O conflito entre os venezianos e os bizantinos teve consequências
dramáticas: embora Comneno se visse obrigado a engolir a ofensa dos
venezianos para que estes voltassem ao cerco e se conseguisse a retirada normanda de Corfu, em 1171 ele se vingou, ordenando que se detivessem todos os venezianos do império e se confiscasse a sua propriedade. Essa situação deixou um rasto de ódio que durou várias décadas, com os venezianos exigindo compensação financeira; essa compensação foi aceita pelos governantes bizantinos, mas nunca chegou a ser paga na totalidade. Outro acontecimento traumático foi o ataque à zona latina de Constantinopla em 1182 pela turba bizantina, que massacrou a população que encontrou. Em 1204, os venezianos conseguiram facilmente direcionar a Quarta Cruzada para a conquista de Constantinopla, realizada com o saque escandaloso de igrejas e objetos sagrados, seguido pela nomeação de um patriarca latino.12 Choniate¯s também relatou esses acontecimentos, descrevendo os conquistadores como selvagens e bárbaros por natureza. Um dos mais reveladores episódios desse acontecimento extraordinário foi a ação do abade cisterciense Gunther Martin, do mosteiro de Pairis, na Alsácia, relatada pelo seu biógrafo. Martin irrompeu pela igreja do Pantocrátor, onde estava sepultada a mãe de Comneno, e obrigou o sacerdote grego a lhe entregar as relíquias, depois de gritar: “Vamos, velho infiel, mostra-me onde tens as tuas relíquias mais preciosas. Se não o fizeres, podes contar com a morte”.13 A violência contra a Igreja ortodoxa eclodiu em outras ocasiões. Logo em 1098, após a conquista de Antioquia, os líderes da Primeira Cruzada haviam enviado uma carta ao papa queixando-se de que as suas tropas tinham conseguido derrotar os turcos e os pagãos, mas não hereges como os gregos, os armênios, os siríacos e os jacobitas.14 As frequentes referências às Igrejas orientais pelos governantes e clérigos latinos como hereges ou “infiéis” é reveladora; a Igreja de Roma nunca descrevera de tal forma a Igreja ortodoxa grega. A verdade era que entre os cristãos latinos existia um preconceito arraigado contra os gregos, considerados cristãos de segunda classe, fracos e de pouca confiança, e vítimas fáceis de pilhagem, saque e