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RESUMO

Aproximadamente no décimo sexto dia, as células progenitoras cardíacas migram


através da linha primitiva para uma posição cranial às pregas neurais, onde elas estabelecem
uma região em formato de ferradura na camada visceral do mesoderma lateral, chamada de
área cardiogênica primária (ACP) ou primeiro campo cardíaco (PCC).

Conforme migram, essas células são especificadas pela via da lateralidade para
contribuir para os lados direito e esquerdo do coração e para formar regiões cardíacas
específicas, que incluem parte dos átrios e do ventrículo direito. O restante do coração,
incluindo parte dos átrios, do ventrículo direito, do cone arterial e do tronco arterioso (a via de
saída) é derivado das células da área cardiogênica secundária (ACS) ou segundo campo
cardíaco (SCC). O SCC surge das células que migram pela linha primitiva e, depois, instala-se no
mesoderma visceral próximo ao assoalho da parte posterior da faringe. Essas células também
são padronizadas pela sinalização de lateralidade e regulam as contribuições das células da
crista neural para septação da via de saída, incluindo a espiralização do septo conotruncal.
Alterações na via de lateralidade resultam em muitos tipos diferentes de defeitos cardíacos,
enquanto alterações no SCC levam a defeitos da via de saída, incluindo transposição das
grandes artérias, estenose pulmonar, dupla via de saída do ventrículo direito (DVSVD), entre
outros.
A indução da região cardiogênica é iniciada pelo endoderma anterior subjacente às
células progenitoras cardíacas e faz com que as células se tornem mioblastos e vasos. BMPs
secretadas por esse endoderma, junto com a inibição da expressão de WNT, induz a expressão
de NKX2.5, o gene-chave para o desenvolvimento cardíaco. Algumas células do PCC se tornam
células endoteliais e formam um tubo com formato de ferradura, enquanto outras compõem
os mioblastos que cercam o tubo. No 22o dia do desenvolvimento, a parede corporal lateral se
dobra, aproximando os dois lados da ferradura na linha média, onde eles se fusionam (exceto
em suas extremidades caudais [atriais]), formando um tubo cardíaco único e levemente
dobrado (ver Figura 13.7), que consiste em um tubo endocárdico interno e um manto
miocárdico circunjacente. Durante a quarta semana, o coração sofre uma alça cardíaca. Esse
processo faz com que o coração se dobre sobre si mesmo e adote sua posição normal na
região esquerda do tórax com os átrios posteriormente localizados e os ventrículos em uma
posição mais anterior. A incapacidade de o coração formar alças apropriadas resulta em
dextrocardia, e o coração fica no lado direito do tórax. A dextrocardia também pode ser
induzida mais precocemente, quando a lateralidade é estabelecida.

A formação dos septos no coração surge em parte pelo desenvolvimento do tecido


dos coxins endocárdicos no canal atrioventricular (coxins atrioventriculares) e na região
conotruncal (coxins conotruncais). Por causa da posição-chave do tecido do coxim, muitas
malformações cardíacas estão associadas à morfogênese anormal dos coxins.

O desenvolvimento atrial depende da expansão da região atrial original e da


incorporação de estruturas adicionais. À direita, o seio venoso é incorporado e forma a parte
de parede lisa do átrio direito, que é separada da parte trabeculada pela crista terminal. À
esquerda, a veia pulmonar, que se forma no mesocárdio dorsal, está posicionada na parede
posterior do átrio esquerdo quando as células da protrusão do mesênquima dorsal (PMD)
proliferam e acompanham o septo primário conforme essa estrutura cresce em direção ao
assoalho do átrio. A seguir, as raízes da veia pulmonar são incorporadas ao átrio esquerdo por
expansão atrial até que as quatro ramificações da veia entrem no átrio em sua parede
posterior. Essa parte constitui a região da parede lisa do átrio esquerdo. O desenvolvimento da
veia pulmonar começa na linha média e muda para a esquerda, como resultado da sinalização
da lateralidade. O retorno venoso pulmonar anômalo total (RVPAT), em que a veia é deslocada
para a direita e entra no átrio direito ou, ainda, na veia cava superior ou na veia
braquiocefálica, surge em casos de heterotaxia quando a padronização esquerda-direita é
interrompida.

