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Bibliografia Recomendada:

I. A. CASTANHEIRA NEVES, "O Método Jurídico", p. 224-228; PAULO FERREIRA DA CUNHA, JOANA AGUIAR E SILVA,
ANTÓNIO LEMOS SOARES, História do Direito, Almedina, 2005, cap. VI.
Bibliografia complementar: PETER STEIN, Roman law in European History, Cambridge University Press, 2004, pp. 38-54,
64-67, 71-76, cap. 2; FRANZ WIEACKER, História do Direito Privado Moderno, 4a. Ed., Fundação Calouste Gulbenkian,
Primeira Parte: os fundamentos medievais da história do direito privado moderno; RUIZ MIGUEL, Una Filosofia del
Derecho en Modelos Históricos, Editorial Trotta, 2002, p. 75-100. ALFONSO RUIZ MIGUEL, Una Filosofia del Derecho en
Modelos Históricos, Editorial Trotta, 2002, p. 57-73; PAULO FERREIRA DA CUNHA, JOANA AGUIAR E SILVA, ANTÓNIO
LEMOS SOARES, História do Direito, Almedina, 2005, cap. IV; ALMEIDA COSTA, História do Direito Português, Capítulo II;
SEBASTIÃO CRUZ, Direito Romano, vol I, 4a ed., 1984, no 6, 10, 19, 20 e 27.

II. Bibliografia complementar: NORBERTO BOBBIO, O Positivismo Jurídico: Lições de Filosofia do Direito, Ícone Editora,
2006, capítulo III – O código de Napoleão e as origens do Positivismo Jurídico na França.

III. Polis:
i. Jurisprudência dos Conceitos (Nuno Espinosa Gomes da Silva)
ii. Jurisprudência dos Interesses (Castanheira Neves)
iii. Jurisprudência dos Valores (Luiz Fernando Coelho)
iv. Escola do Direito Livre (Castanheira Neves)
v. Escola da Exegese (Castanheira Neves)
vi. Escola Histórica do Direito (Castanheira Neves)
vii. Teoria Pura do Direito (Baptista Machado)
viii. Interpretação Jurídica (Castanheira Neves)
ix. Método Jurídico (Castanheira Neves)

Bibliografia Principal:

- KARL LARENZ - Metodologia da Ciência do Direito.

- A. CASTANHEIRA NEVES, "O Método Jurídico".

O PENSAMENTO JURÍDICO ROMANO E MEDIEVAL

- O Direito Romano (DR) como um legado de vários séculos – Vivência e Supervivência.


A Religião como factor de união -> mores maiorum, cujo ius deve ser interpretado por pontífices.

- A época clássica – direito liberta-se do formalismo inicial para se recriar pela inteligência e prudência
dos juristas.

- Fórmulas – certeza, precisão e autonomia – carácter mágico e religioso do Direito.

- Contexto de surgimento da Lei das XII Tábuas e suas consequências: [451 - 450 a.C.]

o Autonomia do direito;
o Mais certeza e segurança -> precisão de contornos do direito quiritário.
o Liberdade -> responsabilidade.

-Intencionalidade axiológico-material do direito -> exige que se quebrem velhos formalismos. Uma
ruptura?

Direito romano -> época clássica:

• Formalmente: apoio nas fontes disponíveis ( mores maiorum…);


• Materialmente: valores da boa fé, equidade, utilidade e humanidade.

Outra influência da cultura grega: a dialéctica. Também ela veio permitir o salto qualitativo na
jurisprudência dos romanos, sobretudo no que se refere à tópica.

a) Dialética como campo do oponível (≠ campo do apodítico).


b) Tópica como arte da disputa. Tópicos: pontos de vista utilizáveis numa discussão (Cícero –
lugares comuns). Orientação para o problema.
c) A inventio. Incessante demanda pela realização do justo prático. O direito não é visto como
algo dado, mas sim como algo construído responsavelmente. – omnis definitio in iuri civili
periculosa est.
d) Os tópicos só ganham sentido face ao problema/caso em concreto, só eles permitem
encontrar premissas que permitam resolver o problema, e não as regras: non ex regula ius
summatur, sed ex iure, quod est, regula fiat (Paulus). [Não é da regra que promana o direito,
antes, a regra faz-se a partir do direito que é]

- direito de juristas – justo prático [não de legislação nem juriscional] – ius naturalis.

