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Comportamento verbal: desafios conceituais da proposta de Skinner

Chapter · August 2021

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3 authors:

Carlos Augusto Medeiros Marcio Borges Moreira


Centro de Ensino Unificado de Brasília Centro Universitário de Brasília
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Lucas Ferraz Córdova

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AMILCAR RODRIGUES FONSECA JÚNIOR

LUZIANE DE FÁTIMA KIRCHNER

CÉSAR ANTONIO ALVES DA ROCHA

ORGANIZADORES

COMPORTAMENTO
EM FOCO

Vol. 13

Ciências do comportamento:
teoria, método e aplicação
Catalogação na publicação
Fernanda Emanoéla Nogueira – CRB 9ª/1607

Comportamento em foco, v.13: Ciências do comportamento - teoria, método e apli-


cação. [recurso eletrônico] / organizadores: Amilcar Rodrigues Fonseca Júnior;
Luziane de Fátima Kirchner; César Antonio Alves da Rocha. – São Paulo, SP:
Associação Brasileira de Ciências do Comportamento, 2021.

129 p.

ISBN versão ebook (digital): nº 978-65-995704-0-7

1. Comportamento humano. 2. Comportamento - Psicologia. I. Fonseca


Júnior, Amilcar Rodrigues. II. Kirchner, Luziane de Fátima. III. Rocha, César Antonio
Alves da. IV. Associação Brasileira de Ciências do Comportamento

CDD – 150.1943

II
Organização deste volume
Amilcar Rodrigues Fonseca Júnior (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo)
Luziane de Fátima Kirchner (Universidade Católica Dom Bosco)
César Antonio Alves da Rocha (Universidade de São Paulo)

Conselho editorial da Editora ABPMC


Bruno Angelo Strapasson (Editor-chefe)
César Antonio Alves da Rocha
Claudia Kami Bastos Oshiro
Daniel Afonso Assaz
Hernando Borges Neves Filho

Projeto Gráfico e Editoração


Associação Brasileira de Ciências do Comportamento

Projeto Gráfico Original


Roberto Colombo (Portfólio)

Diagramação
Carlos Rafael Fernandes Picanço (Contato)

Instituição Organizadora
Associação Brasileira de Ciências do Comportamento

Pareceristas
Ana Carmen Oliveira
Universidade Presbiteriana Mackenzie e Núcleo Paradigma
Ana Carolina Trousdell Franceschini
Financial Services Culture Board (FSCB)
Claudia Daiane Batista Bettio
Universidade de São Paulo - Ribeirão Preto (USP-RP)
Fabiane da Silva Pereira
Centro Universitário Maurício de Nassau (UNINASSAU) e A Comportamental - Ciência & Comportamento
Felipe Pereira Gomes
Centro Universitário de Votuporanga (UNIFEV)
Jaume Ferran Aran Cebria
UNIFACIMED
Pedro Bordini Faleiros
Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP)
Priscila Ferreira de Carvalho Kanamota
Clínica Particular
Renata Penna Borges Nunes Cambraia
Instituto Brasiliense de Análise do Comportamento (IBAC) e Faculdade Anhanguera de Brasília (FAB)
Vinicius Pereira de Sousa
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e Universidade Presbiteriana Mackenzie

III
Sobre a ABPMC

A Associação Brasileira de Ciências do Comportamento (ABPMC), como foi re-


nomeada a até então Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental,
é uma associação civil sem fins lucrativos, fundada em 1991, e tem por objetivos: (a)
Promover, na sociedade, a Análise do Comportamento como área de conhecimento e
como campo de atuação profissional por meio de sua divulgação e de procedimentos
para o contínuo aperfeiçoamento da área; e (b) Criar condições para o aperfeiçoamen-
to do conhecimento científico relacionado com análise do comportamento, de seus
processos de produção e de uso por parte dos analistas de comportamento no Brasil,
por meio de avaliação e crítica sistemáticas.

A ABPMC é constituída por pesquisadores, professores, profissionais que tra-


balham com Análise do Comportamento em suas diferentes dimensões – pesquisa
básica, aplicada, conceitual e prestação de serviços – além de estudantes de psicologia,
medicina comportamental e de outras disciplinas relacionadas ao comportamento
humano. Atualmente congrega mais de 1.500 sócios distribuídos pela maioria dos
estados brasileiros. Entre as principais atividades da ABPMC está o Encontro Brasileiro
de Psicologia e Medicina Comportamental, realizado anualmente.

É considerado o maior fórum brasileiro de Análise do Comportamento e um


dos maiores do mundo. A ABPMC também mantém uma série de publicações cien-
tíficas: Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva (RBTCC), série
Comportamento em Foco (continuação da série Sobre Comportamento e Cognição),
ambas disponíveis online gratuitamente e bem avaliadas pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). A ABPMC também contribui
com outras instituições científicas, como Sociedade Brasileira para o Progresso da
Ciência (SBPC) e a Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP).

Outra atividade de grande importância realizada pela ABPMC é o processo de


acreditação de analistas do comportamento no país. Esta ação visa atender uma de-
manda da comunidade, que apresentou a necessidade de monitorar a qualidade da
prática do analista do comportamento brasileiro, favorecendo a escolha, pela comuni-
dade, de profissionais qualificados para o exercício profissional nos diversos campos
de atuação em Análise do Comportamento.

Saiba mais sobre a ABPMC em www.abpmc.org.br

IV
Diretoria da ABPMC 2021-2022
Presidente Giovana Veloso Munhoz da Rocha
Vice-Presidente Sulliane Teixeira Freitas
Primeira Secretária Angela de Loyola Silva Runnacles
Segunda Secretária Tatiany Honório Porto Aoki
Primeira Tesoureira Fernanda Chaves Pacheco Sorgatto Machado
Segunda Tesoureira Kátia Daniele Biscouto de Souza

Conselho Fiscal 2021-2022 Rafael Ernesto Arruda Santos


Vera Regina Lignelli Otero
Adriano Luís Alves Watanabe (Suplente)

Conselho Consultivo 2021-2022 Ariene Coelho Souza


Elisa Tavares Sanabio Heck
Paula Inez Cunha Gomide
Sandro Iêgo da Silva Santos
Yara Kuperstein Ingberman
Olavo de Faria Galvão

V
Sobre a coleção Comportamento em Foco

Em 1997, a ABPMC iniciou a publicação da série Sobre Comportamento e Cognição,


que teve importante papel na disseminação do conhecimento produzido em Análise do
Comportamento no Brasil. Após 16 anos de publicação da série, a ABPMC mudou seu
formato, de impresso para digital e, em 2012, renomeou a série como Comportamento
em Foco. O objetivo principal da coleção Comportamento em Foco é disseminar o
conhecimento produzido pela comunidade de analistas do comportamento no Brasil,
por meio de coletâneas constituídas pelos trabalhos apresentados nos encontros anuais
da ABPMC sob forma de palestras, mesas redondas, simpósios, sessões coordenadas,
minicursos e sessões primeiros passos.

Também é objetivo contribuir na formação científica dos estudantes e profissio-


nais da área, por meio da avaliação das produções escritas dos autores. Cada volume
é constituído por um conjunto de textos que visa ampliar o acesso de diferentes seg-
mentos da sociedade ao conhecimento produzido pelas ciências do comportamento.
Os capítulos que constituem a coleção passaram pela revisão de pareceristas ad-hoc
convidados em processo de duplo-cego.

Os livros digitais de cada volume estão disponibilizados gratuitamente no site da ABPMC:

www.abpmc.org.br

VI
Sobre os autores deste volume

Ana Claudia Moreira Almeida Verdu


Psicóloga (CRP 06/55548), Doutora em Educação Especial em 2004 pela Universidade
Federal de São Carlos, Mestre em Educação Especial em 2000 pela Universidade Federal
de São Carlos. Docente do Departamento de Psicologia desde 2000 e do Programa de
Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem desde 2005 na
Universidade Estadual Paulista. Membro do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia
Sobre Comportamento, Cognição e Ensino. Desenvolve pesquisas em Análise do
Comportamento Aplicada, comportamento verbal e funcionamento simbólico.
E-mail: ana.verdu@unesp.br

André Luiz
Professor Adjunto na Universidade Positivo (Londrina). Psicólogo (CRP 08/30867) gradu-
ado pela Universidade Positivo - Curitiba (2015). Mestre em Análise do Comportamento
(2018) pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) e Doutorando em Análise do
Comportamento pela mesma instituição. Pesquisador colaborador no Laboratório
de Análise Experimental do Comportamento Humano da UEL. Contemplado com
bolsa CAPES-DS, nível Mestrado, entre os anos de 2016 e 2018. Membro da Rede de
Colaboração Interinstitucional para Pesquisa e o Desenvolvimento das Terapias
Analítico-Comportamentais (REDETAC). Desenvolve pesquisas nas áreas de Resistência
do Comportamento à Mudança (Momentum Comportamental) e Custo da Resposta.
E-mail: andre.luiz@up.edu.br

Angelo Augusto Silva Sampaio


Professor do Colegiado de Psicologia e Vice-Coordenador do Programa de Pós-
Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Vale do São Francisco
(Univasf). Coordenador da Liga Acadêmica de Análise do Comportamento (LiAAC).
Ex-presidente e ex-secretário da Comissão de Publicação e Editorial da Associação
Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental (ABPMC). Editor associado da
Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva. Membro do Think Tank
sobre cultura e Análise do Comportamento. Doutor em Psicologia Experimental
(USP), mestre em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento (PUC-SP)
e graduado em Psicologia (UFBA). Estuda comportamento social, comportamento
verbal, evolução cultural, tratando principalmente dos processos envolvidos em me-
tacontingências e na cooperação, em especial o controle por instruções (ou regras).
E-mail: angelo.sampaio@univasf.edu.br

VII
Ariela Oliveira Holanda
Professora do Ensino Básico Técnico e Tecnológico no Instituto Federal do Paraná, campus
Londrina. Doutorado e Mestrado em Ciências do Comportamento pela Universidade de
Brasília. Especialista em Análise do Comportamento Aplicada ao Transtorno do Espectro
do Autismo pelo Paradigma - Centro de Ciências e Tecnologia do Comportamento.
Graduada em Psicologia pela Universidade Federal do Ceará. Atua nas áreas de Economia
Comportamental, Transtorno do Espectro do Autismo, Jogos de Tabuleiro e Educação.
E-mail: ariela.holanda@gmail.com

Augusto Cézar de Souza Neto


Psicólogo (CRP 03/9409), mestrando em Psicologia pela Universidade Federal do Vale
do São Francisco, especialista em clínica analítica-comportamental pela Unijorge
(Salvador – BA). É docente da UniFTC, de Feira de Santana e psicólogo clínico. Atualmente
desenvolve estudos sobre Teoria das Molduras Relacionais e sua aplicação clínica.
E-mail: augustocezar.s@hotmail.com

Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos


Psicóloga (CRP 01/23084). Graduação pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB).
Especialista em análise comportamental clínica pelo Instituto Brasiliense de
Análise do Comportamento (IBAC). Atua como psicóloga clínica. Tem interes-
se em pesquisas na área de atitudes preconceituosas e comportamento alimentar.
E-mail: barbarasrs18@gmail.com

Carlos Augusto de Medeiros


Psicólogo (CRP 01/7209), Doutor em Ciências do Comportamento pela Universidade
de Brasília, Mestre em Processos Comportamentais pela Universidade de Brasília.
Atua como docente de graduação e mestrado do Centro Universitário de Brasília.
Também atua como Psicólogo Clínico e Diretor Geral da Pragmática: Psicoterapia
e Cursos. Atualmente, desenvolve pesquisas em comportamento verbal, cor-
respondência verbal, independência funcional, relações de equivalência,
comportamento verbalmente governado e pesquisas de processo em clínica.
E-mail: carlos.medeiros@ceub.edu.br

VIII
Carlos Eduardo Costa
Graduado em Psicologia pela Universidade Estadual de Londrina (1994). Mestrado
(1997) e Doutorado (2004) em Psicologia Experimental pela Universidade
de São Paulo. Realizou estágio de Pós-Doutorado (2015) junto ao Programa e
Mestrado Profissional em Análise do Comportamento Aplicada, no Paradigma:
Centro de Ciências e Tecnologia do Comportamento (SP). Professor Associado da
Universidade Estadual de Londrina (UEL). Docente permanente do Programa de
Pós-Graduação em Análise do Comportamento na UEL. http://www.caecosta.com.br.
E-mail: caecosta@uel.br

Felipe Magalhães Lemos


Psicólogo, doutorando em Psicologia pela UFSCar, Mestre em Gestão da Clínica
pela UFSCar e especialista em Análise do Comportamento Aplicada ao Autismo
pela UFSCar. Atua como docente em Análise do Comportamento Aplicada ao TEA
na Censupeg, na Neurokind Roraima e no CBI of Miami e como Diretor Pedagógico
na Luna ABA. Atualmente desenvolve estudos sobre Análise Funcional e IISCA.
E-mail: felipemagalhaeslemos@gmail.com

Guilherme Corrêa Cabeças


Graduando em Psicologia pela Universidade Estadual de Londrina. Atualmente
desenvolve estudos sobre Resistência do Comportamento à Mudança.
E-mail: guicorreacabec@gmail.com

Joshua Jessel
Analista do Comportamento Certificado pelo BACB - Nível Doutorado (BCBA-D). Analista
do comportamento licenciado do Estado de Nova York. PhD pela Western New England
University. Mestre pela University of Maryland, Baltimore County. Atualmente é pro-
fessor assistente no Queens College CUNY e dirige um ambulatório universitário para
crianças diagnosticadas com autismo que apresentam comportamento problema.
E-mail: joshua.jessel@qc.cuny.edu

Julia Röcker dos Santos


Graduanda em Psicologia pela Universidade Estadual de Londrina. Atualmente
desenvolve estudos sobre Resistência do Comportamento à Mudança.
E-mail: julia.rocker.santos@uel.br

IX
Lucas Ferraz Córdova
Psicólogo, Doutor em Ciência do Comportamento pela Universidade de Brasília, Mestre em
Psicologia pela Universidade de Brasília. Atua como professor associado na Universidade
Federal do Mato Grosso do Sul. Docente permanente do Programa de Pós-Graduação
em Psicologia na UFMS. Coordenador do Grupo de Estudo e Pesquisa em Behaviorismo
Radical e Análise do Comportamento – GEPEBRAC. Atualmente desenvolve pesquisas em
comportamento verbal, independência funcional e comportamento verbal do cientista.
E-mail: cordovalf@gmail.com

Márcio Borges Moreira


Psicólogo (CRP 01/15515), doutor em Ciências do Comportamento pela Universidade
de Brasília, mestre em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Atua
como professor no Centro Universitário de Brasília e diretor do Instituto Walden4.
Atualmente desenvolve pesquisas nas áreas de automação de treinamentos para
profissionais e cuidadores que lidam com pessoas diagnosticadas com Transtorno
do Espectro do Autismo e formação e mudança de atitudes preconceituosas.
E-mail: borgesmoreira@gmail.com

Michelli Carrijo Cameoka


Psicóloga pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB). Tem formação
em análise comportamental clínica pelo Instituto Brasiliense de Análise do
Comportamento (IBAC). Interessa-se pela pesquisa sobre formação e mudan-
ça de atitudes, terapias de exposição e terapia de aceitação e compromisso (ACT).
E-mail: micameoka@gmail.com

Myenne Mieko Ayres Tsutsumi


Psicóloga (CRP 08/26504), Mestre em Neurociências e Comportamento em 2017
pela Universidade Federal do Pará, Especialista em Neurociências em 2019 pela
Universidade Estadual de Londrina e doutoranda em Análise do Comportamento
pela mesma instituição. Atuo como docente no curso de Psicologia da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná campus Londrina e da Universidade Positivo/
Faculdade Positivo campus Londrina. Atualmente realizo pesquisas em Psicologia
Experimental sobre resistência do comportamento à mudança (Momentum
Comportamental), tratamentos baseados em evidências e Transtorno do Espectro Autista.
E-mail: myennetsutsumi@gmail.com

X
Patrícia Luque
Doutora em Ciências do Comportamento e Mestre em Psicologia pela Universidade de
Brasília (UnB). Graduada em Psicologia pelo Centro Universitário de Brasília (CRP 01/10087)
e em Administração de Empresas pela UnB. Supervisora de estágio no Instituto Brasiliense
de Análise do Comportamento (IBAC). Psicóloga clínica desde 2004. Atualmente, desen-
volve pesquisas sobre comportamento do consumidor e economia comportamental.
E-mail: patricialuque@hotmail.com

Raquel Neves Balan


Estudante de Psicologia da Universidade Estadual de Londrina e bolsista de Iniciação
Científica Financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq).
E:mail: raquel.neves.balan@uel.br

Verônica Bender Haydu


Psicóloga, Doutora em Psicologia Experimental pela USP de São Paulo, Mestre em Psicologia
Experimental pela USP de São Paulo. Atua como professora na Universidade Estadual de
Londrina. Atualmente desenvolve estudos/atividades sobre terapia de exposição à realida-
de virtual, tecnologia de ensino, e pesquisas em análise experimental do comportamento.
E-mail: veronicahaydu@gmail.com

XI
Apresentação
As ciências do comportamento agrupam um conjunto de ideias que lhes con-
ferem um modo apropriado, coeso e organizado de responder a perguntas como:
“Como as pessoas se comportam?”, “Por que elas fazem o que fazem?”, “O que as move
e o que as governa?”. Essas perguntas podem ser respondidas de várias maneiras, a
partir de diferentes visões sobre o ser humano e suas relações com o mundo natural
e social. Para o Behaviorismo Radical, filosofia que alicerça um sistema psicológico
particular – a Análise do Comportamento –, um dos objetivos da ciência deve ser o de
prover resultados práticos a partir de uma tentativa de apresentar ordenadamente os
acontecimentos do mundo, dado o suposto de que esses acontecimentos se encontram
relacionados entre si.

Assim sendo, os objetivos da Análise do Comportamento devem estar pautados


na previsão e controle de eventos ambientais e comportamentais. É necessário, para
tanto, identificar e descrever relações funcionais entre eventos do ambiente e ações do
organismo, de tal maneira que a previsão e a mudança de tais relações seja possível, o
que permite alterar a probabilidade de ocorrência do comportamento. Tais objetivos
podem ser estendidos para a aplicabilidade da ciência comportamental em inúmeros
contextos, valendo-se de seus conceitos para o planejamento de intervenções eficazes.
Este livro reúne trabalhos apresentados originalmente no XXIX Encontro Brasileiro de
Psicologia e Medicina Comportamental, que versam sobre teoria, método e aplicação
das ciências do comportamento para a resolução de problemas humanos.

Com o objetivo de apresentar, exemplificar e problematizar a proposta skin-


neriana de comportamento verbal, Carlos A. Medeiros, Márcio B. Moreira e Lucas
F. Córdova compartilham a autoria do Capítulo 1. Os autores discutem a definição
de comportamento verbal enquanto operante mantido por reforços mediados por
um ouvinte especialmente treinado por uma comunidade verbal. Em especial, as
implicações dessa definição para o entendimento de instâncias de comunicação com
animais não humanos e máquinas. Ademais, discutem os limites dos operantes verbais
propostos por B. F. Skinner. A partir dessas análises, é enfatizada a complexidade do
comportamento verbal e a necessidade de exames conceituais mais cuidadosos sobre
a temática.

No Capítulo 2, Augusto Cézar de Souza Neto e Angelo Augusto S. Sampaio descre-


vem, de uma maneira didática, como o comportamento governado por regras (CGR)
pode ser definido a partir da Teoria das Molduras Relacionais (RFT - Relational Frame
Theory). Para isso, os autores apresentam um breve histórico do conceito de CGR e da
RFT, bem como uma definição de CGR segundo a RFT, e suas implicações para a pesqui-
sa e para o contexto clínico. São esclarecidas e exemplificadas as relações arbitrárias e
não-arbitrárias entre estímulos, enfatizando-se o responder relacional arbitrariamente
aplicável (RRAA). Assim, as propriedades do RRAA (implicação mútua, implicação
mútua combinatória e transformação de função de estímulo) também são descritas
visando esclarecer os efeitos da regra no controle do comportamento humano. Não
obstante, além de apresentarem evidências empíricas, os autores também argumentam

XII
que a RFT permite explicar o uso de intervenções sobre o comportamento verbal como
ferramenta para a atuação clínica.

Márcio B. Moreira, Bárbara S. R. Santos e Michelli C. Cameoka são autores/as


do Capítulo 3. Esse capítulo tem como objetivo discutir a interseção entre preconcei-
to e controle de estímulos a partir da Análise do Comportamento. Os/as autores/as
caracterizam o preconceito, em suas diversas expressões, como um comportamento
operante discriminado e apresentam pesquisas que ilustram o estado atual da discus-
são sobre o tema – em especial, o sobre o preconceito racial. Em seguida, fornecem
argumentos que dão suporte à concepção de que o preconceito é aprendido, sendo
explicitada a sua inter-relação com os processos de discriminação de estímulos, sim-
ples e condicional, generalização de estímulos e equivalência de estímulos. O exame
apresentado explicita os benefícios mútuos do diálogo entre a Psicologia Social e a
Análise do Comportamento.

O Capítulo 4 foi escrito por André Luiz, Julia R. Santos, Guilherme C. Cabeças,
Carlos E. Costa, Ariela O. Holanda, Patrícia Luque e Myenne M. A. Tsutsumi. Nele, é
apresentada uma proposta metodológica para o estudo de variáveis relacionadas a
comportamentos de prevenção durante pandemia de COVID-19, fundamentada na
Economia Comportamental Operante. A proposta, baseada no uso de questionários
online, focaliza duas principais variáveis: sunk-time e framing. De sua aplicação, es-
pera-se avanços na compreensão de como as pessoas se comportariam em situações
hipotéticas envolvendo medidas de prevenção.

No Capítulo 5, as autoras Verônica B. Haydu e Raquel N. Balan apresentam a


caracterização e um breve histórico do conceito de tecnologia comportamental, bem
como o levantamento de estudos brasileiros que descrevem a aplicação da tecnologia
comportamental nos contextos da educação básica e educação especial, saúde, esporte,
direitos humanos, clínica, desenvolvimento sustentável e meio ambiente, e no contexto
organizacional. Na sequência, as autoras descrevem alguns dos benefícios no uso das
tecnologias comportamentais, e ressaltam que, embora exista uma grande quantidade
de publicações relacionadas ao tema, há uma carência de estudos que se utilizam do
método científico para realizar a avaliação de sua eficácia.

O Capítulo 6 é de autoria de Carlos Augusto de Medeiros, e visa descrever as


concepções filosóficas que embasam a Psicoterapia Comportamental Pragmática (PCP),
e o que diferencia a PCP das demais vertentes de Terapias Analítico-Comportamentais
(TAC). Alguns dos pontos destacados são: a PCP emprega terminologia exclusiva da
Análise do Comportamento, e a implementação de técnicas de outras abordagens só
terão utilidade se os efeitos puderem ser descritos em termos de variáveis de controle
ambiental. Como pontos em comum da PCP em relação às outras vertentes da TAC, o
autor descreve o externalismo, a postura ideográfica, e a necessidade de realização de
análises funcionais individuais. Já os pontos apontados como divergentes são a redução
do controle ostensivo comumente exercido pelos terapeutas comportamentais, e o uso
do questionamento reflexivo para que o terapeutizando aprenda a analisar sozinho
o próprio comportamento e os comportamentos das pessoas ao seu redor.

XIII
O Capítulo 7, escrito por Felipe M. Lemos e Joshua Jessel tem por objetivo apre-
sentar a proposta de Análise de Contingência Sintetizada por Entrevista (IISCA), seguin-
do como tópicos principais a sua definição, fundamentação teórica, objetivos, formas
de avaliação, análise de efetividade e eficiência. De modo geral, os autores pontuam
que a IISCA é um tipo de análise funcional guiada por uma entrevista semiaberta
realizada com pessoas relevantes na vida do paciente, com aplicabilidade em diversos
contextos, e que pode ser conduzida por analistas do comportamento ou até mesmo
por professores ou cuidadores. Os objetivos da IISCA são demonstrar o controle sobre
o comportamento-problema, obter linha de base para avaliar efeitos do tratamento,
e identificar condições motivacionais e reforços que historicamente fortaleceram o
comportamento-problema. Trata-se de uma tecnologia relativamente nova e que tem
apresentado resultados positivos pela sua utilidade prática, bem como pela sua eficácia
em informar o tratamento e aceitabilidade social. Os autores destacam o caráter de
flexibilidade do procedimento, que pode ser ajustado para atender às necessidades
individuais de cada caso.

Por fim, de autoria de Ana Claudia M. A. Verdu, o Capítulo 8 tem como objetivo
sistematizar dados sobre precisão de fala em crianças com deficiência auditiva e im-
plante coclear apresentados em estudos sobre equivalência de estímulos. A análise
proposta contemplou 17 estudos referenciados em documentos do Instituto Nacional
de Ciência e Tecnologia sobre Comportamento, Cognição e Ensino (INCT-ECCE). A
caracterização proposta abarca as autorias dos trabalhos, as universidades envolvi-
das, os tipos de estudos, os participantes, os materiais e procedimentos adotados, os
delineamentos de pesquisa e os principais resultados derivados das intervenções.
Dá-se destaque à importância de que estudos futuros busquem intervir em contextos
clínicos e educacionais, e que seja mantida uma comunicação frutífera entre a Análise
do Comportamento e a Fonoaudiologia.

Os organizadores

Amilcar Rodrigues Fonseca Júnior


Luziane de Fátima Kirchner
César Antonio Alves da Rocha

XIV
Sumário

Comportamento verbal:
desafios conceituais da proposta de Skinner
Capítulo 1 Carlos Augusto de Medeiros 17
Márcio Borges Moreira
Lucas Ferraz Córdova

O que é comportamento
governado por regras para a
Capítulo 2 Teoria das Molduras Relacionais 32
Augusto Cézar de Souza Neto
Angelo Augusto Silva Sampaio

Preconceito e controle de estímulos


Márcio Borges Moreira
Capítulo 3 44
Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos
Michelli Carrijo Cameoka

Contribuições da
Economia Comportamental Operante
para situações de pandemia:
uma breve introdução
André Luiz
Capítulo 4 Julia Röcker dos Santos 59
Guilherme Corrêa Cabeças
Carlos Eduardo Costa
Ariela Oliveira Holanda
Patrícia Luque
Myenne Mieko Ayres Tsutsumi

XV
Tecnologias comportamentais
para intervenção e prevenção:
Capítulo 5 contribuições da Análise do Comportamento 71
Verônica Bender Haydu
Raquel Neves Balan

Psicoterapia Comportamental Pragmática:


uma aplicação da Análise do Comportamento
Capítulo 6 89
à clínica
Carlos Augusto de Medeiros

IISCA, uma proposta de análise funcional


Capítulo 7 Felipe Magalhães Lemos 100
Joshua Jessel

Acurácia da fala
em crianças com deficiência auditiva
Capítulo 8 e implante coclear via tecnologias 113
de ensino baseada em equivalência
Ana Claudia Moreira Almeida Verdu

XVI
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 13 pp. 17—31

Comportamento verbal: Carlos Augusto de Medeiros (1)


carlos.medeiros@ceub.edu.br
desafios conceituais da proposta de Skinner1 Márcio Borges Moreira (1)
Verbal behavior: conceptual challenges of Skinner's proposal borgesmoreira@gmail.com
Lucas Ferraz Córdova (2)
cordovalf@gmail.com
(1)
Centro Universitário de Brasília
(2)
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Resumo Abstract

Os objetivos deste capítulo são apresentar, The objectives of this chapter are to present,
exemplificar e problematizar conceitos e exemplify and problematize concepts and
discussões teóricas pertinentes à proposta theoretical discussions pertinent to Skinner's
de Skinner acerca do comportamento verbal. proposal about verbal behavior. Initially, the
Incialmente, a própria definição de compor- very definition of verbal behavior as an ope-
tamento verbal como operante mantido por rant maintained by mediational reinforce-
reforço mediacional provido por um ouvinte ment provided by a listener specially trained
especialmente treinado em uma comunidade in a verbal community was debated. Special
verbal foi debatida. Deu-se ênfase especial emphasis was placed on the concepts of me-
aos conceitos de reforço mediacional e comu- diation reinforcement and verbal community.
nidade verbal. A definição de comportamento The definition of verbal behavior will also be
verbal também será aplicada a instâncias li- applied to borderline instances, such as when
mítrofes, como na comunicação com animais communicating with non-human animals
não humanos e máquinas. As definições de and machines. The definitions of stimuli and
estímulos e respostas verbais em diferentes verbal responses in different functional cate-
categorias funcionais serão avaliadas quanto gories will be evaluated regarding the role of
ao papel da topografia e da função. Por fim, topography and function. Finally, the notion
a noção de independência funcional será of functional independence will be discus-
discutida com base em usos reificados dos sed based on reified uses of verbal operants,
operantes verbais, quando, na realidade, são when, in reality, they are mere descriptive
meras categorias descritivas de instâncias categories of verbal instances. As conclusions,
verbais. Como conclusões, o presente capítulo this chapter suggests the complexity of the
sugere a complexidade do tema e como a sua topic and how its approach could benefit
abordagem poderia se beneficiar de exames from more careful conceptual examinations.
conceituais mais cuidadosos.
Palavras-chave Keywords

comportamento verbal; comunidade verbal; verbal behavior; verbal community; media-


reforço mediacional; topografia; independên- tional reinforcement; topography; functional
cia funcional. independence.

1 O presente capítulo é derivado de uma mesa redonda apresentada no XXIX Encontro Brasileiro de Psicologia e Medicina Comportamental
e VI Encontro Sul-Americano, realizada no dia 04 de setembro de 2020, sob o título: Comportamento verbal: desafios conceituais da proposta
de Skinner.

17
Comportamento verbal
Carlos Augusto de Medeiros, Márcio Borges Moreira & Lucas Ferraz Córdova

Ao propor analisar funcionalmente os suficientes para analisá-lo e para descrever as


comportamentos resumidos pelo rótulo de relações funcionais a ele pertinentes. Todavia,
linguagem, Skinner (1957/1978) rompe com o comportamento verbal recebeu tratamento
os modelos tradicionais oriundos da Filosofia, diferenciado por Skinner, principalmente com
da Psicologia e da Linguística e defende a per- a proposição de amplas categorias de operantes
tinência da aplicabilidade das relações fun- verbais definidas com base nas variáveis de
cionais obtidas em estudos com não humanos controle e na topografia da resposta. A despei-
para a descrição do comportamento verbal. Tal to da defesa de Skinner de uma abordagem
empreendimento, nas palavras de Skinner, se funcionalista na definição dos conceitos da
constitui em um exercício interpretativo. ciência do comportamento, as definições de
Skinner (1957/1978) diferencia o seu tra- alguns operantes verbais por ele apresentadas
tamento ao tema das demais abordagens da privilegiam as topografias de respostas como
linguagem por privilegiar o falante individual, elementos que os diferenciam.
ao invés de descrever regularidades de uma O tratamento diferenciado dado ao com-
comunidade linguística. Skinner sugere que o portamento verbal por Skinner não foi bem re-
exercício do analista do comportamento é ana- cebido por muitos analistas do comportamen-
lisar funcionalmente as respostas verbais para to, como sugerem Michael (1984) e Medeiros
fins de predição e controle do comportamento (2002a; 2002b). Alguns simplesmente descon-
individual, ainda que as práticas de reforça- sideraram a existência da obra, analisando os
mento responsáveis pelo estabelecimento e comportamentos verbais da mesma forma que
manutenção de tais respostas sejam exemplos analisavam os comportamentos não verbais.
de práticas culturais. Outros, questionaram a utilidade e a perti-
De acordo com Skinner (1957/1978), as nência dos conceitos propostos. Porém, após
abordagens linguísticas tendiam a um viés es- quase 30 anos de atraso em relação à publica-
truturalista das mais diversas instâncias verbais ção do livro "Verbal Behavior", a proposta de
(e.g., frases, parágrafos, livros e poemas). Em Skinner passou a ocupar o léxico de analistas
outras palavras, a função das palavras em uma do comportamento.
frase ou de radicais, sufixos e prefixos de uma Este capítulo tem por objetivo discutir
palavra era inferida a partir da estrutura. A algumas das controvertidas definições dos con-
análise sintática e a busca das origens etimoló- ceitos e teses propostas por Skinner e iniciar
gicas exemplificam abordagens estruturalistas uma discussão com a comunidade acadêmica,
da linguagem. A proposta de Skinner se difere a qual teria como meta, em um segundo mo-
por privilegiar a função em detrimento da es- mento, a proposição de definições alternativas
trutura a partir da investigação do que contro- que tragam menos problemas conceituais para
la o comportamento do falante ao emitir uma o seu uso e ensino – ao longo do texto são esbo-
resposta verbal alvo de interesse, do mesmo çadas algumas propostas de revisão conceitual.
modo como se faz com os comportamentos não O presente capítulo não se propôs a debater
verbais. e, muito menos, oferecer soluções para todos
Skinner (1957/1978) sugere que o com- os problemas apontados. Na realidade, a meta
portamento verbal não se distingue dos ope- foi promover o debate que se possa ter como
rantes não verbais pela sua natureza, de modo resultado uma terminologia mais homogênea
que os princípios comportamentais seriam e com maior regularidade nos usos.

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Inicialmente, será abordada a própria "comportamento reforçado pela mediação de


definição de comportamento verbal, assim outras pessoas" (p. 16).
como os conceitos relacionados a ela, como Além da mediação de outras pessoas,
falante, ouvinte, reforçamento mediacional e Skinner enfatiza que o comportamento verbal
comunidade verbal. Em seguida, serão aborda- se diferencia do não verbal pelo primeiro não
dos os diferentes tipos de operantes verbais e manter relação geométrica ou mecânica com o
como suas definições podem fracassar em não ambiente, "de ele ser impotente contra o mundo
abranger as ocorrências e em excluir as suas físico" (Skinner,1957/1978, p. 16). A distinção
não ocorrências. Por fim, será debatida a noção entre comportamento verbal e não verbal com
de independência funcional entre operantes base nessas características ainda é utilizada em
verbais a partir do conceito de de erros de ca- textos mais recentes (e.g., Barros, 2003; Passos,
tegoria (Ryle, 1969), de acordo com os quais 2007; Xavier et al., 2017) sugerindo uma ade-
se presume a existência dos operantes verbais quação da definição original de Skinner aos
a despeito das ocorrências que se destinam a fenômenos atualmente estudados sob o rótulo
resumir. de comportamento verbal.
Embora a definição de comportamento
Considerações Sobre a Definição verbal continue sendo feita com base na media-
de Comportamento Verbal ção de outras pessoas e com base na ausência
de relações geométricas e mecânicas entre o
Skinner (1957/1957) define o comporta- comportamento verbal e as consequências por
mento verbal como um comportamento ope- ele produzidas, gostaríamos de apresentar aqui
rante. Ou seja, trata-se de um comportamento alguns possíveis problemas com relação a essa
estabelecido e mantido pelas suas consequên- definição, contrastando tal definição com as de-
cias (Catania, 1999/1999; Moreira & Medeiros, finições de alguns operantes verbais e alguns
2019). Todavia, diferentemente dos operantes exemplos diferentes dos tipicamente utilizados
não verbais, não são as alterações espaciais, em artigos e textos didáticos para ilustrar a de-
temporais, mecânicas e geométricas produtos finição. Gostaríamos de ressaltar que se trata
das respostas verbais as consequências que o de uma análise especulativa e não exaustiva
mantêm e sim, os efeitos que tais alterações de usos do conceito de comportamento verbal.
produzem no comportamento de outro indiví- Entendemos, e esperamos, que tais especula-
duo, denominado ouvinte (Skinner, 1957/1978; ções possam gerar novas discussões acerca do
1974). Ocasionalmente, em alguns episódios conceito de comportamento verbal, auxiliando
verbais, falante e ouvinte podem ser a mesma a ratificar, a retificar ou a aprimorar o uso do
pessoa (Baum, 2005/2006; Skinner, 1957/1978; conceito de comportamento verbal tal qual foi
1974). cunhado por Skinner (1957/1978).
Skinner (1957/1978), ao estabelecer uma
primeira distinção do comportamento verbal A Medição por Outra Pessoa
em relação a comportamentos não-verbais,
aponta que comportamentos verbais são aque- Com relação à mediação por outra pessoa,
les que "só são eficientes através da mediação a definição mais sintética e usualmente re-
de outras pessoas" (p. 16). Skinner define ex- produzida na literatura pode levar a algumas
plicitamente comportamento verbal como más compreensões. Entendemos que não

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 1 | 19


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parece apropriado dizer que o comportamen- diferencial, todavia, nesse caso, estamos diante
to verbal não produz mudanças no ambiente de um reforçamento diferencial social. Caso
físico (Passos, 2003). Em primeiro lugar, para o o violonista erre algum acorde ou toque um
Behaviorismo Radical, não há dicotomia entre repertório não apreciado pela audiência, as
ambiente físico e ambiente de outra natureza consequências reforçadoras não serão apre-
(Skinner, 1953; 1974). Ou seja, só existe ambien- sentadas. Desse modo, certas respostas no ins-
te físico. Além disso, parece-nos que não seja trumento serão reforçadas e outras não.
apropriado dizer que o comportamento não Nesse paralelo com o comportamento
muda diretamente o ambiente, na medida em verbal, apenas o segundo tipo de consequência
que deixa marcas no papel na escrita ou produz exerceria controle sobre a sua probabilidade
ondas sonoras na fala, por exemplo (Catania, de ocorrência, ainda que, as respostas verbais
1998/1999). Mas não são essas modificações também alterem o ambiente de forma mecâ-
que estabelecem e mantém o comportamento nica, como no caso do primeiro tipo de refor-
verbal e sim, os efeitos que produzem nos com- çamento do comportamento de tocar violão.
portamentos de ouvintes (Passos, 2003). Em outras palavras, mesmo que as respostas
Um exemplo pode ajudar a esclarecer verbais produzam alterações mecânicas, como
esse ponto. Uma pessoa tocando violão pode tocar violão, apenas as consequências sociais
ter seu comportamento controlado por dois são responsáveis pela sua probabilidade de
tipos de consequências: 1) Os sons que o con- ocorrência futura.
tato de seus dedos com as cordas produz que, Se contrapormos a definição de compor-
nesse caso, são produtos de relações mecâni- tamento verbal, em termos de mediação por
cas; 2) A atenção, os elogios e os aplausos de outra pessoa, há exemplos de comportamento
outras pessoas presentes enquanto ela toca. verbal como alguém pedindo um copo d'água
Poderíamos classificar o primeiro tipo como (e.g., Abreu & Hübner, 2012; Passos, 2003) em
reforçadores não sociais, ou seja, aquelas mo- que o papel da mediação fica claro: o estímulo
dificações no ambiente capazes de afetar a reforçador é a água e a água chega até quem
probabilidade futura de um comportamento a pede pela mediação de outra pessoa. Em
sem a intervenção de outras pessoas. Caso o última análise, a modificação no ambiente que
violonista erre o posicionamento de um dos mantém o comportamento de pedir um copo
dedos, provavelmente o som produzido não d'água é produzida por quem pega e entrega
reforçará essa resposta, ou mesmo, exercerá o copo, e não pelas palavras de quem pede o
funções punitivas sobre ela. Estaremos diante copo d’água (esse é um exemplo do operan-
de um reforçamento diferencial não social, da te verbal chamado de mando). No entanto, se
mesma forma que ocorre quando aprendemos considerarmos situações que envolvem outros
a abrir uma torneira moderna cujo mecanis- tipos de operantes verbais com, por exemplo,
mo de funcionamento não consiste meramente um diálogo em um consultório clínico (e.g.,
girar algo no sentido anti-horário. Medeiros, 2002a; 2002b), ou qualquer conversa
Por outro lado, a atenção, os elogios e cotidiana, o que observaremos serão apenas
os aplausos são consequências sociais (Baum, pessoas conversando, sem que alguma delas
2005/2006), ou seja, são efeitos de respostas nos altere o ambiente inanimado ao seu redor (e.g.,
comportamentos de outras pessoas. Podemos pegar um copo com água, acender uma lâmpa-
novamente nos deparar com um reforçamento da ou ligar um ar-condicionado). Nesse caso, a