Formação de septos no átrio. O septo primário, uma crista falciforme que desce do
teto do átrio, começa a dividir o átrio em dois, mas deixa um lúmen, o óstio primário, que
comunica os dois lados. Mais tarde, quando o óstio primário é obliterado pela fusão do septo
primário com os coxins endocárdicos, o óstio secundário se constitui por morte celular,
criando uma abertura no septo primário. Finalmente, forma-se o septo secundário, mas
persiste uma abertura interatrial, o forame oval. Apenas ao nascimento, quando a pressão no
átrio esquerdo aumenta, os dois septos são pressionados um contra o outro e a comunicação
entre eles se fecha. As anomalias no septo interatrial podem variar da ausência total até uma
pequena abertura conhecida como persistência do forame oval.
Formação de septo no canal atrioventricular. Quatro coxins endocárdicos cercam o
canal atrioventricular. A fusão dos coxins superior e inferior opostos divide o óstio nos canais
atrioventriculares direito e esquerdo. O tecido do coxim se torna fibroso e forma a valva mitral
(bicúspide) na esquerda e a valva tricúspide na direita. A persistência do canal atrioventricular
comum e a formação anormal das valvas são defeitos que ocorrem por causa de anomalias no
tecido do coxim endocárdico.

Formação de septo nos ventrículos. O septo interventricular consiste em uma parte


muscular espessa e uma parte membranosa, formadas por: (1) coxim atrioventricular
endocárdico inferior; (2) projeção direita do cone; e (3) projeção esquerda do cone. Em muitos
casos, esses três componentes não conseguem se fusionar, resultando em um forame
interventricular aberto. Embora essa anomalia possa ser isolada, ela comumente está
combinada com outros defeitos compensatórios.

Formação de septo no bulbo. O bulbo se divide em parte de parede lisa do ventrículo


direito, cone arterial e tronco arterioso. A região do tronco é dividida pelo septo
aorticopulmonar espiralado em segmentos proximais da aorta e da artéria pulmonar Os coxins
do cone dividem as regiões da via de saída dos canais aórtico e pulmonar dos ventrículos
esquerdo e direito, respectivamente e, também, com o tecido do coxim endocárdico inferior,
fecha o forame interventricular. Muitas anomalias vasculares, como transposição dos grandes
vasos e atresia valvar pulmonar, resultam da divisão anormal da região conotruncal; suas
origens podem envolver as células da crista neural que contribuem para a formação do septo
na região conotruncal.

O sistema de condução cardíaco é derivado de células do miocárdio e o coração


começa a se contrair aproximadamente no 21o dia de gestação. Inicialmente, a atividade de
marca-passo do coração fica na parte caudal da parte esquerda do tubo cardíaco. Mais tarde, o
seio venoso assume essa função e, à medida que é incorporado ao átrio direito, o nó sinoatrial
(NSA) é formado. O nó atrioventricular (NAV) é formado a partir de células que circundam o
canal atrioventricular. Mais tarde, os impulsos do NAV avançam para o feixe atrioventricular
(feixe de His) e para os ramos esquerdo e direito e, finalmente, para a rede de fibras de
Purkinje (ramos subendocárdicos do complexo estimulante cardíaco) que circunda e ativa os
ventrículos. Todas as células do sistema de condução do coração derivam de miócitos
cardíacos primários que se diferenciam em nós, ramos de feixes e fibras de Purkinje. A
expressão do fator de transcrição TBX3 inibe a diferenciação destes miócitos primários em
células musculares ventriculares e permite que eles se diferenciem no sistema de condução.

Os arcos aórticos se localizam em cada um dos cinco arcos faríngeos. Quatro derivados
importantes do sistema de arco aórtico original são: (1) as artérias carótidas (terceiro arco); (2)
o arco da aorta (quarto arco aórtico esquerdo); (3) a artéria pulmonar (sexto arco aórtico),
que, durante a vida fetal, está conectada à aorta através do ducto arterioso; e (4) a artéria
subclávia direita, formada pelo quarto arco aórtico direito, pela parte distal da aorta dorsal
direita e pela sétima artéria intersegmental. As anomalias vasculares mais comuns do arco
aórtico incluem (1) persistência do canal arterial (PCA) e coarctação da aorta e (2) arco aórtico
direito persistente e artéria subclávia direita anormal, que podem levar a queixas quanto à
respiração e à deglutição.
As artérias vitelinas irrigam inicialmente a vesícula vitelínica (saco vitelínico), e mais
tarde, formam as artérias mesentéricas celíaca e superior. As artérias mesentéricas inferiores,
por sua vez, são derivadas das artérias umbilicais. Essas três artérias irrigam as regiões do
intestino anterior, do intestino médio e do intestino posterior, respectivamente.

As artérias umbilicais pareadas surgem das artérias ilíacas comuns. Após o


nascimento, as partes distais dessas artérias são obliteradas e formam os ligamentos
umbilicais médios, enquanto as partes proximais persistem como as artérias ilíaca interna e
vesicular.