- As leges eram escassas. O direito assumiu-se essencialmente como interpretatio prudentium –


jurista cidadão, não magistrados, a quem se atribuía autoritas – judicativo-casuística (embora com o
apoio formal nas fontes e nas actiones pretorianas invocava como fundamentos materiais a bona
fides, a aquitas, utilitas e humanitas.
- O ius não se identificava com lex, o que garantia a autonomia sociocultural do primeiro em relação
aos poderes políticos e económicos do segundo – Herança grega. Operava-se tópico-
jurisprudencialmente numa perspectiva analógica – “no princípio era o caso”.

- Queda do Império Romano do Ocidente (476dC)

a) Decresce estudo do Direito Romano;


b) Cai no esquecimento enquanto ordenamento jurídico autónomo;
c) É introduzido pelos povos invasores nos códigos que, entretanto, elaboram…
d) Permanece o Império Romano do Oriente – o surgimento do Corpus Iuris Civilis (565),
cujos textos servirão de base à recepção do Direito Romano na Idade Média.

O PENSAMENTO JURÍDICO MEDIEVAL

a) Receção do Direito Romano no século XII. Supervivência: DR, embora sem o factor que lhe
deu origem – a civitas – permanece aplicável.
b) Processo de reconstrução da obra justinianeia como processo lento (só em 1583, Dionísio
Gotofredo imprime conjuntamente todos aqueles textos e lhes dá o nome de Corpus Iuris
Civilis).
c) Entre os séculos V e XI existiam escolas jurídicas, mas no oriente bizantino.
d) No ocidente, as primeiras escolas a autonomizarem o ensino do Direito são as que maiores
ligações tinham com o oriente bizantino: Ravena, Pavia, Bolonha.
e) Não é fruto de um domínio ou invasão de um povo estrangeiro, mas é assumido
voluntariamente por um grande conjunto de Estados, que vêm no DR uma solução para os
seus problemas jurídicos.
f) Já não é pensado como em Roma – contextualmente diferente.
g) Tribos germânicas – pluralismo – consuetudinarismo- vulgarização perante os costumes
locais.
h) Redescoberta do CIC – Digesto.

Factores que estão na sua origem:

- Inicialmente – período conturbado de invasões e estabelecimento das populações:

a) Desaparece sistema imperial –> pulverização do poder –> unidades fortemente


hierarquizadas –> igreja como factor de unidade na Europa, assumindo funções sociais
e morais. Desenvolvimento da vida à volta dos mosteiros. A igreja assume o lugar
deixado vago pela queda do Império.
b) Igreja é guardiã da tradição (também jurídica) –> mosteiros como centros de cultura
e educação –> preservação do ensino das artes liberales. Vai ser aqui, no trivium
[gramática; logica; retórica]– o jurídico vai ser estudado, mas não de forma autónoma.
c) Em termos práticos, esquece-se o DR e cai-se num sincretismo normativo.

- Pensamento dogmático: os textos da antiguidade são intocáveis. Não são testemunhos históricos
do que se acreditava ser verdade numa determinada época, mas são entendidos como a própria
verdade. Apresentam o carácter de uma revelação que, se bem entendida, ou seja, se bem
interpretada, conduz à verdade. Eles são a ratio scripta! Testemunhos históricos da verdade. Teologia
e supremo conhecimento – revelação. Conhecer não é investigar, mas entender devidamente a
palavra e a doutrina. O CIC continha em si as regras da razão prática e da justiça. Exegética e
Comentário. Depuração e técnicas gramaticais e filológicas em vista à distinção, à síntese, ao
esclarecimento dos textos.

- Assim estão criadas as condições para o renascimento do Direito Romano na Idade Média, que vai
dar origem a uma específica experiência jurídica medieval, principalmente naquilo que foi a
expressão de duas principais escolas – os Glosadores e os Comentadores.