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mudança ambiental que funciona como evento e é mantido por reforçamento mediacional é
selecionador para os comportamentos de uma improcedente. Ainda que se argumente que as
pessoa são mudanças no comportamento de mudanças nos comportamentos dos alunos que
outra pessoa. Nesse sentido, o comportamento caracterizariam a sua aprendizagem seria um
de outra pessoa não é mediador de uma conse- reforço social às respostas verbais do professor,
quência, ele é a própria consequência, ou seja, não faz sentido afirmar que os alunos estejam
a própria alteração no ambiente. Pesquisas alterando o ambiente espacial, mecânica e ge-
que avaliaram o efeito reforçador da atenção ometricamente pelo professor.
sobre o comportamento (olhar, falar, tocar etc.) As evidências científicas disponíveis de-
constituem um conjunto de exemplos da pro- monstram que vocalizações e contato do olhar,
posição de que o comportamento do outro não por exemplo, são eventos reforçadores para os
é mediador das consequências reforçadoras comportamentos, verbais ou não, que os pre-
(pelo menos não em todos os casos), mas é a cedem (e.g., Piazza et al., 1999). Ecóicos, tatos e
própria consequência reforçadora (e.g., Piazza intraverbais, portanto, não seriam comporta-
et al., 1999; van der Mars, 2016). mentos cujas consequências são mediadas por
Se contrapormos a definição de comporta- outras pessoas. A rigor, tais comportamentos
mento verbal, com base na mediação por outra não poderiam ser classificados como compor-
pessoa, às definições de algumas categorias de tamentos verbais, tendo como base para defi-
comportamento verbal, encontraremos algu- nição de comportamento verbal a mediação
mas incongruências. Os comportamentos ca- por outra pessoa. Obviamente, complexas in-
tegorizados como ecóicos, tatos e intraverbais, terações entre membros de uma comunidade
por definição, são comportamentos controla- verbal são responsáveis pelo estabelecimen-
dos, em termos dos estímulos consequentes, to da função dos reforçadores condicionados
por consequências reforçadoras condicio- generalizados. Não restam dúvidas de que os
nadas generalizadas (Barros, 2003; Skinner, reforçadores generalizados têm o potencial de
1957/1978). Tais consequências, basicamente, estabelecer e manter respostas verbais.
são comportamentos de outras pessoas (e.g., A definição de comportamento verbal com
dizer "Isso!", "Concordo", "Muito bem!"). Por base na mediação por outra pessoa parece não
exemplo, quando um professor leciona conte- englobar também situações nas quais o falante
údos à sua turma de forma expositiva, alguns é o ouvinte de seu próprio comportamento (e.g.,
alunos apenas mantêm o olhar em direção ao solilóquio). De acordo com Skinner (1957/1978,
professor; muitos fazem anotações; outros me- p. 88), ao se referir ao comportamento ecóico,
neiam a cabeça; outros fazem "hum-hum"; e, desde que "um falante usualmente se ouve a si
ocasionalmente, alguém faz um comentário ou próprio e, assim, se estimula verbalmente, ele
uma pergunta. Que mudanças os alunos fazem também pode fazer eco a si próprio. Tal com-
no ambiente pelo professor? Não faz sentido fa- portamento é potencialmente auto-reforçador
larmos de reforço mediacional ou de uma ação se fortalecer a estimulação usada no controle
indireta no ambiente como no mando. Sendo do comportamento verbal próprio da pessoa"
assim, na maioria dos operantes verbais (i.e., (Skinner chamou esse comportamento de auto-
tatos, intraverbais, ecóicos, transcrições, textu- ecóico). Nesse caso, o estímulo discriminativo,
ais) a definição de comportamento verbal como a resposta e a consequência reforçadora são
aquele que age de maneira indireta no ambiente todos, em termos não técnicos, comportamentos

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da mesma pessoa. Não há, na descrição dessa mas do físico, parecem ser irrelevantes para
relação entre eventos, referência a um ambien- esta análise. Parece-nos razoável supor que, a
te físico inanimado (ambiente não-pessoa) ou rigor, tais princípios geométricos e mecânicos
um ambiente mecânico. Vale ressaltar que o constituem a busca de uma "causalidade mecâ-
conceito de ambiente, neste caso, é usado em nica" para o comportamento. Para a análise das
oposição ao conceito de organismo. variáveis que controlam um determinado com-
Considerando-se que o raciocínio apre- portamento, conforme apontado por Skinner
sentado até aqui esteja correto, pelo menos par- (1953), importa a relação funcional, importa
cialmente, parece ser necessária uma revisão da a regularidade entre as ocorrências dos dois
definição de comportamento verbal para pro- eventos em questão, e não como a natureza
mover maior aderências da mesma aos eventos os produz. Além dos princípios geométricos e
tipicamente denominados em textos científi- mecânicos, parece-nos também ser irrelevante
cos como comportamento verbal, incluindo as para a análise identificar o agente que produziu
próprias categorias formais de comportamento a alteração (o acender da luz, por exemplo), o
verbal. Nos parece que tal definição poderia agente/ente que dispõem tais eventos no mundo
prescindir do uso do termo "mediação". Nesse – se foi, por exemplo, outra pessoa que ligou
sentido, parece razoável dizer que, para dife- outro interruptor, se foi o Operador Nacional
renciar comportamento verbal de não verbal, do Sistema ou mesmo se foi um software.
tal definição talvez devesse fazer referência a Digamos que alguém reze para chover e
mudanças no comportamento de um organis- que tal comportamento seja seguido da chuva.
mo como sendo a mudança no ambiente rela- A chuva, de alguma maneira, altera a probabili-
cionada à manutenção desse comportamento: dade do rezar, sendo que os eventos relevantes
o comportamento verbal é um comportamento são o rezar e o chover. Dizer que não há rela-
operante cujas consequências mantenedoras ções causais (princípios geométricos e mecâ-
são alterações no comportamento de um (outro) nicos) envolvidos nessa relação é, em última
organismo. análise, uma afirmação baseada na correlação
estatística/observada/inferida entre a ocorrên-
Princípios Geométricos e Mecânicos cia desses dois eventos. Nesse sentido, parece
ser irrelevante falar dos princípios geométri-
O efeito que o comportamento produz cos e mecânicos que produzem o chover. Para
sobre o ambiente, sua consequência, é, via de efeitos da análise funcional do comportamento
regra, definido em termos de suas propriedades de rezar, nesse exemplo, parece ser irrelevan-
físicas (forma, intensidade etc.). A análise do te também identificar o "agente causador da
efeito das alterações ambientais sobre o com- chuva". No entanto, do ponto de vista de quem
portamento prescinde do agente que produziu se comporta, rezando, teríamos um exemplo
aquela alteração no ambiente (Passos, 2007). Se de comportamento verbal tal qual definido por
alguém pressiona um botão e uma luz é acesa, Skinner, pois a chuva foi mediada por outro ser.
o pressionar o botão e o acender da luz são Se Maria diz para João "Acenda a luz, por
os eventos relevantes para uma análise fun- favor", e João acende a luz, temos um exemplo
cional – os princípios geométricos e mecânicos com 100% de aderência à definição de compor-
envolvidos nessa relação, que, inclusive, não tamento verbal proposta por Skinner. É impro-
são da alçada do analista do comportamento, vável que algum analista do comportamento

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diga que esse não é um exemplo de comporta- resultados impressionantes de interações entre
mento verbal. No entanto, se Maria disser para primatas que, se ocorressem em humanos, não
um assistente virtual (Siri, Google Assistente, teríamos dúvida em classificá-las como verbais.
Alexa, entre outros) "Acenda a luz, por favor", Os sujeitos dessas pesquisas emitiram respos-
e o assistente virtual acender a luz, é possível tas que atendem aos critérios da definição de
que tenhamos divergências entre analistas do comportamento verbal e exemplificam tatos,
comportamento se esse é ou não um exemplo mandos e comportamentos de ouvinte. Com
de comportamento verbal: o assistente não é relação a um vocabulário rudimentar, é possí-
uma pessoa. Sendo assim, parece-nos incorreto vel afirmar que os sujeitos compuseram uma
dizer que o assistente virtual seria um ouvinte comunidade verbal.
discriminado ou mesmo que faça parte de uma Existem ressalvas, todavia, quanto à ca-
comunidade verbal. tegorização de tais resultados como evidência
A introdução do papel do ouvinte talvez de interações verbais entre não humanos. A
seja umas das principais contribuições de primeira delas é a de que não foi um grupo
Skinner (1957/1978) em relação ao estudo da de primatas que criou a relação entre as topo-
linguagem. No entanto, parece-nos que o papel grafias de respostas ou símbolos selecionados
do ouvinte seja importante para caracterizar o e as variáveis de controle. Assim como não foi
comportamento verbal como comportamen- esse grupo de primatas que estabeleceu quais
to operante, no sentido de que é controlado comportamentos de ouvinte seriam reforçados
por suas consequências. A ênfase, portanto, diante dos estímulos verbais. Essas relações
deveria ser na seleção por consequências, e foram criadas artificialmente pelos experi-
não no agente que dispõe as consequências. mentadores. É possível questionar a ocorrência
Especificar organismo/pessoa/ouvinte na de- de comportamento verbal em não humanos
finição do comportamento verbal parece-nos justamente pela ausência de espontaneidade
ser desnecessário e anacrônico, vis-à-vis casos da criação de uma comunidade verbal, assim
dos assistentes virtuais, entre outros. É possível como, da inserção de novos membros nessa
fazer perguntas e ligar aparelhos falando com comunidade verbal. Todavia, não há, na defini-
assistentes virtuais. Fazer distinções entre seres ção de comunidade verbal, nada que restrinja
humanos e Inteligências Artificiais para definir a existência de comunidades verbais artificiais
comportamento verbal parece-nos ser, cada ou a inserção de novos membros em tal comu-
vez mais, contraproducente – assim como pa- nidade por meio de ensino formal. Se houvesse,
rece-nos ser o caso para interações entre seres de fato, tais restrições, não poderíamos conside-
humanos e animais ou quaisquer outros entes. rar pessoas fluentes em esperanto ou klingon
Em suma, não seria relevante o que ou quem como membros de uma mesma comunidade
diz "são cinco horas" após uma pessoa dizer verbal.
"que horas são" – importaria, simplesmente, a Além disso, como observa Michael (1984),
consequência "são cinco horas". o fenômeno da "explosão da linguagem", comu-
O estudo de Savage-Rumbaugh (1984) fez mente reportado em crianças por psicólogos do
uma análise com base nos conceitos propostos desenvolvimento, não foi observado em não
por Skinner (1957/1978) de diversos estudos humanos. Mesmo com extensos programas de
que pretenderam ensinar linguagem a ani- treinamento, as respostas verbais observadas
mais não humanos. Esses estudos reportaram em não humanos eram equivalentes às de

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crianças pequenas. Ainda assim, isso não muda Comportamento, o que sempre foi desaconse-
o fato de que as respostas emitidas nesses estu- lhado por Skinner (1945; 1953; 1974).
dos por não humanos estão de acordo com as Uma definição promissora de comuni-
definições de comportamento verbal. dade verbal deveria dar ênfase às práticas de
reforçamento administradas por grupos de
Comunidade Verbal indivíduos. Tais práticas de reforçamento es-
tabelecem as condições nas quais as respostas
Os debates acima ilustram a fragilidade verbais têm probabilidade de serem reforçadas
do conceito de comunidade verbal, que é um (e.g., estímulos verbais ou não; reforçadores
aspecto central da definição de comportamento generalizados ou específicos) e quais com-
verbal. Skinner (1957/1978; 1974) não define portamentos de ouvinte seriam reforçados na
comunidade verbal diretamente, fazendo men- presença de determinados estímulos verbais.
ções a ela. Outros autores como Perterson (1978) Como as comunidades verbais, com exceção
e Baum (2005/2006) a definem como um grupo dos idiomas inventados, se estabelecem de
de pessoas que ocupam papéis de falantes e modo não planejado, as práticas de reforça-
ouvintes. Já Passos (2003), faz menção aos com- mento não possuem uma consistência absoluta,
portamentos de falante estabelecidos por con- de modo que observaremos, com certa regula-
tingências semelhantes. Barros (2003) e Skinner ridade, comportamentos de falantes e ouvintes
(1957/1978) também mencionam a comunida- idiossincráticos.
de verbal como estabelecedoras contingências
que modelam comportamentos de falante e Estímulo Verbal e Resposta Verbal:
ouvinte. Vargas (2003), assim como Skinner Definições Topográficas?
(1957/1978) e Baum (2005/2006), relaciona
comunidade verbal à cultura. Praticamente Considerando-se que a definição de com-
todos os autores discutem a identidade entre portamento verbal poderia prescindir dos
a comunidade verbal e os grupos de pessoas conceitos de mediação e de organismo, essa
que falam a mesma língua. Em resumo, as di- distinção de um operante verbal, em oposição
ferentes definições de comunidade verbal se operantes não verbais, pareceria cada vez mais
referem a pessoas (não a animais não humanos caminhar para uma definição em termos mera-
ou a máquinas); a falantes e ouvintes; à cultura; mente topográficos, o que, ao nosso ver, estaria
às práticas de reforçamento e aos idiomas. mais próximo dos usos dos conceitos relacio-
Do ponto de vista de definições funcionais, nados ao comportamento verbal encontrados
não parece compatível com o Behaviorismo na literatura científica, notadamente estímulo
Radical restringir comunidades verbais às verbal e resposta verbal. Abaixo, seguem alguns
pessoas, uma vez que, com base em critérios exemplos que visam sustentar esse argumen-
exclusivamente funcionais, outros organismos to: 1) "Note que há um discriminativo não-
ou mesmo máquinas exibem instâncias que -verbal presente em ambos os exemplos (um
poderiam ser consideradas verbais se emiti- objeto e um evento privado)" (Borloti, 2004);
das por humanos. A relação da comunidade 2) "Se a situação antecedente for um estímulo
verbal com a cultura e com os idiomas também discriminativo verbal (palavra escrita, falada,
é problemática porque lança mão de concei- gestualizada)" (Borloti, 2004 p. 255); 3) "Entre
tos muito complexos e externos à Análise do o estímulo discriminativo verbal auditivo (o

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som da palavra ouvida pela criança) e a res- Skinner (1957/1978, p. 108) como "um operante
posta verbal da criança (sua reprodução vocal verbal, no qual uma resposta de certa forma
do que ouviu), deve haver correspondência é evocada (ou pelo menos reforçada²) por um
formal, exigência que fazemos para reforçá-la" objeto particular ou um acontecimento ou pro-
(Passos, 2003, p. 203); 4) "Regra para Skinner priedade de objeto ou acontecimento". Tempos
(1969) é um estímulo discriminativo verbal que depois, Barros (2003, p. 77) definiu o tato como
descreve uma contingência" (Scala & Kerbauy, "respostas verbais, vocais ou motoras controla-
2005); e 4) "O principal estímulo discriminati- das por estímulos discriminativos não-verbais
vo verbal usado na pesquisa, após tomarem e mantidas por consequências sociais quando
conhecimento dos objetivos da pesquisa, foi existe correspondência, ou seja, identidade fun-
a seguinte frase ‘Falem as primeiras idéias ou cional (arbitrária e culturalmente estabelecida),
frases que lhe ocorrem quando escutam a frase entre o estímulo discriminativo e a resposta".
Estudar e trabalhar na universidade’" (Teixeira Skinner (1957/1978) utilizou os termos
et al., 2008, p. 184). "acontecimento" ou "propriedade de objeto
Note que, nos exemplos acima, o termo ou acontecimento" para se referir aos eventos
"verbal" é seguido de termos como "palavras", antecedentes que exercem controle discrimina-
"frases", "ouviu", "falou", ou seja, o qualificador tivo sobre um comportamento que, por conta
"verbal" não remete à função ou a qualquer desse tipo de controle, é chamado de tato. Tais
outro aspecto explicitamente indicado na defi- eventos, conforme apresentado na definição
nição de comportamento verbal. Cabe ressaltar de tato apresentada por Barros (2003), são de-
aqui que atrelar a distinção de verbal e não nominados estímulos discriminativos não-ver-
verbal à topografia dos estímulos e das respos- bais. Exemplos de estímulos discriminativos
tas não é incongruente com o apelo maior da não-verbais geralmente são descritos como
proposta de Skinner de comportamento verbal, aspectos do ambiente que não sejam repostas
que é a de apresentar uma proposta de análise verbais de outra pessoa ou do próprio falante
funcional de fenômenos relacionados à lingua- (um copo, a temperatura, um objetivo em mo-
gem. A despeito de quais características distin- vimento, precipitações atmosféricas etc.). Uma
guiram um comportamento operante verbal pessoa comendo uma fruta poderia, de acordo
de um comportamento operante não verbal, com a definição, ter a função de estímulo dis-
o mesmo continua sendo um comportamento criminativo não verbal para a resposta verbal
operante e esse, ao nosso ver, é o grande dife- de dizer "A pessoa está comendo uma fruta".
rencial da proposta de Skinner. Um primeiro ponto a ser destacado é que,
A definição do operante verbal "tato" no exemplo acima, tanto a qualificação do es-
parece ser particularmente interessante para tímulo "pessoa comendo fruta" como estímulo
analisarmos a distinção entre verbal e não-ver- discriminativo não verbal, quanto a classifica-
bal, especialmente porque essa distinção não se ção da resposta de dizer "A pessoa está comendo
aplica somente ao conceito de comportamento, uma fruta" como verbal foram meramente topo-
mas também aos conceitos de estímulo (verbal) gráficas e esse parece ser o uso comum desses
e resposta (verbal). O tato foi definido por termos na literatura científica. Um segundo

2 Na tradução para o português do livro "Verbal Behavior", encontra-se a palavra "reforçada". Todavia, uma tradução mais precisa seria
"fortalecida", no sentido de que teria a sua probabilidade de ocorrência aumentada "por um objeto particular ou um acontecimento ou
propriedade de objeto ou acontecimento".

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ponto a ser destacado é que insistir em uma a partir da relação funcional da mesma com va-
distinção entre verbal e não verbal, pelo menos riáveis ambientais históricas e presentes. Uma
com relação aos eventos antecedentes, parece das implicações no proposto por Skinner no
ser desnecessário e/ou contraproducente. Não livro Verbal Behavior é a de que o que se apren-
teríamos problema em definir uma fruta ou de ao se aprender uma resposta verbal não é
uma "pessoa comendo fruta" como um estímulo um significado (no sentido símbolo/referente)
discriminativo não verbal (pelo simples fato de intrínseco à topografia, mas sim a emissão de
não ser uma pessoa falando ou gesticulando). uma dada resposta diante de uma determinada
Por outro lado, é provável que os exemplos relação contingencial. Nas palavras do próprio
abaixo gerem divergências ou dificuldades de Skinner (1977, p. 8) "Uma resposta verbal sig-
análises para ser definir se são ou não casos de nifica algo no sentido de que o falante está sob
tato (para efeito de exemplo, considere que as controle de circunstâncias particulares".
consequências reforçadoras em todos os exem- Skinner (1957/1978) afirma que o signi-
plos são comentários que expressam concor- ficado não é propriedade da variável depen-
dância como "Isso mesmo!"): 1) Na presença de dente, isto é, da resposta verbal, mas sim da
alguém falando sobre conceitos comportamen- variável independente, ou seja, das condições
tais, dizer "Que assunto legal"; 2) Após ler um sob as quais o comportamento ocorre. Com
poema, dizer "Que poema bonito"; 3) Após ser isso, enfatiza-se a busca por relações funcionais
xingado, dizer "Que palavrão horroroso"; 4) Na tanto da aquisição quanto da manutenção da
presença de uma placa com o sinal de proibido resposta verbal em detrimento da busca por
fumar, dizer "É proibido fumar aqui". significados concretos como propriedades da
Nos exemplos acima, temos estímulos que, palavra (Córdova, 2008; Moxley, 1997).
topograficamente, se parecem com aquilo que Tal noção leva a suposição de indepen-
chamamos de estímulos verbais e as respos- dência funcional entre operantes verbais.
tas são topograficamente similares àquilo que Skinner (1957), ao observar regularidades no
chamamos de respostas verbais – especifica- comportamento, categorizou diferentes tipos
mente, se parecem com tatos. Restringir o tato de comportamentos verbais, tais categorias ele
a controle por estímulos não verbais, sendo que denominou de operantes verbais. Essas catego-
tais definições parecem ser necessariamente rizações são feitas levando em consideração o
topográficas, parece deixar de fora do concei- tipo de variável controladora, o tipo de resposta,
to eventos que deveriam/poderiam ser casos o tipo de consequência, o tipo de relação exis-
de tato. Caso tal proposta se mostre profícua, tente entre a variável antecedente e a resposta.
a distinção entre tatos e intraverbais ou entre A categorização feita por Skinner leva em conta
tatos e ecóicos, por exemplo, seria topográfica a topografia da resposta, mas primordialmente
e em relação ao estímulo antecedente. enfatiza a relação funcional da resposta com as
variáveis ambientais. Skinner apresenta oito
Operantes Verbais e Independência Funcional categorias funcionais, ou operantes verbais (i.e.,
ecóico, cópia, textual, tomar ditado, intraverbal,
Como já dito, ao definir comportamento autoclítico, mando e tato).
verbal como passível de ser descrito em um A partir da concepção funcionalista de
enquadre operante está sendo enfatizado que a significado, uma mesma topografia de resposta
ocorrência de uma dada resposta se explicaria verbal emitida em momentos distintos pode ser

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 1 | 26


Comportamento verbal
Carlos Augusto de Medeiros, Márcio Borges Moreira & Lucas Ferraz Córdova

função de diferentes variáveis independentes. mesma topografia uma vez que respostas com
Uma mesma resposta verbal teria diferentes tal topografia não foram treinadas em função
significados quando sob o controle de diferen- dessas novas variáveis.
tes variáveis ambientais. Para Skinner, "Dizer Como apontado inicialmente, apesar de
que comportamentos têm significados distintos uma lacuna temporal significativa entre a pu-
é apenas outra maneira de dizer que são con- blicação do livro Verbal Behavior e estudos que
trolados por variáveis distintas." (Skinner, 1969, investigaram a proposta apresentada, estudos
p., 156). Uma criança pode emitir a resposta sobre comportamento verbal passaram a ser
verbal "água" sob o controle de um estímulo cada vez mais frequentes entre as publicações
discriminativo não verbal, sendo a resposta analíticas comportamentais. No que diz respei-
definida como um tato, ou pode essa mesma to aos estudos sobre independência funcional,
resposta estar sob o controle de uma operação observa-se um surgimento mais expressivo na
estabelecedora. Já nesse caso, a resposta seria literatura a partir do fim da década de 1960
definida como um mando. Os operantes verbais (Guess, 1969). Na grande maioria (Lamarre &
mando e tato diferenciam-se por constituírem Holland, 1985; Hall & Sundberg, 1987; Twyman,
relações funcionais distintas, e nesse sentido, 1996; Mousinho, 2004; Córdova, Lage & Ribeiro,
sendo relações de significados também distin- 2007), os estudos com o foco na independência
tas, mesmo apresentando respostas topografi- funcional entre operantes verbais caracteri-
camente semelhantes. zam-se por inicialmente estabelecer respostas
A suposição da independência funcional, com uma determinada topografia com uma
defendida por Skinner (1957), é extremamen- função específica (e.g. mando, tato, intraverbal)
te importante para compreensão do desen- e testar se esse treino inicial levaria colateral-
volvimento do repertório verbal. Isso porque, mente (sem treino específico) a emissão dessas
a partir do momento em que duas respostas respostas verbais sob o controle de variáveis
verbais, topograficamente semelhantes, pos- características de outros operantes verbais.
suem variáveis controladoras distintas, essas Com base nesses estudos, buscou-se apoio em-
seriam funcionalmente independentes entre pírico à proposta feita por Skinner (1957/1978).
si. Isso quer dizer que o treino responsável Os estudos sobre independência funcio-
pelo estabelecimento regular da emissão de nal entre os operantes verbais tato e mando têm
uma resposta de dada topografia sob contro- encontrado dados que corroboram parcialmen-
le funcional definidor de um dado operante te a proposta de Skinner (1957/1978). Contudo,
verbal não resultaria na emissão de respostas em todos os estudos aqui apresentados, houve
de mesma topografia sob o controle funcional o surgimento de algum operante colateral em
característico de outros operantes verbais. O alguma fase do experimento (Gamba, Goyos &
que é aprendido ao se adquirir uma resposta Petursdottir, 2014). Na grande maioria, esses
verbal, não é a emissão de uma determinada resultados são normalmente explicados pela
palavra ou o significado intrínseco a ela, e sim idade avançada dos participantes enquanto
uma função comportamental ou seja, a emissão fator preditivo de maior repertório verbal. Tal
de uma dada resposta na presença das variáveis explicação, apesar de coerente, é especulativa
ambientais necessárias. É de se supor então, já que esses estudos não apresentaram um con-
que quando defrontada com variáveis ambien- trole rigoroso sobre a história de reforçamen-
tais outras, a criança não emita respostas com a to dos seus participantes. Gamba et al. (2014)

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Comportamento verbal
Carlos Augusto de Medeiros, Márcio Borges Moreira & Lucas Ferraz Córdova

apontam ainda que questões procedimentais comportamentais sendo unidas por algumas
(e.g., falha em criar eventos que se caracterizam similaridades funcionais. Os elementos com-
plenamente como operações estabelecedoras) ponentes das definições dos operantes verbais
podem ter sido responsáveis pelas falhas dos não devem ser entendidos como exaustivos
participantes nos testes dos operantes verbais das fontes de controle sobre as emissões dis-
não treinados. cretas, mas como forma de categorização de
Para além de questões puramente meto- diferentes comportamentos verbais. Operações
dológicas, talvez um segundo fator, de ordem estabelecedoras e reforço específico definem
conceitual (Harzem & Milles, 1978), pode con- a categoria mando, mas não a totalidade da
tribuir com a diversidade de dados da área. fonte de controle das respostas submetidas a
Tradicionalmente, operantes verbais são en- essa categoria.
tendidos como comportamentos aprendidos, Assumir que o controle sobre as respostas
selecionados e mantidos no mesmo sentido de verbais se restringe àquelas variáveis aponta-
respostas discretas. É comum encontrar obser- das na definição dos operantes verbais leva a
vações como "O mando foi treinado" ou "O tato uma expectativa de uniformidade nos dados de
foi emitido". Contudo, como dito pelo próprio pesquisa sobre independência funcional não
Skinner (1957/1978)" (...) relações funcionais são demonstrados pelos estudos da área. Parece
úteis, primeiramente apenas como um esque- claro, a partir de um entendimento de relação
ma classificatório, funcionando nesse sentido de contingência (Skinner, 1969), que se em
um pouco como os esquemas classificatórios da duas contingências distintas, mando e tato, por
gramática." (p. 178). As definições dos operantes exemplo, os elementos componentes diferem
verbais (por exemplo o tato como o operan- drasticamente, as respostas não apresentaram
te verbal que tem como controle antecedente inter-relação funcional. Contudo, numa visão
estímulo discriminativo não-verbal e reforço multideterminada os parâmetros definidores de
generalizado) não abarcam a totalidade da in- cada operante compõem apenas parte da fonte
tricada rede de relações funcionais as quais a de controle. No interior dessa rede de deter-
emissão de uma dada resposta verbal se insere. minações, é possível/provável que os mesmos
A resposta verbal "biscoito", definida como eventos componham a organização funcional
mando, tem maior probabilidade de reforça- de diferentes respostas, inclusive aquelas clas-
mento específico quando diante de um ouvinte sificadas em diferentes operantes. No exemplo
que possui o objeto biscoito em mãos, fazendo anterior do mando "biscoito" onde o ouvinte se
com esse adquira função discriminativa. Essa encontra com um pacote de biscoito em mãos
é uma característica não presente na definição aproxima o controle funcional daquele defini-
conceitual do operante mando (i.e., operante dor do tato em função da presença de estímulo
verbal controlado por operação estabelecedora discriminativo não verbal.
e reforço específico) apesar de exercer controle A mudança de entendimento do papel do
funcional para essa resposta específica, e assim conceito de operantes verbais não muda a su-
compor como já dito o significado da resposta posição inicial de independência funcional, res-
verbal "biscoito". postas submetidas a controle funcional distinto
Operantes verbais devem ser entendi- exige treino específico. A principal implicação
dos como categorias de padrões de contin- de tal mudança é o de levar a uma alteração no
gências, que englobam diferentes relações foco de análise para além das grandes variáveis

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 1 | 28


Comportamento verbal
Carlos Augusto de Medeiros, Márcio Borges Moreira & Lucas Ferraz Córdova

controladoras das respostas verbais (aquelas na mediação social arbitrária do refor-


explícitas nas definições dos operantes verbais), çamento. Acta Comportamentalia, 20(3),
permitindo uma compreensão menos especula- 367-381.
tiva dos dados divergentes na literatura sobre Barros, R. S. (2003). Uma introdução ao comporta-
independência funcional. mento verbal. Revista Brasileira de Terapia
Comportamental e Cognitiva, 5(1), 73-82.
Considerações Finais https://doi.org/10.31505/rbtcc.v5i1.92
Baum, W. M. (2006). Compreender o behavioris-
A despeito da imensa e inegável contri- mo: Comportamento, cultura e evolução. M.
buição da proposta de Skinner acerca do com- T. A. Silva, M. A. Matos, G. Y. Tomanari, & E.
portamento verbal, há problemas conceituais Z. Tourinho (Trad.). Porto Alegre: Artmed.
que ainda não passaram por uma avaliação (Trabalho original publicado em 2005).
mais cuidadosa. Além disso, a literatura da Borloti, E. (2004). As relações verbais
área tem utilizado a terminologia de maneira elementares e o processo autoclí-
irrefletida, o que pode ter mantido, ou mesmo tico. Revista Brasileira de Terapia
criado, novos problemas conceituais. O pre- Comportamental e Cognitiva, 6(2), 221-236.
sente capítulo não se propôs a debater todos, https://doi.org/10.31505/rbtcc.v6i2.59
muito menos, oferecer soluções para todos os Catania, A. C. (1999). Aprendizagem: comporta-
problemas apontados. Na realidade, a meta era mento, linguagem e cognição (4ª ed.). D. G.
promover o debate que possa ter como resulta- Souza et al. (Trads.), Porto Alegre: Artmed.
do uma terminologia mais homogênea e com (Trabalho original publicado em 1998).
maior regularidade nos usos. Alguns conceitos Córdova, L. F. (2008). Efeito de treino sucessivo
foram revistos ao longo do texto, para o quais sobre o comportamento de transposição
sugeriram-se novas definições, como o próprio entre os operantes mandos e tatos. (Tese
conceito de comportamento verbal, de comu- de doutorado) Universidade de Brasília,
nidade verbal e de operantes verbais. Brasília, DF,
Boa parte da confusão aqui apontada Córdova, L. F., Lage, M., & Ribeiro, A. F. (2007).
decorre da complexidade do tema. O presen- Relações de independência e depen-
te capítulo se ateve aos conceitos e discussões dência funcional entre os operantes
iniciais e já nos deparamos com grandes em- verbais mando e tato com a mesma to-
baraços conceituais. Certamente há temas mais pografia. Revista Brasileira de Análise
áridos no livro para um exame desse tipo, como do Comportamento, 3(2), 279-298.
tatos e mandos ampliados, controle múltiplo e https://doi.org/10.18542/rebac.v3i2.835
autoclíticos. Mas esses temas ficam para uma Gamba, J., Goyos, C., & Petursdottir, A. I. (2014).
próxima publicação. The functional independence of mands
and tacts: has it been demonstrated em-
Referências pirically? Analysis of Verbal Behavior,
31(1),10-38, 2014. https://doi.org/10.1007/
Abreu, P. R., & Hübner, M. M. C. (2012). O com- s40616-014-0026-7
portamento verbal para B. F. Skinner e Guess, D. (1969). A functional analysis of in-
para S. C. Hayes: uma síntese com base dividual differences in generalization
between receptive and productive

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 1 | 29


Comportamento verbal
Carlos Augusto de Medeiros, Márcio Borges Moreira & Lucas Ferraz Córdova

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Comportamento em Foco, v. 13, cap. 1 | 30


Comportamento verbal
Carlos Augusto de Medeiros, Márcio Borges Moreira & Lucas Ferraz Córdova

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Comportamento em Foco, v. 13, cap. 1 | 31


COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 13 pp. 32—43

O que é Comportamento Governado Augusto Cézar de Souza Neto (1)

por Regras para a Teoria das Molduras


augustocezar.s@hotmail.com
Angelo Augusto Silva Sampaio (1)
Relacionais?1 angelo.sampaio@univasf.edu.br

What is Rule-Governed Behavior for Relational Frame Theory? (1)


Universidade Federal do Vale do São Francisco

Resumo Abstract
Uma característica peculiar e extremamente A peculiar and extremely important charac-
importante dos humanos é sua capacidade de teristic of humans is their ability to quickly
adquirir novos comportamentos rapidamente acquire new behavior through exposure to
através da exposição a estímulos verbais, sem verbal stimuli, without direct contact with the
contato direto com as consequências referi- related consequences. In behavior analysis,
das. Na análise do comportamento, esse fenô- this phenomenon was first treated more than
meno foi primeiro tratado há mais de meio half a century ago by Skinner, who defined it
século por Skinner, que o definiu como com- as rule-governed behavior (RGB). Relational
portamento governado por regras (CGR). A Frame Theory (RFT) emerged 40 years later
Teoria das Molduras Relacionais (RFT) surgiu and, although there is a growing number
40 anos depois e, embora haja um crescente of empirical research on the topic, there is
número de pesquisas empíricas sobre o tema, still no objective and consensual definition
ainda não fica em evidência uma definição of rules or RGB. This text contextualizes the
consensual e objetiva de regras ou do CGR. emergence of RFT and offers a basic, clear
Este texto contextualiza o surgimento da RFT and objective definition of RGB from a RFT
e oferece uma definição básica, clara e obje- standpoint, describing the current scenario of
tiva de CGR a partir da RFT, descrevendo o basic and applied research and exemplifying
cenário atual da pesquisa básica e aplicada e its contribution to the clinical context.
exemplificando sua contribuição para o con-
texto clínico.

Palavras-chave Keywords
Regras; Molduras Relacionais; comportamento Rules; Relational Frames; rule-governed
governado por regras. behavior.

1 O presente capítulo é derivado de uma palestra de Primeiros Passos apresentada no XXIX Encontro Brasileiro de Psicologia e Medicina
Comportamental, no dia 05 de setembro de 2020.

32
O que é Comportamento Governado por Regras para a Teoria das Molduras Relacionais?
Augusto Cézar de Souza Neto & Angelo Augusto Silva Sampaio

Se um pai brasileiro fala ao seu filho tratado. Assim, esse texto apresentará de modo
“depois de trinta minutos, então desligue o simples e didático como o CGR pode ser definido
forno”, o filho provavelmente aguardará o pon- a partir de uma perspectiva comportamental
teiro dos minutos de um relógio se mover 180 relativamente recente chamada de Teoria das
graus para emitir respostas como levantar, ir Molduras Relacionais (Relational Frame Theory,
até o forno e girar a chave do acendedor. Nesse RFT; Hayes, Barnes-Holmes & Roche, 2001;
caso, um analista do comportamento diria que Zettle, Barnes-Holmes & Biglan, 2016). Para
o filho emitiu um comportamento governado por isso, apresentaremos brevemente a história do
regras (CGR)2 (Figura 1). Porém, se o pai falasse conceito de CGR, trazendo algumas definições
“A maeʻa le tolusefulu minute, tape le ogaumu”, behavioristas radicais de CGR; contextualizare-
o filho apenas falaria “o quê!?” ou algo seme- mos o surgimento da RFT; descreveremos uma
lhante. Ao contrário de um falante da língua definição de CGR segundo a RFT; e concluire-
samoana, o filho não desligaria o forno após 30 mos com implicações de pesquisa e clínicas,
min – e um analista do comportamento não de- incluindo exemplos.
nominaria as ações do filho de CGR. Mesmo na
presença de estímulos em português, como por
exemplo “Após o almoço, arrume seu quarto”,
o filho poderia não seguir a regra. Por que as
respostas do filho ficam sob controle do que
foi dito em algumas situações e não em outras?
Por que seguimos algumas instruções, leis, di-
tados etc., mas não outras? Quais processos
comportamentais básicos estão na base desse
repertório? Qual história de interações com o
ambiente é necessária para instalar e manter
esse repertório?
Essas questões são essenciais para enten-
der a singularidade e as principais realizações da
espécie humana. Nossa interação com o mundo Figura 1. Um exemplo de comportamento go-
é alterada de modo importante pela capacidade vernado por regras. A resposta verbal do pai
de responder a conjuntos de estímulos arbitrá- (falante) produz um antecedente para a cadeia
rios produzidos por outra pessoa de um modo de respostas do filho (ouvinte). As consequên-
coerente com as práticas de uma determinada cias para o filho são comer o bolo após estar
comunidade. E essa capacidade torna-se ainda pronto e evitar uma bronca.
mais poderosa quando envolve o responder na
presença de uma combinação completamente A História do Conceito de Comportamento
nova daqueles estímulos – em nosso exemplo, Governado por Regras
o filho poderia nunca ter sido pedido a retirar
um bolo do forno. Esses temas estão no cerne O termo CGR foi usado pela primeira vez
da literatura sobre CGR e o primeiro passo para em um artigo sobre resolução de problemas de
tratar deles é definir claramente o fenômeno Skinner (1966/1969), que definiu regra como

2 Os termos controle instrucional e comportamento governado verbalmente também têm sido utilizados na literatura.

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 2 | 33


O que é Comportamento Governado por Regras para a Teoria das Molduras Relacionais?
Augusto Cézar de Souza Neto & Angelo Augusto Silva Sampaio

um estímulo antecedente que especifica uma e Joyce (1988) e desde então é possível encon-
relação de contingência. No nosso exemplo ini- trar trabalhos empregando o termo persistên-
cial, a frase do pai especifica um antecedente cia em seguir regras (Harte et al., 2017), dando
(30 min), uma resposta (desligar o forno) e deixa evidência ao fato do CGR se manter a despeito
implícita uma consequência (evitar bronca e/ do contato com consequências aversivas ou
ou comer o bolo). Assim, os estímulos produ- com a perda de reforçadores, mas sem impli-
zidos pelo comportamento verbal do falante car uma ausência de sensibilidade a qualquer
controlariam (ou governariam) o responder do contingência.
ouvinte de modo a que este se conformasse à A própria definição de regras para Skinner
contingência especificada na regra. No mesmo (1966/1969) não ficou livre de questionamen-
texto, Skinner diferenciou o CGR do compor- tos (Catania, 1989; Glenn, 1987, 1989; Hayes &
tamento aprendido por contato direto com as Rosenfarb, 1989; Mallot, 1989; Michael, 1982;
contingências de reforço, o comportamento Schlinger & Blakely, 1987). Uma das críticas que
modelado por contingências (CMC). No exemplo ela recebeu foi não considerar o comportamen-
anterior, caso o filho tivesse aprendido a des- to do ouvinte como sendo verbal, privilegiando
ligar o forno após 30 min tendo queimado ou consequências que consistem no contato do ou-
solado outros bolos até emitir a resposta dentro vinte com aspectos do ambiente físico. Porém
do tempo determinado, este comportamento há de se considerar que as consequências mais
teria sido modelado por contingências. O CGR relevantes para a construção do repertório de
tem como antecedente um estímulo especifica- ouvinte são aquelas mediadas por outros falan-
dor de contingência enquanto o CMC envolve tes (Dahás, Goulart & de Souza, 2008).
diretamente a própria contingência em si. Ademais, até a década de 1980 outras ques-
Os primeiros estudos empíricos relaciona- tões sobre o CGR continuavam em aberto. Uma
dos ao CGR apareceram já na mesma década delas era a explicação de situações nas quais o
(e.g., Leander, Lippman & Meyer, 1968; Lippman ouvinte emite uma resposta sob controle de estí-
& Meyer, 1967), investigando principalmente a mulos verbais apenas após muito tempo. Outra
interferência do CGR nos efeitos de esquemas questão seria como explicar alguém seguir uma
de reforço sobre o responder de humanos, os regra à qual nunca havia sido exposto antes.
quais diferiam daqueles encontrados nos estu- Por exemplo, alguém viajar pela primeira vez
dos com outros animais. Anos depois, algumas para Salvador e seguir a regra “você precisa ir
pesquisas (e.g., Bentall & Lowe, 1987; Bentall, no Museu de Arte Sacra”, quando a regra foi
Lowe, & Beasty, 1985; Lowe, Beasty, & Bentall, apresentada por um amigo antes da viagem e
1983) observaram que crianças mais novas era inédita para o viajante. Por último, ainda
respondiam aos esquemas com desempenho faltava explicar qual a história responsável por
próximo dos animais não-humanos e diferen- aprendermos não só a entender e seguir regras
te dos de crianças verbalmente competentes. emitidas pelos outros, mas a ficar sob controle
Estudos como esses levaram alguns autores a de regras formuladas por nós mesmos (Barnes-
considerar que o CGR produziria uma insensibi- Holmes et al., 2002; Hayes et al., 1989; Matos,
lidade a contingências (Galizio, 1979; Matthews, 2001).
Shimoff, Catania, & Sagvolden, 1977; Shimoff, Paralelamente a isso, as pesquisas de
Catania, & Matthews, 1981). O uso do termo foi Sidman e colaboradores sobre relações de equi-
questionado por autores como Madden, Chase valência (e.g., Sidman, 1971, 1990; Sidman &

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 2 | 34


O que é Comportamento Governado por Regras para a Teoria das Molduras Relacionais?
Augusto Cézar de Souza Neto & Angelo Augusto Silva Sampaio

Talby, 1987) mostraram como ensinar novas chamado de responder relacional arbitrariamen-
respostas (e.g., falar “bola” na presença da te aplicável (RRAA), sendo capaz de estabelecer
palavra escrita “b-o-l-a”) sem reforço direto, a (e ficar sob controle de) relações arbitrárias
partir do ensino de outras relações (e.g., falar entre estímulos que não apenas a de equiva-
“bola” na presença de uma figura de uma bola lência. O termo responder relacional refere-se
e escolher a palavra escrita “b-o-l-a” na presen- ao responder (verbal ou não) sob controle de
ça da figura da bola). Quando as condições de relações entre estímulos. Tal padrão de respos-
reflexividade, simetria e transitividade eram tas não é exclusividade de humanos. Quando
satisfeitas3, dizia-se que houve o estabeleci- o bicar de um disco com um quadrado por
mento de uma classe de equivalência entre um pombo é reforçado, o quadrado adquire
os estímulos, tornando possível a emergência função discriminativa. Quando o pombo emite
de uma relação nunca treinada. O termo de- a mesma resposta diante de um losango, que
rivado tem sido utilizado para descrever um se assemelha fisicamente com um quadrado,
responder que emerge sem a necessidade de ocorre generalização de estímulos. Entretanto,
treino direto (Barnes-Holmes, Barnes-Holmes, também é possível reforçar respostas na pre-
& Cullinan, 2000; Hayes, Barnes-Holmes, & sença de relações entre estímulos, por exem-
Roche, 2001). Nesse caso, o processo envolvido plo com base em um estímulo ser “maior do
não é a generalização de estímulos, haja vista que” outro ou estar “à direita” de outro (Keller
que os estímulos não compartilham proprieda- & Schoenfeld, 1950; Lashley, 1938; Millenson,
des físicas. O próprio Sidman sugeriu que suas 1967), sendo possível assim observar que tal
descobertas se relacionariam com a questão do padrão de respostas é amplamente dissemina-
significado e da compreensão da linguagem, su- do entre as espécies.
gerindo implicações para o CGR. Começava-se Um indivíduo pode responder sob con-
aí a ampliar as possibilidades para o estudo do trole de relações arbitrárias ou não-arbitrárias
comportamento simbólico, o que foi explorado entre estímulos. Uma relação não-arbitrária é
a seguir pela RFT. aquela entre estímulos que compartilham ou se
distinguem em termos de propriedades físicas.
A Teoria das Molduras Relacionais (RFT) Uma pessoa que fala “meu pai é maior do que
minha mãe” sob controle de um pai que mede
A partir da década de 1980, Hayes e co- 1,80 m e uma mãe que mede 1,70 m tem sua
laboradores buscaram responder a estas la- resposta verbal controlada por uma relação
cunas sobre o CGR desenvolvendo o que pos- não-arbitrária. Respostas não verbais também
teriormente, especialmente com os trabalhos podem ficar sob controle de relações não-arbi-
de Barnes-Holmes, viria a ser a RFT (Hayes, trárias. Uma criança pequena pode entregar a
1987; Hayes, Strosha & Barnes-Homes, 2001). bola de basquete para o pai e não para a mãe,
Para estes autores, o ser humano se distingue sob controle da diferença de altura entre eles.
de outros animais por apresentar um operante No exemplo do pombo, poderíamos treiná-lo

3 Reflexividade é comprovada quando o estímulo é escolhido com ele mesmo como modelo (A=A, B=B, C=C), simetria quando há a bidi-
recionalidade da relação entre dois estímulos (treina-se A=B e a relação B=A emerge em situação de teste) e transitividade quando uma
nova relação envolvendo um terceiro estímulo emerge após o treino (treina-se A=B e B=C, e emerge A=C sem reforço). Como decorrência
da formação de uma relação de equivalência ocorre transferência de função de estímulos: algumas funções (discriminativa, eliciadora,
reforçadora ou punidora) de um dos estímulos da classe de equivalência também passam a ser observadas (i.e., são transferidas) para
outros membros da classe.

