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1 de Março de 2023

Consequências da falta grave na progressão de regime

Publicado por Paula Lizandra há 10 meses

A execução penal está situada na terceira fase do princípio da


individualização da pena, tendo como objetivo, executar o que
foi imposto em sede de sentença penal condenatória. Ocorre
que esta fase se caracteriza por sua dinâmica, podendo sofrer
algumas alterações ao longo do cumprimento de pena. Em
outras palavras, não é porque alguém obteve uma condenação x,
com regime inicial de cumprimento de pena previamente
estabelecido, que seu cumprimento se dará de forma integral
naquele regime, podendo ser concedido benefícios, a exemplo
do livramento condicional e da progressão de regime, que será
objeto de nosso estudo.

1. PROGRESSÃO DE REGIME:

O sistema penal brasileiro adotou três regimes: fechado,


semiaberto e aberto. E, por conseguinte, também adotamos o
sistema progressista de execução, isto é, ao preso condenado
está disponível a possibilidade de, ao longo do cumprimento de
pena, passar do regime mais rigoroso para o mais brando. Um
ponto importante a ser observado é que na progressão, via de
regra, se proíbe a passagem direta do regime fechado para o
aberto, as chamadas progressão por salto, ou seja, nos casos em
que o preso iniciou o seu cumprimento de fecha em regime
fechado, necessariamente deverá ser respeitado a passagem
pelo regime intermediário (semiaberto), com exceção das
hipóteses trazidas pela súmula vinculante nº 56 do STF.

Entende-se a progressão de regime como um direito subjetivo


do preso, portanto, disponível a todos, desde que cumpram os
requisitos contidos no artigo 112 da LEP, conhecidos por
objetivos e subjetivos. Passamos a analisar:

1.1 REQUISITO OBJETIVO:

Ao falarmos em requisitos objetivos, levemos em consideração


questões voltadas a pena do condenado, referindo-se a parcela
necessária de cumprimento de pena para atingir o benefício. No
tocante ao requisito objetivo, podemos observar diferentes
cenários, vejamos:

Antes da vigência lei 13. 964/19, também conhecida como


pacote anticrime, era exigido como tempo necessário de
cumprimento de 1/6 da pena, em se tratando de crime comum,
independentemente de reincidência em crimes dessa natureza,
já que a lei não trouxe distinção. Por outro lado, no tocante aos
crimes hediondos e seus equiparados, seria necessário o
cumprimento de 2/5 da pena, se primário, e 3/5 para os casos
de ser reincidente.

Com o advento da lei 13.964/19, alterando o artigo 112 da lei


7210, trazendo nos parâmetros de progressão de regime.
Portanto, agora temos:

16%: Para primário condenado em crimes sem violência ou


grave ameaça;

20%: Para o reincidente condenado em crimes sem violência ou


grave ameaça;
25%: Para o primário condenado em crimes com violência ou
grave ameaça;

30%: Para o reincidente condenado em crimes com violência ou


grave ameaça;

Atenção: O dispositivo pede uma reincidência específica,


portanto nos casos em que houver uma reincidência genérica
(condenações por crime sem violência + crime com violência),
deverá ser aplicado o quantum exigido no inciso III - 25%: Para
o primário condenado em crimes com violência ou grave
ameaça;

40%: Condenado primário em crime de hediondo ou


equiparado.

50%:

a) Primário condenado em crime hediondo com resultado morte


– Vedado o livramento condicional

b) Exercer comando, individual ou coletivo, de organização


criminosa estruturada destinado a cometer crimes hediondo;

c) Condenado pela prática do crime de constituição de milícia


privada;

60% Condenado reincidente em crime hediondo ou equiparado;

Atenção: Aqui, a lei exige uma reincidência específica.