Escola de Bolonha ou dos Glosadores (século XII e XIII)

- Fundador: Irnério, Wernerius ou Guarnerius


- Porquê o interesse pelo direito? Porquê o desenvolvimento dos estudos jurídicos nesta
altura?

-Necessidade de encontrar para o discurso da ciência jurídica um manto de validade e de


legitimidade, por duas razões essenciais:
▪ Desenvolvimento de uma nova ordem económico-social, com um sem número
de relações carecidas de nova regulamentação e de um direito que acompanhe
a sua complexificação;
▪ Vocacional incompletude do poder político medieval -> o direito justinianeu
surge como genial e fundamental instância de validação de direito novo.

- Nasce a escola dos Glosadores. Coordenadas:

b) Tarefa do jurista: O CIC é admitido como texto de autoridade, logo, não se engana
(pensamento dogmático). Nele está a verdade, por isso convém compreendê-lo
corretamente – comprehensio legis. Técnica da glosa, essencialmente assente em
exegese gramatical com vista ao esclarecimento, à conciliação, à distinção e à síntese
dos textos relevantes.
c) Aqui nota-se já uma intenção dogmática (processo cognitivo cujas condições e
princípios fundamentais já estão predeterminados por uma autoridade). O seu modo
de trabalho não é casuístico, de busca indutiva de soluções justas a partir dos casos
concretos, mas com eles aparece já um tipo de pensamento dogmático de solução
dedutiva a partir dos textos jurídicos romanos e canónicos que refletiria a mesma
reverência ao texto da lei que cultivarão os juristas positivistas dos séculos XIX e XX,
que, nesta medida, não teriam feito mais do que continuar a esteira aberta pelos
primeiros civilistas e canonistas medievais.
d) O texto aqui pré-existe como colectânea de decisões, já constituída e objectivada.
e) Relação entre autoridade e razão – o objectivo dos glosadores é comprovar com o
argumento da razão (lógica escolástica - dialéctica) a verdade irrefutável da
autoridade (e não a justeza da afirmação, porque para eles isso seria já ponto de
partida).
f) O modus era o tipo escolástico, o recurso à lógica aristotélica e à retórica, fossem os
problemas reais ou imaginários, a invocar textos ou opiniões de autores, conjugadas
numa communis opinio.

✓ Resultado:
a) Domínio do texto romano - anunciou à Europa a importância do CICivilis.
b) Treino na exploração lógica dos problemas jurídicos;
c) Jurisdicionalização da Europa, onde se substitui a imposição de uma força e de
costumes irracionais só por si, procurando-se antes a justificação pelo Direito. Este
factor será essencial no progresso da cultura na Europa, promovendo o legalismo.
d) O que se aprendia com os glosadores era um método, uma gramática jurídica e não o
direito realmente aplicável nos vários domínios.
e) Nova classe de homens cultos (além dos clérigos): os juristas. Estes intervinham na
vida pública profana: diplomacia, administração civil, administração da justiça.

✓ Críticas:
a) Regressão da razão prática e da justiça pelo culto da autoridade e do formalismo
lógico.

A Magna Glosa sobre o CIC de Acúrsio viria a adquirir um prestígio extraordinário, procurando
satisfazer exigências de certeza do direito. Gradualmente é dada prioridade ao estudo da Glosa sobre
o dos próprios textos justinianos e tornou-se muito forte a fidelidade à glosa, manifestada no brocado
Quod non adgnovit glossa, non adgnoscit curia – o que não reconhecido pela glosa, também não é
reconhecido pelo tribunal. Os magistrados, temendo cometer algum erro, seguiam à risca a glosa,
esquecendo até os textos originais. Inclusivamente, começaram a fazer-se glosas sobre as glosas já
existentes, sem passarem pelo texto original.