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 2 | 35


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para bicar sempre no triângulo de maior ta- utilizado pela RFT para tratar de funções con-
manho dentre três opções e ele se comportar textuais como essa: a expressão moldura rela-
da mesma forma quando substituímos por três cional4 (Hayes et al., 2001).
quadrados. Como explicado por Blackledge (2003),
Outro tipo de relação entre estímulos que uma moldura relacional seria composta por
pode controlar o responder é a relação arbi- uma dica contextual relacional (termo “maior
trária, aquela que não envolve propriedades que”) e pelas dicas contextuais funcionais (Cfunc)
físicas compartilhadas entre eles. Por exemplo, que compõem o restante da frase (e.g., “pai” e
um pombo pode bicar um disco com um triân- “mãe”) – a primeira indicaria a qual “família”
gulo apenas na presença do quadrado e não na de molduras a relação em questão pertence. A
presença de um hexágono; ou um filho pode expressão moldura foi adotada por represen-
emitir um tato “meu pai é maior do que minha tar uma estrutura que pode ser colocada ao
mãe” sem referir-se à diferença de altura, mas redor de qualquer fotografia ou pintura, de-
à habilidade culinária. Uma questão a ser res- limitando-as. Metaforicamente, as fotografias
pondida é qual a história necessária para o ou pinturas são como conjuntos de estímulos.
desenvolvimento deste operante. Uma criança Peguemos como exemplo o conjunto de quatro
aprendendo a falar é exposta a uma série de estímulos: Amor, Paixão, Pai e Mãe. O falante
exemplares de relações não-arbitrárias como pode afirmar que “amor é MAIOR QUE paixão”,
“Seu pai é mais alto do que sua mãe”, “uma assim como que “o pai é MAIOR QUE a mãe”,
carreta é maior do que um carro” e também aplicando a mesma moldura de comparação
a relações arbitrárias como “Bahia é maior do “maior que”. Pode também afirmar que “paixão
que Vitória”. Tal história pode produzir a de- ocorre ANTES DO amor” ou que “a mãe nasceu
rivação de uma série de relações arbitrárias ANTES DO pai”. A moldura aplicada pelo falan-
aplicadas a uma infinidade de eventos à sua te é definida pelas dicas contextuais treinadas
volta. na comunidade verbal do ouvinte, do contrário
A expressão arbitrariamente aplicável em não exerce tal função. Na comunidade falan-
RRAA retrata a possibilidade de uma mesma te de português termos como MAIOR QUE ou
relação (e.g., comparação) ser aplicada a uma MENOR QUE delimitam relações de compara-
variedade de estímulos que vão desde objetos ção, bem como os termos ANTES DE e DEPOIS
físicos até estímulos de natureza arbitrária ou DE determinam relações de temporalidade.
convencional como os conceitos abstratos de Uma mesma moldura pode ser aplicada para
amor, felicidade e fama. O termo “maior que” é uma quantidade infinita de estímulos, bem
aquele em comum dentre todos os exemplares como um mesmo estímulo pode fazer parte de
e assim adquire uma função bem específica no uma quantidade grande de molduras, como no
controle do comportamento, chamada de função exemplo inicial (“depois de 30 minutos, então
contextual de estímulo (Hayes et al., 2001), sendo desligue o forno”). Uma relação de equivalên-
especificamente uma “dica” para uma relação cia é uma relação de igualdade (Sidman, 1990),
entre estímulos que a RFT chama de compara- ou uma moldura de coordenação para a RFT.
ção – daí falar-se de dica contextual relacional A RFT descreve ainda outros tipos de relações
(Crel). Um construto metafórico-científico é arbitrárias que podem fazer parte do repertório

4 A partir de agora, os termos “moldura”, “contexto funcional” e “relação do tipo” serão usados como sinônimos.

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de um ouvinte humano verbalmente compe- a relação preconizada pela moldura, processo


tente, como oposição (e.g., “felicidade é o oposto este chamado de transformação de função5.
de tristeza”), hierarquia (e.g., “felicidade é parte
dos sentimentos”), relações espaciais (e.g., “fe-
licidade vem antes da tristeza”), causalidade
(e.g., “se você buscar felicidade, não irá sentir
tristeza”) e dêiticas (e.g., “felicidade aqui e tris-
teza aí”).

O Comportamento Governado por Regras para a


Teoria das Molduras Relacionais

No exemplo no início do texto, a frase Figura 2. As funções de cada estímulo que


emitida pelo pai “Depois de trinta minutos, compõe o exemplo inicial de comportamento
então desligue o forno” estabelece uma relação governado por regras, indicando uma moldura
entre estímulos que na história do filho como relacional temporal.
ouvinte (que responde à regra) já foram coor- Assim, de acordo com a RFT, para um
denadas (ou se equivalem) a outros eventos: conjunto de estímulos verbais (uma regra)
a expressão “trinta minutos” está coordenada controlar um comportamento é necessário que
com o posicionamento dos ponteiros de um o ouvinte tenha sido treinado ao menos para
relógio e “desligue o forno” com uma ação de relacionar estímulos em molduras de coorde-
girar a chave do acendedor do fogão (Figura nação e relacionar estímulos em moldura tem-
2). Os termos “Depois de” e “então”, por sua poral (Hughes & Barnes-Holmes, 2014; O’Hora
vez, são uma dica contextual relacional, que et al, 2004; O’Hora et al., 2014). Com treinos
junto com elementos anteriores compõem uma para relacionar a partir de outras molduras re-
moldura relacional temporal. O contexto no lacionais, como dêiticos e hierarquia, o ouvinte
qual a frase é emitida também deixa implícito se torna apto a seguir ou formular uma quan-
possíveis consequências, como evitar bronca tidade maior de regras. Isto também significa
e/ou comer o bolo. Segundo a RFT, o operan- que um organismo que não passou pelo treino
te RRAA permite que o conjunto de estímulos de RRAA segundo alguns tipos de relações com-
produzidos pela resposta do falante funcione plexas pode não seguir determinadas regras
como antecedente para a cadeia de respostas por não entende-las, podendo ser interpreta-
emitidas pelo ouvinte posteriormente. Sem ele, do talvez como indulgente. Aprender a fazer e
não haveria um controle de estímulos, ou em entender relações causais, por exemplo, pode
outros termos, não haveria um entendimento ser pré-requisito para seguir uma regra de um
do ouvinte. Isso acontece por meio da alteração médico para prevenção de doenças.
da função eliciadora, discriminativa, reforça- Em suma, podemos definir CGR para a
dora ou punidora de estímulos coordenados RFT como um comportamento sob controle de
com alguns dos estímulos verbais (e.g., “trinta um conjunto de estímulos que participam de
minutos” e “desligar o forno”) de acordo com relações de coordenação e de outras molduras

5 O termo transferência tem sido usado na literatura quando a relação entre estímulos é de coordenação ou de equivalência. Já o termo
transformação tem sido usado para tratar de outras relações arbitrárias (temporal, hierárquicas, de comparação etc.).

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 2 | 37


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relacionais com outros eventos, transformando generalização de estímulo). Após o teste dessas
as funções dos mesmos. Levando em conta esta relações, os participantes passaram por um
definição, uma regra pode assumir múltiplas treino discriminativo apenas com um dos estí-
funções de estímulos, tornando possível que mulos (B) para o comportamento de pressionar
outros controles de estímulos passem a ou em frequência moderada as teclas de um com-
deixem de ocorrer (como já preconizado por putador. Após estabelecida a função discrimi-
Schlinger & Blakely, 1987). nativa para o estímulo B, os experimentadores
Para explicar como uma regra provo- testaram a apresentação dos outros dois estí-
ca um efeito no controle do comportamento mulos que faziam parte do treino de relações
humano, é necessário explicar as proprieda- arbitrárias. Os resultados demonstraram que
des do RRAA (Hayes et al., 2001). Em estudos o estímulo A ganhou função discriminativa
empíricos, o estudo do RRAA envolve três pro- para o comportamento de pressionar as teclas
priedades: (1) implicação mútua, que descreve a lentamente e o estímulo C, função discrimi-
bidirecionalidade entre os estímulos, incluindo nativa para pressionar mais rapidamente. No
dentro dela (mas não exclusivamente) a sime- mesmo estudo, os experimentadores testaram
tria, termo usado na equivalência de estímu- a transformação de função eliciadora entre os
los para relações de igualdade (Se A=B, B=A); estímulos pareando o estímulo B com choques
(B) implicação mútua combinatória, que envolve elétricos leves. O estímulo A eliciou respostas
também relações de transitividade (se A é maior galvânicas da pele de menor magnitude e o es-
que B e B é maior que C, então A é maior que tímulo C eliciou respostas de maior magnitude.
C), indicando assim relações que emergem sem Hayes et al. (2001, pp. 115-116) discuti-
treino direto (também chamado na literatura ram a participação dessas três propriedades no
de derivação), estabelecendo o que é chamado estudo do CGR, destacando ser possível produ-
de rede relacional (conjunto de relações arbi- zi-lo sem treino direto. Esses autores citaram
trárias entre estímulos); e (3) transformação de experimentos com um procedimento chamado
função de estímulo, onde as funções de estímu- de avaliação relacional (Relational Evaluation
los (discriminativa, eliciadora, reforçadora e Procedure), o qual permite estabelecer dicas
punidora) são transformadas de acordo com a contextuais relacionais de molduras tempo-
relação subjacente estabelecida pela moldura rais (Antes e Depois) e de coordenação (Igual
relacional aplicada. e Diferente) para estímulos arbitrários (sem
Um experimento que buscou demonstrar função contextual prévia). A seguir, os parti-
a transformação de função de estímulo foi o de cipantes desses experimentos realizaram uma
Dougher, Hamilton, Fink e Harrington (2007). tarefa nova, sem consequenciação, na qual
Os universitários participantes deste estudo tinham sido orientados a clicar em uma sequ-
foram treinados a estabelecer funções relacio- ência de botões coloridos sob controle de um
nais para três estímulos visuais arbitrários: A conjunto de estímulos na tela do computador
como indicando a escolha do estímulo menor, - uma rede relacional estabelecendo relações de
B como indicando a escolha do estímulo médio coordenação entre cores e outros estímulos (e.g.,
e C indicando a escolha do maior. Os estímulos Classe A) do tipo Verde igual a A1, Azul igual a
A, B e C eram do mesmo tamanho (do contrário A2 etc.; e relações temporais entre estímulos da
a relação seria não-arbitrária) e não tinham classe A, como A2 antes de A4, A4 antes de A1
similaridade física (para não ser considerado etc. Do ponto de vista da RFT, essas sequências

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de respostas não treinadas deveriam ser con- sofrimento humano com a linguagem. O con-
sideradas seguimento de regras porque foram ceito de regras para a RFT também possibilita
produzidas pela transformação de funções de explicar o uso do comportamento verbal como
estímulos de acordo com uma rede relacional ferramenta de intervenção do psicólogo clínico.
composta de múltiplas relações de estímulos. Como já foi dito anteriormente, uma pessoa
Estes estudos comprovam a capacidade que pode seguir uma regra sem necessidade desta
um humano adulto tem de seguir uma regra ter sido ouvida ou lida anteriormente. Assim
sem ser treinado diretamente para tal e que como a pessoa pode formular novas regras,
este CGR pode ser fortalecido ou enfraquecido pode passar a segui-las de maneira derivada
a posteriori, através de reforço e punição (ver (O’Hora et al., 2014). Um exemplo é quando um
também O’Hora et al., 2014). cliente relata para sua terapeuta que está há
Estes achados explicam como um conjun- dois anos sem ir a um encontro amoroso. Ao
to de estímulos verbais pode ocasionar trans- ser perguntado sobre suas razões, ele mostra
formações de função de estímulos em nosso sinais de estar seguindo uma regra diretamente
cotidiano, como quando um lançamento de um aprendida ou derivada do tipo “se você sentir
aparelho celular reduz a função reforçadora de medo, então se afaste”. Esta regra contém dicas
um celular lançado anteriormente. Os estudos contextuais relacionais (“se..., então...”) que es-
sobre esta propriedade são capazes de expli- tabelecem uma relação de causalidade entre
car como as regras funcionam como operações sentir medo (que entra em coordenação com
motivadoras (cf. Michael, 1982) ou estímulos determinados eventos privados) e o ato de afas-
alteradores de função (Schlinger, 1993). Além tar-se (que entra em coordenação com respostas
disto, a transformação de função pode ajudar de esquiva). Então, esta regra produz uma série
a explicar como o controle por regras pode de transformações de funções no repertório do
também sobrepujar o controle exercido pelas cliente podendo reduzir drasticamente as chan-
contingências (quando há um conflito entre os ces de ele aceitar ou propor um convite para
dois) a ponto de reduzir o efeito das consequ- ir a um encontro com uma pessoa. Processos
ências – fenômeno chamado na literatura de como este são interpretados pela Terapia de
insensibilidade a contingência (Catania, Cerutti, Aceitação e Compromisso 6 (Acceptance and
1989; Shimoff, & Matthews, 1989; Shimoff et al, Commitment Therapy, ACT) como uma esquiva
1981) ou persistência em seguir regras (Harte et experiencial, definida como uma classe de res-
al, 2017; Harte et al, 2020). postas de evitação de sentimentos e emoções
reforçadas negativamente (Hayes, Strosahl &
Considerações Finais Wilson, 1999).
A terapeuta pode, como ferramenta de in-
A RFT enfatiza processos que controlam tervenção, inserir um novo contexto funcional
o comportamento do ouvinte sem apelar para para os mesmos estímulos por meio, por exem-
“teorias do significado” ou constructos men- plo, da regra “sentir medo significa que é impor-
talistas, amplia as possibilidades de pesquisa tante; aceite-o para ser feliz”. A primeira parte
básica sobre CGR e sugere a ligação de parte do da frase utiliza uma dica contextual relacional

6 Hayes (2004) se refere à RFT como uma análise empírica abrangente da cognição humana, ramo assim da pesquisa básica. Para o autor,
a ACT por sua vez seria uma proposta de aplicação clínica que abarca tais pressupostos da RFT mas também outros, como provenientes por
exemplo de técnicas orientais, espiritualidade, valores e self.

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(“significa que é”) que coordena o sentimento Skinner’s verbal behavior: a possible syn-
de medo com potenciais reforçadores – “ser thesis. The Behavior Analyst, 23, 69–84.
importante”. A segunda parte estabelece um https://doi.org/10.1007/BF03392000
contexto de causalidade entre aceitação (já pre- Barnes-Holmes, D., Barnes-Holmes, Y., &
viamente coordenada com ações de exposição McEnteggart, C. (2020). Updating RFT (More
ao invés de esquiva) e ser feliz (coordenado Field than Frame) and its Implications for
com contingências de reforço positivo). Caso Process-based Therapy. The Psychological
esta nova regra cause uma série de transfor- Record, 70, 605–624. https://doi.
mações de função fazendo com que agora o org/10.1007/s40732-019-00372-3  
encontro amoroso ganhe função reforçadora, Barnes-Holmes, D., Hayes, S.C., & Dymond,
aumentam-se as chances de o paciente aceitar S. (2002). Self and Self-directed rules.
um convite ou propor um. Caso isto aconteça, Em Hayes, S.C., Barnes-Holmes, D,
o terapeuta obteve êxito no que os autores da Roche, B (Eds.), Relacional Frame Theory.
ACT chamam de recontextualização verbal (De Springer. Boston, MA. https://doi.
Souza Neto & Ferreira, 2020; Hayes, Strosahl, org/10.1007/0-306-47638-X_7
& Wilson, 1999, p. 12), podendo gerar uma Bentall, R. P., & Lowe, C. F. (1987). The role of
espécie de afrouxamento do seguimento de verbal behavior in human learning: III.
certas regras (ou redução da insensibilidade a Instructional effects in children. Journal
contingências, de acordo com Shimoff, Catania of the Experimental Analysis of Behavior,
& Matthews, 1981), o que é chamado pela tera- 47(2), 177–190 . https://doi.org/10.1901/
pia de aceitação e compromisso de flexibilidade jeab.1987.47-177
psicológica (Hayes, Strosahl, & Wilson, 1999). Bentall, R. P., Lowe, C. F., & Beasty, A. (1985).
O conceito de CGR aqui descrito é uma The role of verbal behavior in human
formulação dos trabalhos de Dermot Barnes- learning: II Developmental differen-
Holmes e colaboradores (Barnes-Holmes et al., ces. Journal of the experimental Analysis
2002; Barnes-Holmes et al., 2020; Harte et al., of Behavior, 43(2), 165–181. https://doi.
2020) e se aproxima dos resultados de pesqui- org/10.1901/jeab.1985.43-165
sas empíricas (O’Hora et al., 2004, 2014), muito Blackledge, J.T. (2003). An introduction to
embora tenha sido pouco explorado na litera- Relational Frame Theory: Basics and
tura clássica sobre a RFT. Tal conceito pode Applications. The Behavior Analyst Today,
facilitar a aplicação de achados da RFT para 3(4), 421–432. https://doi.org/10.1037/
a realidade clínica, a favor da redução do so- h0099997
frimento humano. Espera-se que este trabalho Catania, A.C. (1989). Rules as classes of verbal
funcione como incentivo para que seja dada behavior: A reply to Glenn. The Analysis
uma maior atenção para o assunto e que esti- of Verbal Behavior, 7, 49–50. https://doi.
mule o seu crescimento em termos de pesquisa org/10.1007/bf03392835
básica e aplicada. Catania, A. C., Shimoff. E., & Matthews, B. A.
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Comportamento em Foco, v. 13, cap. 2 | 42


O que é Comportamento Governado por Regras para a Teoria das Molduras Relacionais?
Augusto Cézar de Souza Neto & Angelo Augusto Silva Sampaio

the Experimental Analysis of Behavior,


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Comportamento em Foco, v. 13, cap. 2 | 43


COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 13 pp. 44—58

Preconceito e controle de estímulos


Márcio Borges Moreira (1)
1
borgesmoreira@gmail.com
Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos (2)
Prejudice and stimulus control barbarasrs18@gmail.com
Michelli Carrijo Cameoka (1)
micameoka@gmail.com
(1)
Centro Universitário de Brasília
(2)
Instituto Brasiliense de Análise do Comportamento

Resumo Abstract
O objetivo deste capítulo é discutir as relações The purpose of this chapter is to discuss the
entre preconceito e controle de estímulos a relationship between prejudice and stimulus
partir do referencial teórico da análise do control based on the theoretical framework
comportamento, caracterizando o preconcei- of behavior analysis, characterizing prejudice
to como um comportamento operante discri- as a discriminated operant behavior, that is,
minado, ou seja, sob controle de diferentes under the control of different stimulus pro-
propriedades dos estímulos. Pesquisas ana- perties. Analytical-behavioral research will
lítico-comportamentais exemplificam como exemplify how different stimulus controls
diferentes controles de estímulos podem can affect what we call prejudice, widely
afetar o que chamamos de preconceito, en- understood as a negative attitude towards
tendido de maneira ampla como uma atitude certain groups or people, drawing attention
negativa em relação a determinados grupos to the difficulties encountered in studies that
ou pessoas, chamando a atenção para as di- attempted to demonstrate the transfer of
ficuldades encontradas em estudos que ten- function or reversal of equivalence classes
taram demonstrar transferência de função with socially relevant stimuli, which would be
ou reversão de classes de equivalência com explained, at least in part, by characteristics
estímulos socialmente relevantes, o que seria of stimuli whose control over behavior may
explicado, ao menos em parte, por caracterís- have occurred differently from that predicted
ticas de estímulos cujo controle sobre o com- by the researchers. We argue that the fields of
portamento pode ter ocorrido de maneira social psychology and behavior analysis can
diferente daquela prevista pelos pesquisado- mutually benefit from their efforts to unders-
res. Defendemos que os campos da psicologia tand social attitudes and prejudice.
social e da análise do comportamento podem
se beneficiar mutuamente dos seus esforços
de compreensão das atitudes sociais e do
preconceito.

Palavras-chave Keywords
preconceito; controle de estímulos; atitudes; prejudice; stimulus control; attitudes; behavior
análise do comportamento; psicologia social. analysis; social psychology.

1 O presente capítulo é derivado de um minicurso ministrado no XXIX Encontro Brasileiro de Psicologia e Medicina Comportamental e VI
Encontro Sul- Americano realizado no dia 04 de setembro de 2020, sob o título: Preconceito e controle de estímulos.

44
Preconceito e controle de estímulos
Márcio Borges Moreira, Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos & Michelli Carrijo Cameoka

Temas como racismo, homofobia, xe- Social do Preconceito e do Racismo”, de Marcus


nofobia e gordofobia têm ganhado cada vez Eugênio Oliveira Lima (2020), e “On the Nature
mais espaço em debates e pesquisas, trazendo of Prejudice: Fifty Years after Allport”, de John
maiores informações sobre a origem, desenvol- Dovidio, Peter Glick e Laurie Rudman (2005).
vimento e propagação do preconceito. Como Posto isso, no campo da psicologia social,
consequência de maior conhecimento do fenô- entre outras condições, quando as percepções
meno, há a possibilidade do desenvolvimento e crenças que uma pessoa tem em relação a
de ações para a busca de uma mudança dos outras pessoas ou grupos de pessoas produzem
comportamentos que caracterizam essas atitu- afetos negativos, caracteriza-se o preconceito
des. Isso é em si importante, pois os preconceitos (Pérez-Nebra & Jesus, 2011). Uma das possíveis
e estereótipos de diversas naturezas acarretam explicações sobre a origem do preconceito des-
prejuízos para as pessoas e os grupos alvos de creve-o como resultado da aprendizagem social.
preconceitos de todos os tipos. As normas culturais presentes em cada comu-
Há diversos estudos na psicologia que bus- nidade, e passadas no processo de socializa-
caram investigar o preconceito contra diferen- ção, acabam por instruir “aberta ou sutilmente
tes grupos, dentre os quais homossexuais (e.g., sobre o que pensar, como reagir afetivamente
Lacerda, Pereira, & Camino, 2002), obesos (e.g., ou como agir no mundo” (Rodrigues, Assmar,
Crandall, D’Anello, Sakalli, Lazarus, Nejtardt, & & Jablonski, 1999, p. 170; ver também Crochik,
Feather, 2001), Negros (e.g., Lima & Vala, 2004) 1996; Miranda, 2012).
e grupos étnicos (e.g., Dixon & Lemke, 2007). Ainda no âmbito da psicologia social,
Nesse contexto, propõe-se que a psicologia, de Neiva e Mauro (2011) destacaram que atitude
modo geral, e a análise do comportamento, em é um construto psicológico e pode ser enten-
particular, podem contribuir na compreensão dido como o posicionar-se, de forma negativa
desses fenômenos e no desenvolvimento de ou positiva, diante dos diferentes estímulos do
ferramentas e estratégias de intervenção com mundo. A atitude, nessa perspectiva, caracteri-
capacidade para minorar esses problemas so- za-se, portanto, como uma posição avaliativa e
ciais (Dixon & Lemke, 2007; Kohlenberg, Hayes, constante assumida pelas pessoas. Albarracin
& Hayes, 1991; Matsuda, Garcia, Catagnus, & e Shavitt (2018), também partindo do ponto
Brandt, 2020; Mizael & de Rose, 2017; Mizael, de vista da psicologia social, afirmaram que o
Santos, & de Rose, 2016; Watt, Keenan, Barnes, estudo das atitudes é o estudo das avaliações,
& Cairns, 1991). e que a sua definição foca em sua natureza
Uma discussão ampla do preconceito e do avaliativa como, por exemplo, favorável ou
racismo, mesmo no âmbito da psicologia, está desfavorável, bom ou ruim.
além do escopo do presente capítulo. O objetivo Sob o recorte amplo do racismo, a socio-
aqui é uma abordagem da relação entre contro- logia vem se debruçando sobre o fenômeno
le de estímulos e preconceito, particularmente do colorismo, que pode ser definido simplifi-
no contexto de tarefas de julgamento e avalia- cadamente como a correlação negativa entre
ção de faces humanas em estudos da análise do a cor da pele mais escura e o acesso a recursos
comportamento e da psicologia social. Para uma econômicos, sociais e simbólicos. De acordo
leitura introdutória mais aprofundada desse com Dixon e Telles (2017), esse fenômeno
tema complexo, sugerimos os livros “Racismo tem alcance mundial, com nuances próprias
Estrutural”, de Silvio Almeida (2019), “Psicologia a cada contexto social. No Brasil, o colorismo

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 3 | 45


Preconceito e controle de estímulos
Márcio Borges Moreira, Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos & Michelli Carrijo Cameoka

historicamente orientou as classificações raciais verificou que apesar do controle dessas variá-
(Guimarães, 2012) e já se verificou que aqui, veis, a raça e a cor da pele continuavam cor-
assim como em outros países latinoamericanos, relacionadas com o tamanho da sentença. O
tons mais escuros de pele são consistentemente autor concluiu, portanto, que a raça e a cor da
associados a menores níveis de escolaridade, pele tiveram grande relevância ao se proferir
o que por sua vez é uma variável que capta o uma sentença e também destacou a hierarquia
status socioeconômico dos indivíduos (Telles, racial ainda existente no sistema de justiça
Flores, & Urrea-Giraldo, 2015). estadunidense.
Outra expressão das consequências do Resultados como os apresentados por
colorismo é apresentada por Burch (2015), que Burch (2015) ilustram, ao nosso ver, um aspecto
realizou uma análise de sentenças que foram importante em estudos sobre o preconceito: va-
proferidas em relação a homens Brancos e riações do comportamento preconceituoso que
Negros, réus primários, no estado da Georgia, ocorrem em função de variações em aspectos
nos Estados Unidos. Nessa pesquisa, foram relevantes dos estímulos relacionados ao pre-
resgatados os dados referentes ao outono de conceito, nesse caso, a cor da pele. Em outras
2003 e, a partir do que constava nos arquivos palavras, os resultados de Burch remetem ao
acerca da raça e da cor da pele, comparou-se campo de estudos analítico-comportamentais
essas características com a duração da sentença chamado de controle de estímulos, do qual tra-
condenatória. taremos neste capítulo (Catania, 1999; Hübner,
No que diz respeito à cor da pele, foram 2006).
comparados os indivíduos Brancos e Negros. Mas antes de abordarmos o conceito de
Burch (2015) fez uma classificação da cor da controle de estímulos, consideramos pertinente
pele negra, considerando-a pele negra clara apontar que ao longo dos anos, voltando uma
(light-skinned black), pele negra média (medium- vez mais às contribuições da psicologia social,
-skinned black) e pele negra escura (dark-skinned diversos estudos experimentais têm demons-
black). Como resultado, verificou-se diferença trado como diferentes características podem
significativa entre o tamanho das sentenças de influenciar na percepção que se tem de um
Brancos e Negros, sendo as dos primeiros em estímulo e no julgamento feito acerca dele. Por
média 270 dias menores. Além disso, entre os exemplo, em uma série de artigos, Stepanova e
diferentes tons da pele negra, foram constata- Strube (2009, 2012a, 2012b, 2017; Stepanova,
das as seguintes diferenças: indivíduos com Strube, Clote, & Limes, 2016) apontaram que in-
pele negra clara tiveram sentenças, em média, terações entre diferentes características de um
20 dias menores que as dos Brancos; indivíduos estímulo (e.g., cor da pele e traços do rosto) que
de pele negra média tiveram condenações, em pesquisadores usam para representar grupos
média, 200 dias maiores do que as condenações étnicos e raciais, particularmente em estudos
dos Brancos; e aqueles de pele negra escura sobre preconceito, podem ajudar a explicar a
receberam sentenças, em média, 400 dias maio- variabilidade dos resultados encontrados em
res que as atribuídas aos Brancos. pesquisas desse tipo.
Burch (2015), ao considerar a possibilida- Em um estudo (Stepanova & Strube,
de de influência de outras variáveis nos resul- 2012a) que teve como objetivo determinar
tados como, por exemplo, gravidade do crime como certas características faciais – tom da
cometido, idade e variáveis socioeconômicas, pele e fisionomia – manipuladas de forma

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 3 | 46


Preconceito e controle de estímulos
Márcio Borges Moreira, Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos & Michelli Carrijo Cameoka

independente influenciavam em uma tarefa de que, a fim de evitar vieses, os estudos sobre
de avaliação afetiva, os resultados encontrados preconceito e estereótipos raciais deveriam se-
sugeriram que tanto o tom de pele quanto a lecionar criteriosamente os estímulos usados,
fisionomia influenciaram em avaliações raciais além de controlar outras variáveis com poten-
implícitas. Essa influência se mostrou indepen- cial de influência.
dente para as duas variáveis, mas na mesma Stepanova e Strube (2017) expandiram o
direção; ou seja, um tom de pele mais claro, escopo de seus estudos anteriores por meio de
assim como uma fisionomia mais eurocêntri- dois experimentos cujo objetivo foi avaliar e
ca, se relacionaram com avaliações implícitas comparar percepções de atratividade e de tipi-
mais positivas (e menos negativas) do que tom cidade em relação a fenótipos raciais brancos,
de pele mais escuro e fisionomia afrocêntrica. negros e mestiços, a partir de manipulações de
Os autores concluíram que nesse tipo de ava- tom de pele e de características faciais. Os resul-
liação é provável que as faces humanas não tados indicaram que rostos de fenótipos raciais
sejam processadas de maneira global, como mistos (tom de pele médio-escuro e feições que
um todo, mas sim a partir de características misturavam uniformemente traços afrocêntri-
particulares e independentemente, o que não cos e eurocêntricos) foram percebidos como os
impede que algumas dessas características mais atraentes, seguidos pelos fenótipos negros.
sejam mais salientes do que outras em dado Já os fenótipos brancos foram percebidos como
contexto (Stepanova & Strube, 2012a). os menos atraentes (Stepanova & Strube, 2017).
Em outro estudo, Stepanova e Strube É interessante observar que, nesse estudo, a
(2012b) investigaram o peso relativo da varia- avaliação de atratividade e a categorização
bilidade dessas mesmas características ––cor da racial se mostraram independentes uma da
pele e fisionomia–– nos julgamentos a respeito outra, sugerindo que as diversas característi-
da tipicidade racial, ou seja, se determinada cas faciais podem exercer influência própria,
face era considerada caucasiana ou afro-ame- a depender do tipo de julgamento realizado.
ricana. Os autores também buscaram averiguar Alguns estudos apontaram que, além da
se atitudes raciais prévias dos respondentes, cor da pele e da fisionomia, as expressões de
bem como o tempo disponível para a tarefa de emoção também estão entre as características
avaliação, atuavam como moderadores desses faciais com potencial para exercer contro-
julgamentos. Os resultados indicaram que: (a) le sobre comportamentos avaliativos. Song,
a cor da pele foi um forte preditor das classi- Vonasch, Meier e Bargh (2012), por exemplo,
ficações de tipicidade racial; (b) a fisionomia examinaram se as pessoas julgam rostos sorri-
facial ganhava peso na classificação quanto dentes como mais claros do que rostos carran-
mais clara a cor da pele; (c) sem restrição de cudos. Essa hipótese foi demonstrada por meio
tempo, a cor da pele era uma dica mais impor- de quatro estudos, que diferiam em termos do
tante do que a fisionomia, mas essa importân- tipo de tarefa (escolha binária ou julgamento
cia diminuía conforme o tempo para decidir absoluto), dos estímulos utilizados (faces esque-
ficava mais escasso; e (d) os respondentes com máticas ou faces realistas) e da escolha de pala-
atitudes raciais implícitas mais negativas apre- vras (claro [bright] ou alvo [light]). Com base nos
sentaram uma relação mais forte entre cor da resultados obtidos, os autores sugeriram que
pele e classificações de tipicidade racial. Os re- as expressões emocionais podem enviesar os
sultados encontrados fortaleceram a suposição julgamentos sobre a luminosidade (percepção

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 3 | 47


Preconceito e controle de estímulos
Márcio Borges Moreira, Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos & Michelli Carrijo Cameoka

de tonalidade mais clara) da face e, por conse- caracterizando o preconceito como um com-
quência, afetar outros julgamentos associados portamento operante e, portanto, aprendido.
à tonalidade da pele (Song et al., 2012). Em seguida, o preconceito será descrito como
Em estudo que ilustra outra linha de in- um comportamento operante discriminado e,
vestigação da psicologia social que contribui também, como classes de equivalência de estí-
para a compreensão da gama de atributos que mulos. Por fim, apresentaremos relatos de pes-
pode servir de pista na avaliação de rostos hu- quisas analítico-comportamentais que exempli-
manos, Keating, Randall, Kendrick e Gutshall ficam como diferentes controles de estímulos
(2003) testaram a hipótese de que feições “in- podem afetar o que chamamos de preconceito.
fantis” (babysh-looking) em adultos evocariam
comportamento de ajuda por parte de outros Preconceito: Um Comportamento Aprendido
adultos. Para isso, utilizaram imagens digitali-
zadas de rostos de homens e mulheres adultos O comportamento é o objeto de estudo da
afro-americanos e europeus-americanos, nas análise do comportamento. Embora defini-lo
quais os olhos e lábios originais foram substitu- não seja uma tarefa fácil, para este capítulo será
ídos por outros mais dilatados, a fim de fazê-las utilizada a definição de comportamento, espe-
parecer infantis. Por outro lado, olhos e lábios cificamente comportamento humano, apresen-
foram reduzidos para fazer os rostos parecerem tada por Cooper, Heron e Heward (2014):
mais maduros. A conclusão geral desses autores
Comportamento é a atividade dos orga-
foi favorável à hipótese inicial, sugerindo que
nismos vivos. Comportamento humano
características faciais de aparência submissa
é tudo o que as pessoas fazem, incluin-
sinalizam aproximação social e evocam ajuda,
do como elas se movem e o que elas
enquanto traços faciais maduros, com aparên-
dizem, pensam e sentem. Abrir um saco
cia dominante, são pistas para comportamentos
de amendoins é comportamento, assim
de esquiva (Keating et al., 2003).
como o é pensar o quão bom será o gosto
Os estudos da psicologia social apresenta-
do amendoim uma vez que o saco esteja
dos até o momento apontam para a diversida-
aberto. Ler esta frase é comportamento,
de de características de um rosto, – como, por
e se você está segurando o livro, também
exemplo, a fisionomia, o tom da pele e a pre-
o é sentir o peso e a forma do livro nas
sença ou ausência de sorriso –, que podem ter
suas mãos. (p. 45)
influência no julgamento a respeito desse tipo
de estímulo. Entendemos que essa literatura Se o comportamento é o objeto de estudo
pode dialogar com a psicologia comportamen- da análise do comportamento, isso é equiva-
tal no sentido de destacar a importância de um lente a dizer que analistas do comportamento
olhar mais detido sobre a seleção de estímulos estudam quais variáveis produzem efeitos, e
em pesquisas experimentais e as possíveis con- quais efeitos, sobre o comportamento. Grosso
sequências dessa seleção nos resultados alcan- modo, há dois grandes conjuntos de variáveis
çados. A fim de desenvolver esse tema, neste que afetam o comportamento: (a) eventos que
capítulo utilizaremos as ferramentas teóricas ocorrem imediatamente antes da ocorrência
da análise do comportamento para abordar em de um dado comportamento; e (b) eventos que
mais detalhes as relações entre preconceito e ocorrem imediatamente após a ocorrência de
controle de estímulos. Para tanto, iniciaremos um dado comportamento. A especificação de

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 3 | 48


Preconceito e controle de estímulos
Márcio Borges Moreira, Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos & Michelli Carrijo Cameoka

relações de controle entre os eventos antece- delta. O estabelecimento de processos compor-


dentes, o comportamento e os eventos conse- tamentais de discriminação de estímulos leva
quentes é chamada de contingência tríplice em consideração, como dito anteriormente,
(Todorov, 2012). Nesta relação, antecedentes e as características que os estímulos possuem e
consequentes são as variáveis independentes que indicam a possibilidade de reforçamento
e o comportamento é a variável dependente. de certos comportamentos.
Comportamentos cujos eventos conse- Neste ponto, já estamos em condições de
quentes afetam sua probabilidade de ocorrên- começar a analisar o preconceito como um com-
cia são chamados de comportamentos operan- portamento aprendido, mais especificamente,
tes (Catania, 1999; Moreira & Medeiros, 2019). como um comportamento operante discrimina-
Assim, entende-se que o comportamento ope- do. Imagine, por exemplo, uma criança que não
rante é selecionado por suas consequências - é apresenta nenhum comportamento que possa
função das consequências por ele produzidas, o ser chamado de preconceituoso. Certo dia, essa
que possibilita seu controle e predição (Moreira criança, talvez por ter visto um adulto fazer a
& Medeiros, 2019; Todorov, 2012). Para além do mesma coisa, diga para seu coleguinha que está
controle pelas consequências, a compreensão acima do peso: “Seu bolo fofo”. Se esse compor-
do comportamento operante também deve levar tamento da criança for seguido, por exemplo,
em consideração o contexto em que ele ocorre, por risadas de outros coleguinhas, é possível
os eventos antecedentes. Comportamentos que que essas risadas tenham um efeito reforçador
são controlados por estímulos antecedentes e sobre o comportamento de dizer bolo fofo na
estímulos consequentes são chamados de ope- presença de pessoas obesas (i.e., a ocorrência
rantes discriminados (Catania, 1999; Moreira desse comportamento torna-se mais provável
& Medeiros, 2019; Moreira, Todorov, & Nalini, na presença daquele estímulo). Temos aqui um
2006; Todorov, 2012). exemplo do “nascimento”, do início da apren-
Com relação aos comportamentos ope- dizagem de um comportamento que pode ser
rantes discriminados, os estímulos anteceden- considerado preconceituoso. Nesse exemplo,
tes são uma variável importante ––definidora, uma pessoa acima do peso é o estímulo dis-
na verdade–– e, como é destacado por Catania criminativo, o comportamento sob análise é
(1999), eles caracterizam “sinais ou pistas” do dizer "bolo fofo" e a consequência, nesse caso,
ambiente que controlam o comportamento. reforçadora, são as risadas dos colegas.
Quando esses estímulos apontam que um com- Uma análise de atitudes em termos de
portamento específico será reforçado diante suas variáveis de controle por estímulos ante-
deles, fala-se em estímulo discriminativo (SD), e cedentes e consequentes foi apresentada por
quando não há a correlação entre o estímulo e a Guerin (1994). Mais especificamente, Guerin
produção do reforço – ou sua produção é redu- apresentou uma análise das atitudes em termos
zida –, ele é configurado como um estímulo delta de categorias de comportamento verbal. No
(SΔ) (Catania, 1999; Moreira & Medeiros, 2019). exemplo apresentado acima (dizer "bolo fofo"
Moreira e Medeiros destacaram que é possível na presença de uma pessoa obesa), estaríamos
falar em um controle discriminativo quando falando, conforme Guerin, de um tato. Trata-
uma resposta ocorre diante de um estímulo se de um tato pois o controle discriminativo é
discriminativo, mas não ocorre, ou tem sua exercido por um estímulo discriminativo não-
frequência diminuída, diante de um estímulo -verbal (i.e., a forma do corpo de uma pessoa).