Portanto, nos casos de reincidência genérica (Comum +
Hediondo), deverá ser utilizado o patamar de 40%.
Entendimento firmado pela jurisprudência RE 1.327.963 do
STJ. Por ser mais benéfico que a lei anterior, deverá retroagir
para os casos que antecede a lei 13.964/19. Isso porque, antes
da referida lei, a aplicação de 3/5 para progressão não exigia
uma reincidência específica, visto que o entendimento
majoritário seria de que a reincidência é uma característica
inerente a personalidade do condenado, além do antigo
dispositivo não fazer menção a necessidade de uma
especificidade.

70%: Condenado reincidente em crime hediondo ou equiparado


por resultado morte – Vedado o livramento condicional.

1.2 REQUISITO SUBJETIVO:

Enquanto o requisito objetivo está ligado a questões da pena do


preso, o requisito subjetivo está ligado a questões inerentes a
sua personalidade. O caput artigo 112 exige o bom
comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do
estabelecimento prisional.

Atenção: O exame criminológico deixou de ser obrigatório, no


entanto, não havendo proibição legal, o juiz poderá solicitar sua
realização, desde que mediante decisão fundamentada –
Súmula 439 do STJ. Não podendo ser fundamentada na
gravidade abstrata do delito, tampouco na longevidade da pena.
A fundamentação ocorre em face de elementos concretos que
aconteceram ao longo da execução da pena, a exemplo de
cometimento de falta grave. De todo modo, a fundamentação
deve recair em concordância com o artigo 315, § 2º do CPP.

2. MARCO INICIAL PARA CONTAGEM DA


PROGRESSÃO DE REGIME:

Como sabemos, a lei exige um lapso temporal de cumprimento


de pena para concessão da progressão de regime. No entanto,
para além do tempo exigido para obter direito ao benefício, é
preciso entender de que ponto se inicia a contagem desse lapso.
Vejamos:

a) Data da última prisão;

b) Data em que se deu a última progressão – Importante


lembrar que não será a data da decisão que autoriza a
progressão, mas sim a data em que se preencheu o requisito
para se alcançar. Predomina-se o entendimento de que a
respectiva data é referente ao dia que o condenado atingiu o
último requisito.

c) Data da falta grave – Trata-se da data que efetivamente se


deu a falta, não a data da sua homologação pelo juiz da VEC.
Nos casos de fuga, a falta de prolonga no tempo, sendo a data-
base fixada no dia da recaptura.

3. FALTA DISCIPLINAR DE NATUREZA GRAVE:

Dentro das unidades prisionais há um conjunto de normas de


conduta, que objetivam a manutenção da ordem e disciplina
desses estabelecimentos. Ao passo de que, o descumprimento
dessas normas, acarretam em faltas disciplinares, podendo ser
leve, média ou grave. No que se refere as faltas leves e média,
estão contidas em legislação específica, isto é, cada estado tem a
sua. De outra sorte, a falta disciplinar de natureza grave está
disciplinada na lei de execução penal, em seu artigo 50.

É importante ter em mente que as faltas disciplinares são


regidas pelo princípio da legalidade, sendo assim, para que uma
conduta seja considerada falta disciplinar, é necessário que
esteja disciplinado em lei, e mais ainda, que esteja consignada
no diploma legal em data pretérita ao fato. Ademais, por força
do princípio da legalidade, as faltas estão regidas em um rol
taxativo, significa dizer que só será considerado falta disciplinar
o que estiver descrito em lei como tal, não cabendo
interpretações extensivas.

4. CONSEQUÊNCIAS DA FALTA GRAVE NA


PROGRESSÃO:

Como o próprio nome já diz, a falta disciplinar de natureza


grave é a falta com consequências mais gravosas para o
condenado, sendo a única que possui consequências direta na
execução da pena. Passaremos a estudar os impactos dessa falta
na progressão de regime.