Pensa-se que terá começado aqui a consciência da doutrina como fonte de direito. “[A Magna
Glosa] salva tudo aquilo que nela se inclui e faz cair no esquecimento tudo aquilo que dela fica
excluído”. Foi aqui que a Escola dos Glosadores estagnou, chegando ao seu fim e deixando espaço ao
aparecimento de uma nova escola – a dos comentadores.
Escola dos Pós-glosadores ou Comentadores (séculos XIV e XV, as suas metodologias vão dominar
até ao século XVIII)

Após a Glosa de Acúrsio, considera-se que a interpretação dos textos está definitivamente feita.
Então que espaço existe para os comentadores?

- Características:

a) Glosas sobre glosas -> progressivo desprendimento dos textos originais.

b) Objetivo dos comentadores: nova orientação metodológica ao estudar o direito


romano justinianeu: aplicação prática -> adaptar regras à sociedade medieval, sem
que os textos perdessem o seu carácter de autoridade – extensio legis [ Interpretativos
comentários de natureza construtiva de forma a dar resposta aos problemas sociais
que vinham aparecendo, no sentido de extrair um sentido normativo (intenção e
ratio), indo além da mera letra.], a exprimir a ratio naturalis/ius naturalis.

c) Maior conhecimento da obra aristotélica, veiculada por S. Tomás de Aquino, no século


XIII – maior uso da dialéctica. A interpretatio já não é tão literal e gramatical, mas mais
criativa e construtiva.

d) Utilização dos métodos da escolástica: ampliationes, limitationes, distinções e sub-


distinções, divisões e sub-divisões, comparação das instituições jurídicas, oposições,
regras e excepções, etc. tudo isto era presidido por um espírito sistemático,
empenhado em encontrar a harmonia lógica e racional do todo coerente que é o
direito.

e) Juristas assumem-se cada vez mais como uma autoridade, gerando-se uma nova fonte
de direito -> argumento de autoridade -> doutrina da comum opinião dos doutores.

Instrumentos do saber e ação humana – auctoritas e ratio. Há uma ligação essencial aos textos, que
não foi perdida, mas acentuada ao longo da Idade Média. Interpretação torna-se mais artificiosa e
imponente, para dar resposta às necessidades práticas...

Pensa-se o direito como lex (os legistas). A estrutura dogmática do direito europeu nasce na Idade
Média.

O direito passa a ser entendido como uma normatividade que se retira de fontes textuais, como
lex; o seu pensamento jurídico é essencialmente hermenêutico do ponto de vista epistemológico, e
lógico-dialéctico na metódica, que haveria de marcar (hermenêutica e dogmática) a ciência jurídica
europeia até ao presente.
PENSAMENTO JURÍDICO MODERNO [15]

- filosofia prática, embora comece já a tomar contornos que vão facilitar a sua transição para
o positivismo jurídico, já no século XIX –> Direito como ciência.
- Primeiro impulso: humanismo – autonomia do homem: a sua plena realização temporal e
como fundamentos únicos, a razão e a experiência, mas vista numa razão fundamentada nos
seus próprios axiomas e não transcendente ou “natural”. A natureza do homem! O direito
natural, mudado agora, assumia-se como princípio e modelo da interpretação segundo a
recta razão. Uma nova antropologia: o homem não aparece mais como uma obra divina,
eterna e desenhada à semelhança de Deus, mas como um ser natural, como elemento de um
mundo apreensível através de leis naturais, a desenvolver à natureza da sociedade, do direito,
do estado – também para estes haverá de se formular leis com a imutabilidade das deduções
matemáticas.

- Racionalismo setecentista –> versão jurídica: jusracionalismo.


- Os comentadores mantiveram a sua influência até às codificações resultantes do
Jusracionalismo, mas não sem oposição, pelo menos a partir do século XV.

a) Nova experiência direta da antiguidade:


o Regresso às fontes originárias – mera substituição das autoridades medievais pelas da
antiguidade.
o Exaltação do realismo idealista de Platão
o Sistema em vez de interpretatio
o Razão e experiência (em vez de autoridade e razão) – alteração do conceito de razão:
deixa de ser material e judicativa, para ser auto-fundamentada nos seus axiomas e
desenvolvimentos dedutivos. A razão como critério de validade científica.
o A partir do momento em que o direito se desvinculou das ligações ao sagrado, o
modelo da comunidade jurídica era convictamente concebido por leis, válidas para
todos os homens.