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 3 | 49


Preconceito e controle de estímulos
Márcio Borges Moreira, Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos & Michelli Carrijo Cameoka

Por outro lado, em um exemplo no qual uma comportamentos podem ficar sob controle de
pessoa geralmente recite frases do tipo “índios múltiplos estímulos (ou múltiplas característi-
são preguiçosos” quando alguém fala sobre cas de um mesmo estímulo; Moreira, Oliveira,
índios, estaríamos falando em um comporta- & Hanna, 2017; Reynolds, 1961). Pesquisas
mento intraverbal. Trata-se de um intraverbal oriundas da psicologia social têm nos mostrado
porque o controle discriminativo é exercido por que esse é um aspecto relevante para se com-
um estímulo verbal (e.g., a palavra “índio”). preender comportamentos preconceituosos. Os
A probabilidade do comportamento pre- resultados da pesquisa realizada por Stepanova
conceituoso ocorrer aumenta na presença do e Strube (2012b), cuja descrição foi apresentada
estímulo discriminativo inicialmente correla- anteriormente, constituem uma boa ilustração
cionado com o reforçamento, assim como na de como comportamentos relacionados ao ra-
presença de estímulos fisicamente semelhantes cismo podem estar sob controle de múltiplos
ao correlacionado com o reforçamento inicial. estímulos. Stepanova e Strube demonstraram
Esse fenômeno é chamado de generalização que o comportamento de uma pessoa julgar
de estímulos. Dizemos que há generalização outra como sendo afro-americana ou cauca-
quando estímulos que compartilham certas ca- siana é função de uma interação de variáveis
racterísticas físicas passam a exercer controle (múltiplos estímulos), como cor da pele e fisio-
discriminativo sobre um determinado com- nomia, assim como do tempo disponível para
portamento sem que tenha havido um treino realizar esse julgamento.
direto (Moreira & Medeiros, 2019). Para além dos aspectos relacionados à
Tatos como o descrito acima, cuja topogra- generalização e controle por múltiplos estí-
fia de resposta é classificada em nossa cultura mulos, pesquisas analítico-comportamentais
como preconceito, podem passar a ocorrer na têm demonstrado que parte do fenômeno que
presença de pessoas obesas diferentes daquela chamamos de preconceito está relacionada à
que a criança do exemplo passou a chamar de formação de classes de equivalência de estímu-
bolo fofo. Esse seria um exemplo de generaliza- los (Sidman, 1971; Sidman & Tailby, 1982). Para
ção de estímulos e passaríamos a falar de uma que os estímulos possam ser caracterizados
criança que chama pessoas obesas em geral de como equivalentes, eles devem ser substituíveis
“bolo fofo”. Sabemos que a generalização de entre si no controle do comportamento sem a
estímulos é descrita por gradientes de genera- necessidade de que compartilhem característi-
lização, isto é, variações nas características fí- cas físicas comuns. Por exemplo, quando diante
sicas dos estímulos alteram a probabilidade do de uma palavra falada, palavra impressa e da
comportamento ocorrer (Moreira & Medeiros, figura condizente, a mesma resposta é observa-
2019). Um exemplo prático, e dramático, de tal da (de Rose, Souza, Rossito, & Rose, 1989). Uma
gradiente foi aquele que vimos na descrição classe de equivalência de estímulos consiste
da pesquisa de Burch (2015). Nela, o compor- em um conjunto finito de estímulos que não
tamento de sentenciar dos juízes variou em têm atributos físicos semelhantes, mas para os
função de variações na cor da pele dos indiví- quais, após o estabelecimento de discrimina-
duos que receberam as sentenças. ções condicionais entre um subconjunto desses
Além da generalização de estímulos, estímulos, todos os estímulos do conjunto tor-
outro aspecto importante relacionado ao con- nam-se substituíveis uns pelos outros (Arntzen
trole de estímulos é o fato de que determinados & Nartey, 2018; Sidman & Tailby, 1982).

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 3 | 50


Preconceito e controle de estímulos
Márcio Borges Moreira, Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos & Michelli Carrijo Cameoka

As relações de equivalência podem ser en- é possível aprender a relação “negro-coitado”,


sinadas e testadas a partir do procedimento de mesmo sem que esse indivíduo tenha sido di-
matching-to-sample (MTS), ou emparelhamento retamente exposto a essa relação. Isso aconte-
de acordo com o modelo. No MTS, um estímulo é ce porque a participação indireta em relações
apresentado como modelo e, simultaneamente com, no mínimo, um estímulo comum, no caso
ou logo após, dois ou mais estímulos de compa- “pobre”, permite a emergência de uma nova
ração são mostrados; diante deles, o indivíduo relação não treinada diretamente envolvendo
deve escolher o único estímulo comparação que tais estímulos.
se relaciona com o estímulo modelo para que Segundo Rosendo e Melo (2018), funções
haja reforçamento e qualquer outra resposta de um estímulo específico podem ser transferi-
não é reforçada (Hübner, 2006; Mizael et. al., das para outros estímulos da classe, sem treino
2016). Tendo como exemplo o treino da relação adicional, após a formação de uma classe de
AB, se o estímulo modelo for A1 e os estímulos equivalência de estímulos. O fenômeno da
comparação B1, B2 e B3, a escolha correta seria transferência de função nos permite enten-
B1, diante de A1. Nesse exemplo, três classes de der, por exemplo, como as pessoas passam a
estímulos equivalentes poderiam ser formadas, apresentar determinadas atitudes em relação
a saber, A1B1, A2B2 e A3B3. a estímulos com os quais nunca interagiram.
Mizael et. al. (2016) assinalaram que o Por exemplo (grosso modo), uma pessoa que
paradigma de equivalência tem sido utilizado odeia comunistas, e nunca interagiu com um
para o estudo das atitudes e apontam que as professor universitário, ao ser ensinada que
atitudes são entendidas como comportamentos. professores universitários são comunistas pode
Assim, atitudes ocorrem a depender da histó- passar a odiá-los e, nesse sentido, haveria uma
ria prévia de reforçamento à qual o indivíduo transferência do ódio direcionado aos comu-
foi exposto. Mais especificamente, “é possível nistas para os professores universitários por
entender as atitudes como a avaliação de pes- eles fazerem parte de uma mesma classe de
soas, objetos e eventos” (Mizael et. al., 2016, p. estímulos.
126). Nesse sentido, certos grupos (pessoas ou Da mesma forma que relações entre es-
características dessas pessoas) podem passar tímulos que caracterizam preconceito podem
a fazer parte de uma classe de equivalência ser aprendidas e expandidas via classes de
na qual alguns dos estímulos membros sejam equivalência, tais relações podem ser desfeitas
adjetivos pejorativos. Isso ocorre por meio da ou pode-se ensinar relações diferentes ou con-
derivação de relações que não foram treina- trárias. Dito de outro modo, em tese, é possível
das e em razão da possibilidade de substituição “desfazer” o preconceito utilizando-se proce-
entre os estímulos, que adquirem funções uns dimentos destinados a promover a reorgani-
dos outros. zação de classes de equivalência. Analistas do
Vejamos um exemplo associado ao pre- comportamento têm investigado a formação
conceito racial. Imagine-se, então, que ao longo e reorganização de classes de equivalência de
da história de aprendizagem de um indiví- estímulos utilizando estímulos com significa-
duo, as relações “negro-pobre” e “pobre-coi- do social como, por exemplo, fotografias de
tado” tenham sido estabelecidas, porque no homens Brancos e homens Negros, de pessoas
convívio familiar e na escola tais associações do Oriente Médio e profissões (e.g., de Carvalho
fossem repetidas e reforçadas. Nessa condição, & de Rose, 2014; Dixon & Lemke, 2007; Mizael,

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 3 | 51


Preconceito e controle de estímulos
Márcio Borges Moreira, Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos & Michelli Carrijo Cameoka

de Almeida et al., 2016; Rosendo & Melo, 2018). a compreensão científica do preconceito. Em
Os estímulos utilizados nessas pesquisas refe- alguns deles, no entanto, têm sido reportadas
riam-se a grupos ou indivíduos alvos de algum variabilidade no desempenho de participantes
tipo de preconceito. ou mesmo a ausência da reversão ou da trans-
Em conjunto, os resultados dessas pes- ferência de função (e.g., de Carvalho & de Rose,
quisas têm demonstrado que procedimentos 2014; Haydu, Camargo, & Bayer, 2015; Portela,
de emparelhamento de acordo com o modelo 2014; Rosendo & Melo, 2018).
(MTS) podem produzir a formação de classes Alguns dos estudos que reportaram resul-
de equivalência com estímulos com e sem tados inconclusivos ou negativos propuseram
significado social, bem como promover reor- que parte desses resultados pode ser explicada
ganização dessas classes e, em alguns casos, pelas características dos estímulos, que podem
reversão ou diminuição de certas atitudes pre- exercer controle sobre o comportamento dos
conceituosas em contexto experimental (Dixon participantes de maneira não especificada
& Lemke, 2007; Mizael, de Almeida et al., 2016). pelos pesquisadores, conforme apontado por
A seguir, apresentaremos algumas dessas pes- de Carvalho e de Rose (2014). Nessa pesquisa,
quisas, relacionando seus resultados a questões de Carvalho e de Rose buscaram modificar re-
de controle de estímulos. lações de equivalência verificadas com quatro
crianças em um pré-teste no qual relacionaram
Controle de Estímulos, Formação e Reversão de faces de pessoas Negras com símbolos conside-
Classes de Equivalência rados de valor negativo.
As crianças passaram por treinos que ob-
Considerando-se que preconceito é com- jetivaram estabelecer, inicialmente, a relação
portamento operante, ele pode ser medido como AB, de símbolos positivos (A) com símbolos
qualquer outro operante. Partindo da definição abstratos (B), e posteriormente a relação BC,
de comportamento operante discriminado, é entre símbolos abstratos (B) e faces de Negros
possível a realização de uma análise do pre- (C). Por fim, foi feito um treino misto, unindo
conceito, ou melhor, de comportamentos que AB e BC, e um pós-teste, no qual, assim como
podem ser caracterizados como exemplares de haviam feito no pré-teste, as crianças deveriam
preconceito, levando em consideração nessa relacionar os símbolos positivos e negativos (A)
análise as variáveis de controle presentes e o com as faces (C). Ou seja, os autores buscaram
processo de aprendizagem envolvido. fazer com que, por meio dos treinos da relação
A partir dessa premissa, diversos estudos de símbolos positivos com imagens abstratas
têm procurado demonstrar transferência de (AB) e das imagens com as faces (BC), emer-
função ou reversão de classes de equivalência gisse a relação entre os símbolos positivos e as
com estímulos socialmente relevantes. Em prin- imagens de Negros (AC), revertendo a associa-
cípio, tais pesquisas podem contribuir para uma ção negativa verificada no início do estudo (de
compreensão mais aprofundada dos processos Carvalho & de Rose, 2014).
envolvidos no surgimento e na manutenção Segundo de Carvalho e de Rose (2014),
do preconceito. Mais ainda, haveria potencial apenas uma das quatro crianças demonstrou
para o desenvolvimento de estratégias compor- reversão das classes de equivalência, isto é,
tamentais para sua superação. Tais estudos têm mudou de atitude. Os autores argumenta-
apresentado contribuições inestimáveis para ram que o histórico pré-experimental dos

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 3 | 52


Preconceito e controle de estímulos
Márcio Borges Moreira, Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos & Michelli Carrijo Cameoka

participantes pode ter exercido maior controle com um círculo, ou somente com a cor verde,
sobre seu comportamento do que as relações ou apenas com a cor vermelha, e nenhuma
treinadas no experimento. Além disso, apon- resposta era reforçada.
taram que as faces utilizadas como estímulos Após os treinos, o autor identificou que o
podem ter exercido controle sobre as respostas triângulo no fundo vermelho passou a exercer
dos participantes devido às emoções expressas controle discriminativo sobre a resposta de bi-
e sugeriram, portanto, que estudos futuros bus- cadas de ambos os pombos, tendo em vista que
cassem uma metodologia mais formal para a eles passaram a bicar o disco quase que apenas
seleção das faces. diante desse estímulo. Por outro lado, ao apre-
Nessa mesma direção, de Carvalho (2010), sentar os estímulos decompostos, a frequência
na dissertação que deu origem ao trabalho de de respostas do pombo 105 foi maior diante
de Carvalho e de Rose (2014), após não ter ob- do triângulo e menor diante da cor vermelha,
servado a reversão da relação entre faces de mesmo com a condição sendo apresentada em
Negros e atributos negativos, argumentou que extinção, ou seja, sem a presença de reforço.
alguns participantes possivelmente estivessem Já para o pombo 107, a maior quantidade de
“respondendo não apenas à cor dos homens respostas aconteceu diante da cor vermelha
das fotos, mas também aos olhos, à boca e ao (Reynolds, 1961). O autor apontou que, mesmo
cabelo” (de Carvalho, 2010, p. 72), destacando que a resposta de ambos os pombos tenha
assim algumas características, para além da ex- sido reforçada diante do estímulo composto,
pressão de emoção, que podem ter prejudicado triângulo com o fundo vermelho, as respostas
a discriminação controlada pela característica estavam sob controle de apenas uma das pro-
de interesse na pesquisa. priedades do estímulo.
De fato, estudos sobre controle de estímu- Com relação ao preconceito, Cameoka e
los têm demonstrado que partes específicas dos Moreira (2021) realizaram três estudos com o
estímulos podem exercer controle sobre o com- objetivo de verificar como diferentes caracte-
portamento (e.g., Moreira et al., 2017; Reynolds, rísticas de faces de homens Negros e Brancos
1961). Reynolds (1961), por exemplo, buscou poderiam afetar o comportamento de avaliação
variar características físicas dos estímulos e dos participantes acerca dessas faces e busca-
observar o comportamento de dois pombos (de- ram, também, observar se haveria a criação de
nominados 105 e 107) diante dessas variações. vieses nessa avaliação, a depender da seleção
Um disco foi iluminado com dois estímulos dos estímulos. As avaliações foram realizadas
compostos, ora sendo um triângulo branco em utilizando-se uma escala tipo Likert ancorada
um fundo vermelho, ora um círculo branco em nos adjetivos mau (1) e bom (10).
um fundo verde. Cada um desses estímulos era As fotografias utilizadas variaram no que
apresentado por três minutos e, dentro desse diz respeito aos tons de pele branca e negra,
período, a resposta de bicar o triângulo com cabelo e fisionomia, mas todas estavam cen-
fundo vermelho, era reforçada com alimento, tralizadas do ombro para cima e os homens
mas se essa resposta ocorresse diante do círculo estavam olhando para frente, sem camisa e sem
com fundo verde, nenhuma consequência era adereços. No Estudo 1, os homens apresenta-
fornecida. No teste subsequente, os estímulos vam expressões neutras e no Estudo 2 sorrisos
foram decompostos, de modo que o disco foi discretos. Já no Estudo 3, foram utilizadas as
iluminado ora só com o triângulo, ou apenas fotografias que nos estudos anteriores haviam

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 3 | 53


Preconceito e controle de estímulos
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obtido as mais altas avaliações para os Brancos do que nas classes que continham rostos irrita-
e as mais baixas para os Negros. Dessa forma, dos (Bortoloti & de Rose, 2009, 2011). Cameoka
no terceiro estudo, buscou-se observar a pos- e Moreira destacaram que os resultados suge-
sibilidade de viés das avaliações a partir de rem ainda ser necessário investigar em mais
um critério arbitrário de seleção de estímulos detalhe a influência de diferentes característi-
(Cameoka & Moreira, 2021). cas de faces humanas sobre comportamento de
No Estudo 1, das 10 faces de Negros e avaliar no contexto de pesquisas sobre atitudes
das 10 faces de Brancos utilizadas, seis e duas, raciais, particularmente em estudos baseados
respectivamente, tiveram avaliações positi- no paradigma de equivalência de estímulos.
vas, observando-se variações nas avaliações
de faces dentro de um mesmo grupo racial. Considerações finais
No que tange ao Estudo 2, os autores obser-
varam que a avaliação de todas as faces, para Neste capítulo, relações entre preconceito
ambos os grupos, foi positiva, com aumento e controle de estímulos foram discutidas a partir
estatisticamente significativo das médias ao se do referencial teórico da análise do comporta-
comparar com o primeiro estudo. Por fim, no mento, por meio de uma caracterização do pre-
Estudo 3, as avaliações se mantiveram entre conceito como um comportamento operante
neutras ou positivas, sendo que neste estudo e, principalmente, como um comportamento
a diferença entre a média das avaliações das operante discriminado, ou seja, sob controle
faces de Negros e de Brancos não foi estatisti- de diferentes propriedades ou dimensões dos
camente significativa, contrastando com o que estímulos.
ocorreu nos estudos anteriores e sugerindo que Foram apresentadas pesquisas analíti-
a seleção das fotografias com base nas avalia- co-comportamentais que exemplificam como
ções nos Estudos 1 e 2 produziu viés avaliativo diferentes controles de estímulos podem afetar
(Cameoka & Moreira, 2021). o que chamamos de preconceito, entendido de
Cameoka e Moreira (2021) discutiram que maneira ampla como uma atitude negativa em
as diferenças de avaliação observadas dentro relação a determinados grupos ou pessoas. Ao
de um mesmo grupo de estímulos fortalecem mesmo tempo, chamou-se a atenção para as
a proposição de que diversas variáveis, dentre dificuldades encontradas em estudos que ten-
as quais a cor da pele e traços fisionômicos, taram demonstrar transferência de função ou
poderiam estar controlando o comportamento reversão de classes de equivalência com estí-
de avaliar dos participantes. Além disso, o au- mulos socialmente relevantes, nos quais têm
mento da frequência de avaliações positivas do sido reportados resultados inconclusivos ou
Estudos 1 para o Estudo 2 apontou para uma in- mesmo a ausência da reversão ou da transfe-
terferência da expressão de emoção como algo rência pretendidas.
que pode refletir no controle experimental, o Propomos que os resultados incongruen-
que converge com outros achados na literatura tes podem ser explicados, ao menos em parte,
da análise do comportamento em estudos com pelas características dos estímulos utilizados
classes de equivalência compostas por estímu- nesses estudos, cujo controle sobre o compor-
los arbitrários e imagens de rostos expressan- tamento dos participantes pode ter ocorrido
do emoções, os quais relataram relações mais de maneira diferente daquela prevista pelos
fortes nas classes que continham rostos felizes pesquisadores. Essa proposição foi fortalecida

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 3 | 54


Preconceito e controle de estímulos
Márcio Borges Moreira, Bárbara de Sousa Ribeiro dos Santos & Michelli Carrijo Cameoka

pelos resultados relatados por Cameoka e The Psychological Record, 59, 563–590.
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ça de um discreto sorriso nas faces utilizadas Bortoloti, R., & de Rose, J. C. C. (2011). An
como estímulos alterou significativamente as “Orwellian” account of stimulus equiva-
avaliações dos respondentes em relação a essas lence: Are some stimuli “more equivalent”
faces, tanto de Negros quanto de Brancos. than others? European Journal of Behavior
Por fim, argumentamos que os campos da Analysis, 12, 121–134. https://doi.org/10.1
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sobre priming com faces humanas em pesquisas Cameoka, M. C., & Moreira, M. B. (2021).
de preconceito racial e estereótipos (Stepanova Preconceito racial: Viés na mensuração
et al., 2016), que demonstram a necessidade de de atitudes produzido por controle de
controle meticuloso dos estímulos utilizados. estímulos. Acta Comportamentalia, 29(1),
De sua parte, a perspectiva da análise do com- 93–112.
portamento oferece um modelo empiricamente Catania, A. C. (1999). Aprendizagem:
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Comportamento em Foco, v. 13, cap. 3 | 58


COMPORTAMENTO
pp. 59—70
EM FOCO VOL. 13

André Luiz (1) Julia Röcker dos Santos (2)


Contribuições da Economia andre.luiz@up.edu.br julia.rocker.santos@uel.br
Guilherme Corrêa Cabeças (2) Carlos Eduardo Costa (2)
Comportamental Operante guicorreacabec@gmail.com caecosta@uel.br

para situações de pandemia: Ariela Oliveira Holanda (3)


ariela.holanda@gmail.com
Patrícia Luque (4)
patricialuque@hotmail.com
uma proposta de investigação1 Myenne Mieko A. Tsutsumi (1, 5)
myennetsutsumi@gmail.com
(1) Universidade Positivo – Faculdade Londrina
Contributions of the Operant Behavioral (2) Universidade Estadual de Londrina
Economics to pandemic’s situations: a research (3) Instituto Federal do Paraná
(4) Instituto Brasiliense de Análise do Comportamento
proposal (5) Pontifícia Univ. Católica do Paraná

Resumo Abstract
Desde o início de 2020, o mundo enfrenta a Since the beginning of 2020, the world is dea-
pandemia da COVID-19 e seus impactos so- ling with the Coronavirus 2019-nCoV (COVID-
ciais, econômicos e políticos. Estudos têm sido 19) pandemic and its social, economic, and
desenvolvidos para entender e predizer como political impacts. Several studies have been
as pessoas se comportam durante a pande- developed to understand and predict how
mia e quais variáveis podem influenciar people behave under this circumstance and
comportamentos de prevenção. Conceitos which variables can affect the occurrence of
da Economia Comportamental Operante preventive behaviors. Focusing on undergra-
podem ajudar nessa tarefa. Descreve-se bre- duate students, we discussed how sunk-time
vemente o que é a Economia Comportamental and framing, two groups of events used by
Operante e como utilizá-la para analisar o Operant Behavior Economics to examine
comportamento humano durante contextos choice behaviors, can affect human beha-
de pandemia. Em seguida, é apresentado um vior under pandemic situations. Further, we
método de pesquisa baseado em questioná- described a research method based on online
rios online para examinar os efeitos de duas questionnaires that can be used to exami-
variáveis principais (i.e., sunk-time e framing) ne the effects of sunk-time and framing on
sobre como as pessoas descrevem que se how people describe they would behave in
comportam em situações hipotéticas envol- hypothetical situations involving preventive
vendo medidas de prevenção. Esperamos measures. We hope this work sets the stage
que o presente trabalho possa servir como for future research about human behavior
mecanismo de estudos e fundamentação de during pandemic situations and, especially,
projetos de iniciação científica e de trabalhos serves as a theoretical basis for undergradua-
de conclusão de curso (TCC) para estudantes tes interested in Operant Behavior Economics.
de graduação interessados neste campo do
conhecimento.
Palavras-chave Keywords
Economia Comportamental; Análise do Behavioral economics; behavioral analysis;
Comportamento; Pandemia; COVID-19; pandemic; COVID-19; social distancing.
Distanciamento Social.

1 O presente capítulo é derivado de um Simpósio apresentado no XXIX Encontro da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina
Comportamental, realizado no dia 05 de Setembro de 2020, sob o título: Simpósio REDETAC.

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Economia Comportamental e pandemia
Luiz, A.; Santos, J. R.; Cabeças, G. C.;Costa, C. E.; Holanda, A. O.; Luque, P.; & Tsutsumi, M. M. A.

O presente capítulo é de cunho didático completamente consciente das variáveis que


e especialmente voltado para estudantes de controlam seu comportamento, minimizando
graduação em Psicologia. Para tanto, busca- custos e maximizando seus ganhos a longo
-se explicar brevemente o que é a Economia prazo (Reed, Niileksela & Kaplan, 2013). A
Comportamental Operante e como ela pode Economia Comportamental é uma área que
ser usada para entender e prever tomadas interliga a Psicologia às Ciências Econômicas
de decisões durante contextos de pandemia. (Franceschini & Ferreira, 2012; Hursh, 1984) e
Em seguida, serão descritos dois fenômenos possui como objeto de estudo o comportamento
frequentemente observados em cenários de humano, em especial, os processos de tomada
tomadas de decisão, quais sejam: sunk-time e de decisão. Em contraste com as teorias eco-
framing. Adicionalmente, será apresentado um nômicas tradicionais, pesquisas em Economia
possível método de estudo com base em ques- Comportamental sugerem que os humanos nem
tionários online que pode ajudar a avaliar os sempre tendem a ser racionais e a otimizar as
efeitos das variáveis envolvidas em ambos os suas escolhas (Thaler, 2016). Entretanto, termos
fenômenos no relato das pessoas sobre como como racional e irracional pouco esclarecem
se comportariam em situações hipotéticas en- acerca de quais são as variáveis responsáveis
volvendo medidas de prevenção do contágio pelo comportamento de escolha. Rachlin (2003)
de vírus (por exemplo, o 2019-nCoV), como o propõe que o conceito de escolha racional não
distanciamento social. Com essa apresentação, deve ser explicado a partir de definições in-
pretende-se identificar maneiras de coletar ternalistas, como heurística e lógica, mas por
dados em situações de pandemia e descrever meio de ferramentas conceituais teóricas que
como a Economia Comportamental Operante proponham uma explicação comportamental
pode ser utilizada na análise dos dados cole- do objeto de investigação.
tados. Esperamos que o capítulo possa servir Em uma perspectiva da Economia
como mecanismo de estudos e fundamentação Comportamental Operante, busca-se entender,
de projetos de iniciação científica e de trabalhos com base na análise da história de vida e em
de conclusão de curso (TCC) para estudantes de variáveis contextuais atuais, as razões pelas
graduação interessados neste campo do conhe- quais uma pessoa toma algumas decisões em
cimento. Dessa forma, leitores mais experientes detrimento de outras (ver Skinner, 1989). Nesse
na literatura de Economia Comportamental sentido, as relações organismo-ambiente, his-
Operante podem recorrer a outros textos (e.g., tóricas e atuais, tomam o lugar de termos in-
Fantino e Stolarz-Fantino 2012; Foxall, 2016; ternalistas, como “racional” e “irracional” (cf.
Kagel, Battalio & Green, 1995; Magalhães & Foxall, 2016). O conceito de racional pode ser
White, 2016). Isso porque não é objetivo do pre- empregado para nomear os comportamentos
sente capítulo realizar uma revisão sistemática que diminuem de probabilidade quando a re-
da literatura sobre Economia Comportamental lação resposta-reforço é quebrada ou quando
Operante, mas sim descrever uma possibilida- o custo (e.g., quantidade de tempo gasto, esfor-
de de pesquisa com formulários para coleta de ço despendido, perda de reforçadores etc.) é
dados. maior do que o benefício (reforçadores obtidos)
Tradicionalmente, a Economia enten- e o conceito de irracional seria o oposto (ver
de que as pessoas tomam decisões de ma- Magalhães & White, 2016, para uma definição
neira racional, comportando-se de forma semelhante, mas, talvez, menos abrangente).

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Na Tabela 1, que será apresentada mais adiante Wisconsin, na qual haviam investido US$50.
neste capítulo, os termos racional e irracional Dos 61 participantes, 33 optaram pela viagem
aparecerão com suas definições de um ponto para Michigan, na qual investiram mais dinhei-
de vista da Economia Comportamental e da ro, mesmo informados que aproveitariam mais
Economia Comportamental Operante. a viagem para Wisconsin.
Entre as variáveis que podem afetar a Dando continuidade à investigação, Arkes
tomada de decisão estão a quantia em dinheiro, e Blumer (1985, Experimento 2) avaliaram o
o esforço ou o tempo investido em alguma situ- efeito sunk-cost em um contexto aplicado, uti-
ação e as mudanças contextuais na formulação lizando a venda de ingressos de um evento do
de problemas que as pessoas precisam resolver. Departamento de Teatro da Universidade de
Estudos demonstraram que quanto maior o in- Ohio. Para isso, forneceram descontos a alguns
vestimento financeiro em uma atividade, maior dos compradores, visando avaliar a frequência
é a probabilidade de que as pessoas persistam de comparecimento dos consumidores que pa-
nessa atividade, mesmo que a possibilidade de garam menos para assistir às peças em relação
ganho seja reduzida. Assim, a persistência na ati- aos consumidores que pagaram o “preço cheio”,
vidade não ocorre em razão das consequências sem desconto. Nesse experimento, foram ven-
provenientes da permanência no curso da ação didos três tipos de ingressos: 18 ingressos de
(e.g., Arkes & Blumer, 1985; Bragger, Bragger, valor normal, custando US$15; 19 ingressos
Hantula & Kirnan, 1998; Magalhães & White, custando US$13 e 17 ingressos custando US$8.
2016; Moon, 2001; Navarro & Fantino, 2009). A venda dos ingressos foi realizada seis meses
Esse fenômeno é chamado de efeito sunk-cost antes do evento. Os resultados indicaram que
e tem sido estudado por meio da aplicação de os participantes que pagaram o valor integral
questionários e da exposição de humanos e não do ingresso (US$15) compareceram mais ao
humanos a tarefas experimentais (e.g., Arkes & evento do que os participantes dos grupos com
Blumer, 1985; Navarro & Fantino, 2005; 2009). desconto, pelo menos nas peças iniciais. Os au-
Arkes e Blumer (1985) investigaram como tores destacaram a importância desses resulta-
investimentos anteriores em um curso de ação dos, visto que o efeito sunk-cost foi observado
poderiam afetar a escolha do participante entre mesmo tendo se passado seis meses desde a
persistir na alternativa inicial (na qual já foi compra dos ingressos.
investido dinheiro) ou investir em uma nova Utilizando novamente questionários, no
alternativa (em que ainda não foi investido di- Experimento 3, Arkes e Blumer (1985) avalia-
nheiro, mas que poderia gerar mais benefícios). ram os efeitos sunk-cost com o uso de cenários
No Experimento 1, os participantes eram infor- hipotéticos apresentados a 48 participantes.
mados de que já haviam gasto US$100 em uma Cada participante era informado de que ele
passagem para Michigan e, semanas depois, desempenhava o papel de presidente de uma
por engano, teriam comprado uma passagem companhia aérea e já havia investido 10 mi-
de US$50 para Wisconsin no mesmo dia da lhões de dólares em um projeto de pesquisa
passagem para Michigan. Adicionalmente, di- para construir um avião que não seria detecta-
zia-se que a viagem para Wisconsin seria mais do por radares convencionais. Após a execução
divertida. Sabendo disso, os participantes deve- de 90% do projeto, outra empresa começou a
riam decidir em qual viagem ir: para Michigan, anunciar um avião que também não seria de-
na qual já haviam investido US$100, ou para tectado por radares convencionais, mais rápido

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e econômico do que o avião que estava sendo tempo em uma atividade (e.g., Bragger et al.,
feito pela empresa do participante. Diante disso, 1998; Moon, 2001; Navarro & Fantino, 2009):
o participante poderia escolher entre continuar se quanto maior o tempo despendido em uma
investindo para terminar os 10% restantes do atividade, maior seria a probabilidade de que
projeto ou abandoná-lo. Cerca de 85% dos par- as pessoas optassem por continuar investindo
ticipantes optaram por continuar investindo no nela. Navarro e Fantino (2009), por exemplo,
projeto inicial, sugerindo a ocorrência do efeito testaram o efeito do tempo despendido em
sunk-cost e replicando os resultados obtidos nos uma atividade sobre a escolha de continuar
Experimentos 1 e 2 de Arkes e Blumer. ou desistir dela. Respondendo a questionários
Navarro e Fantino (2005, Experimento com situações hipotéticas nos Experimentos
1) realizaram um estudo para investigar se o 1-4, os participantes deveriam escolher entre
efeito sunk-cost também poderia ser observado continuar ou desistir da realização de uma
em animais não humanos. Nesse caso, o inves- tarefa, sem a necessidade de realizá-la. Nesses
timento em determinada alternativa era men- experimentos, os cenários descritos informa-
surado pelo número de respostas despendido vam ao participante o tempo despendido na
na obtenção da consequência anterior. Quatro atividade até aquele momento, que poderia
pombos poderiam responder em duas chaves ser de nenhum dia, um mês ou dois meses. Os
de resposta: uma em que vigorou um programa participantes cujos cenários informavam que
de reforço de Razão Fixa (FR) e outra chama- o tempo já despendido na atividade era mais
da de “chave de fuga”. O valor da razão em longo (i.e., um mês e dois meses) relataram que
vigor era selecionado aleatoriamente em cada optariam por persistir realizando a atividade
tentativa, sendo que, em metade das tentativas mais vezes do que os participantes cujos cená-
vigorou um FR 10, em 1/4 das tentativas vigo- rios informavam que o tempo já despendido
rou um FR 40 e em 1/8 das tentativas vigorou na atividade era mais curto (i.e., zero dias). Nos
um FR 160. Completar a razão resultava em Experimentos 5-7, os participantes deveriam
acesso a comida por 3 s. Responder na chave escolher entre continuar ou desistir da realiza-
de fuga encerrava a tentativa em vigor e inicia- ção de uma atividade em que, de fato, haviam
va uma nova tentativa, com a razão diferente, se engajado durante o experimento. Nesses ex-
em geral, menor do que a razão que estava perimentos, as sessões poderiam durar até 75
sendo exigida. Os resultados demonstraram min, e os participantes poderiam ser expostos
que três dos quatro pombos completaram as a uma de duas condições: “Curta”, na qual eles
razões mais altas, persistindo consistentemente realizavam a atividade preliminar por 50 min,
entre tentativas a despeito da possibilidade de e a atividade principal por 10 min; ou “Longa”,
“desistir do investimento” ao bicar a chave de na qual eles realizavam a atividade prelimi-
fuga. Resultados semelhantes foram obtidos nar por 10 min, e a atividade principal por 50
por Magalhães, White, Stewart, Beeby e Van min. A atividade proposta era trabalhar em
der Vliet (2012) também utilizando ratos. quebra-cabeças de 500 peças, o que, segundo
Alguns estudos investigaram se o efeito os autores, impossibilitava os participantes de
sunk-cost, já observado com investimentos mo- terminarem a atividade antes do fim da sessão.
netários e de esforço (i.e., número de respostas Os resultados indicaram que os participantes
emitidas por animais não humanos), também que passaram pela condição “Longa” optaram
poderia ser observado com o investimento de por persistir na realização da atividade mais

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vezes do que os participantes que passaram dos participantes optaram pelo Programa A.
pela condição “Curta”. Portanto, foi observado No Problema 2, os participantes poderiam es-
o efeito sunk-cost em ambos os experimentos colher entre o Programa C, em que 400 das 600
(a partir de agora denominado sunk-time, por pessoas morreriam; e o Programa D, em que
se referir a tempo). Ou seja, os resultados dos havia 1/3 de chance de que ninguém morresse;
experimentos realizados demonstraram que a e 2/3 de chance de que 600 pessoas morressem.
probabilidade de escolha de uma determina- Nesse caso, 78% dos participantes optaram pelo
da alternativa teve correlação positiva com o Programa D. No Problema 2, foram apresen-
tempo já investido nessa alternativa, a despeito tados programas com a mesma efetividade
da existência de alternativas que ofereciam con- dos programas apresentados no Problema 1,
sequências mais vantajosas. Adicionalmente, contudo, os resultados da aplicação dos pro-
esses resultados foram obtidos tanto por meio gramas C e D foram descritos em termos do
do uso de questionários com situações hipo- número de pessoas que morreriam; enquanto
téticas, quanto pela realização propriamente os resultados da aplicação dos programas A e B
dita das atividades. A replicação dos resultados foram descritos em termos do número de vidas
entre os Experimentos 1-4 e os Experimentos que seriam salvas com cada um dos programas.
5-7 de Navarro e Fantino (2009) sugere que, Logo, mudanças na formulação de problemas
para condições semelhantes, resultados obtidos produziram alterações na preferência por uma
por questionários podem servir como predi- ou outra alternativa.
tores de como as pessoas se comportarão se Levin e Gaeth (1988) também realizaram
realmente expostas às contingências. um estudo para avaliar os efeitos do framing
Além do sunk-time, a forma de apresen- sobre a opinião dos consumidores. Para isso,
tação das alternativas também pode alterar o 96 estudantes de graduação foram distribuídos
padrão de escolha, o que é conhecido como em dois grupos: o primeiro grupo degustaria
efeito de framing e pode ser observado em dife- pedaços de carne após ver o rótulo e o segundo
rentes contextos (DeHart et al., 2018; Tversky & grupo degustaria pedaços de carne antes de
Kahneman, 1981). Tversky e Kahneman reali- ver o rótulo. O rótulo apresentado descrevia a
zaram um experimento com estudantes univer- carne como sendo 75% magra para metade dos
sitários em que apresentaram dois problemas participantes – o que foi chamado pelos autores
hipotéticos, diante dos quais o participante de- de framing positivo – e para a outra metade, a
veria escolher entre dois programas governa- carne era descrita como tendo 25% de gordura
mentais a serem implementados para enfrentar – o que foi chamado pelos autores de framing
uma doença. Os dois problemas eram idênticos, negativo. Após a degustação, ambos os grupos
mas as opções de programas foram descritas respondiam à avaliação, em uma folha, infor-
de maneiras diferentes. No Problema 1, foram mando se tinham considerado a carne saboro-
apresentados dois programas para enfrentar sa, gordurosa, de alta ou baixa qualidade e se a
uma doença que mataria 600 pessoas: Programa carne era gorda ou magra. Os resultados mos-
A e Programa B. Adotando o Programa A, 200 traram que os participantes avaliaram melhor
pessoas seriam salvas; e adotando o Programa a carne quando ela foi apresentada como sendo
B, haveria 1/3 de chance de que 600 pessoas 75% magra (framing positivo) e a ordem de
se salvassem, e 2/3 de chance de que ninguém apresentação do rótulo e degustação da carne
fosse salvo. Os resultados apontaram que 72%

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não resultou em diferenças significativas nas última fase, os participantes da categoria “busi-
opiniões dos participantes. ness people” recebiam o feedback dos “public
Lambsdorff e Frank (2010) também in- officials” e poderiam escolher entre denunciar
vestigaram os efeitos de framing em um ex- ou não os participantes da categoria “public of-
perimento sobre corrupção. Os participantes ficials”. Os resultados não demonstraram dife-
foram distribuídos em duas categorias: “busi- renças na reação dos “public officials” quando
ness people” e “public officials”. Em uma pri- o pagamento era chamado de propina ou pre-
meira fase experimental, os participantes da sente. Contudo, uma diferença foi encontrada
categoria “business people” deveriam realizar nos resultados da terceira fase, em que os par-
um pagamento aos participantes da categoria ticipantes da categoria “business people” po-
“public officials” em nome de sua empresa, e deriam denunciar ou não os “public officials”:
deveriam decidir se chamariam essa transação os participantes “business people” que chama-
de “propina” ou “presente”. Na segunda fase, ram o pagamento de propina demonstraram
os participantes da categoria “public officials” maior probabilidade de denunciarem o com-
poderiam escolher como reagir ao pagamento: portamento oportunista dos “public officials”
(1) denunciar; (2) aceitar o pagamento sem fa- do que aqueles que chamaram o pagamento
vorecer a empresa que enviou (oportunismo) de presente.
ou (3) aceitar o pagamento e favorecer a em- A Tabela 1 apresenta as definições dos
presa que enviou (reciprocidade). Na terceira e termos racional, irracional, sunk-time e framing

Tabela 1
Definições de alguns termos a partir da Economia Comportamental e da Economia Comportamental
Operante
Teoria
Economia Comportamental Economia Comportamental Operante
Conceito
Comportamentos que diminuem de probabili-
Uma escolha é considerada racional quando dade quando a relação resposta-reforço é que-
apenas consequências futuras são levadas em brada ou quando o custo (e.g., quantidade de
Racional
consideração no processo de tomada de decisão tempo gasto, esforço despendido, perda de refor-
(Tversky & Kahneman, 1981). çadores) é maior do que os reforçadores obtidos
(cf. Magalhães & White, 2016).
Uma escolha é considerada irracional quando Comportamentos que continuam ocorrendo
variáveis além das consequências futuras são quando a relação resposta-reforço é quebrada
levadas em consideração no processo de tomada ou quando o custo (e.g., quantidade de tempo
Irracional
de decisão, como, por exemplo, o tempo, dinhei- gasto, esforço despendido, perda de reforça-
ro ou esforço investido em uma alternativa (cf. dores) é maior do que os reforçadores obtidos
Tversky & Kahneman, 1981). (cf. Magalhães & White, 2016).
Tendência de continuar um investimento ou Tendência de persistir em um curso de ação em
realizar uma ação mesmo que tenha custos fu- razão de investimentos anteriores nessa opção,
Sunk-time turos mais altos do que benefícios, seja custos e não em razão das consequências programadas
de tempo, dinheiro ou esforço que foram incor- ou sinalizadas para a permanência nesse curso de
ridos anteriormente (Arkes & Blumer, 1985). ação (Magalhães & White, 2016).
É a concepção do indivíduo sobre os re-
sultados de uma escolha. A escolha é in-
É a forma de estruturação do contexto em que
fluenciada pela forma de apresentação das
Framing uma oportunidade de escolha é apresentada
alternativas e também por normas, hábi-
(DeHart et al., 2018).
tos e características pessoais do indivíduo
(Tversky & Kahneman, 1981).