Sistema venoso. Podem ser reconhecidos três sistemas: (1) o sistema vitelino, que se
torna o sistema portal; (2) o sistema cardinal, que forma o sistema cava; e (3) o sistema
umbilical, que desaparece após o nascimento. O complicado sistema cava é caracterizado por
muitas anomalias, como veias cavas inferior e anterior duplicadas, que também estão
associadas a defeitos de lateralidade.

Alterações ao nascimento. Durante a vida pré-natal, a circulação placentária fornece


ao feto seu oxigênio, mas, após o nascimento, são os pulmões que realizam a troca gasosa. No
sistema circulatório, ocorrem as seguintes alterações ao nascimento e durante os primeiros
meses pós-natais: (1) o ducto arterioso se fecha; (2) o forame oval se fecha; (3) a veia umbilical
e o ducto venoso se fecham e permanecem como o ligamento redondo do fígado e o
ligamento venoso; e (4) as artérias umbilicais formam os ligamentos umbilicais mediais.

Sistema linfático. O sistema linfático se desenvolve após o sistema cardiovascular e se


origina do endotélio das veias como seis estruturas saculares: duas jugulares, duas ilíacas, uma
retroperitoneal e uma cisterna do quilo. Numerosos canais se constituem para conectar as
estruturas saculares e fornecer a drenagem de outras estruturas. Em última análise, o ducto
torácico se forma pela anastomose dos ductos torácicos direito e esquerdo, da parte distal do
ducto torácico direito e da parte cranial do ducto torácico esquerdo. O ducto linfático direito
se desenvolve a partir da parte cranial do ducto torácico direito.

Defeitos cardíacos

As anomalias cardíacas e vasculares constituem a maior categoria de defeitos


congênitos humanos e são encontradas em 1% dos nascidos vivos. A incidência em natimortos
é 10 vezes maior. Estima-se que 12% dos recém-nascidos com defeitos cardíacos tenham uma
anomalia cromossômica e, por outro lado, que 33% dos bebês com anomalia cromossômica
tenham um defeito cardíaco. Além disso, 30% dos defeitos cardíacos ocorrem em recém-
nascidos com outras malformações principais. Aproximadamente 2% dos defeitos cardíacos se
devem a agentes ambientais; porém, a maioria deles é causada por uma interação complexa
de influências genéticas e ambientais (causas multifatoriais). Exemplos clássicos de
teratógenos cardiovasculares incluem o vírus da rubéola e a talidomida. Outros incluem ácido
retinoico, álcool etílico e muitos outros compostos. Doenças maternas, como diabetes melito
insulinodependente, também foram relacionadas com defeitos cardíacos.
A inversão ventricular é um defeito no qual o ventrículo esquerdo morfológico está à
direita e se conecta ao átrio direito por uma valva mitral. O ventrículo direito morfológico está
no lado esquerdo e se conecta ao átrio esquerdo por uma valva tricúspide. Algumas vezes, o
defeito é chamado de levotransposição das grandes artérias porque a artéria pulmonar sai do
ventrículo esquerdo morfológico e a aorta sai do ventrículo direito morfológico. As artérias
estão em suas posições normais, mas os ventrículos estão revertidos. A anomalia surge
durante o estabelecimento da lateralidade e a especificação dos lados esquerdo e direito do
coração pela via da lateralidade.

A comunicação interatrial (CIA) é uma anomalia cardíaca congênita com uma


incidência de 6,4/10.000 nascimentos e com uma prevalência de 2:1 em recém-nascidos do
sexo feminino em relação aos do sexo masculino. Um dos defeitos mais significativos é o
defeito do óstio secundário, caracterizado por uma grande abertura entre os átrios esquerdo e
direito. Ele pode ser causado por excesso de morte celular e pela reabsorção do septo primário
ou por desenvolvimento inadequado do septo secundário. Dependendo do tamanho da
abertura, pode ocorrer shunt intracardíaco considerável da esquerda para a direita.

A atresia tricúspide, que envolve a obliteração do óstio atrioventricular direito, é


caracterizada pela ausência ou pela fusão das valvas tricúspides. A atresia da valva tricúspide
sempre está associada a: (1) persistência do forame oval; (2) comunicação interventricular
(CIV); (3) subdesenvolvimento do ventrículo direito; e (4) hipertrofia do ventrículo esquerdo.

A anomalia de Ebstein é uma condição em que a valva tricúspide está deslocada na


direção do ápice do ventrículo direito e, como resultado, há um átrio direito expandido e um
ventrículo direito pequeno. Os folhetos das valvas estão posicionados anormalmente, e o
folheto anterior está geralmente aumentado. Os folhetos da valva tricúspide estão deslocados
em direção ao ápice do ventrículo direito e há expansão da região atrial direita.

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