Racionalismo – a razão setecentista

- Racionalismo: atitude espiritual que se traduz num abuso ou excesso de confiança na razão,
considerando-se que:

o Tudo o que é real é inteligível, ou seja, a razão consegue compreender tudo o que
existe;
o Não há conhecimento para além da razão, ou seja, exclui-se do conhecimento (e
também da ordem moral e religiosa) tudo o que, por definição, lhe é superior (supra-
racional) ou estranho (irracional).

- Crença generalizada de que a razão é infalível –> divinização da razão.

Delimitam-se os critérios do Direito natural de outros fundamentos que outrora o contaminaram:


metafísicos, religiosos, morais:
✓ Laicização do Direito Natural: passagem de um jusnaturalismo ontológico para um
jusnaturalismo deontológico. A universalidade do Direito Natural – alteração na conceção da
razão.

✓ Fonte de Direito Natural = natureza racional do homem.


✓ Jurisprudência:
o Dispensa-se a autoridade e a tradição –> razão e experiência.
o Abandona-se a interpretatio através de comentários a textos isolados, com carácter
tópico. Critica-se nos antigos:
▪ Falta de rigor na definição do objecto de estudo;
▪ Referência a elementos supra-racionais e irracionais que não permitem
delimitar racionalmente o seu objecto de estudo;
▪ Falta de resultados universais;
▪ Arbitrariedade.
o Pretende-se fazer a demonstração lógica de um sistema fechado. Pela razão chega-se
a verdades absolutas, das quais se deduzem outras verdades absolutas universais =
sistemas.
o No jusracionalismo, os métodos das novas ciências da natureza estendem-se à ética
social.

Ou seja, estes métodos olham para o ser humano, enquanto ser social, como objecto de observação
e de conhecimento, liberto de pressupostos. Assim, o objectivo é encontrar as leis naturais que
regem os homens e que serão as leis da sociedade: objetivo do pensamento jurídico –> construção
de sistemas de direito natural; deste modo, descobre-se um sistema de Direito Natural (=leis naturais
da sociedade) que se vai dualizar perante o sistema de Direito Positivo:

✓ Direito natural deixa de ser visto como a fundamentação do direito positivo, intimamente
relacionado com as validades axiológicas comunitárias, para passar a ser a interpretação
segundo a recta razão, ou seja, a regra expressa ditada pela recta razão, em tratamento
analítico-dedutivo.

✓ Deus deixa de ser o verdadeiro fundamento do Direito –> há uma nova configuração do
direito natural. A verdadeira fonte de toda a moral e de todo o direito radica na natureza
racional do homem (e não noutros fundamentos, como Deus). Essa natureza é o logos que é
apreensível pela razão, comum a todos os homens, e que vai ordenar toda a actividade social.

✓ Atitude metódica:
o Razão não é serva da revelação;
o Razão é fonte autónoma de conhecimento do justo;
o Princípios de direito natural internos ao ser humano (≠reflexo de lei natural);
o Construção de sistemas completos e imutáveis de direito natural –> prenuncia já o
movimento de codificação na Europa –> fruto do Jusracionalismo.
o O sistema jurídico “normatiza-se”, através de regras a prescrever ou prescritas,
fundadas lógico-dedutivamente: de um sistema axiológico para um sistema de
regulamentação.

Um programa político-jurídico e não mais axiológico, a ser cumprido numa legislação sistemática,
numa codificação, num sistema de regulamentação.
Não já um conjunto de decisões prudenciais, não já um sistema de critérios dogmáticos e exegéticos,
mas antes um sistema lógico de normas a prescrever ou já prescritas – uma perspetiva normativista
do direito vence-se, afirmando-se plenamente.