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tanto para uma abordagem da Economia no processo de tomada de decisão de perma-


Comportamental “tradicional” quanto para a necer ou romper o distanciamento social pode
Economia Comportamental Operante. auxiliar no desenvolvimento de intervenções
Sabendo que variáveis como o tempo que sejam eficazes em diminuir a velocidade
investido em uma atividade e a forma de de propagação da COVID-19.
apresentação das alternativas podem afetar a No mundo, segundo a OECD (2017), há
maneira como um indivíduo escolhe ou relata mais de 100 países que utilizam conceitos e
escolher entre alternativas, pode-se utilizar aplicações da Economia Comportamental para
esse conhecimento para tentar compreender direcionar e desenvolver políticas públicas, em
e predizer como as pessoas podem se compor- programas de combate à pobreza, conservação
tar em situações de pandemia, como no caso de recursos hídricos e adoção de comportamen-
da COVID-19. Segundo Cohen e Corey (2020), tos saudáveis pela população. Entre os países
mudanças comportamentais são os primeiros que possuem laboratórios e departamentos
passos para diminuir a disseminação da doença. governamentais organizados para esse fim
Nesse sentido, é imprescindível compreender destacam-se: Alemanha, Austrália, Canadá,
quais comportamentos podem resultar na di- Dinamarca, Estados Unidos, França, Holanda,
minuição efetiva da velocidade de propagação Peru, Reino Unido e Singapura (cf. World Bank,
da COVID-19 (Schiffer, 2020). 2015).
Com base nos estudos sobre sunk-time
Economia Comportamental Operante e Pandemia e framing, podemos questionar se o tempo in-
vestido por uma pessoa no cumprimento de
Desde o fim de 2019, o mundo tem en- medidas de distanciamento e se a forma de
frentado a pandemia do Coronavírus 2019- apresentar informações sobre a pandemia po-
nCoV (COVID-19). Esse cenário impôs inúme- deriam influenciar sua escolha por permanecer
ros desafios como, por exemplo, a tomada de ou não respeitando essas medidas (Navarro &
decisões governamentais para frear a expansão Fantino, 2009; Tversky & Kahneman, 1981). Ou
da pandemia com base em informações limita- seja, será que quanto maior o tempo já investi-
das sobre o funcionamento da doença (Schiffer, do no cumprimento do distanciamento social,
2020). Algumas das mudanças comportamen- maior será a probabilidade de que o indivíduo
tais que podem reduzir a expansão da pande- continue respeitando essas medidas? Será que
mia da COVID-19 são a higienização frequente a forma de escrever notícias e manchetes, de
das mãos e superfícies, a utilização de máscaras apresentar dados sobre a efetividade de medi-
faciais e as medidas de distanciamento social, camentos ou sobre o número de casos e mortes
que consistem na proibição de aglomerações, pode afetar a maneira como as pessoas rela-
na restrição da circulação de pessoas nas ruas, tam que se comportariam durante o período
em estabelecimentos comerciais – mantendo de distanciamento social? Se sim, como a forma
somente os serviços essenciais – e a diminuição de apresentação dessas informações pode in-
do número de passageiros no transporte públi- fluenciar o comportamento dos indivíduos?
co, entre outros protocolos sanitários (Aquino, O esclarecimento de questões como essas é
Silveira, Pescarini, Aquino & de Souza-Filho, essencial para que os meios de comunicação
2020; Secretaria de Vigilância em Saúde, 2020). possam noticiar fatos de forma a aumentar a
Identificar variáveis que possam influenciar probabilidade de que as pessoas continuem

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respeitando o distanciamento social. Nesse Uma possibilidade de investigação


sentido, se observarmos que quanto maior o
tempo já cumprido no distanciamento social, Pesquisas que utilizam questionários
maior é a probabilidade de as pessoas conti- devem se preocupar com a escolha de um
nuarem engajadas nessa medida preventiva, método eficaz de divulgação para conseguir
podemos e devemos elaborar estratégias que um número adequado de participantes e
fortaleçam os comportamentos envolvidos no obter dados significativos de uma população.
distanciamento para que ele perdure enquanto O método snowball sampling é uma forma sim-
for necessário. Ao mesmo tempo, se observar- ples e eficiente para realizar essa divulgação e
mos que determinadas formas de apresenta- tem como objetivo promover uma sequência
ção de dados sobre o andamento da pandemia de envios que caracteriza um aumento pro-
podem afetar a probabilidade das pessoas con- gressivo do tamanho da amostra, de maneira
tinuarem engajadas no distanciamento social, semelhante ao que ocorre com uma bola de
podemos auxiliar os meios de comunicação e o neve que se expande em tamanho de maneira
poder público na elaboração da melhor forma progressiva (Etikan, Alkassim & Abubakaret,
de apresentação desses dados, de maneira a 2015). Inicialmente, uma amostra por conve-
contribuir para o aumento e a manutenção das niência é selecionada e os participantes que
medidas preventivas tomadas pela população. aceitarem participar, após responderem ao
Apesar da necessidade de desenvolver questionário, podem ser solicitados a enviar o
estudos que ajudem a esclarecer as questões questionário a outras pessoas. As pessoas que
levantadas anteriormente, a realização de pes- receberem os questionários enviados pelos par-
quisas que exijam a participação presencial das ticipantes da amostra por conveniência podem
pessoas pode criar situações de risco, como o ser solicitadas a enviar o questionário a novas
contágio do vírus da COVID-19. Portanto, a pessoas e assim por diante.
elaboração de outras formas de pesquisa que Tendo definido um método de divulgação,
não envolvam o deslocamento e a participa- pode-se passar para a elaboração do questioná-
ção presencial das pessoas é essencial para a rio. Há diversas plataformas online para a ela-
continuidade da produção de conhecimento boração de questionários como, por exemplo,
científico sobre o comportamento humano o Google Forms. A montagem do questionário
durante situações de pandemia. Uma dessas pode ser baseada em seções. Dessa forma, po-
formas envolve a utilização de questionários de-se testar os efeitos de diferentes variáveis
online. Obviamente, os dados produzidos por sobre o relato dos participantes, uma em cada
questionários (online ou físicos) se referem ao seção, o que pode permitir uma análise de
comportamento verbal dos participantes em dados mais clara. Considerando a possibilidade
relação ao que é apresentado. Todavia, o com- da elaboração de seções, pode-se separar uma
portamento de relatar do falante permite ao seção para investigar variáveis de sunk-time e
ouvinte (nesse caso, os pesquisadores) inferir outra para investigar variáveis de framing.
quais aspectos das condições relatadas são im- Como descrito anteriormente, variáveis
portantes para quem relata e como isso poderia de sunk-time envolvem a quantidade de tempo
afetar o seu comportamento se for exposto a já investida em uma tarefa. Pensando em um
essas condições (cf. De Rose, 1999; Luna, 1997). contexto de pandemia, pode-se investigar se
diferentes durações de tempo despendidas em

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Economia Comportamental e pandemia
Luiz, A.; Santos, J. R.; Cabeças, G. C.;Costa, C. E.; Holanda, A. O.; Luque, P.; & Tsutsumi, M. M. A.

distanciamento social (ou outras medidas de situações hipotéticas. Um exemplo de situação


prevenção) podem alterar a decisão das pes- hipotética pode ser: “O Brasil está enfrentan-
soas em se manter em distanciamento. Para do uma disseminação mundial de uma nova
tanto, pode-se criar situações hipotéticas como: doença viral (pandemia). Você está seguindo
“você está há 5 dias em distanciamento social. as medidas de isolamento social impostas pelo
O poder público informou que aplicará mais 40 poder público e recebe a informação de que
dias de distanciamento social. Você romperia surgiu um novo remédio para o tratamento da
o distanciamento para realizar atividades não doença. Esse remédio será distribuído gratui-
essenciais?”. Como medida comparativa, uma tamente e contém quantidade suficiente para
segunda situação hipotética poderia manter toda a população. Em estudos realizados com
todas essas informações iguais, mas alterar o esse remédio, das 1000 pessoas que foram trata-
tempo em que a pessoa está em distanciamen- das com ele, 900 sobreviveram. Com base nessa
to social para 15 dias, depois 20 dias, 30 dias notícia, você romperia o distanciamento social
e assim por diante. Como opções de respostas para realizar atividades não essenciais?". Em
pode-se adotar escalas que vão de “certamen- uma segunda alternativa, tudo pode ser man-
te não romperia” a "certamente romperia”. A tido igual ao trecho anterior, porém informan-
partir dessa manipulação é possível avaliar se do ao participante que: das 1000 pessoas que
o tempo já investido no distanciamento social foram tratadas com o remédio, 100 morreram.
afeta a probabilidade de as pessoas continuarem Outra opção de cenário hipotético poderia
se mantendo em distanciamento ao longo da ser:
pandemia. Se observarmos que quanto maior o
“Imagine que você precisa decidir entre
tempo já investido maior é a probabilidade de
duas opções de vacina para o tratamento
as pessoas relatarem que continuariam em dis-
de uma doença letal. A primeira opção
tanciamento, poderíamos considerar a hipótese
oferece a você uma vacina com 75% de
de que criar medidas que estendam a duração
chance de que você sobreviva à doença e
do isolamento é essencial para que as pessoas
25% de que ela não seja eficaz. A segunda
persistam em distanciamento social. Por outro
opção oferece a você uma vacina com 25%
lado, se observarmos que o aumento no tempo
de chance de que você não seja curado
de isolamento tende a diminuir a adesão a essa
de uma doença letal e 75% de chance de
medida, simplesmente estender esse tempo
que você sobreviva à doença. Com base
não constituiria uma estratégia eficaz para a
nessas opções, qual você escolheria?” (cf.
diminuição do contágio. Possivelmente outras
Tversky & Kahneman, 1986).
estratégias teriam de ser elaboradas para for-
talecer a adesão ao isolamento. Por fim, uma terceira opção de cenário
A investigação das variáveis de framing hipotético poderia não estar necessariamente
pode seguir o mesmo raciocínio adotado para relacionada a uma situação de pandemia, mas
as variáveis de sunk-time. Contudo, em vez expor o indivíduo a situações limítrofes nas
de alterar as opções de tempo despendido em quais teria de escolher entre alternativas que
distanciamento social, deve-se criar a apresen- impactariam suas chances ou sua qualidade de
tação de diferentes alternativas para avaliar
se essas diferenças podem afetar as respostas
dos participantes. Para tanto, podem ser criadas

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 4 | 67


Economia Comportamental e pandemia
Luiz, A.; Santos, J. R.; Cabeças, G. C.;Costa, C. E.; Holanda, A. O.; Luque, P.; & Tsutsumi, M. M. A.

vida, à semelhança do que ocorre em cenários Por fim, vale destacar que independen-
de pandemia. Um exemplo disso seria: temente do método a ser utilizado, é essencial
desenvolver pesquisas com o objetivo de in-
“Imagine que você vai realizar um tra-
vestigar quais variáveis estão envolvidas nos
tamento para retirar um tumor. No tra-
processos de tomada de decisão e como essas
tamento para tumores, às vezes há uma
variáveis podem ser manipuladas a fim de
escolha entre um tratamento radical,
favorecer o engajamento das pessoas nas me-
como uma cirurgia extensa, a qual en-
didas de prevenção à COVID-19. A Economia
volve risco de morte iminente. A segunda
Comportamental Operante parece ser uma área
opção envolve um tratamento de risco
promissora para esse tipo de estudo. Pesquisas
moderado, como uma cirurgia limitada
nesse sentido podem auxiliar na elaboração
ou radioterapia. Suponha que você seja
de políticas públicas a fim de estabelecer
um homem de 40 anos de idade e que
programas para manutenção de medidas de
sem tratamento a morte seja iminente
segurança, assim como maneiras de divulga-
(i.e., ocorrerá dentro de um mês) e que
ção de dados sobre a pandemia na mídia que
apenas um dos tratamentos a seguir possa
possam resultar na melhor aplicação e aderên-
ser aplicado: a) 20% de chance de morte
cia a essas políticas de forma preventiva e não
iminente e 80% de vida normal, com ex-
apenas paliativa.
pectativa de longevidade de 30 anos; b)
certeza de uma vida normal, com uma
Referências
expectativa de longevidade de 15 anos.
A partir dessas opções de tratamento,
Arkes, H. R., & Blumer, C. (1985). The psy-
você escolheria a opção com chance de
chology of sunk-cost. Organizational
risco iminente, entretanto maior longe-
Behavior and Human Decision
vidade, ou certeza de uma vida normal,
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porém menor longevidade?” (cf. Tversky
org/10.1016/0749-5978(85)90049-4
& Kahneman, 1986).
Aquino, E. M. L., Silveira, I. H., Pescarini,
Os dados obtidos poderiam ser submeti- J. M., Aquino, R., & de Souza-Filho, J.
dos a análises estatísticas descritivas e inferen- A. (2020). Social distancing measu-
ciais. Seriam utilizadas medidas de tendência res to control the COVID-19 pande-
central (e.g., média e mediana) para a descrição mic: Potential impacts and challenges
do perfil da amostra, sendo calculadas para as in Brazil. Ciência e Saúde Coletiva, 25,
variáveis contínuas, e valores de porcentagens, 2423–2446. https://doi.org/10.1590/1413-
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volume de dados e da distribuição amostral, co- Bragger, J. D., Bragger, D., Hantula, D. A., &
eficientes de correlação de Pearson, Spearman e Kirnan, J. (1998). Hyteresis and uncertain-
Kendall poderiam ser calculados, sempre entre ty: The effect of uncertainty on delays to
as respostas dos participantes e as variáveis exit decisions. Organizational Behavior and
manipuladas (e.g., probabilidade estimada de Human Decision Processes, 74(3), 229–253.
rompimento do distanciamento social e tempo https://doi.org/10.1006/obhd.1998.2779
já dedicado ao cumprimento dessas medidas). Boletim Epidemiológico 06, Centro de Operações
de Emergências em Saúde Pública

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 4 | 68


Economia Comportamental e pandemia
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Comportamento em Foco, v. 13, cap. 4 | 70


COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 13 pp. 71—88

Tecnologias comportamentais Verônica Bender Haydu (1)


para intervenção e prevenção: veronicahaydu@gmail.com

contribuições da Análise do Comportamento1 Raquel Neves Balan (1)


raquel.neves.balan@uel.br

Behavioral technologies for intervention and prevention: (1)


Universidade Estadual de Londrina
contributions from Behavior Analysis

Resumo Abstract
A Análise do Comportamento é composta por Behavior Analysis is composed of three central
três vértices principais: Behaviorismo Radical, vertices: Radical Behaviorism, Experimental
Análise Experimental do Comportamento Analysis of Behavior (EAB), and Applied
(AEC) e Análise do Comportamento Aplicada Behavior Analysis (ABA). EAB and ABA enable
(ABA). A AEC e a ABA possibilitam o desen- the development of behavioral technologies
volvimento de tecnologias comportamentais applicable to different contexts of the psycho-
aplicáveis a diversos contextos da prática logist’s practice. In this chapter, we charac-
do psicólogo. Neste capítulo, caracterizamos terize the concept of behavioral technology
o conceito de tecnologia comportamental and present a brief history of its evolution
e apresentamos um breve histórico de sua in Behavior Analysis. We then summarize
evolução na Análise do Comportamento. Em studies that have produced and evaluated
seguida, apresentamos sínteses de estudos behavioral technologies, as well as pointing
que produziram e avaliaram tecnologias com- out some of their benefits. We conclude that
portamentais, bem como apontamos alguns several Brazilian studies have described the
de seus benefícios. Concluímos que diversos development of technologies based on beha-
estudos brasileiros descreveram o desenvol- vior analytic principles, providing applicable
vimento de tecnologias embasadas em prin- resources to different services. However, we
cípios analítico-comportamentais, fornecen- emphasize the need for additional studies
do recursos aplicáveis a diferentes serviços. that scientifically evaluate the effectiveness
Entretanto, enfatizamos a necessidade de es- of the developed technologies.
tudos adicionais que avaliem cientificamente
a eficácia das tecnologias desenvolvidas.

Palavras-chave Keywords
tecnologia comportamental; tecnologia de behavioral technology; teaching technology;
ensino; análise experimental do comporta- experimental behavior analysis; applied beha-
mento; análise do comportamento aplicada; vior analysis; reinforcement contingencies.
contingências de reforço.

1 O presente capítulo é derivado de uma mesa redonda apresentada no XXIX Encontro da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina
Comportamental, realizada no dia 5 de setembro de 2020, sob o título: Tecnologias comportamentais para intervenção e prevenção: contri-
buições da Análise do Comportamento.

Agências de Fomento: CNPq (bolsa de IC para Raquel Neves Balan). O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

71
Tecnologias comportamentais
Verônica Bender Haydu & Raquel Neves Balan

A Análise do Comportamento, segun- ambiente) e generalizável (programação para


do Tourinho (2003), é uma ciência compos- que as mudanças se estendam a outros am-
ta por três vértices principais: a filosofia do bientes e por longo período de tempo). A partir
Behaviorismo Radical, a Análise Experimental das descrições das sete características da ABA, é
do Comportamento (AEC) e a Análise do possível evidenciar que as intervenções analíti-
Comportamento Aplicada (em inglês, Applied co-comportamentais direcionadas à problemas
Behavior Analysis – ABA). Considera-se que os humanos são inseridas nesse campo de estudo
três campos são complementares, pois as in- e muitas delas podem ser classificadas como
tervenções da ABA devem estar embasadas sendo tecnologias comportamentais. O presen-
nos princípios experimentais da AEC que, por te estudo caracteriza o que é considerado tec-
sua vez, devem estar em concordância com a nologia comportamental e apresenta um breve
epistemologia do Behaviorismo Radical. Em histórico da evolução do conceito na análise do
relação às principais características da AEC des- comportamento. Em seguida são apresentadas
tacam-se: procedimentos com delineamentos sínteses de estudos que produziram e avaliaram
do sujeito único como forma de avaliação do tecnologias comportamentais aplicáveis a dife-
efeito da variável independente (VI) sobre a rentes contextos da atuação do psicólogo, como
variável dependente (VD); definição de critérios o da educação básica, da educação especial, da
de estabilidade (obter variações mínimas entre saúde, do esporte, dos direitos humanos, da clí-
uma observação e outra); garantia da validade nica, do meio ambiente e das organizações. No
interna (se a VI é a variável responsável pela final, são levantadas algumas críticas feitas às
mudança na VD) e da validade externa (ga- aplicações das tecnologias comportamentais
rantir generalização das condições por meio aos problemas humanos e são apresentados
de replicações sistemáticas dos experimentos). argumentos como respostas a essas críticas.
Diversos estudos realizados na AEC não pos-
suem todas essas características, assim é impor- Um pouco de história e caracterização do conceito
tante destacar que os critérios definidos para de tecnologia comportamental
AEC não são absolutos e inflexíveis, no entanto,
são úteis para garantir o controle experimental A expressão “tecnologia comportamen-
necessário na busca de evidências científicas tal” é caracterizada aqui conforme Johnston
dos métodos da ABA e das tecnologias compor- (1991) “para se referir aos resultados da ciência
tamentais produzidas. experimental e aplicada do comportamento”
A caracterização da ABA, segundo Baer, (p. 425). Uma tecnologia cujos procedimentos
Wolf e Risley (1968), envolve sete critérios que devem ser explicados com base em dados de
são: ser aplicável (relevante para a sociedade); pesquisas com detalhamento das variáveis crí-
comportamental (o objeto estudado e alvo da ticas e descrições em termos das leis básicas
intervenção deve ser mensurável); analítica do comportamento. Assim, em vez de focali-
(deve haver controle de variáveis estranhas); zar os procedimentos, analistas do comporta-
tecnológica (descrição da intervenção deve ser mento devem dar ênfase aos comportamentos,
suficiente para replicação por outros pesqui- explicando experimentalmente os processos
sadores); conceitual (embasada em conceitos no nível dos princípios básicos da análise do
do behaviorismo radical); eficaz (assegurar comportamento.
mudanças comportamentais relevantes ao

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 5 | 72


Tecnologias comportamentais
Verônica Bender Haydu & Raquel Neves Balan

No contexto histórico da Análise do avaliaram, por exemplo, se a instrução progra-


Comportamento, pode-se iniciar citando a pro- mada em livros ou em máquinas seria eficiente
posição de uma tecnologia que possibilitou uma para aprendizagem. Dentre eles estão os estu-
incontável quantidade de dados científicos para dos de Daniel e Murdoch (1968), Hamilton e
o estudo do comportamento operante por meio Heinkel (1967), e Marsh e Pierce-Jones (1968).
da análise experimental do comportamento (cf. Esses estudos compararam a instrução pro-
Johnson, 2014; Skinner, 1953). Conforme des- gramada com métodos tradicionais de ensino,
creveu Johnson, para facilitar suas atividades tendo-se verificado resultados estatisticamente
de pesquisa, Skinner integrou às caixas de con- significativos a favor do método proposto por
dicionamento operante um dispositivo que per- Skinner.
mite a liberação automática de reforços (pelotas A Instrução Programada é um método de
de ração) e adicionou um sistema que gerava ensino para a aprendizagem por meio da orga-
um registro em folhas de papel à medida que nização de contingências ambientais. As prin-
cada pelota de ração era liberada. O registro de cipais características da Instrução Programada
repostas reforçadas ao longo do tempo produ- são sucessão de elementos curtos e simples,
zia curvas acumuladas facilmente analisáveis. coordenados por meio de um encadeamento
Assim, “o primeiro registro cumulativo nasceu de acordo com as características de ensino e
e a taxa de respostas repentinamente tornou-se nível de dificuldade de cada aluno. Além disso,
uma variável dependente prática e sensível” Skinner (1972) sugeriu que antes da programa-
(Johnson, 2014, p. 60). Johnson argumentou ção das instruções é necessário apresentar a de-
que Skinner defendia a taxa de resposta como finição dos objetivos de aprendizagem de cada
uma medida da força do comportamento fun- aluno, de modo a conhecer o que o estudante
damentalmente melhor para qualquer ciência já sabe e o que ele ainda precisa aprender.
do comportamento. Outros aspectos que são critérios para esse tipo
Ainda considerando o aspecto histó- de metodologia de ensino são: a apresentação
rico, destacam-se as tecnologias de ensino fragmentada de informações em ordem cres-
(a Instrução Programada e as Máquinas de cente de dificuldade; respostas ativas do aluno
Ensinar) primeiramente citadas por Skinner às perguntas objetivas ou subjetivas; feedback
em 1959. Alguns anos mais tarde, em seu livro imediato das respostas e aprendizado individu-
Tecnologias de Ensino, Skinner (1972) descre- al de acordo com o ritmo de cada aluno.
veu de forma mais sistematizada o método da À medida que a instrução programada foi
Instrução Programada e a maneira de funcio- disseminada para outros países além dos EUA,
namento das máquinas de ensinar. Skinner im- sugiram algumas variantes do modelo, como,
plementou as ideias apresentadas por Pressey no Brasil, o Sistema Personalizado de Ensino
(1926) e propôs uma máquina de ensinar com (Personalized System of Instruction - PSI). O PSI,
recurso de instrução programada. A defesa de elaborado com a colaboração de Fred Keller,
tecnologias de ensino como as máquinas de Carolina M. Bori e Rodolpho Azzi, se caracteri-
ensinar e a instrução programada se baseia no za como uma tecnologia de ensino muito mais
fato de esses recursos maximizarem o êxito e ampla do que a instrução programada, por en-
minimizarem os erros dos estudantes durante volver e possibilitar a programação de cursos
o processo de aprendizagem. Já na década de
1960, foram conduzidos alguns estudos que

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 5 | 73


Tecnologias comportamentais
Verônica Bender Haydu & Raquel Neves Balan

ou disciplinas como um todo (Cândido, 2017). maior imersão do professor em seu próprio
Conforme destacou Nale (1998), papel de educador². Assim, argumenta-se que
as tecnologias de ensino compõem uma grande
“essa tecnologia destaca a importância
parte do que pode ser denominado tecnologia
da proposição de objetivos como pri-
comportamental, uma vez que o conceito im-
meiro passo na programação; a necessi-
plica contingências de reforço que estabelecem
dade de, através de pesquisa empírica,
repertórios comportamentais, tanto na aquisi-
buscar objetivos de ensino para além
ção quanto na extinção de comportamentos.
dos limites determinados pelo que tradi-
cionalmente se ensina; a busca de alter-
Tecnologias comportamentais aplicadas a diferentes
nativas inovadoras para a disposição de
contextos: estudos brasileiros
contingências de ensino; a concepção de
atividades como recurso para o ensino
Um grande número de estudos que des-
de habilidades, conhecimentos, métodos
creveram e avaliaram tecnologias voltadas para
etc.” (p. 275).
diferentes contextos e setores da atuação do
Na instrução programada e no PSI, seja psicólogo podem ser encontradas na literatura
por meio de recursos como livros (e.g. Holland (cf, Tsutsumi, Goulart, Silva Júnior, Haydu, &
& Skinner, 1975) ou maquinas, é possível garan- Jimenéz, 2020; Zamignani, Vilas Boas, & Calixto,
tir aos estudantes um ensino individualizado e 2019), sendo o contexto educacional e o clíni-
ativo (cf. Skinner, 1972), de modo que o papel do co os que recebem maior atenção dos analis-
professor é o de programador de contingências tas do comportamento. Essas tecnologias são
e de auxiliador no processo ensino-aprendiza- compostas por procedimentos de intervenção
gem. Skinner ressalta que essas tecnologias de sistematizados, como o procedimento de ensino
ensino não seriam eficientes para aprendiza- descrito por de Rose, Souza e Rossito (1989) e o
gem por si só, pois seu êxito depende da manei- programa de Formação Permanente na Atenção
ra como os materiais didáticos são organizados ao Usuário de Álcool e Outras Drogas (Borloti,
pelos educadores. Isso significa que os professo- Ramos, & Baltar, 2017). Os estudos que se ca-
res devem programar o instrumento para que racterizam como analítico-comportamentais,
formas específicas de comportamento sejam conforme Johnston (1991, p. 425), “envolvem
emitidas sob controle de estímulos específicos aprender sobre as origens e as fontes atuais de
como contingência para o reforço. Além disso, controle sobre os comportamentos-alvo, bem
essas tecnologias permitem que os professores como identificar e analisar separadamente os
compreendam mais sobre o processo de ensino, elementos de um procedimento para determi-
pois exigem que conheçam o repertório inicial nar o papel de cada um no efeito geral”. Assim,
de seus alunos, os objetivos a serem desenvolvi- a eficácia da tecnologia deve ser avaliada com
dos e a programação da aproximação sucessiva a mensuração da variável dependente antes e
de comportamentos desejáveis. Isso resulta em depois da intervenção, com o intuito de verificar

2 O texto de Bandini e de Rose (2006) é sugerido ao leitor do presente capítulo que se interesse por uma revisão das análises conceituais
das publicações de Skinner que focalizaram as tecnologias que o autor propôs para a melhoria da Educação, com ênfase no livro Tecnologia
do Ensino.

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 5 | 74


Tecnologias comportamentais
Verônica Bender Haydu & Raquel Neves Balan

o efeito da utilização de determinado proce- Destaca-se, no cenário nacional, a tecnolo-


dimento ou recurso sobre o comportamento gia de ensino identificada como o Gerenciador
dos indivíduos; controlar outras variáveis para de Ensino Individualizado por Computador
garantir que o efeito no comportamento tenha (LECH-GEIC) desenvolvido por Capobianco,
sido resultado da tecnologia comportamental Teixeira, Bela, Orlando, de Souza, e de Rose
avaliada; utilizar um delineamento adequado (2009). Esse sistema foi concebido inicialmente
de acordo com os objetivos do estudo, e replicar para o ensino de leitura, mas pode ser utilizado
o estudo para garantir sua validade interna e para o ensino de outros conteúdos e para a rea-
externa. bilitação auditiva de indivíduos surdos e usuá-
No presente capítulo será apresentada rios de implante coclear (cf. Lucchesi, Almeida-
uma breve descrição de diferentes tipos de Verdu, Buffa, & Bevilacqua, 2015). Participaram
tecnologias comportamentais, com ênfase em do estudo de Lucchesi et al. crianças portadoras
materiais como jogos, softwares e manuais, de- de deficiência adutiva e crianças que utilizam
senvolvidos com base nos princípios da Análise implante coclear para avaliar o efeito do pro-
do Comportamento com detalhamento das va- grama de ensino de leitura de palavras na
riáveis críticas. A seleção dos materiais levou melhoria da fala de duas crianças em teste de
em conta o fato desses materiais terem sido leitura e nomeação de figuras. Para isso, foram
avaliados em estudos científicos por pesquisa- ensinadas relações condicionais entre palavras
dores brasileiros. Uma classificação com base ditadas, figuras e palavras impressas. Verificou-
no contexto ao qual a tecnologia é aplicável se que houve um aumento na porcentagem
foi realizada para facilitar aos estudantes de de acertos na nomeação de figuras (relação
Psicologia identificar esses contextos. entre figuras e palavras ditadas) e na leitura
de palavras (relação entre palavras impressas
Tecnologia comportamental aplicada ao contexto e palavras ditadas). Os autores sugerem que o
da educação básica e da educação especial programa de ensino utilizado criou condições
A educação básica e a educação espe- de aprendizagem por meio de uma grande va-
cial são contextos que vêm recebendo grande riedade de tarefas com estímulos e respostas
atenção dos analistas do comportamento. A variadas. Além disso, o procedimento permitiu
produção de tecnologias educacionais foi in- monitorar sistematicamente o desempenho dos
tensificada depois da publicação do estudo participantes e avaliar a tecnologia de ensino,
desenvolvido por Sidman (1971), em que foi bem como programar novas intervenções.
proposto um procedimento de ensino de leitura Ainda com ênfase no ensino de leitu-
a um participante com desenvolvimento atípi- ra, outro exemplo de tecnologia de ensino
co. Esse procedimento passou a fundamentar o consiste em um jogo de tabuleiro intitulado
desenvolvimento de tecnologias para o ensino “AbraKedabra: Construindo Palavras”, de-
de leitura, da escrita, da matemática, de libras, senvolvido por Souza (2007). Essa tecnologia
o ensino de participantes com implante coclear, permite o ensino de relações entre diferentes
e desenvolvimento atípico. O número de tecno- estímulos, como palavras impressas, conjunto
logias de ensino é bastante grande, mas a des- de sílabas, figuras, palavras escritas e palavras
crição aqui é limitada a um pequeno número faladas. “AbraKedabra: Construindo Palavras”
delas. foi avaliado no estudo desenvolvido por Souza
e Hübner (2010), cujo objetivo foi investigar se

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 5 | 75


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essa aprendizagem promovida pelo jogo per- Transtorno do Espectro Autista (TEA). Pode-se
mite produzir: (a) a leitura e a escrita corretas citar como exemplo o programa de computador
das palavras ensinadas na fase de interven- denominado mTEA que permite o ensino de
ção e (b) a leitura e a escrita de novas palavras conteúdos por tentativas discretas. Os conteú-
formadas a partir da recombinação de sílabas dos ensinados são referentes a sobreposição de
(generalização de estímulos). Os participantes palavras, formação de palavras, identificação
foram nove crianças que passaram por um pro- de figuras similares e sequência numérica. Esse
cedimento com pré-teste, intervenção, sonda programa foi descrito e avaliado no estudo de
e follow-up. Nos testes foram avaliadas as rela- Silva, Soares e Benitez (2020) com a participação
ções entre palavra impressa e palavra falada, de duas professoras e cinco crianças com TEA.
palavra falada e conjunto de sílabas, palavra As professoras passaram pelo procedimento de
falada e palavra manuscrita, e entre figura e pa- programação e aplicação das atividades, bem
lavra falada. A intervenção consistiu em quatro como responderam a um questionário sobre
sessões com o AbraKedabra. Os resultados do o mTEA. As crianças realizaram as atividades
estudo demonstraram que, em relação aos es- do mTEA no computador. Verificou-se que o
tímulos utilizados no jogo, houve um aumento programa foi eficaz para que os professores
de emissão de palavras e sílabas lidas correta- personalizassem as atividades de cada aluno
mente e de emparelhamentos corretos entre de acordo com seus currículos e suas caracterís-
os estímulos. Em relação à generalização de ticas, bem como acompanhar a execução delas.
estímulos, houve um aumento no número de Em relação ao desempenho dos participantes,
sílabas corretamente selecionadas. As autoras verificou-se que as atividades estavam coeren-
concluíram que o jogo AbraKedabra foi eficaz tes com os níveis de dificuldades adequados a
para promover o ensino de leitura e escrita cada uma delas. Conclui-se que o mTEA que foi
correta de palavras do repertório dos partici- elaborado com base nos princípios da análise
pantes e a generalização para sílabas novas. do comportamento, pode ser considerado uma
Estudos subsequentes (Pellizzetti & Souza, tecnologia que permite aos educadores progra-
2014; Suzuki & Souza, 2019) aperfeiçoaram marem atividades de ensino individualizadas
o jogo, estenderam sua aplicação envolvendo e promove a aprendizagem dos conteúdos
pais de alunos e descreveram o processo de especificados.
aprendizagem envolvido. Assim, considera-se
que foi demonstrado que o jogo AbraKedabra Tecnologia comportamental aplicada ao contexto da
promove a aprendizagem da leitura e da escrita saúde
de palavras, podendo ser usado inclusive por Um exemplo de tecnologia comportamen-
pais e cuidadores, caracterizando-se como uma tal para promoção de saúde de crianças é o
tecnologia comportamental. jogo de tabuleiro “Cestinha Mágica” desenvol-
Outro contexto educacional no qual as vido por Panosso e Souza (2014), que ensina
tecnologias de ensino podem ser inseridas são a seleção e o consumo de alimentos diversi-
as intervenções com pessoas portadoras do ficados. Baseado em princípios da análise do

4 É importante diferenciar o que se entende por demonstração e o que se entende por aula prática. Em uma demonstração não há parti-
cipação ativa do aluno, ou seja, a atividade é realizada pelo professor, como ilustração do princípio ensinado. Na aula prática, por sua vez,
há a participação do aluno de maneira ativa, envolvendo habilidades diversas da parte dele, desde psicomotoras até de reflexão.

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 5 | 76


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comportamento, a efetividade do jogo foi ava- Amaral (2010). O estudo envolveu duas crianças
liada por Panosso, Gris e Souza (2018) em um com câncer (9 e 4 anos) que foram submetidas
estudo com três crianças identificadas como P1, a avaliações pré-intervenção, durante a inter-
P2 e P3. Os participantes foram submetidos a venção e pós-intervenção com a Observation
três fases do procedimento: linha de base, inter- Scale of Behavioral Distress. A intervenção com
venção com o jogo e avaliação pós-intervenção. o livro foi realizada em três sessões, com a
As sessões de intervenção variaram para cada leitura do texto e a realização das atividades
participante, sendo 12, 11 e 13 partidas para P1, descritas. Verificou-se o aumento na frequência
P2 e P3 respectivamente. As autoras verificaram de respostas de adesão ao tratamento e com-
que os três participantes, na fase pós-interven- portamentos cooperativos no momento da in-
ção, passaram a consumir alimentos que antes jeção aplicada (quimioterapia) em comparação
não faziam parte de suas dietas, permitindo à frequência pré-intervenção. A criança com
aquisição de nutrientes mais diversificados. 9 anos manteve esses comportamento pós-in-
É importante enfatizar que recursos educati- tervenção, mas a criança de 4 anos apresentou
vos como o jogo Cestinha Mágica promovem redução na frequência dos mesmos. Entretanto,
saúde não apenas na infância, mas também a frequência na fase pós-intervenção foi maior
na vida adulta, pois em muitos casos os hábitos do que na fase pré-intervenção. Amaral con-
alimentares adquiridos nos primeiros anos de cluiu que “para crianças mais novas, o acom-
vida perpassam os demais períodos de desen- panhamento psicológico focalizando a questão
volvimento, sem grandes variações. Dada a im- da informação e da expressão de sentimentos
portância do ensino de hábitos alimentares na deve ser constante, pois as três sessões realiza-
infância e do fato de o jogo “Cestinha Mágica” das não foram suficientes para a manutenção
ter sido eficaz para que as crianças passassem a deste padrão comportamental” (p. 36). Além
consumir alimentos que antes não consumiam, disso, foi concluído que a tecnologia compor-
resultado confirmado em outros estudos (por tamental representa ser um recurso de baixo
exemplo, Brandina, Panosso, & Souza, 2016), custo financeiro, e que dado que o livro pode
o jogo pode ser considerado uma tecnologia ser levado para casa, ele amplia a possibilidade
comportamental. de generalização das mudanças comportamen-
Uma tecnologia comportamental na tais obtidas no contexto hospitalar para outros
forma de um livro intitulado “Estou doente, e contextos, como a casa e a escola.
agora? Orientações para crianças com câncer” Em relação as questões de saúde pública
foi desenvolvido Casanova e Soares (2009), o e que também estão relacionadas à educação
qual visa subsidiar intervenções na área da ambiental, do Nascimento, Borloti e Haydu
Oncologia com base em princípios da análise do (2018) avaliaram um jogo educativo que visa
comportamento. O livro fornece informações ensinar comportamentos de prevenção da
a respeito da condição de tratamento quimio- dengue. O jogo “Nossa Turma Contra a Dengue”
terápico de forma adequada ao nível de com- foi desenvolvido Valentim (2009). O estudo teve
preensão de crianças. O texto é estruturado em como objetivo avaliar os efeitos do jogo sobre
forma de fichas contendo informações, ativida- os conhecimentos verbais e comportamentos
des recreativas e de expressão de sentimento não verbais de prevenção à dengue. Os parti-
relacionadas à doença e ao tratamento. Essa cipantes foram 16 estudantes submetidos a um
tecnologia foi avaliada em uma dissertação de teste pré-intervenção, à intervenção com o jogo

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 5 | 77


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em forma de um campeonato e um teste pós-in- de desempenho em direção ao qual um indiví-


tervenção. Nas fases de pré e pós-intervenção, duo ou grupo deve trabalhar” (Gamba & Souza,
os participantes executaram uma atividade 2012, p. 298). De acordo com Weinberg e Gould
prática avaliativa sobre prevenção da dengue, (2001), programas de estabelecimento de metas
responderam a um questionário sobre as regras podem ser aperfeiçoados com o registro das
de prevenção e responderam a um jogo do tipo metas e o fornecimento de feedback. As metas
Tapa Certo. Do Nascimento et al. verificaram devem ser específicas, moderadamente difíceis,
que após o campeonato com o jogo, 12 dos 16 mas realistas, e devem ser de desempenho e de
estudantes apresentaram aumentos de acerto resultado. O treinador deve considerar metas
na atividade prática, e 15 dos 16 mantiveram em longo e curto prazo e, ao estabelecer uma
seu desempenho no questionário de regras de meta, ele deve considerar o repertório inicial
prevenção (pelo menos 86% de acerto nas al- do atleta a fim de estabelecer os passos a serem
ternativas). Na adaptação do jogo Tapa Certo, os seguidos para o desempenho final a ser alcan-
participantes que não haviam respondido cor- çado. O progresso ao longo da modelagem deve
retamente na fase pré-intervenção, passaram ser reforçado.
a emitir acertos. Os resultados do teste prático, O estudo de Gamba e Souza (2012) descre-
do questionário verbal e do jogo adaptado Tapa veu e avaliou um programa de estabelecimento
Certo permitem concluir que a tecnologia na de metas com a inclusão do feedback no treino
forma do jogo Nossa Turma Contra Dengue foi de crianças praticantes de ginástica artística.
eficiente para ensinar comportamentos verbais O estudo focalizou os efeitos do programa no
e não verbais de prevenção contra dengue. auxílio da execução do salto Tsukahara, que
Esse resultado foi confirmado em estudos para ser efetuado:
adicionais (Carneiro, Haydu, Borloti, & Souza,
“o atleta deve realizar uma corrida em
2019; Haydu, Borloti, do Nascimento, Valentim,
uma esteira de corrida, saltar e cair com
& Melo, 2019) e Haydu, Borloti, do Nascimento,
os pés em um trampolim de salto, realizar
Valentim e Melo (2019) fizeram uma análise
o primeiro voo, tocar as mãos na mesa re-
das contingências de ensino presentes em jogos
alizando a repulsão, passar pelo segundo
educativos usando como exemplo do jogo Nossa
voo com a execução de um mortal para
Turma Contra Dengue.
trás e aterrissar no solo” (p. 301).