4.1 REGRESSÃO DE REGIME:

Art. 118. A execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita


à forma regressiva, com a transferência para qualquer dos
regimes mais rigorosos, quando o condenado:

I - Praticar fato definido como crime doloso ou falta grave;

Implica saber que, nos casos que a falta grave originar do


cometimento de um delito durante o cumprimento de pena, é
prescindível o trânsito em julgado da condenação ( súmula 534
do STJ). Existe uma discussão sobre quando seria efetivamente
computado essa falta, sendo predominante o entendimento de
que ocorre a falta grave a partir do conhecimento da prática
delituosa, assim bastaria um B.O. para ensejar falta grave.

4.1.2 REGRESSÃO POR SALTO E OFENSA A COISA


JULGADA:

Imagine a seguinte situação: João é condenado a uma pena de 5


anos de reclusão, iniciando seu cumprimento de pena em
regime semiaberto. Após cumprir uma parcela da sua pena,
progride para o regime aberto, quando comete uma falta. A
determinação da regressão para o regime fechado seria uma
ofensa a coisa julgada? O STJ firmou entendimento de a
imposição de regime mais severo do que aquele imposto como
regime inicial de cumprimento de pena, em virtude de falta
grave, não ofende coisa julgada.

De outra sorte seria se João inicia seu cumprimento de pena em


regime semiaberto e, durante o cumprimento de pena, comete
falta grave, sem nunca ter sido beneficiado com a progressão de
regime. Neste caso, existem decisões no sentido de que é
necessário progredir para se decretar a regressão. Portanto,
nessas hipóteses, poderia ser aplicado a João as demais
consequências da falta grave, com exceção da regressão de
regime.

4.2 INTERRUPÇÃO DO LAPSO PARA PROGRESSÃO


DE REGIME:

Interromper equivale a zerar a contagem do tempo necessário


de cumprimento de pena para concessão do benefício. No
entanto, não se despreza o tempo de pena que fora cumprida
pelo condenado até a data da falta. Neste caso o cálculo fica da
seguinte forma:

Total da pena imposta – Pena cumprida até o dia da falta =


Resultado 1

Resultado 1 x fração/porcentagem correspondente = resultado 2

Aplica o resultado 2 na data-base (dia da conduta faltosa) =


Nova data para progressão.

4.3 ALTERAÇÃO DA DATA-BASE:


Como já foi mostrado, a partir do cometimento de uma falta
grave, temos um novo marco inicial para contagem da
progressão.

Fiquem atentos:

1) No caso de cometimento do crime, a data-base é o dia do fato


criminoso, não da sentença condenatória;

2) No caso de falta cometida dentro da unidade, será o dia da


conduta faltosa;

3) No caso de fuga, a falta de prolonga com o decorrer do


tempo, sendo a data-base o dia da recaptura.

4.4 PERDA DOS DIAS REMIDOS:

Nos termos do artigo 127 da lei de execução penal, o


cometimento de falta grave acarreta na perda de até 1/3 dos dias
remidos. Sobre esse tema é importante o entendimento de
alguns pontos:

1) O texto original do artigo 127 da LEP trazia como


consequência a perda de todos os dias remidos. A partir da lei
12.433 de 2011, a perda dos dias remidos se limita em ATÉ 1/3.
Portanto, tratando de uma nova lei que beneficia o condenado,
retroage aos fatos que antecederam a data da sua vigência.

2) O texto de lei traz a expressão “PODERÁ”, significa dizer que


o juiz não está obrigado a fazer o desconto dos dias remidos,
mas se fizer, deve respeitar o limite, que é de 1/3. Devendo, nos
casos de aplicação do patamar máximo de descontos de dias
remidos, dar-se por meio de decisão fundamentada, seguindo os
preceitos do artigo 93, IX da CF/88.
Referência Bibliográfica:

ROIG, Rodrigo. EXECUÇÃO PENAL: teoria crítica. 5. ed. São


Paulo: Revistas dos Tribunais, 2021

Disponível em: https://paulalizandraa.jusbrasil.com.br/artigos/1465102127/consequencias-da-


falta-grave-na-progressao-de-regime

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