As codificações oitocentistas

✓ Pressupostos culturais e políticos:


o Sincretismo normativo –Direito fragmentado em sistemas particulares: clero,
nobreza, povo; direito mercantil, direito local, usos, costumes, Direito Canónico,
Direito Estatal, opinião comum dos doutores, recurso ao Direito Natural… Gerava falta
de clareza que fomenta insegurança, abusos e fraudes.
o Ideias iluministas :
▪ Convicção de que pode existir um legislador universal (que dita leis válidas para
todos os tempos e lugares);
▪ Realização de um direito simples e unitário, que ultrapassasse a arbitrariedade
da história, fundado na nova ciência da legislação, que interrogando a
natureza do homem, estabeleceria quais eram as leis universais e imutáveis
que deveriam regular a conduta humana = crença iluminista de que o direito
histórico, constituído por uma selva de normas complicadas e arbitrárias, era
apenas uma espécie de direito fenoménico e que, além dele, fundado na razão
humana, existia o verdadeiro direito, cognoscível pela razão humana.

o Ideias iluministas encarnam em forças histórico-políticas, dando lugar à Revolução


Francesa:
▪ Valores da segurança, certeza, previsibilidade e separação dos poderes –>
magistrados (Montesquieu).
▪ Necessidades modernas de unificação e afirmação nacional exigem texto de
aplicação geral, que acabe com os privilégios e limitações de super-estrutura
feudal – classe no poder: burguesia.
▪ Exigência de refundar as relações entre privados sobre os princípios da
igualdade, da liberdade e da soberania individual. A burguesia, classe que
legislava, tinha aspirações e interesses no sentido de:
• Liberdade de iniciativa e de contrato;
• Segurança e certeza;
• Clara definição de direito, deveres e faculdades;
▪ Primazia da lei, enquanto manifestação do direito e da vontade geral,
nomeadamente sobre a jurisprudência e a doutrina. Exige-se a criação de um
direito civil comum a todos os cidadãos, de fácil compreensão, que unificasse
a amálgama normativa até aí existente. Se a lei é a expressão da vontade geral,
entende-se que também será expressão da vontade autêntica de cada um.
▪ Convicção iluminista de que a actuação racional dos governantes gera uma
sociedade melhor – a razão (=direito natural) leva à descoberta de um direito
justo do ponto de vista do seu conteúdo.

✓ Códigos oitocentistas como atos de transformação revolucionária:


o Intenção diferente de todas as anteriores redações de direito: visam planificar
globalmente a sociedade através de uma reordenação sistemática e inovadora da
matéria jurídica –> possível graças ao racionalismo: crença na infalibilidade da razão e
dos seus métodos para alcançar verdades absolutas, e de que a actuação racional dos
governantes ou da vontade comunitária geral criaria uma sociedade melhor. O Código
Napoleónico tinha na sua base dois princípios essenciais:
▪ Todos são iguais perante a lei;
▪ Há uma lei geral para todos.
o Complexo normativo com vocação totalizante –> passo para o Juspositivismo –
objectivo: evitar corrupção da bondade legislativa pelos advogados, juízes…
o Protesto contra os costumes e preconceitos que se opunham aos códigos, como
projetos para uma vida melhor.
o Foi por assentarem numa nova concepção que não são projectados pelos professores
de direito ou juízes, mas por filósofos e políticos da confiança dos soberanos;
o Confiança na razão gera interesse da opinião pública, que busca um direito mais justo
– os cidadãos assumem os códigos como seu património.

✓ Consequências metodológicas:
o O direito identifica-se com a lei escrita, de vocação totalizante, crente de alcançar uma
normatividade acabada, pré-determinada, não dependente de posteriores
interpretações = pouco espaço para interpretação.
o Carácter objectivo e neutral da linguagem jurídica, capaz de transmitir com clareza um
ou mais sentidos inequívocos e definitivos;
o Distinção entre a esfera política e jurídica;
o A racionalidade é imanente aos Códigos;
o Criação de regras interpretativas, tendentes a garantir a uniformidade dos resultados
interpretativos.