Tecnologia comportamental aplicada ao contexto do Participaram do estudo de Gamba e


esporte Souza (2012) cinco atletas do sexo masculino
No contexto do esporte, uma tecnologia (8 a 10 anos de idade) submetidos ao treino
comportamental aplicável ao treino de atle- dos componentes do salto que foram divididos
tas, descrita e avaliada por analistas do com- em submetas, com estabelecimento de critério
portamento, é o “estabelecimento de metas”. para serem considerados corretos. Verificou-se
Estabelecer metas consiste em especificar as que a intervenção não aumentou de forma ex-
condições nas quais esse comportamento deve pressiva o número de componentes executados
ocorrer (eventos antecedentes), a ação que deve corretamente, mas foi efetiva “para aumentar
ser emitida (resposta) e as possíveis consequ- o número de componentes executados de ma-
ências da ação (Martin, 2001). “Uma meta tem neira consecutiva” (p. 315). Essa tecnologia
sido definida como uma descrição de um nível também foi avaliada por Souza, Sudo, Gamba,

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 5 | 78


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Oliveira e Teixeira (2009) que a consideraram Tecnologia comportamental aplicada ao contexto dos
como uma das mais efetivas para melhorar direitos humanos
desempenho atlético, podendo ser associada a No contexto dos direitos humanos uma
uma série de procedimentos baseados em prin- questão relevante, principalmente em escolas,
cípios analítico-comportamentais que tornam refere-se ao bullying. Uma tecnologia com-
uma intervenção ainda mais eficaz. portamental foi estruturada por meio do jogo
Ainda no contexto do esporte, pode-se educativo “O Espião” desenvolvido Perkoski
citar como tecnologia comportamental para o e Souza (2015). Nesse jogo, são apresentadas
treino de atletas de futsal o jogo de tabuleiro cartas de situações-problema de relacionamen-
desenvolvido e avaliado por Bayer, Haydu, to entre pares na escola, em que os jogadores
Santana e Souza (2014). Os pesquisadores precisariam escolher cartas de resolução para
adaptaram um jogo de botões e realizaram o problema apresentado. A escolha do jogador
um estudo em que foi feita a comparação do é reforçada (e.g., ganhar pontos) diante de reso-
desempenho de treinadores de futsal em duas luções consideradas pacíficas (que promovem
condições (tabuleiro e quadra de futsal), ao en- relacionamento saudável e respeitoso entre
sinar jogadas de diferentes dificuldades. Além colegas). Caso contrário, são aplicadas con-
disso, compararam o desempenho dos atletas sequências consideradas aversivas (e.g., não
nessas condições após o ensino proporcionado avançar casas no tabuleiro). Souza, Perkoski e
por seus treinadores. Os participantes foram dos Anjos (2019) descreveram uma partida-tes-
três treinadores e 15 atletas. A partir do estudo, te da qual participaram cinco alunos de uma
pode-se observar que os treinadores emitiram escola pública que eram capazes de ler textos
comportamentos corretos de ensino tanto com simples e apresentavam baixo repertório de
o uso do tabuleiro quanto na quadra, e que conhecimento sobre bullying avaliado por uma
os atletas apresentaram o mesmo número de entrevista estruturada (pré-teste). A entrevista
tentativas para aprender as jogadas entre as continha cinco perguntas referentes ao que é o
duas condições. No entanto, no treino com o bullying e as respostas dos participantes eram
tabuleiro, os treinadores emitiram menos ins- classificadas como adequadas, adequadas in-
truções parciais e menos críticas. Além disso, completas ou inadequadas. Após o pré-teste, foi
ocorreram mais reforços na forma de elogios executado o jogo “O Espião” que caracterizava
em comparação ao treino na quadra. De acordo a fase de intervenção. A mesma entrevista da
com Bayer et al., o excesso de instruções pode fase pré-teste foi aplicada como pós-teste. Os
restringir o comportamento criativo de atletas resultados demonstraram que o jogo promoveu
e as críticas podem promover medo, falta de a aprendizagem de descrições verbais relacio-
iniciativa, inibição e até mesmo desistência nadas ao conceito de bullying, a identificação de
da prática do esporte. O uso de tabuleiros no suas consequências e formas de denúncia. As
ensino de jogadas ensaiadas combinado com autoras concluíram que o jogo “O Espião” foi
os princípios do reforço pode ser considerado eficaz para o ensino de comportamentos ver-
como sendo uma tecnologia comportamental bais relacionados ao bullying, aprendizagem
para o treino inicial de comportamentos de essa adquirida com base no estabelecimento de
atletas de futsal. princípio do reforço, o que permite caracterizar
o jogo como uma tecnologia comportamental.

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Ainda no contexto dos direitos humanos proposto por Gomide (2010). Esse programa é
uma tecnologia comportamental, foi implemen- composto por uma etapa inicial para a inte-
tada por meio do Jogo Dilema do Prisioneiro gração do grupo e no final um procedimento
Repetido para avaliar relações de conflito entre de encerramento. Na etapa de intervenção são
interesses individuais e coletivos dos participan- focalizadas as seguintes virtudes/questões nas
tes. Ferrante, Fidelis, Faleiros e Hübner (2018) sessões: polidez, mentira, obediência, hones-
desenvolveram um estudo que visou identifi- tidade, amizade, expressão de sentimentos,
car o efeito de uma regra que especificou uma vergonha e culpa, reparação do dano e perdão,
instrução em prol da cooperação. Participaram justiça, generosidade. O procedimento é desen-
do estudo 20 estudantes universitários distri- volvido com recursos como filmes, quadrinhos,
buídos em dois grupos: o Grupo 1 recebeu a bonecos, histórias, parábolas; e atividades
instrução antes do jogo, no início da Sessão 1; como teatro, solução de dilemas, brincadeira
o Grupo 2 recebeu a instrução após a Sessão 3 (siga o mestre), discussões em grupo e tarefas
do jogo. Um computador era programado para de casa. Um estudo que avaliou esse programa
realizar jogadas como adversário sem o partici- foi desenvolvido por Netto e Gomide (2016).
pante saber que se tratava de uma programa- As pesquisadoras demonstraram que o recur-
ção e não de outro participante. Na primeira so é eficaz para desenvolver comportamentos
tentativa do jogo, o computador executava uma morais em crianças por meio de apenas cinco
ação de cooperação, em seguida apresentava encontros realizados em salas de aula. A rele-
uma resposta igual à que o participante havia vância do programa consiste no fato de que
feito na tentativa anterior. Os participantes comportamentos antissociais em ambientes
recebiam pontos de acordo com as regras es- escolares são desafios para os educadores,
tabelecida no procedimento. Verificou-se que evidenciando a importância de intervenções
os dois grupos ficaram sob o controle da regra que ensinem comportamentos adequados a
de cooperação e que 60% dos participantes do crianças.
Grupo 1 e 80% dos participantes do Grupo 2
passaram a cooperar. Os participantes do Grupo Tecnologia comportamental aplicada ao contexto
1 apresentaram respostas de cooperação mais clínico
prontamente após a apresentação da regra. No contexto clínico, uma tecnologia
Os participantes do Grupo 2 que cooperaram, comportamental que pode ser utilizada para
apresentaram cooperação de forma gradual, o tratamento de medos e fobias é a Realidade
após receberem a regra. Os autores concluíram Virtual (RV). O Virtua Therapy consiste em um
que “a regra e história de reforçamento pro- simulador desenvolvido para a terapia de
duzida pela participação cooperativa no jogo claustrofobia, acrofobia, glossologia e a fobia
tiveram efeito sobre as escolhas cooperativas social. Ele possui cenários específicos para
no jogo Dilema do Prisioneiro Repetido” (p. essas fobias e pode ser programado de forma
113). Essa conclusão aponta que o jogo Dilema a expor o participante a cenas em que o grau
do Prisioneiro Repetido usado para avaliar re- de ansiedade produzido pode ser controlado
lações de conflito pode ser considerado uma pelo terapeuta. Esse simulador foi avaliado
tecnologia comportamental. em diversos estudos (e.g., de Oliveira, Borloti,
Um programa de ensino de comporta- Banaco, & Haydu, 2020; Perandré & Haydu,
mento socialmente relevantes (as virtudes) foi 2018; Zacarin, Borloti, & Haydu, 2019). O estudo

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 5 | 80


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desenvolvido por Zacarin et al. combinou o pro- A confecção do jogo foi distribuída em fases,
cedimento de exposição com realidade virtual à como a definição do público-alvo, a defini-
terapia comportamental para uma intervenção ção dos comportamentos a serem ensinados,
com participantes com ansiedade de falar em o planejamento das contingências de ensino,
público. A partir do estudo, foram investigados e a elaboração e a avaliação do protótipo do
os efeitos de uma intervenção comportamental jogo. Os participantes da avaliação do protótipo
com exposição à RV, respiração diafragmática, foram três crianças que primeiro responderam
reforço diferencial e análise funcional sobre a o inventário Social Skills Rating System validado
ansiedade de falar em público. Os participantes para o Brasil (SSRS-BR) e depois jogaram oito
foram seis estudantes que passaram por um sessões. Após as sessões de intervenção, respon-
procedimento de quatro etapas: entrevista ini- deram novamente ao inventário. Os resultados
cial e linha de base, intervenção, encerramento para dois dos participantes indicaram um au-
e acompanhamento. As medidas de linha de mento em todas as classes de habilidades sociais
base eram registradas com base em um discur- avaliadas (responsabilidade, empatia, asserti-
so realizado pelo participante em uma sala na vidade, autocontrole, civilidade e expressão de
RV sem avatares (audiência). Nas intervenções, sentimento positivo). Verificou-se também que
os discursos eram realizados na presença de o jogo possui usabilidade e engajamento ade-
um número cada vez maior de avatares, segui- quados para a faixa etária dos participantes.
dos de feedbacks da pesquisadora. Além disso, As autoras discutiram aspectos que podem ter
eram realizadas análises funcionais dos com- contribuído para as mudanças comportamen-
portamentos dos estudantes no contexto do dia tais estabelecidas por meio de princípios como
a dia. Zacarin et al. verificaram mudanças esta- a “modelagem de comportamento verbal e seu
tisticamente significativas entre os dados pré e efeito sobre comportamentos não-verbais e do
pós-intervenção em relação à autoavaliação dos repertório social durante as partidas – uso de
participantes ao falar em público, bem como jogo cooperativo” (p. 203).
melhora na qualidade dos discursos. Pode-se Os efeitos das tecnologias comportamen-
concluir que a tecnologia de RV, associada as tais de videofeedback e a de modelação em vídeo
outras intervenções, foi eficiente para diminuir sobre a mudança de comportamentos maternos
autorregras negativas como “meu discurso é foram estudados por Moura, Silvares, Jacovozzi,
ruim” e a ansiedade diante de situações sociais. Silva e Casanova (2007). O estudo teve como
Outra tecnologia comportamental apli- objetivo comparar dois tipos de procedimen-
cada ao contexto clínico foi implementada no to (o videofeedback e a modelação em vídeos
jogo denominado “Space Ability: fazendo con- com gravações de profissionais experientes) na
tato com Aliens”. Em um estudo realizado por orientação de mães quanto ao uso de reforço
Benevides e Souza (2020), houve a descrição do diferencial aos comportamentos adequados e
processo de construção e avaliação do jogo. O inadequados de seus filhos. Os participantes
objetivo principal do jogo é desenvolver habili- foram duas díades mãe e filho, sendo que as
dades sociais, pela cooperação entre jogadores. crianças apresentavam problemas de compor-
A partir do enredo criado, são promovidas si- tamento, como birras, agressividade e timidez
tuações de aprendizagem de comportamentos excessiva. Com relação às duas díades de par-
sociais e são reforçadas respostas verbais ade- ticipantes, o procedimento de modelação com
quadas e compatíveis com habilidades sociais. vídeo demonstrou-se mais eficaz na orientação

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 5 | 81


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as mães em comparação ao videofeedback. al. observaram que 15 dos 18 jogadores apre-


Quanto à primeira díade, observou-se aumento sentaram maior conhecimento verbal sobre o
de 35% dos elogios por parte da mãe e dimi- descarte correto de resíduos após terem sido
nuição de 100% de emissão de críticas após submetidos ao jogo. Sugere-se que estudos adi-
o procedimento de modelação em vídeo. Na cionais avaliem a eficácia do jogo como uma
condição com videofeedback, houve diminuição tecnologia comportamental.
de elogios em 36%. Para segunda díade, houve Ainda considerando a preservação am-
aumentos de elogios em 58% e diminuição de biental e o desenvolvimento sustentável,
críticas em 57,1% por parte da mãe após a mo- Camargo (2019) desenvolveu, descreveu e
delação em vídeo. Os valores no videofeedback avaliou um jogo eletrônico para educar os jo-
foram menores nas duas categorias, pois houve gadores com relação à extração de recursos
aumento de elogios em 32,5% e diminuição de naturais em um contexto de pescaria. O jogo
críticas em 33,3%. Conclui-se que apresentar Keep Fishin’ apresenta na tela do computador
modelos de como manejar comportamentos um ambiente de pesca em um oceano. Os joga-
das crianças com vídeos de profissionais é uma dores devem pescar os peixes que saltam acima
metodologia adequada de aprendizagem para do nível das ondas do mar. Cada jogador com-
pais. O videofeedback e a modelação em vídeo pete por peixes com outros dois jogadores, ga-
são tecnologia comportamentais descritas e nhando pontos. No Experimento 1 do estudo de
avaliadas em outros contextos como o do es- Camargo, participaram 90 pessoas distribuídas
porte especificado anteriormente. em três condições: condição controle, condição
de recebimento de bônus e condição de rece-
Tecnologia comportamental aplicada ao bimento de multas. Na condição controle não
desenvolvimento sustentável e ao meio ambiente havia consequências, na condição de bônus,
Outra área na qual as tecnologias compor- os participantes recebiam pontos extras diante
tamentais podem ser aplicadas é o contexto do de respostas com intervalos moderados entre
desenvolvimento sustentável e da preservação a extração de peixes. Já na condição multas, os
ambiental. Em um estudo realizado por Balan, jogadores perdiam pontos diante de respostas
Haydu, Sobreira, Santini, Pereira e Zacarin com intervalos de extração de peixes muito
(2020), o jogo educativo Muzamba na Caçamba curtos. Camargo verificou que os participantes
foi descrito e avaliado com a participação de 18 da condição bônus e multas precisaram emitir
alunos do Ensino Fundamental. O jogo ensina menor número de jogadas para ganhar o jogo,
regras de descarte de resíduos sólidos por meio o que significa que esse sistema de aplicação
de um cenário de uma cidade representada em de consequências selecionou comportamen-
um tabuleiro. Mini caminhões são usados como tos de consumo mais otimizado de recursos.
peões para o deslocamento da trilha à medida Pode-se concluir, a partir desse experimento e
que são lançados os dados do jogo. Os jogadores de experimentos adicionais, que Keep Fishin’
recebem cartas que representavam resíduos é um jogo que ensina comportamentos de pre-
sólidos que devem ser descartados em locais servação ambiental por meio de princípios do
corretos que estavam espalhados e escondidos reforço, caracterizando-se como uma tecnolo-
ao longo da trilha. No estudo, forma feitos pré gia comportamental.
e pós-testes para avaliar o conhecimento dos
participantes das regras de descarte. Balan et

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Tecnologia comportamental aplicada ao contexto análise experimental e aplicada do comporta-


organizacional mento, a tecnologia comportamental é descrita
No contexto organizacional o treinamento e explicada em termos dos princípios básicos
de líderes foi alvo de dois estudos da dissertação do comportamento, com ênfase nos processos
de mestrado desenvolvida por De Paula (2019). comportamentais envolvidos. As tecnologias
O Estudo 1 visou elaborar programa de ensino comportamentais, assim, possibilitam uma
para treinar líderes organizacionais a capacita- aprendizagem mais rápida, uma vez que a pro-
rem os liderados a realizarem suas atividades gramação de contingências promovida por elas
de trabalho, tendo sido usada a tecnologia da minimiza a probabilidade da aprendizagem
Programação de Ensino para Desenvolvimento por tentativa e erro. Outro benefício é que di-
de Comportamentos. Como resultado foi apre- versas tecnologias comportamentais possuem
sentado um “Programa de Ensino para Líderes” características divertidas (e.g., o enredo dos
composto de 23 comportamentos-objetivo, di- jogos educativos, o contato com avatares em
vididos em cinco módulos, totalizando aproxi- ambientes virtuais na RV), as quais promovem
madamente 30 horas de capacitação (somando maior engajamento dos usuários. Outro bene-
encontros e atividades extraclasse)”. O Estudo fício das tecnologias comportamentais é a faci-
2, avaliou o grau de eficiência e eficácia do pro- litação de aquisição de repertórios quando as
grama elaborado no Estudo 1, o qual foi execu- contingências são muito complexas. Por exem-
tado com a participação de cinco empresários plo, no caso da RV utilizada com pessoas com
juniores, com função de liderança. Para ava- medo de dirigir, não é muito seguro ou prático
liação do programa foram realizadas entrevis- expor o cliente a um carro em uma via movi-
tas e aplicados questionários tanto aos líderes mentada. Assim, a RV permite uma exposição
quanto aos liderados em pré-teste, pós-testes e mais segura e menos aversiva. No caso de jogos
follow-up. Ao longo do programa foram aplica- educativos, novos comportamentos podem ser
das sondas após inserção dos módulos cujos estabelecidos e generalizados para o dia a dia
comportamentos-objetivos estavam sendo de forma divertida, alterando comportamentos
avaliados. O programa promoveu o ensino das verbais, promovendo a aquisição de regras e
classes comportamentais especificadas, poden- aumentando comportamentos socialmente re-
do-se considerar o mesmo como uma tecnologia levantes, bem como os que são relevantes para
comportamental adequada para treinamento o indivíduo. No jogo “O Espião” de Perkoski e
de líderes. Souza (2015), por exemplo, as consequências
negativas do bullying que antes não estariam
Benefícios e críticas à proposição e uso tão claras a estudantes podem estar mais bem
das tecnologias comportamentais explicitadas de modo a se tornarem um esti-
mulo discriminativo para o comportamento de
Entende-se que a utilização de tecnologias não fazer bullying.
comportamentais para resolução de problemas A apresentação feita neste capítulo mostra
humanos possui benefícios por fornecer pro- que uma diversidade de tecnologias foi desen-
cedimentos, recursos e materiais especiais e volvida e avaliada por pesquisadores brasileiros.
por permitir a complementação dos serviços No entanto, um aspecto que requer ser destaca-
oferecidos por analistas do comportamen- do é que na busca por estudos que avaliaram
to. Caracterizada como sendo o resultado da tecnologias comportamentais, localizamos um

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Tecnologias comportamentais
Verônica Bender Haydu & Raquel Neves Balan

grande número de materiais interessantes e Ademais, sendo aplicáveis a diferentes con-


provavelmente eficazes, mas que não foram textos, sugerimos que as tecnologias compor-
avaliados em estudos científicos. A avaliação tamentais podem melhorar o desempenho e o
da eficácia da tecnologia é um aspecto funda- bem-estar da população em áreas como edu-
mental não só no que diz respeito às práticas cação, saúde, preservação ambiental, clínica,
baseadas em evidências na clínica, mas em organizações, direitos humanos e esporte. Os
qualquer outro contexto. Destacamos ainda, recursos devem ser avaliados, disponibilizados
que os profissionais e a comunidade devem e acompanhados por orientações que levem o
ter acesso às tecnologias comportamentais e usuário a fazer uma aplicação correta e eficaz.
ao conhecimento produzido, o que ainda é res- Concluímos, enfatizando a necessidade de es-
trito em nossa comunidade conforme apontou tudos adicionais que avaliem cientificamente
Botomé em entrevista dada à Couto (2014). O a eficácia das tecnologias desenvolvidas e en-
procedimento, o jogo, a cartilha, o software, cerramos com uma citação de Skinner (1974,
muitas vezes estão ao alcance apenas dos que p. 11): “os principais problemas enfrentados
desenvolveram o material ou dos membros da hoje pelo do mundo só poderão ser resolvidos
instituição dos pesquisadores que o avaliaram. se melhorarmos nossa compreensão do com-
Por último, sugerimos que ao se disponibilizar portamento humano”.
a tecnologia comportamental à profissionais da
área, devemos garantir uma utilização adequa- Referências
da. Portanto, é preciso orientar os usuários para
que um uso adequado da tecnologia seja feito. Amaral, M. (2010). Efeitos de uma intervenção
comportamental com crianças durante in-
Considerações finais jeção intramuscular para quimioterapia.
Dissertação de Mestrado. Universidade
As tecnologias comportamentais são pro- Estadual de Londrina, Londrina, PR,
cedimentos, recursos e materiais especiais de Brasil. http://www.uel.br/pos/pgac/wp-
intervenção voltados à contextos práticos. Uma -content/uploads/2014/03/Efeitos-de-
das primeiras discussões sobre tecnologias uma-intervenção-comportamental-com-
comportamentais aplicadas aos problemas hu- crianças-durante-injeção-intramuscular-
manos foi realizada por Skinner (1959), artigo para-quimioterapia.pdf
no qual foram especificadas as maquinas de Balan, R. N., Haydu, V. B., Sobreira, D. K. S.,
ensinar propostas na época e a metodologia de Santini, G. J., Pereira, M. P., & Zacarin, M.
Instrução Programada. Essas duas tecnologias R. J. (2020). Avaliação do jogo Muzamba
seriam aplicáveis ao contexto educacional de na Caçamba no ensino de regras de des-
modo a promover uma aprendizagem mais carte de resíduos. Revista Brasileira de
eficaz e melhorar o papel dos professores en- Análise do Comportamento, 16(1), 11–20.
quanto educadores. Destacamos, no presente https://doi.org/10.18542/rebac.v16i1.8884
capítulo, que a interconexão entre os três vér- Bandini, C. S. M., & de Rose, J. C. C. (2006).
tices da Análise do Comportamento (behavio- Tecnologia comportamental no contexto
rismo radical, AEC e ABA) deve contribuir para de ensino: Favorecimento da aprendiza-
intervenções concisas, embasadas em conhe- gem e do surgimento de comportamentos
cimentos científicos e pesquisas reaplicáveis. criativos. In H. J. Guilhardi & Aguirre N. C.

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 5 | 84


Tecnologias comportamentais
Verônica Bender Haydu & Raquel Neves Balan

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Comportamento em Foco, v. 13, cap. 5 | 88


COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 13 pp. 89—99

Psicoterapia Comportamental
Pragmática: Uma aplicação da Análise do Carlos Augusto de Medeiros (1)

Comportamento à clínica1
carlos.medeiros@ceub.edu.br

(1)
Centro Universitário de Brasília
Pragmatic Behavioral Psychotherapy (PCP): An application
of Behavior Analysis in psychotherapy

Resumo Abstract
A Psicoterapia Comportamental Pragmática Pragmatic Behavioral Psychotherapy (PCP)
(PCP) é fundamentada no Behaviorismo is based on Radical Behaviorism, opposing
Radical, opondo-se ao mentalismo e ao livre- mentalism and free will, in addition to adop-
-arbítrio, além de adotar o modelo selecionista ting the selectionist model of determinism.
de determinismo. As análises e as interven- PCP analyzes and interventions are descri-
ções em PCP são descritas em termos compor- bed in behavioral terms, emphasizing verbal
tamentais, enfatizando-se o comportamento behavior since therapist/client interactions
verbal já que as interações terapeuta/terapeu- are predominantly verbal. The PCP is oppo-
tizando são predominantemente verbais. A sed to the use of ostensive behavioral con-
PCP se opõe ao uso do controle ostensivo do trol (i.e., issuing rules and using arbitrary
comportamento (i.e., emissão de regras e uso consequences) characteristic of behavioral
de consequências arbitrárias) característico oriented therapies. As an alternative to osten-
de terapias de orientação comportamental. sive control, it uses reflexive questioning and
Como alternativa ao controle ostensivo, utiliza natural differential reinforcement. Through
o questionamento reflexivo e o reforçamento Unsystematic Social Skills Training, the pa-
diferencial natural. Com o uso do Treinamento cient/client or therapeutizing person or the-
de Habilidades Sociais Assistemático, o tera- rapeutized person is led to develop ways of
peutizando é conduzido a desenvolver formas dealing with social demands that are more
de lidar com as demandas sociais com maior likely to be reinforced. PCP is characterized
probabilidade de reforçamento. A PCP se as a clinical application of Behavior Analysis
caracteriza como uma aplicação clínica da that in addition to changing the frequency of
Análise do Comportamento que visa, além de target behaviors, it aims to generate analy-
mudar a frequência de comportamentos alvo, sis repertoires. Essential repertoires for the
gerar repertórios de análise. Repertórios es- client´s independence from the therapist.
senciais à independência do terapeutizando
quanto ao terapeuta.

Palavras-chave Keywords

Psicologia clínica, terapias de orientação analítica Clinical psychology, analytical behavioral the-
comportamental, Psicoterapia Comportamental rapies, Pragmatic Behavioral Psychotherapy,
Pragmática, Análise do Comportamento. Behavior Analysis.

1 O presente capítulo é derivado da fala do autor no Simpósio intitulado: “Propostas brasileiras para a terapia fundamentada nos pres-
supostos filosóficos, conceituais e metodológicos da Análise do Comportamento: a) Terapia por Contingencias de Reforçamento; b) Terapia
Molar e de Autoconhecimento e; c) Psicoterapia Comportamental Pragmática” realizado XXIX Encontro Brasileiro de Psicologia e Medicina
Comportamental e VI Encontro Sul-Americano, no dia 05 de setembro de 2020.

89
Psicoterapia comportamental pragmática
Carlos Augusto de Medeiros

Como sustentam Leonardi e Meyer (2015; delineamentos correlacionais e de grupo foram


2016) e Leonardi (2017), o cenário atual da tidos como evidência fraca do efeito de vari-
terapias de orientação comportamental no áveis (Sidman, 1960/1976). Além disso, surge
Brasil é característico de uma crise de identi- o questionamento se as terapias de terceira
dade, onde são observadas terapias mais iden- onda poderiam ser consideradas aplicações
tificadas com a Análise do Comportamento, da Análise do Comportamento, uma vez que
baseada no Behaviorismo Radical (e.g., TAC se baseiam no Behaviorismo Contextual e não
Terapia Analítico-Comportamental, TCR no Behaviorismo Radical (Guilhardi, 2012;
Terapia por Contingências de Reforçamento, Vandenberghe, 2017).
Terapia Molar e do Autoconhecimento) ao lado Com base nesse cenário, o presente capítu-
de terapias mais identificadas com a Ciência lo tem como objetivo descrever a PCP de modo
Comportamental Contextual (e.g., FAP Terapia a posicioná-la frente as diferentes denomina-
Analítica Funcional, ACT Terapia de Aceitação ções de Terapias Analíticas Comportamentais
e Compromisso, DBT Terapia Comportamental (TAC) praticadas no Brasil (Costa, 2011). Além
Dialética). disso, este capítulo visa justificar, de maneira
As terapias de terceira onda, fundamenta- sucinta, as suas principais características.
das na Ciência Behaviorista Contextual (Hayes,
Barnes-Holmes, & Wilson, 2012), têm obtido Behaviorismo Radical e a PCP
evidências de sua eficácia no tratamento de
psicopatologias (e.g., depressão, transtorno de Talvez os pressupostos filosóficos sejam o
personalidade bipolar, transtornos de ansieda- modo mais importante para se diferenciar as
de) com base em ensaios clínicos randomizados terapias analíticas comportamentais das tera-
e em meta-análises com amplo uso de estatísti- pias contextuais, as quais se fundamentam na
ca inferencial (Leonardi, 2017). Ao utilizarem Ciência Behaviorista Contextual (Hayes et al.
protocolos estruturados de tratamento às cate- 2012) e não no Behaviorismo Radical. Alguns
gorias nosológicas do DSM IV (APA, 2013/2014), pontos são fundamentais para se discutir as
aferidas por meio de instrumentos de avaliação concepções filosóficas que embasam a PCP e
psicológica e valendo-se da remissão de sinto- contribuem para a compreensão de suas prin-
mas como evidência de eficácia no tratamento, cipais características.
se aproximam da postura nomotética dos mo- O ser humano é um organismo que mo-
delos médicos de saúde e doença. Ainda, para difica o meio e é modificado pelas ações de
Leonardi (2017), as terapias identificadas com produz no meio (Skinner, 1957). As alterações
a Análise do Comportamento tendem a funda- no meio, produtos de seus comportamentos,
mentar a sua prática em estudos de caso e pela resultarão na mudança na sua probabilidade
extrapolação de dados obtidos em pesquisa de ocorrência no futuro. A visão de ser humano
básica, o que, de acordo com o que preconiza traz dois desdobramentos:
a Prática Baseada em Evidências, sugere fraco 1. A probabilidade de ocorrência de um
apoio empírico de efetividade. comportamento é afetada por aspectos do am-
Ao mesmo tempo, behavioristas radi- biente que podem ser organizados em três tipos
cais mais puristas têm questionado o tipo (Skinner, 1981): a) filogenéticos – os quais se re-
de evidência gerada por meta-análises e en- ferem aos efeitos do ambiente sobre o compor-
saios clínicos randomizados, uma vez que os tamento ao longo de inúmeras gerações, sendo

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 6 | 90


Psicoterapia comportamental pragmática
Carlos Augusto de Medeiros

responsáveis por características das espécies; b) Por exemplo, é fundamental prever em que
ontogenéticos – os quais se referem aos efeitos circunstâncias um terapeutizando específico
do ambiente sobre o comportamento ao longo pode ter dificuldades em negar pedidos pouco
da vida do organismo, sendo responsáveis pelos razoáveis e, além disso, criar condições para
condicionamentos operante e respondente; c) que ele consiga fazê-lo.
culturais – que ser referem, tanto aos efeitos do Com relação ao determinismo, o
ambiente sobre o comportamento de grupos de Behaviorismo Radical adota o modelo selecio-
indivíduos (e.g., evolução ou entropia de cultu- nista, no qual comportamentos são formas de
ras), assim como, aos efeitos que comportamen- adaptação ao meio (Skinner, 1981). A depender
tos de grupos exercem sobre o comportamento dos efeitos que um dado comportamento produz
dos organismos (e.g., comportamento verbal, no meio, ele tenderá a se repetir ou tenderá a
controle instrucional, aprendizagem por mo- deixar de ocorrer. Daí decorre a impossibilidade
delação etc.). de adjetivar o comportamento como disfuncio-
2. Por mais que não se trate de uma rela- nal, doente, anormal, desadaptado ou proble-
ção mecânica, o comportamento é parcialmen- ma (Fonseca & Nery, 2018; Goldiamond, 1974;
te determinado pelo ambiente, sendo dever do Medeiros & Medeiros, 2011). Comportamentos
analista do comportamento investigar como se cuja intervenção se destine a aumentar de fre-
dá tal determinação. A parte indeterminada do quência são funcionais e adaptados do mesmo
comportamento, para o Behaviorismo Radical, modo que aqueles cuja intervenção se destine
não se refere a uma autodeterminação ou ao a diminuir de frequência. Funcional ou adapta-
livre arbítrio e sim, à variação casual de respos- do são termos que não permitem gradação, de
tas que ocasionalmente são selecionadas pelo modo que não faz sentido afirmar que a meta
ambiente (Baum, 2005/2006). da terapia é estabelecer comportamentos mais
Por razões pragmáticas, o Behaviorismo funcionais ou mais adaptados.
Radical se opõe ao livre arbítrio, ou seja, pre- Para a PCP, portanto, os comportamen-
sumir que a pessoa pode decidir o que fazer tos são formas de adaptação ao meio e os pro-
diante de condições do ambiente dificulta, cessos pelos quais são selecionados e manti-
senão, impossibilita a previsão e o controle do dos podem ser identificados pelo analista do
comportamento (Baum, 2005/2006). No contex- comportamento (Medeiros & Medeiros, 2011).
to da clínica, predição e controle são essenciais, O procedimento utilizado para tal é a análise
uma vez que, numa perspectiva pragmática, funcional, que consiste em identificar os deter-
é essencial ter condições de prever com certa minantes ambientais de comportamentos de
acurácia, como o terapeutizando se compor- interesse clínico, ou seja, os comportamentos
tará diante de eventos do ambiente. Eventos alvo (Neno, 2003; Lettner, 1995). Apenas com a
esses que o terapeutizando irá se deparar, análise funcional é possível prever e controlar
tanto dentro, quanto fora do consultório. Na o comportamento. Como o comportamento é
medida em que as terapias de orientação ana- selecionado pelo ambiente a partir de varia-
lítico comportamental estabelecem os objeti- ções casuais, as interações com o meio são to-
vos terapêuticos em termos de mudanças de talmente privativas, de modo que as análises
comportamento, a possibilidade de o terapeuta funcionais realizadas em PCP são individuais
modificar a probabilidade de ocorrência de (Medeiros & Medeiros, 2011).
comportamentos do terapeutizando é essencial.

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 6 | 91


Psicoterapia comportamental pragmática
Carlos Augusto de Medeiros

A ênfase na função em detrimento da estru- do tipo “ela permanece casada com o marido
tura é uma das características do Behaviorismo violento porque quer” ou “ele se autodeprecia
Radical (Skinner, 1953; 1974). Os comporta- porque tem baixa autoestima”. Aumentos da
mentos, em PCP, serão designados como alvo autoestima ou da assertividade, por exemplo,
de intervenção a partir da sua função e não da não serão metas de uma terapia em PCP. Os
sua topografia (Medeiros & Medeiros, 2011). objetivos das intervenções em PCP consistirão
Os comportamentos de cuidar dos outros, tra- na modificação das frequências dos comporta-
balhar ou estudar, por exemplo, são compor- mentos resumidos por tais categorias, as quais,
tamentos que, apenas pela sua topografia, de frequentemente e equivocadamente, são utiliza-
acordo com critérios culturais, deveriam ter sua das como explicação para tais comportamentos.
frequência mantida ou aumentada. Todavia, O mesmo vale para psicodiagnósticos,
em uma análise funcional, esses mesmos com- como depressão, transtorno bipolar, transtor-
portamentos podem ser designados a enfraque- no de personalidade borderline, síndrome do
cer caso produzam estímulos aversivos ou a pânico entre outros. Em PCP, não há tratamento
perda de reforçadores de grande magnitude para tais categorias diagnosticas amplas, uma
em longo prazo. vez que agrupam apenas topografias e frequ-
Comportamentos de topografias dife- ências de respostas (Araújo & Medeiros, 2003;
rentes podem ter a mesma função e compor- Cavalcante & Tourinho, 1998; Hayes & Follette,
tamentos com a mesma topografia podem 1992; Lopes, Lopes, & Lobato, 2006). As respos-
ter funções diferentes (Medeiros & Medeiros, tas de mesmas topografias de um terapeutizan-
2011; Medeiros & Medeiros, 2018). Cabe ao do diagnosticado com depressão podem ter
terapeuta, portanto, identificar as funções dos funções distintas das de outro terapeutizando
comportamentos por meio da análise funcional com o mesmo diagnóstico. Desse modo, o diag-
para cada terapeutizando (Lettner, 1995; Neno, nóstico, em si, é pouco útil para o psicotera-
2003). Diferentes terapeutizandos podem apre- peuta pragmático. Ainda, para tais autores, os
sentar comportamentos de mesma topografia, diagnósticos adotados pelo modelo médico são
porém com funções distintas. A mera aplicação nomotéticos, negligenciando as especificidades
de relações funcionais identificadas em um te- de cada indivíduo, o que é incompatível com a
rapeutizando para explicar o comportamento postura ideográfica do Behaviorismo Radical.
de outro terapeutizando pode resultar em uma Um protocolo de tratamento para o trans-
análise equivocada. Por mais que certas exposi- torno de personalidade borderline pode ser
ções ao ambiente sejam funcionalmente equi- eficaz para a remissão dos sintomas para a
valentes em diferentes pessoas, é fundamental maioria dos indivíduos de um grupo experi-
a testagem das hipóteses de análises funcionais mental em comparação a um grupo controle
com cada terapeutizando específico (Lettner, que permaneceu na lista de espera, por exem-
1995; Neno, 2003). plo. Todavia, não se pode afirmar que o mesmo
Também, de acordo com Behaviorismo protocolo seja eficaz para o indivíduo que emite
Radical, para a PCP não há espaço para a au- comportamentos resumidos por tal rótulo. Em
todeterminação da conduta nem para explica- decorrência disso, a PCP vê com ceticismo a
ções do comportamento que utilizem eventos utilização de ensaios clínicos randomizados
externos à relação organismo ambiente (i.e., focados no tratamento de categorias nosológi-
mentalismo) como, por exemplo, afirmações cas como evidência de eficácia de modelos de

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Psicoterapia comportamental pragmática
Carlos Augusto de Medeiros

intervenção comumente utilizados pelas tera- do comportamento, o psicoterapeuta pragmático


pias contextuais (Leonardi, 2017; Leonardi & deve se comunicar utilizando a linguagem ordi-
Meyer, 2015; 2016). nária, com sugere Ryle (1949/2009). Todavia, na
Ainda com relação aos ensaios clínicos descrição de análises de comportamentos alvo
randomizados como evidência de eficácia de e do funcionamento das práticas interventivas,
terapias e técnicas, a remissão do sintoma não a terminologia da Análise do Comportamento
necessariamente representa sucesso do tra- deverá ser empregada. Os termos da linguagem
tamento (Banaco, 1999, Ferster, 1967, 1972, ordinária e os de nível intermediário perdem
1979/2007). A aplicação de tratamentos padro- em precisão, ainda sejam vantajosos quanto à
nizados aos sintomas característicos de dadas abrangência. A maior ressalva da PCP ao uso de
psicopatologias pode resultar na sua remissão termos de fora da Análise do Comportamento
sem a compreensão da função adaptativa desse é o risco de reificação e o seu uso mentalista
sintoma. Outros comportamentos não planeja- (Skinner, 1953), como, por exemplo, explicar o
dos pela intervenção com a mesma função dos comportamento por flexibilidade psicológica
suprimidos podem passar a ocorrer. ou por valores.
Finalmente, o pragmatismo, caracterís- Técnicas de outras abordagens, ou mesmo
tica epistemológica do Behaviorismo Radical de fora da Psicologia (e.g., reflexo de sentimen-
(Baum, 2005/2006), para a PCP, além possibi- tos, cadeira vazia, associação livre e mindful-
litar a análise e a intervenção sobre compor- ness), para a PCP, só deveriam ser utilizadas
tamentos privados, representa o critério de caso seus efeitos pudessem ser descritos em
veracidade de análises feitas pelo terapeuta. termos de variáveis de controle ambiental.
Muitos dos modos como o terapeutizando des- Mais especificamente, utilizando-se a lingua-
creve os eventos do seu dia a dia, seus sonhos, gem comportamental e descrevendo-se as con-
filmes e séries que assiste podem contribuir ou tingências envolvidas. Em outras palavras, não
não para se atingir os objetivos terapêuticos. basta ter eficácia (Neno, 2005) para a remissão
Cabe ao terapeuta em PCP criar condições para de sintomas em estudos que empregaram en-
evocar descrições mais úteis no sentido que fa- saios clínicos randomizados para uma técnica
vorecem a consecução dos objetivos clínicos. ser incorporada à PCP. É necessário entender
o seu funcionamento e os múltiplos efeitos
Análise do Comportamento comportamentais de seu uso. O acolhimento
de terapeutizandos poliqueixosos, por exemplo,
A PCP empregará, em suas análises, a pode resultar em relatos de bem-estar ao final
terminologia da Análise do Comportamento, da sessão (e.g., “saio daqui bem mais leve”). Por
assim como, as relações funcionais observa- outro lado, podem reforçar a emissão de relatos
das em contextos de pesquisa básica e aplicada queixosos, o que pode ser contraterapêutico em
(Medeiros & Medeiros, 2018). Diferentemente de alguns casos.
algumas terapias contextuais de terceira onda, A Análise Experimental do Comportamento
as quais adotam os termos de nível intermedi- e a Análise do Comportamento Aplicada já
ários (Hayes et al., 2012), a PCP utiliza termos produziu um vasto conhecimento acerca das
exclusivamente da Análise do Comportamento. variáveis de controle do comportamento.
Obviamente, na interação com terapeuti- Obviamente, muitas das relações funcionais
zandos e com outros profissionais não analistas obtidas em pesquisa básica ainda precisam

