações é fundamental realizar o tratamento adequado para evitar que surjam complicações,
que podem levar à morte, ou que a SMD evolua para uma leucemia mieloide aguda (LMA).

Anemia aplásica é uma doença das células-tronco hematopoiéticas que resulta na perda dos precursores
dos eritrócitos, hipoplasia ou aplasia da médula óssea e citopenia de duas ou mais linhagens celulares
(eritrócitos, leucócitos e/ou plaquetas). Os sinais e sintomas são provenientes da anemia, da
trombocitopenia (petéquias, sangramento) ou da leucopenia (infecções). O diagnóstico exige a comprovação
da pancitopenia periférica e biópsia da médula óssea revelando hipocelularidade medular. O tratamento
geralmente é feito pela imunossupressão com globulina antitimocítica equina e ciclosporina, ou transplante
de medula óssea.

CA de medula óssea, Também conhecido como mieloma múltiplo, é uma proliferação neoplásica de
plasmócitos, que produz imunoglobulina monoclonal. Dessa forma, os plasmócitos se proliferam na medula
óssea e costumam resultar em uma destruição esquelética.Os sintomas mais comuns envolvem lesões
osteolíticas, hipercalcemia, anemia normocítica e normocrômica, além de lesão renal.

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