O JUSPOSITIVISMO DO SÉCULO XIX

Nota distintiva: jurisprudência procurar agora o seu lugar já não numa filosofia prática, mas no meio
da ciência, descartando qualquer referência a valores e à dimensão prática do Direito, ou seja, ao
momento da sua aplicação.

Contexto cultural – o positivismo como corrente filosófica

✓ Positivismo Científico domina espírito cultural do século XIX;


✓ Corrente filosófica originada em França, que teve a sua formulação mais precisa na obra de
Comte e significava o verdadeiro espírito científico, nesta época de novos despertares e
grandes progressos das ciências naturais exactas e suas consequências técnicas e industriais.
✓ Comte considerava o positivismo como o último de três estádios:
o Estádio teológico: os fenómenos naturais explicam-se a partir da vontade
sobrenatural e divina;
o Estádio metafísico: os fenómenos são explicados a partir de forças abstractas;
o Estádio positivo: há investigação das leis efectivas dos fenómenos, das suas relações
constantes de sucessão e semelhança
✓ Recusa da metafísica –> reduz-se a uma sistematização das ciências.
✓ A sociologia é a ciência suprema, porque vai ser aquela que vai permitir conhecer as leis que
regem a Humanidade.
✓ Relevância do método para a afirmação das ciências:
o Serve de modelo de actividade de um certo domínio cultural;
o É condição e critério de validade das produções desse mesmo domínio;

Contexto político – A emergência do Estado Moderno-

Sociedade Medieval Sociedade Moderna

Organização Pluralista Monista

Origem do Dto Sociedade civil – cada agrupamento Estado – concentra em si todos os


social tinha o seu Dto –> Dto. poderes, desde logo o de criar Dto,
consuetudinário. quer directamente (lei), quer
indirectamente (fontes) =>
«processo de monopolização da
produção jurídica por parte do
Estado».

Posição do juiz Juiz como livre órgão da sociedade Juiz como órgão do Estado –> juiz é
quanto à –> Juiz não está obrigado a escolher titular de um dos poderes estatais e
formação do Dto as normas emanadas pelo Estado, está subordinado ao poder
mas tem certa liberdade de escolha legislativo. O direito positivo é o
na norma a aplicar: costume, direito posto e aprovado pelo
doutrina, equidade… todas estão ao Estado –> é o único e verdadeiro
mesmo nível. O juiz escolhe a que se direito.
adapta melhor ao caso.

Expressão metódica da conceção positivista de Direito

✓ Direito também se quer afirmar como ciência –> juristas dedicam-se à procura do método,
pois ele é que vai elevar a Jurisprudência à categoria de ciência.
✓ Diferença radical em relação ao método jurídico romano e medieval:
o Conceito descritivo de MJ: métodos identificam-se com a prática do pensamento
jurídico; é pela análise, pela descrição da prática que se chega ao método.
o Conceito normativo de MJ: há uma construção doutrinal que visa prescrever, prévia
e autonomamente, o modelo e o processo que o pensamento jurídico deve cumprir
para actuar correctamente.

Em que consiste esse método?

✓ Pressupostos
o Funções do jurídico: segurança das expectativas + igualdade de tratamento.
o Não podemos compreender o positivismo jurídico do século XIX sem referência a duas
escolas fundamentais deste século – Escola da Exegese e a Escola Histórica – que,
apesar de diferirem muito nos seus pressupostos, partem de um ponto comum: o
direito é um pressuposto. A forma como se chega à conclusão de que o Direito é um
pressuposto é diferente nestas duas escolas:

Escola da Exegese Escola Histórica do Direito

Escola de civilistas, profundamente Direito manifesta-se na História: é um


arreigada ao Código Napoleónico elemento cultural, como a língua ou a arte
de um Povo;

Representativa do legalismo contratualista O direito é criação do Volksgeist (espírito


dominante do Povo).

O direito é o direito positivado pelo O direito não é fruto da vontade um Estado


legislador nas leis e, sobretudo, nos ou legislador, mas do espírito do Povo.
Códigos – é ao Estado moderno
centralizado que cabe criar direito na
observância da separação de poderes!