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 6 | 93


Psicoterapia comportamental pragmática
Carlos Augusto de Medeiros

ser replicadas em ambiente aplicado (Leonardi e Medeiros (2010; 2020a; 2020b) as descrições
& Meyer, 2015; Medeiros & Medeiros, 2018). de contingências (i.e., regras) são de extrema
Todavia, é preferível o terapeuta testá-las em importância na clínica, seja pelo controle que
sua aplicação pelos efeitos observados em exercem sobre os comportamentos dos tera-
situações controladas de laboratório do que peutizandos, seja como forma de mudar com-
aplicar procedimentos de fora da Análise do portamentos que ocorrem dentro e fora dos
Comportamento que ainda não foram descritos consultórios. Inadvertidamente, terapeutas de
em termos de variáveis de controle. Na realida- diferentes abordagens emitem regras como
de, é esperado que o psicoterapeuta pragmáti- forma de exercer controle sobre os comporta-
co, em sua atuação clínica, tenha condições de mentos dos usuários de seus serviços. Ao devol-
descrever, em termos comportamentais, todas verem análises funcionais ou interpretarem,
as suas interações com o terapeutizando. também estão emitindo regras. A emissão de
De acordo com Medeiros e Medeiros (2011), regras por terapeutas, de acordo com Medeiros
alguns temas em Análise do Comportamento são (2010; 2020), possui múltiplos efeitos sobre o
particularmente relevantes em PCP, como com- repertório comportamental dos terapeutizan-
portamento verbal, classes funcionais/equiva- dos, muitos dos quais, contraterapêuticos (e.g.,
lência, comportamento verbalmente controlado insensibilidade as contingências, quebra na
e determinantes culturais do comportamento correspondência verbal, respostas de contra
(e.g., regras, modelos e estímulos reforçado- controle).
res/punitivos condicionados generalizados). A Os comportamentos alvo produzem con-
ênfase no comportamento verbal, nas classes sequências conflitantes. Algumas delas são
funcionais/equivalência e no controle verbal simbólicas, como admiração, status, poder e
se dá pelo fato de que a maior parte das intera- respeito (i.e., reforçadores condicionados ge-
ções entre terapeuta e terapeutizando é verbal neralizados) ou rejeição, humilhação e ostra-
(Hamilton, 1988; Medeiros, 2002a; Medeiros, cismo (i.e., estímulos aversivos condicionados
2002b). Porém, mais do que dar ênfase no que o generalizados), enquanto outras são práticas,
terapeutizando diz, cabe ao terapeuta questio- como atividades de lazer, tempo de descanso, o
nar-se acerca do que leva o terapeutizando a di- sabor de um alimento calórico, bate papo com
zê-lo (Glenn, 1983; Medeiros & Medeiros, 2011). um amigo etc. A preponderância do controle
As intervenções do terapeuta, por sua vez, se pelas consequências simbólicas do comporta-
dão predominantemente, pela apresentação mento em detrimento das práticas, de acordo
de estímulos verbais. Sendo assim, é essencial, com Medeiros e Medeiros (2011) e Medeiros
em PCP, o terapeuta não apenas analisar as (2018), pode resultar em padrões comporta-
respostas verbais do cliente, como também ter mentais correlacionados ao que se denomina
condições de categorizar funcionalmente as cotidianamente de sofrimento.
suas próprias respostas verbais. Tais análises, A cultura tende a fortalecer certos com-
em PCP, utilizarão a terminologia proposta por portamentos como cuidar dos outros, se exer-
Skinner (1957), como defendem Glenn (1983), citar, flertar com várias mulheres, iniciar um
Hamilton (1988) e Medeiros (2002a; 2002b; namoro etc. com reforçadores simbólicos.
2013). Porém, esses mesmos comportamentos podem
Como discutem Poppen (1989), Abreu- resultar em perdas de reforçadores práticos,
Rodrigues e Sanabio-Heck (2004), Meyer (2005), os quais, a despeito de pouco valorizados pela

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Psicoterapia comportamental pragmática
Carlos Augusto de Medeiros

cultura, podem ser essenciais. O adoecimento O desenvolvimento de repertórios analíti-


(quadros depressivos, transtornos de ansiedade cos é outra marca da PCP (Medeiros, 2020a). O
ou dores crônicas) usualmente é uma forma de uso do procedimento de questionamento refle-
esquiva do conflito entre consequências sim- xivo (Medeiros, 2020b) tem como objetivo, não
bólicas e práticas (Medeiros, 2018). Ao adoecer, só criar condições para que o terapeutizando
o terapeutizando evita as cobranças por não emita autorregras, como também aprenda a
estar agindo do modo socialmente imposto. analisar sozinho o próprio comportamento e
Uma meta comum, portanto, de intervenções os comportamentos das pessoas ao seu redor.
em PCP é o enfraquecimento do controle exer- O Treino de Habilidades Socias
cido por consequências simbólicas sobre os Assistemático (THSA) é um procedimento da
comportamentos alvos dos terapeutizandos PCP destinado a estabelecer repertório social-
(Medeiros, 2018; 2020; Medeiros & Medeiros, mente habilidoso no qual o terapeuta não expõe
2011). ao terapeutizando qual é a resposta socialmen-
te habilidosa. No THSA, o terapeuta apenas cria
O que torna a PCP diferente das demais vertentes condições para que o próprio terapeutizando
de TAC? formule as respostas socialmente habilido-
sas em cada demanda social trazida por ele.
Muitos dos elementos da PCP descritos Ensaios comportamentais são feitos, nos quais
até aqui, principalmente na sua relação com as respostas dos terapeutizandos são segui-
o Behaviorismo Radical, são comuns às outras das de consequências naturais providas pelo
vertentes de TAC, como o externalismo, a postura terapeuta simulando como as outras pessoas
ideográfica, a necessidade de realização de aná- reagiriam. Com esse procedimento, o terapeu-
lises funcionais individuais etc. (Castanheira, ta modela as respostas do terapeutizando de
2002; Ribeiro, 2001). Resta a pergunta acerca modo aproximado às consequências naturais.
do que diferencia à PCP das outras vertentes Ao invés de dar feedbacks acerca das respos-
de TAC. tas emitidas pelo terapeutizando, o terapeuta
Medeiros (2020a) chama a atenção para solicita que o próprio terapeutizando avalie as
o caráter ostensivo das terapias de orientação suas respostas. Por meio do questionamento
comportamental ao utilizarem com frequência reflexivo, o terapeuta leva o terapeutizando a
consequências reforçadoras ou punitivas arbi- identificar o que deveria ser mantido e o que
trárias (e.g., congratulações ou repreensões) e a deveria ser modificado em suas respostas para
emissão de regras pelo terapeuta. Esse tipo de terem maior probabilidade de reforçamento.
intervenção reduz a variabilidade comporta- Perguntas são feitas acerca dos efeitos emo-
mental e a sensação de liberdade do terapeuti- cionais de cada interação simulada, tanto para
zando (Baum, 2005/2006; Ferster, 1967; 1972). verificar até que ponto as simulações são fun-
Os controles ostensivos evidenciam o papel de cionalmente equivalentes às situações reais,
agente controlador exercido pelo terapeuta. Na como para avaliar se, com as repetições dos
medida em que uma das metas da PCP é en- ensaios, tais efeitos reduzem de magnitude.
fraquecer o controle social, cabe ao terapeuta O THSA é desenvolvido de modo que o
evitar ao máximo o papel de agência de con- terapeutizando aprenda a construir sozinho as
trole social. respostas socialmente habilidosas sem depen-
der do terapeuta para lhe fornecer modelos ou

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 6 | 95


Psicoterapia comportamental pragmática
Carlos Augusto de Medeiros

instruí-lo a como fazê-lo. Além disso, possibilita conjuntura atual. Como base nas relações entre
ao terapeutizando construir respostas ao seu a PCP e o Behaviorismo Radical, a Análise do
próprio estilo e não aquelas que arbitraria- Comportamento e as demais vertentes de te-
mente o terapeuta considera mais adequadas. rapias analíticas comportamentais, ficou evi-
Portanto, o THSA, como os demais procedi- dente que ela é uma aplicação da Análise do
mentos em PCP se destina a reduzir o controle Comportamento à clínica. Desse modo, não faz
ostensivo exercido pelo terapeuta, conferindo sentido questionar em que onda ela surfa, uma
um papel mais ativo ao terapeutizando. vez que as ondas são uma maneira de organi-
A ideia por trás da PCP é criar condições zar cronologicamente as terapias de orientação
para que o terapeutizando comporte-se de comportamental e cognitivo comportamental
modos diferentes do que sempre fez. Todavia, concebidas nos Estados Unidos (Vandenberghe,
parte-se do pressuposto em PCP de que tais 2017).
mudanças não são sustentáveis se a relação A característica diferenciadora da PCP em
de controle do terapeuta e terapeutizando for relação às demais vertentes de TAC é a oposi-
ostensiva (Ferster, 1967; 1972; 1979/2007). O ção ao controle ostensivo comumente exercido
mesmo ocorre em outras relações entre agentes pelos terapeutas de orientação comportamen-
controladores e controlados, como famílias e tal. Ao presumir que grande parte do sofrimen-
filho (a), professore(a)s e aluno(o)s, chefes e su- to experienciado pelos terapeutizandos decorre
bordinado(a)s, pastore(a)s e fiéis etc. Caso o que de conflitos entre controles simbólicos sociais e
controle o comportamento dos agentes contro- práticos, a PCP preconiza a redução do controle
lados sejam as instruções e as consequências social, a começar pelo controle social exercido
arbitrárias providas pelo agente controlador, pelo terapeuta. Além da mudança na frequ-
dificilmente os comportamentos se manterão na ência de comportamentos alvo, a PCP busca
sua ausência. Além disso, o controle ostensivo estabelecer repertórios comportamentais que
diminui a probabilidade de que consequências tornem o terapeuta desnecessário.
naturais e práticas assumam o controle do com-
portamento. Por fim, as intervenções ostensivas Referências
deixam pouco espaço para desenvolvimento
de repertório descritivo e analítico, mantendo Abreu-Rodrigues, J., & Sanabio-Heck, E. T. (2004).
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Psicoterapia comportamental pragmática
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Comportamento em Foco, v. 13, cap. 6 | 99


COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 13 pp. 100—112

Felipe Magalhães Lemos (1, 2)


IISCA, uma proposta de Análise Funcional 1
felipemagalhaeslemos@gmail.com

Joshua Jessel (3)


IISCA, a Functional Analysis proposal joshua.jessel@qc.cuny.edu

(1) Universidade Federal de São Carlos


(2) Luna ABA
(3) Queens College CUNY

Resumo Abstract

Revisamos a literatura atual sobre um modelo We reviewed the current literature on a re-
de análise funcional recentemente desenvol- cently developed functional analysis model
vido denominado de análise de contingên- termed the interview-informed synthesized
cia sintetizada por entrevista (IISCA), com contingency analysis (IISCA) to improve
intuito de melhorar a disseminação dos pro- dissemination of the procedures among the
cedimentos entre a população brasileira. A Brazilian population. The IISCA has the poten-
IISCA tem potencial para ser uma avaliação tial to be a viable behavioral assessment that
comportamental viável que pode ser usada can be used across countries to reduce pro-
em todos os países para reduzir o comporta- blem behavior exhibited by individuals with
mento-problema exibido por indivíduos com intellectual and developmental disabilities.
deficiência intelectual e de transtornos de de- The IISCA identifies the functions of problem
senvolvimento. A IISCA identifica as funções behavior in an efficient and practical manner,
do comportamento-problema de forma efi- allowing clinicians to design effective, skill-
ciente e prática, permitindo que os analistas -based treatments that produce meaningful
do comportamento planejem tratamentos changes in problem behavior. In this review,
eficazes e baseados em habilidades, produ- we will be emphasizing the early develop-
zindo mudanças significativas no comporta- ment of the IISCA and track its evolution as
mento-problema. Nessa revisão, nós enfati- a practical functional assessment model with
zaremos o desenvolvimento inicial da IISCA utility as a resource in Brazil.
e acompanharemos sua evolução como um
modelo de avaliação funcional prática como
um recurso útil para o Brasil.

Palavras-chave Keywords

IISCA; análise funcional; contingência IISCA; functional analysis; synthesized


sintetizada. contingency.

1 Apresentação na ABPMC: Lemos, F. M., Almeida, C. G. M., Chereguini, P. A. C., Freitas, D. F. C. L. Uma discussão sobre possibilidades de
análise funcional do comportamento em intervenções baseadas na análise do comportamento aplicada ao transtorno do espectro autista.
Mesa redonda. 05/09/2020. Lemos, F. M. Análise Funcional por Contingência Sintetizada (IISCA), um estudo de caso. Mesa redonda. 05/09/2020.

100
Análise funcional do comportamento
Felipe Magalhães Lemos & Joshua Jessel

Análise Funcional: aspectos históricos implementados em uma gama de pacientes que


apresentavam comportamentos-problema. A
Há várias décadas analistas do compor- Análise Funcional Padrão (também conhecida
tamento vêm estudando e desenvolvendo téc- no Brasil como Análise Funcional Experimental)
nicas de avaliação funcional para identificar é um tipo de avaliação que isola (a) reforço po-
contribuintes ambientais para o comportamen- sitivo em uma condição de teste que manipula
to-problema. Uma das primeiras demonstrações o acesso à atenção na forma de repreensões, (b)
foi realizada com um paciente diagnosticado reforço negativo em uma condição de teste que
com esquizofrenia que apresentava compor- manipula a fuga de condições aversivas sob
tamento auto lesivo (do inglês, Self-Injurious a forma de instruções acadêmicas, e (c) refor-
Behavior, SIB), como pancadas na cabeça e ço automático em uma condição de teste sem
braço (Lovaas, Freitag, Gold, & Kassorla, 1965). consequências socialmente mediadas (Iwata et
Embora as causas para o SIB fossem muitas al., 1982/1994; Sella & Ribeiro, 2018). Embora
vezes conceituadas internamente e assumidas historicamente relevante, têm sido necessárias
como produto do diagnóstico, os pesquisado- múltiplas modificações na aplicação da análise
res foram capazes de determinar que o SIB era funcional padrão a fim de identificar com pre-
mais propenso a ocorrer quando o paciente não cisão as funções comportamentais (Hagopian,
estava recebendo acesso à música preferida e Rooker, Jessel, & DeLeon, 2013). Além disso, esse
aprovação social. Assim, considerou-se que o modelo apresenta diversas barreiras práticas
SIB era sensível a mecanismos operacionais e que impactam negativamente a utilidade entre
influenciado por reforço social-positivo. Esse os analistas do comportamento (Hanley, 2012;
resultado estimulou pesquisas na área de ava- Oliver, Pratt, & Normand, 2015; Roscoe, Phillips,
liação funcional e intervenção para SIB e outras Kelly, Farber, & Dube, 2015). Para a tornar mais
topografias semelhantes de comportamentos- prática, Hanley (2012) sugeriu uma abordagem
-problema (Berkson, 1965; Berkson, Mason, mais individualizada para a análise funcional
& Saxon, 1963; Lovaas et al., 1965; Lovaas & que incluiu uma contingência sintetizada atra-
Simmons, 1969). A tecnologia de avaliação fun- vés de informações qualitativamente ricas, co-
cional centra-se em compreender como refor- letadas a partir de entrevistas e observações.
çadores putativos historicamente mantiveram Na publicação seminal desse modelo prático, a
o comportamento-problema, e então, usar essas análise funcional exigiu menos de 30 minutos
informações para projetar procedimentos de para ser realizada e informou um tratamento
tratamentos subsequentes. baseado em função (do inglês, function-based
A combinação dessas demonstrações ini- treatment) que resultou em melhorias social-
ciais da avaliação funcional levou a algumas mente significativas no comportamento-pro-
conclusões gerais sobre eventos ambientais blema (Hanley, Jin, Vanselow, & Hanratty,
comuns que poderiam estar contribuindo para 2014). Esse modelo de análise funcional ficou
o comportamento-problema (Carr, 1977). Em conhecido como análise de contingência
um modelo altamente influente, Iwata, Dorsey, sintetizada por entrevista (IISCA - Interview-
Slifer, Bauman, & Richman (1982/1994) utiliza- Informed Synthesized Contingency Analysis) e
ram o entendimento comum de reforços po- foi baseado nos componentes procedimentais
sitivos e negativos para projetar um conjunto descritos em detalhes abaixo (Jessel, Hanley, &
de procedimentos padrão que poderiam ser Ghaemmaghami, 2016).

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 7 | 101


Análise funcional do comportamento
Felipe Magalhães Lemos & Joshua Jessel

IISCA base em informações de desfechos que ocor-


rem logo após o comportamento-problema.
Definição Elas podem incluir uma combinação de fuga
A IISCA é um tipo de análise funcional de demanda, acesso à atenção ou acesso a itens
que alterna uma condição única de teste com tangíveis. A importância de sintetizar variáveis
uma condição de controle correspondente, relevantes em uma única contingência reside
ambas guiadas por uma entrevista semiaber- no potencial de emular o contexto natural em
ta com familiares, cuidadores, professores ou que o comportamento normalmente ocorre.
quaisquer outras pessoas relevantes na vida Além disso, sintetizar contingências durante
do paciente. Ao contrário de outras análises a IISCA aumenta a probabilidade de obter
funcionais que tendem a avaliar contingências resultados diferenciados em um período efi-
isoladamente, a IISCA avalia o contexto como ciente de tempo, o que permite aos analistas
um todo e sintetiza variáveis relevantes infor- do comportamento a capacidade de passar a
madas pelos cuidadores como coocorrentes implementar mais rapidamente tratamentos
no ambiente natural. De fato, os componentes baseados em funções (Jessel et al., 2020).
centrais da IISCA são notavelmente diferen-
tes dos procedimentos da análise funcional Fundamentação
padrão, tendo como uma de suas principais A teoria fundamental na aplicação de me-
diferenças o compromisso de analisar contin- todologias de análise funcional é que o compor-
gências de reforço sintetizadas (Jessel, Hanley, tamento-problema é aprendido ou são respostas
& Ghaemmaghami, 2020). As variáveis a serem operacionais (ou seja, aquelas que são mantidas
sintetizadas são antecedentes (operações esta- por suas consequências). Como alguns eventos
belecedoras), comportamentos (topografias de ambientais são mais comuns após o comporta-
respostas) e consequências (reforços positivos e mento-problema do que em sua ausência, eles
negativos). As operações estabelecedoras (OEs) podem aumentar a probabilidade futura desse
são sintetizadas apresentando múltiplos even- comportamento-problema ocorrer. Além disso,
tos evocativos ao mesmo tempo (por exemplo, alguns eventos antecedentes podem aumentar
apresentar instruções para concluir uma de- o valor dessas consequências, que são chama-
manda restringindo o acesso a itens preferidos dos de operações estabelecedoras. Outras vari-
e/ou atenção). As topografias de resposta são áveis antecedentes, referidas como estímulos
sintetizadas pela inclusão de precursores de discriminativos, estão correlacionadas com
comportamentos-problema mais graves, além a entrega dessas consequências e tornam-se
de quaisquer topografias que existam dentro sinal para a relação contingente entre compor-
da mesma classe de contingência. Por exemplo, tamento e consequências. Tomados como um
se um paciente geralmente emite grunhidos todo, antecedentes naturais evocam o compor-
logo antes de jogar os livros no chão, o reforço tamento-problema e as consequências fortale-
será fornecido contingente aos grunhidos com cem esse comportamento-problema. O dever
o objetivo de desescalar (evitar a escalada da do analista do comportamento é usar a tecno-
topografia de reposta para uma topografia mais logia de análise funcional para identificar os
grave) a situação antes que o paciente recorra ao eventos ambientais que ocorrem naturalmen-
comportamento mais destrutivo de jogar livros. te, a fim de reorganizar o contingenciamento
Por fim, as consequências são sintetizadas com para apoiar formas de comportamento mais

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 7 | 102


Análise funcional do comportamento
Felipe Magalhães Lemos & Joshua Jessel

apropriadas. Isto é, por mais que os eventos Objetivos da IISCA


comportamentais observados possam parecer A IISCA tem objetivos particulares, com
extraordinários, essas respostas têm uma causa os três principais sendo: (1) demonstrar forte
lógica de eventos antecedentes e consequentes controle sobre o comportamento-problema; (2)
próximos. obter uma linha de base estável para avaliar
A IISCA avalia esses antecedentes e con- os efeitos do tratamento; e (3) identificar con-
sequências em uma contingência de múltiplas dições motivacionais que servirão para refor-
variáveis combinadas que representam a com- çar outras habilidades utilizando reforços que
plexidade do contexto em que o comportamen- historicamente fortaleceram o comportamen-
to-problema é exibido. Embora incorporar a to-problema (Rajaraman & Hanley, 2018). Ao
complexa coleção de variáveis na contingência demonstrar controle sobre o comportamen-
sintetizada muitas vezes ofusque o controle to-problema por meio de uma contingência
isolado de cada variável (por exemplo, Fisher, composta de materiais e interações descritas
Greer, Romani, Zangrillo, & Owen, 2016), a li- pelos cuidadores na entrevista, é possível obter
teratura sugere que muitas vezes é necessário uma linha de base estável a partir da qual se
incorporar a síntese para entender o compor- pode avaliar a eficácia de um tratamento ba-
tamento-problema durante uma análise funcio- seado em função e identificar um conjunto de
nal (Call & Mevers, 2014; Call, Wacker, Ringdahl, condições motivadoras que servirão como
& Boelter, 2005; Dolezal & Kurtz, 2010; Mann & instruções podendo reforçar diferencialmen-
Mueller, 2009). Slaton, Hanley, & Raftery (2017) te habilidades sociais importantes. A natureza
também demonstraram que a sintetização de prática da IISCA permite que o processo seja
contingências complexas aumenta a probabi- aplicado de forma flexível em casa, escola, clíni-
lidade de obtenção de resultados diferencia- ca, ou outros ambientes. Além disso, o analista
dos em comparação com a análise funcional do comportamento utiliza o tratamento base-
padrão. Os autores constataram que em 80% ado em função como uma oportunidade para
dos casos era necessário sintetizar contingên- ensinar habilidades relevantes relacionadas
cias para obter resultados analisáveis para in- às necessidades do cuidador e do paciente. O
formar um tratamento eficaz. Isso sustenta a processo de ensino de habilidades muitas vezes
noção de que as contingências sintetizadas são começa com a melhoria da comunicação, ensi-
mais vantajosas do que as variáveis isoladas. nando progressivamente habilidades linguísti-
De fato, Coffey et al. (2019) apontam que a IISCA cas mais apropriadas para o desenvolvimento.
busca gerar procedimentos seguros e rápidos O analista do comportamento, então, continua
que sejam aceitáveis às famílias, professores o tratamento incluindo o ensino de tolerância
ou cuidadores de indivíduos que apresentam com negações e cooperação com a instrução
comportamento-problema. Ou seja, os proce- de adultos. Após a conclusão do processo de
dimentos de análise funcional devem ser tele- avaliação e tratamento abrangentes a partir
visíveis (qualidade de procedimento do qual da IISCA, o objetivo é alcançar reduções sus-
o terapeuta se orgulharia de transmitir na te- tentáveis no comportamento-problema e um
levisão) ou conduzidos de uma forma em que repertório alternativo que garanta a tolerân-
a comunidade esteja disposta a apoiar como cia bem-sucedida de situações desafiadoras no
serviços terapêuticos adequados. futuro.

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 7 | 103


Análise funcional do comportamento
Felipe Magalhães Lemos & Joshua Jessel

Locais e participantes acompanham de forma confiável o comporta-


A IISCA tem sido aplicada em diversos mento e tranquilizam o indivíduo. A entrevista
contextos, como escolas (por exemplo, Herman, pode levar cerca de 30 min para ser concluída
Healy, & Lydon, 2018; Santiago, Hanley, Moore, e é seguida de uma observação breve. Durante
& Jin, 2016; Taylor, Phillips, & Gertzog, 2018), a observação, o analista do comportamento in-
ambulatórios clínicos (por exemplo, Ferguson et terage informalmente com os participantes e
al., 2020; Jessel et al., 2018), casas (por exemplo, começa a sondar alguns dos eventos ambientais
Rose & Beaulieu, 2019; Strand & Eldevik, 2018) descritos como relacionados ao comportamen-
e programas de habilitação diária para adul- to-problema na entrevista. A observação breve
tos (Ghaemmaghami, Hanley, & Jessel, 2016). é conduzida como uma oportunidade para ca-
Grande parte dos participantes da literatura de librar as definições operacionais do compor-
pesquisa foram diagnosticado com transtorno tamento-problema e a relevância ecológica da
do espectro autista (TEA); no entanto, houve contingência sintetizada a ser avaliada durante
replicação da IISCA entre pessoas com trans- a IISCA com base na performance do paciente
tornos de ansiedade generalizadas, síndrome durante a observação e feedback dos cuidado-
de down, e mesmo sem qualquer diagnóstico res in situ. A observação breve leva cerca de
de deficiência intelectual ou de transtornos do 10 minutos para ser conduzida, a depender de
desenvolvimento (Jessel, Metras, Hanley, Jessel, quão confiantemente o analista do comporta-
& Ingvarsson, 2020a). Entre aqueles que viven- mento sente que identificou o contexto relevan-
ciaram a IISCA as idades variam drasticamen- te de interesse para determinar a necessidade
te, desde 1 ano e meio de idade até pacientes de avaliações adicionais e tratamento (Jessel
adultos. As topografias mais comuns que têm et al., 2016).
sido avaliadas e tratadas são agressão, SIB, com- Após a conclusão da entrevista e da ob-
portamento destrutivo, e problemas de sono, servação, o analista do comportamento plane-
embora outras topografias mais idiossincráti- ja os procedimentos da IISCA para emular as
cas tenham sido avaliadas (por exemplo, Jessel, descrições dos eventos feitas pelos cuidadores e
Ingvarsson, Metras, Kirk, & Whipple, 2018). as experiências notadas durante a observação.
A IISCA inclui uma condição única de teste na
Procedimentos de avaliação qual a OE sintetizada putativa é organizada
Antes de realizar a IISCA, o analista do para evocar o comportamento-problema e o
comportamento realiza uma entrevista semia- reforço sintetizado putativo é apresentado para
berta (Hanley, 2012) com pessoas acostumadas aplacar o comportamento-problema após sua
a lidar com o comportamento-problema do pa- ocorrência. Durante o controle correspondente,
ciente (por exemplo, pais, professores e cui- a OE putativa é eliminada com a entrega contí-
dadores). O objetivo desta entrevista é reunir nua e não-contingente dos reforços putativos.
informações qualitativas sobre (a) os tipos e Portanto, todas as variáveis incluídas em ambas
topografias de comportamentos precursores as condições são equiparadas e a única diferen-
não-perigosos e comportamentos perigosos que ça entre as condições de teste e controle é a mu-
serão alvo na classe de contingência da IISCA, dança na relação contingente entre reforços e
(b) os eventos antecedentes que geralmente comportamento-problema, ou seja, reforço con-
evocam esses comportamentos no ambiente tingente na condição de teste; reforço não-con-
natural, e (c) os eventos consequentes que tingente na condição de controle. As condições

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 7 | 104


Análise funcional do comportamento
Felipe Magalhães Lemos & Joshua Jessel

de teste e controle são rapidamente alternadas manter o acesso aos reforçadores seja deter-
em um delineamento multielementos e o con- minado com base no desempenho e consumo
trole funcional é demonstrado quando taxas individuais dos reforços. Muito embora o tempo
elevadas de comportamento-problema são re- designado para devolver o acesso aos reforçado-
petidamente demonstradas nas sessões de teste res seja determinado com base na performance
em comparação com baixas ou nenhuma taxa e consumo individuais dos reforços. Em outras
de comportamento-problema nas sessões de palavras, o indivíduo pode exigir mais tempo
controle. A IISCA é tipicamente realizada em com os reforçadores se estes envolverem um
uma sessão subdividida em cinco sessões de jogo que requer tempo para configurar ou para
3 ou 5 min cada, potencialmente criando uma revezar. Normalmente é melhor dar tempo su-
duração total de análise de 15 ou 25 min. As ses- ficiente com os reforços para que o paciente
sões são ordenadas para ocorrer no padrão de retorne a um estado calmo e feliz. Esse proces-
(1) controle, (2) teste, (3) controle, (4) teste e (5) so intercambiavelmente apresentando as OEs
teste, representado da seguinte forma CTCTT, e os reforçadores contingentes ao comporta-
a menos que mais sessões sejam necessárias mento-problema é repetido até que a sessão
para garantir o controle experimental. A sessão de teste seja concluída. Durante a condição de
de controle é realizada primeiro para estabe- controle, os reforçadores estão disponíveis no
lecer confiança com o indivíduo e criar algum decorrer de toda a sessão e qualquer compor-
nível de rapport entre paciente e analista do tamento-problema é ignorado. Isso significa
comportamento. Duas condições de teste são que o analista do comportamento continua a se
repetidas no final para replicar os efeitos da engajar com o paciente e permite o acesso aos
contingência quando o teste é implementado reforçadores tangíveis, independentemente de
independentemente de sua localização tempo- o comportamento-problema estar ocorrendo.
ral para o controle. É importante ressaltar que o Essa comparação de teste-controle intima-
número de sessões pode variar dependendo da mente combinada permite uma exibição trans-
performance do paciente durante a IISCA; no parente da influência de eventos ambientais
entanto, resultados diferenciados implicando informados pelos cuidadores sobre o compor-
em uma função socialmente mediada são um tamento-problema com a possibilidade de três
desfecho provável na maioria dos casos (Jessel desfechos potenciais. Em primeiro lugar, se o
et al., 2020a) comportamento-problema for elevado na con-
A condição de teste começa com a OE defi- dição de teste e eliminado na condição de con-
nida a partir da entrevista e da observação. Ela trole, isso indica um desfecho de diferenciação
pode envolver o analista do comportamento e o analista do comportamento pode iniciar a
remover itens tangíveis e instruir o indivíduo implementação de um tratamento baseado em
a fazer a transição para um contexto com ma- função. Em segundo lugar, o analista do com-
teriais acadêmicos. Os reforços (ou seja, a inter- portamento pode precisar voltar a entrevistar
rupção das instruções e a devolução do acesso os cuidadores ou a realizar mais observações se
não-contingente a itens tangíveis) são devolvi- o comportamento-problema não for presencia-
dos imediatamente após alguma das respostas do no teste ou na condição de controle. Sem ob-
sintetizadas como comportamentos-problema servar o comportamento-problema (o que pode
ocorrer, e são mantidos por volta de 30 segun- incluir topografias não-perigosas e perigosas,
dos, muito embora o tempo designado para sendo a primeira preferível em detrimento da

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 7 | 105


Análise funcional do comportamento
Felipe Magalhães Lemos & Joshua Jessel

segunda), o analista do comportamento é inca- entre as condições de teste e controle, em sua


paz de determinar a função e pode ter perdido empresa, FTF Behavioral Consulting, e proje-
algumas variáveis ecologicamente relevantes tou um novo formato de IISCA chamado IISCA
que precisam ser incluídas na IISCA. Terceiro, baseada em performance. A IISCA baseada em
o comportamento-problema pode ocorrer em performance evoluiu a partir de avaliações re-
condições que sugerem a influência potencial centes, sugerindo que a eficiência de uma aná-
do reforço automático. Os cuidadores devem lise funcional pode ser melhorada sem afetar
ser consultados se o reforço automático estiver o controle analítico, mensurando instâncias de
implicado como uma fonte potencial de influ- comportamentos-problema durante intervalos
ência sobre o comportamento-problema, pois onde o reforçador está presente em compara-
isso afetará os procedimentos de tratamento ção com intervalos onde o reforçador está au-
(Hagopian, Rooker, & Zarcone, 2015). sente (Jessel et al., 2020a, b). A IISCA baseada
Os dados podem ser coletados ao vivo em performance elimina quaisquer intervalos
quando a IISCA é conduzida ou a partir de fixos de tempo e apresenta apenas OEs desti-
uma gravação de um vídeo, em um registro nadas a evocar o comportamento-problema
posterior (Hanley, 2020a). Os dados são re- quando o paciente indica que está confortável
gistrados em planilhas, que estão disponíveis com a situação e contexto em que se encontra.
gratuitamente online (https://practicalfunctio- Portanto, as sessões não têm mais um tempo
nalassessment.com), gerando gráficos específi- predeterminado (ou seja, 3 ou 5 min) e a dura-
cos. Normalmente o comportamento-problema ção do reforço depende de o paciente estar feliz,
é registrado como frequência e convertido em relaxado e engajado antes de reintroduzir a OE.
uma taxa dividindo o número de ocorrências Essa modificação nos procedimentos da IISCA
de comportamento-problema pela duração da visa melhorar a segurança e a aceitabilidade
sessão. Por exemplo, se o paciente apresentar geral entre aqueles que recebem os serviços.
10 instâncias de agressão em uma sessão de No entanto, é importante ressaltar que esses
cinco minutos, a taxa de comportamento-pro- procedimentos ainda estão sendo avaliados em
blema seria de 2 respostas por minuto. Usar a pesquisas.
taxa como medida de comportamento-proble-
ma permite uma avaliação fluida das mudan- Efetividade e eficiência
ças de comportamento nas sessões e o analista A eficácia de uma análise funcional é veri-
do comportamento pode avaliar mudanças na ficada através dos efeitos do tratamento obtidos
tendência, nível e variabilidade. Além disso, a ao utilizar uma análise funcional. Esta forma
interpretação da qualidade do controle pode ser de verificação foi identificada como “utilidade
inferida com base no nível de sobreposição da do tratamento” (Hayes, Nelson, & Jarrett, 1987;
taxa de comportamento-problema, com maior Kratochwill & Shapiro, 2000) e sugere que uma
sobreposição (entre respostas na condição de análise funcional é tão boa quanto o tratamento
controle e teste) sugerindo controle mais fraco que informa. É improvável que os analistas do
e menor sobreposição sugerindo um contro- comportamento selecionem e usem uma aná-
le mais forte (Jessel, Metras, Hanley, Jessel, & lise funcional, a menos que ela potencialize os
Ingvarsson, 2020a, b). resultados dos tratamentos de seus pacientes.
Atualmente, o Dr. Gregory Hanley não Em demonstrações comparativas, os tratamen-
utiliza mais o critério de tempo para trocar tos precedidos por uma IISCA ou procedimentos

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 7 | 106


Análise funcional do comportamento
Felipe Magalhães Lemos & Joshua Jessel

semelhantes têm sido considerados mais efica- minutos e analisaram o comportamento-proble-


zes na redução de comportamentos-problema ma durante os primeiros 5 min e 3 min. Jessel
(Slaton & Hanley, 2018; Slaton et al., 2017). Desse et al. encontraram queda mínima no controle
modo, a IISCA estabelece o contexto ideal para o mesmo quando as sessões eram relativamente
ensino, criando um ambiente rico com reforço breves e replicaram esses desfechos com mais 8
sintetizado que pode ser usado para ensinar casos consecutivos quando as sessões da IISCA
um mando omnibus (referente a “geral”, e que foram de 3 minutos. Esses resultados sugerem
pode ser entendido com um mando controlado que, em muitas ocasiões, uma análise funcio-
por múltiplas OEs) inicial que produz todos os nal precisa apenas de um total de 15 minutos
reforços e subsequentemente múltiplos mandos para ser realizada. É provável que a segurança
específicos que ensinam o paciente a identifi- também seja uma preocupação para os ana-
car múltiplos eventos (Ward, Hanley, Warner, listas do comportamento durante uma análise
& Gage, 2020). Isso sugere que a IISCA tem a funcional e recomenda-se que os analistas do
capacidade de manter um nível de integridade comportamento utilizem o modelo de análise
na redução do comportamento-problema e tem funcional que provavelmente estabelecerá um
alta validade de tratamento. ambiente controlado, limitando a exposição a
Isso não quer dizer que a IISCA seja o único comportamentos-problema graves. Warner et
modelo de análise funcional com validade de al. (2020) realizaram a IISCA com 10 participan-
tratamento, e em alguns casos o tratamento tes que apresentaram múltiplas topografias de
informado pela análise funcional padrão tem comportamento-problema que vão desde não-
sido igualmente eficaz (Holehan et al., 2020). -perigosos (por exemplo, resmungar, chorar)
Assim, é provável que o analista do compor- até perigosos (por exemplo, SIB, agressão) que
tamento tenha múltiplas opções ao decidir foram relatados pelos cuidadores como fun-
qual formato de análise funcional é adequado cionalmente relacionados. Os autores original-
para uma determinada situação. Com isso em mente conduziram a IISCA usando uma classe
mente, os pesquisadores têm tentado modificar de contingência aberta (do inglês, open con-
a análise funcional para melhorar as qualida- tingency-class) que reforçava qualquer com-
des da utilidade pragmática e prática para os portamento-problema que ocorresse dentro da
analistas do comportamento (Northup et al., contingência e, em seguida, progressivamente
1991; Sigafoos & Saggers, 1995; Thomason- introduziram a extinção para validar empirica-
Sassi, Iwata, Neidert, & Roscoe, 2011). mente os relatos dos cuidadores sobre as topo-
Por exemplo, os analistas do comporta- grafias que provavelmente existiam dentro da
mento muitas vezes preferem análises funcio- mesma classe funcional. Os comportamentos
nais que necessitam menos tempo de aplicação, não-perigosos apresentaram maior probabi-
pois uma análise funcional eficiente permitiria lidade de ocorrer primeiro, com os comporta-
que eles passassem a introduzir o tratamento mentos de topografias perigosas somente sendo
e reduzir o comportamento-problema mais exibidos quando a extinção foi implementada
imediatamente. Jessel et al., (2020a) realiza- para os comportamentos não-perigosos. Ou
ram um estudo avaliando a eficiência da IISCA seja, comportamentos que coocorrem em uma
analisando o nível de controle obtido quando mesma situação serão provavelmente sensíveis
sessões mais breves eram utilizadas. Os autores aos mesmos reforçadores sintetizados. Sendo
realizaram 18 IISCAs utilizando sessões de 10 assim, planejar um tratamento com base na

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 7 | 107


Análise funcional do comportamento
Felipe Magalhães Lemos & Joshua Jessel

função obtida em uma análise funcional que diferenciados serão sustentáveis ao longo do
apenas observou o comportamento não-peri- tempo, entre indivíduos e contextos?
goso (precursor ou coocorrentes), não apenas é Essas perguntas são projetadas para
eficiente, mas muitas vezes uma opção segura fornecer ao analista do comportamento uma
para os analistas do comportamento. compreensão abrangente de quão eficaz uma
De fato, a IISCA é um modelo de análise análise funcional será, não apenas em simples-
funcional altamente flexível e os procedimen- mente evidenciar contingências de reforço que
tos podem ser altamente individualizados para podem influenciar o comportamento-proble-
atender às necessidades específicas dos analis- ma, mas em promover mudanças maiores e
tas do comportamento. Por exemplo, a latência mais globais durante a vida do paciente. Essa
tem sido usada como medida durante a IISCA é a diferença entre criar uma compreensão
quando o comportamento-problema analisado mais focada de procedimentos isolados em
é uma resposta discreta (ou seja, fuga; Boyle, um laboratório com pesquisadores altamente
Bacon, Brewer, Carton, & Gaskill, 2020; Jessel et qualificados e uma compreensão mais geral de
al., 2018), e tentativas têm sido utilizadas para pacotes de tratamento maiores que reintegram
melhorar a validade ecológica na condução os pacientes de volta ao ambiente doméstico e
da IISCA em sala de aula (Curtis et al., 2020), e escolar com os cuidadores como implementa-
análises intra-sessão têm sido utilizadas para dores (Ghaemmaghami, Hanley, & Jessel, 2020).
avaliar comportamentos potencialmente pe-
rigosos que não podem ser exibidos repetida- Considerações finais
mente (Jessel et al., 2019). Os procedimentos
originais da IISCA, embora práticos, podem A IISCA tem sido aplicada nos últimos
ser facilmente ajustados quando necessário e anos com resultados positivos obtidos especi-
permitem ao analista do comportamento um ficamente para a (a) utilidade prática da análise
nível de liberdade no planejamento da análise funcional, (b) eficácia em informar o tratamen-
funcional. to, (c) aceitabilidade social entre os cuidadores,
No geral, os analistas do comportamento e (d) generalidade dos desfechos do tratamento
são encorajados a validar um modelo de aná- entre pessoas e contextos relevantes. Isso tudo
lise funcional conforme apropriado para uso considerando que a IISCA é uma tecnologia de
em sua situação específica, fazendo quatro desenvolvimento relativamente nova entre
perguntas: alguns procedimentos de análise funcional
(1) É provável que os resultados diferen- muito mais históricos. A IISCA pode ser imple-
ciados impliquem em uma função socialmente mentada por analistas do comportamento ou
mediada? até mesmo por professores e cuidadores. Assim,
(2) Posso obter esses resultados diferen- parece ser uma proposta viável para o público
ciados de forma eficiente e segura? brasileiro, que ainda não possui uma regula-
(3) Os desfechos diferenciados podem in- mentação da profissão, e que apresenta todas
formar um tratamento baseado em função para as dificuldades atendidas pela IISCA.
reduzir o comportamento-problema e ensinar Para mais informações, vídeos e materiais
habilidades importantes? relevantes sobre a IISCA: www.practicalfunc-
(4) Os efeitos do tratamento baseado tionalassessment.com
em função informados por esses desfechos

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 7 | 108


Análise funcional do comportamento
Felipe Magalhães Lemos & Joshua Jessel

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Comportamento em Foco, v. 13, cap. 7 | 112


COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 13 pp. 113—129

Acurácia da fala em crianças com deficiência


auditiva e implante coclear via tecnologias
de ensino baseada em equivalência1 Ana Claudia Moreira Almeida Verdu (1)
ana.verdu@unesp.br
Speech accuracy in children with deaf and hard hearing (1)
Universidade Estadual Paulista
and cochlear implant via equivalence-based instruction
technology

Resumo Abstract
A Equivalence Based Instruction (EBI) pode pro- The Equivalence Based Instruction (EBI) can
mover a acurácia da fala em crianças com de- promote speech accuracy in deaf and hard
ficiência auditiva e implante coclear. Após o hearing children with cochlear implant. After
ensino de discriminações condicionais entre teaching conditional discriminations among
estímulos ditados, figuras e estímulos impres- dictated stimuli, pictures and printed stimuli
sos e suas unidades menores, o controle exer- and their minimal units, the control exerci-
cido pelos estímulos impressos sobre vocali- sed by the printed stimuli over more precise
zações mais precisas (leitura) são transferidos vocalizations (reading) are transferred to
para as figuras (tato). Este trabalho objetivou pictures (naming tact). This study aimed was
extrair e sistematizar os dados de precisão to extract and systematize accuracy speech
da fala nesses estudos. Foram identificados data. 17 studies were identified involving
17 estudos envolvendo palavras (10) e sen- words (10) and sentences (7), amounting to
tenças (7), totalizando 57 participantes. O EBI 57 participants. The EBI included teaching
incluiu passos de ensino (de 1 a 24 passos); steps (from 1 to 24 steps); each step taught
cada passo ensinou relações entre estímulos relationships between stimuli and between
e entre estímulos e respostas com três conjun- stimuli and responses with three sets of sti-
to de estímulos cada. A diferença percentual muli each. The percentile difference between
entre leitura e tato de figuras diminuiu com- reading and picture naming tact decreased
parando pré e pós-testes: de 28,2 para 12,7 by comparing pre and post-tests: from 28.2 to
com palavras; de 59,6 para 9,3 com sentenças. 12.7 points with words; from 59.6 to 9.3 points
A quantidade de estudos, instituições envol- with sentences. The number of studies, ins-
vidas, participantes e delineamentos empre- titutions involved, participants and designs
gados incorporam os critérios científicos que employed to incorporate the scientific criteria
sustentam práticas baseadas em evidências that support evidence-based practice with a
em delineamento de sujeito único. single case design.

Palavras-chave Keywords
ensino baseado em equivalência; acurácia da equivalence-based instruction; speech accura-
fala; deficiência auditiva; implante coclear; prá- cy; deaf and hard hearing; cochlear implant;
ticas baseadas em evidências. evidence-based practice.

1 O conteúdo do presente capítulo é derivado de um minicurso realizado durante o XXIX Encontro Brasileiro de Psicoterapia e Medicina
Comportamental, no dia 03 de setembro de 2020, sob o título “Contribuições da Análise do Comportamento Aplicada no ensino da fala
acurada em crianças com diferentes necessidades educacionais especiais”.

Este trabalho obteve recursos de auxílios individuais da FAPESP (2019/17480-1) e do CNPq (#306535/2018-1) e foi apoiado pelo Instituto
Nacional de Ciência e Tecnologia sobre Comportamento, Cognição e Ensino – INCT-ECCE: FAPESP (Process # 2008/57705-8) and CNPq
(Process # 573972 / 2008-7).

113
Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
Ana Claudia Moreira Almeida Verdu

Linguagem e Comportamento Verbal em Crianças amamentação e troca de fraldas até a atenção


com Deficiência Auditiva e Implante coclear ao balbucio ou mesmo ao choro, que o bebê vai
discriminar unidades sonoras e reagir diferen-
A linguagem é uma habilidade essencial cialmente a elas relacionando essas unidades
expressa em várias atividades humanas na in- a aspectos do ambiente. E falhas, quer seja na
teração com o ambiente físico e social. Envolve integridade sensorial auditiva ou no sistema
habilidades como pensar, lembrar, planejar e fonoarticulatório, quer seja nas interações com
interferir sobre o comportamento de outras pes- os cuidadores, podem implicar em perda de
soas. Do balbucio de bebês e unidades inicial- experiências críticas para a aquisição da lin-
mente não linguísticas, estudiosos observaram guagem (Drash & Tudor, 1993; Levine et al.,
padrões significativos e confiáveis no fluxo da 2016).
fala e nos sinais visuais presentes, observando São muitas as condições diagnósticas em
e descrevendo conexões consistentes entre a que são observados déficits na linguagem, seja
linguagem e o mundo (Levine et al., 2016). pelo fato de estruturas sensoriais não estarem
Pesquisadores da Análise do Compor- preservadas como no caso de deficiências au-
tamento tem estudado a linguagem buscando ditivas, seja pela ocorrência de transtornos
identificar as condições sob as quais a aprendi- do neurodesenvolvimento como no caso de
zagem de tais comportamentos ocorre e, para transtornos do espectro autista. Crianças sob
evitar imprecisões terminológicas com as várias esses diagnósticos podem apresentar reper-
outras disciplinas que estudam linguagem tório verbal limitado se comparado com in-
(i.e. Linguística, Fonoaudiologia, Psicologia, divíduos da mesma idade e desenvolvimento
Informática) propôs o uso da expressão com- típico. Indivíduos típicos aprendem a exibir
portamento verbal. De maneira parcimoniosa, repertório verbal funcional de maneira inci-
compreende linguagem como comportamento dental; os demais indivíduos podem requerer
e afirma que esse é aprendido, ou seja, é sele- a necessidade de uma programação explícita
cionado e mantido por contingências de reforço de contingências de ensino. Para os indivíduos
(Skinner, 1957). A Análise do Comportamento que irão requerer programações explícitas e
tem demonstrado aporte teórico e empírico na sistemáticas de ensino a literatura tem denomi-
explicação do desenvolvimento e aprendiza- nado de pessoas com repertório verbal mínimo
gem da linguagem (Almeida & Gil, 2019). (Almeida-Verdu & Golfeto, 2016; McIlvane,
Do ponto de vista do desenvolvimento Gerard, Kledaras, Mackay, & Lionello-Denolf,
típico, as condições para desenvolvimento e 2016).
aquisição do comportamento verbal são mul- Considerando pessoas com deficiência
tifacetadas e começam muito antes do nas- auditiva, principalmente aquelas que foram
cimento, uma vez que o sistema auditivo se estabelecidas antes da aquisição da fala (pré-
torna funcional em torno da 25a semana de -linguais), que comprometem o ouvido interno
gestação, permitindo perceber estimulação (sensorineurais), nos dois ouvidos (bilateral), e
sonora externa à vida uterina como ritmos de cujo limiar auditivo é superior a 70dB (grau se-
fala, distinguir voz materna de outros adultos, vero-profundo), é documentado que suas habi-
e entonações familiares e de não familiares. No lidades verbais são inferiores às observadas em
entanto, é com o nascimento e pelas múltiplas seus pares ouvintes (Geers, Nicholas, & Sedey,
interações com seu cuidador que vão desde a 2003; Percy-Smith et al., 2012). O implante

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 8 | 114


Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
Ana Claudia Moreira Almeida Verdu

coclear tem sido uma alternativa eficaz para o e de tato de figuras não está nas ações exter-
restabelecimento da detecção sonora (Svirsky, nas realizadas restritas a pronunciar oralmente
2017). Porém, mesmo após o recebimento do palavras, mas sim no contexto em que esses
implante coclear via procedimento cirúrgico, comportamentos são realizados. Ler é defi-
ainda que as habilidades de ouvinte sejam nido pela resposta vocal diante de estímulos
estabelecidas no primeiro ano de uso de im- textuais (usualmente escritos, mas podem ser
plante coclear (Geers, Nicholas, & Sedey, 2003) em Braille como resultado da estimulação tátil,
são observados atrasos na linguagem de ma- por exemplo, ou a resposta pode ser sinaliza-
neira geral, incluindo alfabetização (Miller, da pela Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS);
Lederberg, & Easterbrooks, 2013), linguagem não necessariamente envolve compreensão
falada como a rotulação de figuras (Levine, leitora. Compreensão leitora requer o tato, de-
Stother-Garcia, Golinkhoff, & Hirsh-Pasek, finido pela produção de respostas vocais na
2016), além de diferenças entre a precisão da presença de estímulos pictóricos, ou seja, as
fala em tarefas de leitura e de tato de figuras figuras frequentemente associadas aos objetos
(Almeida-Verdu & Golfeto, 2016; Golfeto, 2010). e eventos. Como apontado por Almeida-Verdu,
Considera-se como precisão da fala a Neves, Postalli e de Souza (no prelo), muitas
acurácia com que a criança produz os sons da vezes esse comportamento verbal é referido
fala em comparação à emissão realizada por como nomeação no senso comum e, embora
um adulto típico (Yoder, Camarata, & Gardner, haja distinções teóricas entre tato² e nomeação
2005). A precisão da fala diferencia-se da inteli- (naming)³, essas não serão alvo de análise nesta
gibilidade, pois a inteligibilidade envolve o grau proposta; uma distinção entre ambas pode ser
em que a mensagem pretendida pelo falante é obtida em Miguel (2016). Na presente proposta,
recuperada pelo ouvinte (Kent, Weismer, Kent, o alvo de análise é o fato de que se a criança
& Rosenbek, 1989, apud Yoder, Camarata, & vocaliza “bola”, “sopa”, ou “dedo” diante das
Gardner, 2005). As diferenças entre a precisão respectivas figuras (emite tatos) e, se essas figu-
da fala em tarefas de leitura e de tato de fi- ras são equivalentes às palavras escritas BOLA,
guras observadas em criança com deficiência SOPA ou DEDO, então, a mesma resposta vocal
auditiva e implante coclear são evidências da poderá ser emitida para as palavras escritas
independência funcional (Lee & Pegler, 1982; (leitura).
Skinner, 1957) entre os operantes verbais tex- Neste capítulo, serão exploradas as rela-
tual e tato, e têm sido documentadas em crian- ções entre o falar com precisão em crianças
ças com deficiência auditiva e implante coclear com deficiência auditiva e implante coclear e
(Almeida-Verdu et al., 2008; Battaglini et al., os contextos sob os quais a vocalização ocorre,
2013; Golfeto, 2010). ou controle de estímulos (Hübner, 2006; Matos,
O estudo das relações entre ações es- 1999); como controle de estímulos serão con-
pecificas e seus contextos é denominado de sideradas as figuras e as palavras impressas.
controle de estímulos (Hübner, 2006; Matos, Nos primeiros estudos, após o ensino de discri-
1999). O cerne dos comportamentos de leitura minações condicionais entre palavras ditadas

2 Tato é descrito por uma relação funcional entre estímulo antecedente não verbal (objeto, ação, evento), a resposta vocal evocada e a
consequência (Miguel, 2016).

3 A nomeação é descrita por uma relação de bidirecionalidade entre um nome e um objeto e envolve comportamento de falante e de
ouvinte (Migue, 2016).

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 8 | 115


Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
Ana Claudia Moreira Almeida Verdu

e figuras, e as mesmas palavras ditadas e pa- Transferência do Controle da Unidades Textuais


lavras impressas, em testes subsequentes dos Impressas para Figuras
comportamentos de tato e leitura, ainda que
a topografia vocal esperada fosse a mesma, os O paradigma que descreve operacional-
participantes demonstraram diferenças nas vo- mente o comportamento simbólico a partir de
calizações emitidas quando controladas pela relações entre estímulos equivalentes (Sidman
figura (tato de figuras) e pela palavra impres- & Tailby, 1982; Sidman, 1994) e como classes
sa (leitura de palavras) (Battaglini et al., 2013; de estímulos equivalentes controlam diferen-
Golfeto, 2010); a precisão da fala foi maior tes respostas como construção de palavras e
quando a vocalização foi controlada pela pa- vocalizações (Mackay & Sidman, 1984) tem se
lavra impressa (Golfeto, 2010). constituído em um aporte teórico, metodológico
Uma hipótese explicativa para o fato de e aplicado no estudo da fala com precisão em
das palavras impressas controlarem mais preci- crianças com deficiência auditiva e implante co-
samente as vocalizações é pelo fato de os grafe- clear (Almeida-Verdu & Golfeto, 2016; Lucchesi
mas, unidades que compõem a palavra escrita, et al., 2015; Neves et al., 2018).
controlarem mais precisamente a emissão de Como abordado na vasta literatura sobre o
fonemas, unidades que compõem a palavra tema, o paradigma de equivalência de estímulos
falada (de Rose, 2005). Esse controle ponto a descreve de maneira geral que, após o ensino
ponto da relação entre grafemas e fonemas é de duas discriminações condicionais com um
uma das bases do princípio alfabético (Godoy, estímulo em comum (e.g. entre palavra ditada
2008). Na análise de de Rose os aspectos semân- “boca” e figura de uma boca e entre a mesma
ticos, representados pela figura que se relacio- palavra ditada e a palavra escrita BOCA), podem
na à palavra falada, são mais salientes que os gerar não só a aprendizagem das relações en-
aspectos fonológicos; isso significa dizer que sinadas, mas também derivar relações novas
as unidades sonoras que constituem a palavra entre estímulos cuja relação não foi ensinada
falada são componentes que controlam menos diretamente (e.g. entre figura e palavra escrita
as vocalizações em crianças com deficiência au- e vice-versa). Após o ensino das discriminações
ditiva se comparadas com a figura ou o evento condicionais e dos testes das relações deriva-
relacionado a ela. No entanto, crianças expostas das, diz-se que os estímulos (i.e., palavra ditada,
às contingências de alfabetização são delibe- figura e palavra escrita) compõem uma classe
radamente ensinadas a estabelecer a relação de estímulos equivalentes (Sidman & Tailby,
entre grafemas e fonemas. A alfabetização es- 1982). Se para um dos estímulos da classe foi
tabelece condições para que o comportamento estabelecida uma resposta com topografia vocal
vocal seja controlado não somente pela figura (e.g. falar) ou motora (e.g. escrever) específica,
relacionada à palavra ou pelos aspectos fono- todos os estímulos da classe tendem a contro-
lógicos dos estímulos vocais (palavra falada), lar a mesma resposta (Sidman, 2000; Mackay,
mas também pela relação que estabelecem com 2013).
seus grafemas (palavras escritas). O potencial gerativo de Instruções
Baseadas em Equivalência (do inglês Equivalence
Based Instruction - EBI) é o aspecto de potencial
interesse para o estudo da precisão a fala em
crianças com deficiência auditiva e implante

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 8 | 116


Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
Ana Claudia Moreira Almeida Verdu

coclear, qual seja, após o ensino de discrimina- impressas quando ouvem as palavras ditadas
ções condicionais com ao menos um elemento (realizam discriminações condicionais entre
em comum, são observadas a emergência de palavras ditadas e palavras impressas), o con-
relações novas entre estímulos tais como as trole exercido pela figura é transferido para a
baseadas em seleção e, além dessas, também palavra impressa nas tarefas que envolvem
são observadas a emergência de relações novas vocalização. A transferência do controle é de-
entre estímulos e respostas tais como as base- monstrada pelos testes de equivalência entre
adas em topografia (Mackay & Sidman, 1984; figuras e palavras impressas e vice-versa e
Pilgrim, 2019). Em outras palavras, não há a ne- pelos testes de leitura oral de palavras escri-
cessidade de se estabelecer pareamentos entre tas. Resultados como esse têm sido obtidos em
todos os membros do conjunto de estímulos situações controladas de laboratório (de Souza
para se obter relações de equivalência ou substi- et al., 1997), em aplicações em grupos maiores
tuição mútua entre eles (Flores, Oliveira-Castro, como escolas (Reis, de Souza, & de Rose, 2009)
& Souza, 2020). Da mesma maneira, não há a ou mesmo em escala maior, com intervenção
necessidade de se estabelecer todas as relações via computador e programa de ensino disponi-
entre estímulos e tipos de respostas, pois se as bilizado online, envolvendo mais de 500 alunos,
funções discriminativas estabelecidas para um na região metropolitana de São Paulo (de Souza
dos estímulos controlam uma resposta, essas et al., 2019).
funções são transferidas para todos os estímu- Em uma série de estudos recentes, crianças
los da classe, por equivalência, e essa resposta com deficiência auditiva e implante coclear com
passa a ser controlada por todos os estímulos déficits na produção vocal em tarefas de tato de
da classe (dos Santos & de Rose, 2019; Fields & figuras, mas com precisão mais acurada em ta-
Garruto, 2009). refas de leitura têm sido expostas a programas
A transferência de função exercida por de ensino baseados em equivalência (Pilgrim,
figuras para as palavras impressas equivalentes 2019). Os programas de ensino têm adotado
tem sido largamente demonstrada em crianças diferentes softwares e diferentes extensões de
ouvintes. Crianças com diferentes necessidades estímulos como palavras (e.g., Anastácio-Pessan
educacionais especiais e que não aprenderam et al, 2015; Lucchesi et al., 2015; Lucchesi et al.,
a ler sob as contingências educacionais regu- 2018; de Souza et al., 2020) e sentenças com
lares, aprendem a ler novas palavras após a três (Neves et al., 2018), quatro (Neves, 2019)
exposição a programas instrucionais baseados ou cinco termos (Silva et al., 2017).
em equivalência (Cravo & Almeida-Verdu, 2018; Nos estudos envolvendo palavras, os es-
de Souza et al., 2019). De maneira geral os par- tímulos adotados têm sido figuras e palavras
ticipantes das pesquisas são falantes e ouvintes ditadas e escritas tais como “bola”, “boca”,
competentes, ou seja, apontam figuras quando “cabide”, “cavalo,” etc (e.g., Anastácio-Pessan
ouvem palavras ditadas correspondentes (re- et al., 2015; Lucchesi et al., 2015). O ensino con-
alizam discriminações condicionais entre pa- siste no ensino de discriminações condicionais
lavras ditadas e figuras) e emitem tatos vocais entre palavra ditada e figura, discriminações
para essas mesmas figuras, e as respostas vocais condicionais entre palavra ou sílaba ditada e
são controladas pela figura em conformidade palavra ou sílaba escrita, e ensino de discrimi-
com as convenções da comunidade verbal. nações condicionais via construção da resposta
Ao aprenderem a apontar palavras pela seleção de letras ou sílabas. O ensino é

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 8 | 117


Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
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seguido dos testes de formação de classes de se por um lado os ouvintes já emitiam tatos
equivalência além de leitura de palavras e tato figuras, passam a ler as palavras ou sentenças
de figuras. impressas que integram a mesma classe de es-
Já nos estudos envolvendo sentenças, tímulos equivalentes; por outro lado, crianças
os estímulos têm sido figuras de ações e sen- com deficiência auditiva e implante coclear que
tenças ditadas e escritas tais como “Juca joga primeiro aprenderam a ler e a emitir uma to-
bola” (três termos), “Malu pega o copo” (quatro pografia vocal para cada um dos grafemas das
termos), “O Dudu lava um carro” (cinco termos) palavras ou das sentenças, melhoram o vocabu-
etc. (Neves et al., 2018; Silva et al., 2017). De lário e a precisão da fala em tarefas de tato de
maneira similar ao ensino de palavras, o ensino figuras. Esses resultados têm sido obtidos com
com sentenças consiste no ensino de discrimi- bastante regularidade seja nos estudos envol-
nações condicionais entre sentenças ditadas vendo palavras (Almeida-Verdu & Golfeto, 2016;
e figuras de ação e entre sentenças ditadas e Almeida-Verdu, Lucchesi, & Silva, submetido),
construção de sentenças pela seleção de pala- seja envolvendo sentenças (Neves et al., 2018).
vras. O ensino é seguido de testes de formação Em um estudo recente Nanjundaswamy,
de classes, de leitura de sentenças e de tato de Prabhu, Rajanna, Ningegowda e Sharma (2018)
figuras de cenas. verificaram a eficácia de programas de treina-
Nos dois casos, com ensino de palavras ou mento auditivo baseado em computador de
com ensino de sentenças, além de emergirem acordo com os critérios científicos que possam
relações que a atestam a formação de classes sustentar práticas baseadas em evidências. A
de equivalência e denotam a função simbólica revisão nas bases Google Scholar e PubMed apli-
entre estímulos textuais e pictóricos, o com- cou o seguinte critério de inclusão: participan-
portamento textual (leitura de palavras ou de tes crianças ou adolescentes com deficiência
sentenças) que já era bom, melhora. E, em tato auditiva, com aparelhos de amplificação sonora
de figuras (representativas de substantivos ou ou implante coclear, expostos a programas de
de cenas de ação), aumenta a porcentagem de treinamento auditivo baseado em computador,
acertos atingindo porcentagens próximas àque- com medidas receptivas (i.e., comportamento
las obtidas em tarefas de leitura. A hipótese é de auditivo) e expressivas (i.e., vocalizações) e deli-
que os procedimentos de ensino que favorecem neamento experimental, no caso, ensaio clínico
a transferência de controle entre estímulos (de randomizado. Essa revisão resgatou apenas
Souza et al., 1997; Fields & Garruto, 2009) podem cinco estudos demonstrando uma lacuna na
ser usados com certa flexibilidade a depender condução de estudos sobre treinamento audi-
da linha de base dos participantes (Lucchesi tivo e medidas de linguagem expressiva com
et al., submetido). De acordo com Lucchesi et essa população.
al. (submetido), depois da aprendizagem das O conjunto de pesquisas realizado sob
relações entre estímulos ditados e pictóricos e o escopo do Instituto Nacional de Ciência e
os mesmos estímulos ditados e impressos, além Tecnologia sobre Comportamento, Cognição e
de emergirem as relações não diretamente Ensino (INCT-ECCE) que tem demonstrado que
ensinadas, a classe de estímulos equivalentes a precisão da fala de crianças com repertório
que foi estabelecida criam a condição para a verbal mínimo que apresentam vocalizações
transferência do controle sobre uma produção incompreensíveis pode ser refinada a partir
oral de topografia já estabelecida. Desta feita, de programas de leitura e escrita baseados

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 8 | 118


Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
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em equivalência (de Rose, de Souza, & Hanna, e sentenças e que obtiveram medidas de pré e
1996; de Souza et al., 1997; de Souza et al., 2009; pós-testes de leitura e de tatos de figuras ou de
Pilgrin, 2019). Uma síntese dos estudos envol- cenas de ação. Foram excluídos desta análise
vendo palavras faladas e escritas como estímu- estudos envolvendo palavras e sentenças que
los foi apresentada Almeida-Verdu, Lucchesi expuseram participantes a outros procedimen-
e Silva (no prelo), mas não inclui os dados de tos de compartilhamento de controle de estímu-
porcentagem de acertos. Considerando a lacuna los como o Múltiple Exemplar Instruction (MEI).
da literatura sobre treinamento auditivo via
computador e linguagem expressiva e o con- Etapa 2 – Extração e sistematização dos dados
junto de pesquisas do INCT-ECCE, o objetivo Ainda que os estudos tivessem objetivos
do presente trabalho foi recuperar os estudos distintos, os participantes foram expostos a, ao
envolvendo palavras, extrair e sistematizar menos, uma unidade de ensino baseado em
os resultados obtidos em testes de leitura e de equivalência. Como variável independente
tato de figuras antes e depois da exposição ao os participantes foram expostos ao ensino de
programa de ensino e demonstrar a mudança discriminações condicionais entre estímulos
na acurácia da fala considerando o conjunto ditados, impressos e figuras (de palavra ou de
de participantes e a totalidade de estudos até sentenças) e ensino do controle por unidades
o presente. Também foi objetivo do presente mínimas via seleção (matching-to-sample) ou
trabalho acrescentar a essa análise os testes de construção de respostas (constructed-response-
leitura e de tato de figuras de cenas dos partici- -matching-to-sample) seguido de testes de acordo
pantes de estudos envolvendo sentenças, ainda com o paradigma de equivalência de estímulos.
não sistematizados. Os estudos também conduziram testes gerais
de leitura e de tato. Como variável dependente
Método foram extraídos os resultados de vocalizações
controladas pelos estímulos textuais (leitura)
Os dados para essa análise foram secun- e pelas figuras (tato). Em todos os estudos os
dários, isto é, obtidos de estudos realizados resultados as vocalizações foram transcritas e
anteriormente. A análise foi dividida em três comparadas aos estímulos auditivos das classes
etapas: (1) identificação dos estudos, (2) extra- de equivalência (emitidos por um adulto típico).
ção e sistematização dos dados e (3) análise dos Após a transcrição foi obtida uma porcentagem
resultados. de acertos a partir de dois procedimentos, quais
sejam, a análise fonêmica (Barreto & Ortiz,
Etapa 1 – Identificação dos estudos 2008) ou a análise por bigramas (Lee & Pegler,
A identificação dos estudos foi realizada 1982).
nos documentos do Instituto Nacional de Ciência Considere-se como exemplo a palavra
e Tecnologia sobre Comportamento, Cognição alvo “cavalo”; a palavra emitida antes do ensino
e Ensino (INCT-ECCE, 2020, Annual Report #3). pode ser “pocotó” e depois do ensino “afalo”. A
Foram selecionados artigos científicos, capítu- análise da palavra antes do ensino representa
los de livros, dissertações e teses que descre- zero acertos, pois foi emitida uma outra palavra
veram experimentos que expuseram crianças em vez de “cavalo”, embora seja uma alusão
com deficiência auditiva e implante coclear ao onomatopeica da palavra cavalo. Na análise
ensino baseado em equivalência com palavras da palavra emitida após o ensino, de acordo

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 8 | 119


Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
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com a transcrição fonêmica o resultado seria três universidades sob o escopo do INCT-ECCE,
“_/a/f/a/l/o” e, comparando ponto a ponto com quais sejam, UNESP, HRAC/USP e UFSCar. Os
a palavra alvo tem-se 66% de correspondência. estudos, no conjunto, totalizaram 27 partici-
Em uma análise por bigrama a transcrição da pantes dos quais 16 foram do sexo feminino
palavra alvo seria “_c/ca/av/va/al/lo/o_” e da pa- e 11 masculino. A idade variou entre seis e 14
lavra emitida “__/_a/af/fa/al/lo/o_”; nesse caso, anos; a maioria (21 participantes) com idades
a análise da correspondência ponto a ponto abaixo de 10 anos e frequentando o Ensino
entre os bigramas seria de 42,8%. Ainda que a Fundamental 1. O tempo de uso do implante
emissão de “_afalo” em vez de “cavalo” ainda coclear variou de um a 10 anos sendo 13 partici-
represente erros, ela representa um aumento pantes com tempo de implante abaixo de cinco
da correspondência pontual com a palavra alvo. anos de uso. Embora todos os procedimentos
Então, independente do procedimento de aná- de ensino fossem baseados em equivalência, os
lise, a porcentagem final obtida para cada par- materiais adotados para a programação foram
ticipante representou uma medida da melhor distintos. O Módulo 1 (M1 – palavras simples)
acurácia da fala se comparada à emissão inicial, do ALEPP (Rosa Filho et al., 1989) foi adotado
antes do ensino (Yoder, Camarata, & Gardner, em cinco estudos, o Módulo 2 (M2 – palavras
2005), ou seja, a precisão ou a correspondência com dificuldades ortográficas) em dois estudos
e o MTS (Dube, 1991) em três estudos. A quan-
ponto a ponto em que os sons da fala foram
tidade de passos de ensino aos quais os partici-
emitidos.
pantes foram expostos variou de dois a 24; em
seis estudos os participantes foram expostos a
Etapa 3 – Análise dos resultados
mais de 10 passos de ensino. Em todos os es-
A análise foi realizada obtendo-se a
tudos foi adotado variações de delineamentos
porcentagem média de acertos obtidas pelos
experimentais de sujeito único sendo linha de
participantes considerando seus primeiros pré-
base múltipla em cinco estudos, sondas em três
-testes e os últimos pós-testes, em tarefas de lei-
e contrabalanceamento de condições em dois
tura e tato, independentemente da quantidade
estudos.
de passos de ensino às quais os participantes
foram submetidos, comparando-as.

Resultados

A Tabela 1 apresenta a lista de estudos


identificados que adotaram palavras como es-
tímulo. Na tabela são exibidos dados geais dos
estudos (autoria, universidade de origem, tipo
de trabalho); também são apresentadas as prin-
cipais características metodológicas (número
de participantes, idade, sexo, tempo de uso do
implante coclear, material, número de passos
de ensino e delineamento).
De acordo com a Tabela 1 foram realiza-
dos dez estudos envolvendo, essencialmente,

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 8 | 120


Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
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Tabela 1
Lista de estudos com palavras: Características gerais (autoria, universidades envolvidas, tipo de
trabalho) e metodológicas (número de participantes, idade, sexo, tempo de uso do implante coclear,
material adotado, número de passos de ensino e delineamento) dos estudos.
Universidades Tipo de Partici- Se- Ida- Tempo Passos de
Autoria Material adotado Delineamento
envolvidas estudo pantes xo de de IC Ensino
Tal F 11 8
Viv F 11 7
Anastácio-Pessan et al. UNESP/UFSCar/ Gab M 12 8 Linha de Base
artigo MTS (Dube, 1991) 2
(2015) HRAC-USP Gus M 14 10 Múltipla
Tam F 11 7
Lua F 12 7

Lyn M 8 6 ALEPP (Rosa


UNESP/
Lucchesi et al. (2015) artigo Filho et al., 1998) 13 Sondas
HRAC-USP Let F 7 5
– M1

Almeida-Verdu & Gomes UNESP/ Gab M 7 5 Linha de Base


artigo MTS (Dube, 1991) 2
(2016) HRAC-USP Luc M 6 4 Múltipla

Ben M 8 5 3
UNESP/ Linha de Base
Rique et al. (2017) artigo Jan M 7 5 MTS (Dube, 1991) 3
HRAC-USP Múltipla
Gui M 10 7 1

ALEPP (Rosa
Lucchesi, Almeida-Verdu, & UFSCar/UNESP/
artigo Let F 7 5 Filho et al., 1998) 20 Sondas
de Souza (2018) HRAC-USP
– M1

Lau F 10 7
ALEPP (Rosa
Lucchesi, de Souza, & UFSCar/UNESP/ Isa F 9 7 Linha de Base
artigo Filho et al., 1998) 17
Almeida-Verdu, submetido HRAC-USP Alu F 10 9 Múltipla
– M1
Sam M 10 8

Cravo, Almeida-Verdu, ALEPP (Rosa


UNESP/UFSCar/ Linha de Base
Lucchesi, Moret, & Silva artigo Jul F 9 1 Filho et al., 1998) 24
HRAC-USP Múltipla
(2019) – M2

Kam F 9 6 ALEPP (Rosa


Cravo (2018) - Estudo 3 UNESP/FSCar/ Disser-
Filho et al., 1998) 8 Sondas
(artigo em elaboração) HRAC-USP tação Sar F 8 6
– M2

Run F 8 4 ALEPP (Rosa Condições


Husseim, 2018 (Estudo 1, UNESP/
Tese Bia F 8 2 Filho et al., 1998) 17 Contra-
qualificação) HRAC-USP
Thi M 8 2 – M1 balanceadas

Lar F 8 3 ALEPP (Rosa Condições


Husseim, 2018 (Estudo 2, UNESP/
Tese Mat M 8 5 Filho et al., 1998) 17 Contra-
qualificação) HRAC-USP
Liv F 8 2 – M1 balanceadas

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 8 | 121


Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
Ana Claudia Moreira Almeida Verdu

As Figura 1 apresenta os dados de pré- e pontos com linhas as vocalizações controladas


pós-testes extraídos dos estudos. As barras re- pelas figuras de objetos ou figuras de cenas
presentam as vocalizações controladas pelas relacionadas experimentalmente às palavras
palavras ou sentenças impressas (leitura) e os ou sentenças (tatos). O gráfico à esquerda

leitura nomeação
leitura nomeação
100 100
90 90

Porcentagem de acertos
80
Porcentagem de acertos

80
70 70
60 60
50 50
40 40
30 30
20 20
10 10
0 0
pré pós pré pós
Testes de vocalizações - palavras Testes de vocalizações - sentenças

Figura 1. Média das porcentagens de acertos obtidas pelos participantes nos pré e pós testes de
vocalizações controladas pelas: palavras impressas (leitura) e pelas figuras relacionadas experimen-
talmente às das palavras (nomeação), à esquerda; e sentenças impressas (leitura) e pelas figuras de
cenas relacionadas experimentalmente (nomeação), à direita.

representa os dados dos participantes subme- implante coclear, quantidade de passos de


tidos aos procedimentos com palavras e à di- ensino e delineamento.
reita àqueles submetidos a procedimentos com De acordo com a Tabela 2 sete estudos
sentenças. envolvendo sentenças foram realizados com
De acordo com a Figura 1 (gráfico à es- quatro universidades envolvidas, quais sejam,
querda), antes da exposição ao ensino, os parti- UNESP, HRAC-USP, UFSCar e UFPA. Os estudos,
cipantes apresentavam porcentagens de acertos no conjunto, totalizaram 25 participantes dos
em leitura (66,1%) superior à de tato de figuras quais 17 foram do sexo feminino e oito do sexo
(37,9%). Após a exposição ao ensino baseado masculino. A idade variou entre sete e 12 anos; a
em equivalência com palavras, aumentam as maioria (19 participantes) com idade abaixo de
porcentagens de acertos em leitura (88,3%) e 10 anos e frequentando o Ensino Fundamental
em tato (75,6%). Antes do ensino, a diferença 1. O tempo de uso do implante coclear variou
entre as porcentagens de acertos entre leitura de três a 10 anos sendo 14 participantes com
e tato era de 28,2 pontos percentuais. Essa di- tempo de uso de implante abaixo de cinco anos.
ferença diminui após o ensino passando para Todos os procedimentos de ensino foram basea-
12,7 pontos percentuais. dos em equivalência programados no software
A Tabela 2 apresenta a lista de estudos PROLER (Assis & Santos, 2010). Os participantes
identificados com sentenças. Na tabela são foram expostos a um, dois ou três passos de
exibidos dados gerais dos estudos como auto- ensino. Em todos os estudos foi adotado varia-
ria, universidade de origem, tipo de trabalho; ções de delineamentos experimentais de sujeito
além disso são apresentadas as principais ca- único como linha de base múltipla em quatro
racterísticas metodológicas como número de estudos e sondas em três estudos.
participantes, idade, sexo, tempo de uso do De acordo com a Figura 1 (gráfico à direita),
Comportamento em Foco, v. 13, cap. 8 | 122
Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
Ana Claudia Moreira Almeida Verdu

Tabela 2
Lista de estudos com sentenças: Características gerais (autoria, universidades envolvidas, tipo de
trabalho) e metodológicas (número de participantes, idade, sexo, tempo de uso do implante coclear,
quantidade de passos de ensino e delineamento) dos estudos.
Universidades Tipo de Partici- Tempo de Passos de
Autoria Sexo Idade Delineamento
envolvidas estudo pantes uso do IC Ensino
Let F 11 6
UNESP, HRAC-
Neves et al. (2018) artigo Ray M 12 10 1 Linha de Base Múltipla
USP, UFPA
Liv F 10 7

Sue F 8 6
Lui M 8 7
UNESP e
Neves et al. (2019) artigo Luc M 10 8 1 Linha de Base Múltipla
HRAC-USP
Edu M 11 7
Lin M 10 7

Sah F 8 5
Tha F 9 5
Kam F 9 5
Neves (2019) - Estudo 1 UFSCar Tese 3 Linha de Base Múltipla
Dem F 9 3
Bia F 11 8
Joa M 10 6

Sah F 8 5
Mat F 8 5
Kam F 9 5
Neves (2019) - Estudo 2 UFSCar Tese 3 Linha de Base Múltipla
Dem F 9 3
Lau F 11 8
Sam M 11 8

Silva et al. (2017) UNESP artigo P1 F 7 5 2 Sondas

Ale F 7 5
Nascimento (2020) UNESP Dissertação 2 Sondas
Ren F 9 5

Vic M 9 4
Alvarez (2020) UNESP Dissertação 2 Sondas
Lun F 9 4

antes da exposição ao ensino, os participantes de 59.6 pontos percentuais que diminuiu para
apresentavam porcentagens de acertos em lei- 9,3 após o ensino.
tura de sentenças (87,4%) superior à de tato
de figuras de cenas (27,8%). Após a exposição Discussão
ensino baseado em equivalência com senten-
ças, aumentam as porcentagens de acertos em Os dados sintetizados no presente capítulo
leitura (96,2%) e em tato (86,9%). A diferenças demonstram o potencial do EBI na emergência
entre os pontos percentuais de leitura e de tato de relações entre estímulos e respostas vocais
também diminui nos estudos envolvendo sen- em pessoas com deficiência auditiva e implante
tenças. Antes do ensino, a diferença entre as coclear. Grow e Kodak (2010) ao fazerem uma
porcentagens de acertos entre leitura e tato era análise sobre potenciais aplicações clínicas
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Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
Ana Claudia Moreira Almeida Verdu

derivadas de pesquisas sobre comportamento Lucchesi et al., 2018; de Souza et al., 2020) e
verbal emergente reconhecem que (1) novas sentenças (e.g. Almeida-Verdu et al., no prelo;
relações verbais emergem sob algumas con- Neves et al., 2018; Neves et.al, 2020).
dições, mas não em outras, (2) que a pesquisa Os resultados apresentados aqui são se-
clínica é necessária para avaliar os procedimen- melhantes aos apresentados em estudos an-
tos ou arranjos de condições que favorecem a teriores sobre a proposição de que a precisão
emergência de novas relações verbais e que (3) da fala de crianças com deficiência auditiva e
procedimentos baseados em equivalência (jun- implante coclear melhora após a exposição à
tamente com o MEI), incorporam esse potencial EBI com palavras (Almeida-Verdu & Golfeto,
e (4) a avaliação de estabelecimento de relações 2016; Almeida-Verdu, Lucchesi, & Silva, no
entre estímulos e transferência de controle de prelo) e acrescenta informações com dados
estímulos sobre relações verbais emergentes de mudanças nas porcentagens de acertos e
deve ser realizada. sobre o delineamento dos estudos, número de
Os dados extraídos e sistematizados no participantes, número de conjuntos de estí-
presente estudo reúnem um conjunto de pes- mulos. E, em acréscimo aos estudos envolven-
quisas sobre ensino baseado em equivalência do palavras, apresenta a sistematização dos
(Pilgrim, 2019) em pessoas com deficiência au- dados envolvendo sentenças (i.e., Neves et al.,
ditiva e implante coclear. Em síntese eles de- 2018). Os estudos selecionados para a análise
monstram que, após estabelecidas relações de e discussão geral apresentadas, no conjunto,
equivalência entre estímulos ditados, impres- reúnem as características científicas essências
sos e figuras, o controle exercido por um dos que sustentam prática baseadas em evidências
membros da classe é transferido para todos os (Almeida-Verdu, Lucchesi, & Siva, no prelo;
demais membros (de Souza et al., 1997). Se há Byiers, Reichle, & Simons, 2012). Dentre essas
uma topografia vocal estabelecida para um dos características estão a boa qualidade meto-
membros (i.e., leitura de estímulos impressos), dológica em que o controle da exposição dos
essa topografia passa a ser controlada por todos participantes aos procedimentos de ensino e
os membros da classe (i.e., tato de figuras), seja os sucessivos testes que se interpõem demons-
com estímulos da extensão de palavra ou sen- tram que a mudança observada é função das
tenças. Os resultados extraídos demostraram, variáveis independentes às quais foram expos-
ainda, que a topografia já estabelecida com tos e não à mera passagem do tempo ou outra
mais precisão em tarefas de leitura, pode ser re- variável interveniente. Para que estudos com
finada após a exposição ao EBI. Discute-se, nos delineamentos experimentais de sujeito único
estudos individualmente, que procedimentos sustentem práticas consideradas eficazes é ne-
de ensino de construção de respostas (Mackay cessário replicação (Baer, Wolf, & Risley, 1968;
& Sidman, 1994; de Rose, de Souza, & Hanna, Munafò et al., 2017). Embora possa haver varia-
1996) e de organização dos estímulos de acordo ção nas recomendações sugerem-se cinco estu-
com matrizes que promovem a sobreposição de dos, em três localidades geográficas diferentes e
unidades menores (Goldstein, 1983; Remington, envolvendo, ao menos, 20 participantes (Byiers,
1994) se constituam em condições relevantes Reichle, & Simons, 2012). A síntese apresentada
para o estabelecimento e o refinamento do neste capítulo reúne tais características suge-
controle pelas unidades menores e generali- rindo que procedimentos de ensino baseados
zação recombinativa envolvendo palavras (e.g. em equivalência são eficazes de emergência

Comportamento em Foco, v. 13, cap. 8 | 124


Acurácia da fala via ensino baseado em equivalência
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e com sentenças. D. G., de Rose, J. C., Bevilacqua, M. C., Lopes.
Considera-se, a partir de tais resultados, Jr., J., Alves, C. O., & McIlvane, W. J. (2008).
que o próximo estágio do programa de pes- Relational learning in children with de-
quisas seja a aplicação em situações clínicas afness and cochlear implants. Journal
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