Mas a consequência é a mesma: se o direito já está criado, já está posto, e se essa positivação não
passa pelo jurista enquanto tal, então a tarefa do jurista já não é a de contribuir para essa criação,
mas sim a de conhecer o Direito que já está constituído.

Relegam-se as considerações de tipo material e axiológico para o momento da criação do Direito e


exclui-se essa tarefa da ciência jurídica, cujo pensamento jurídico fica reduzido a um pensamento
meramente formal, autónomo em relação ao momento prático-material do Direito.

Tarefa do jurista –> perceber quais as relações entre os conceitos de direito, através de um processo
de lógica formal.

✓ Coordenadas
o Redução do jurídico a estruturas e categorias formais;
o Elaboram-se dogmaticamente conceitos e institutos jurídicos de índole abstracto-
formal, para construir um sistema unitário e fechado;
o Este sistema não deve ter contradições, nem lacunas -> tarefa de interpretação do
jurista fica reduzida a uma interpretação filológico-analítica;
o Pensamento jurídico de tipo lógico-formal e dedutivo: a norma funciona como
premissa e a solução como a conclusão, ou seja, autonomiza-se o momento da criação
e o momento da aplicação do direito.
o A validade dos juízos jurídicos não se afere por referências axiológicas ou intenções
práticas, mas pela coerência sistemática, ou seja, a conclusão a que o jurista chega
tem de se enquadrar de forma lógica no sistema que entretanto foi construído. Cada
conceito tem que estar encadeado e a solução tem de ser reconduzível à norma.
– ESCOLA DA EXEGESE

✓ Expoentes da EE: Alexandre Duranton, Charles Aubry e Frédéric Charles Rau, Jean Demolombe,
Troplong.
✓ Foi nesta escola que o legalismo da codificação pós-revolucionária, ou seja, o legalismo que se
estabeleceu após a Revolução Francesa e que se exprimiu, de forma excecional, no Code Civil,
onde encontrou a sua expressão doutrinária e metodológica;
✓ Pressões exercidas pelo regime napoleónico sobre as ED para que fosse ensinado apenas o
Direito Positivo. Há um desprezo pela filosofia e pela história. Bugnet: “Eu não conheço Direito
Civil, eu só ensino o Código de Napoleão”.
✓ Códigos oitocentistas –> produto do Jusracionalismo. Eram o produto de uma crença ilimitada
na razão humana, a quem se concedia a capacidade de descobrir e plasmar em obras unificadas
– os códigos – todas as leis humanas, que fossem justas. É claro que o princípio jusracionalista
admitia que essa razão se fosse descobrindo e adaptando às novas situações históricas que
surgissem. Disso mesmo nos dá conta Portalis no discours préliminaire ao Code Civil –> diferença
entre intenção dos redactores e intenção dos intérpretes. São os intérpretes do Código Civil que
vão formar a EE – são eles que adoptam de forma absoluta o princípio da omnipotência do
legislador, que é um dos dogmas do positivismo jurídico.

Contexto cultural - pressupostos:

✓ Ideia de Estado Moderno;


✓ Pressuposto filosófico-jurídico –> jusnaturalismo moderno-iluminista: direito = são as leis
fundadas no direito natural-racional deduzido de axiomas socialmente antropológicos – é
possível atingir-se a razão;
✓ Pressuposto político-juridico –> legalismo demoliberal:
o Origem ideológica no contratualismo iluminista – Rousseau e a vontade geral: apesar de
a burguesia nunca adoptar o pensamento democrático de Rousseau, vai aproveitar o
prestígio da sua ideia de que a lei estatal é expressão da vontade geral;
o O direito são as leis politicamente legitimadas:
▪ Num Estado de assembleia legislativa;
▪ Num estrito princípio de separação de poderes;
✓ Pressuposto cultural –> codificação pós revolucionária:
o A forma jurídico-positiva da racionalidade essencial das leis é o Código:
▪ Convicção de que pode existir um legislador universal (= válido para todos os
tempos e lugares);
▪ Exigência de um direito simples e unitário, que dissolvesse a pluralidade de
ordenamentos jurídicos franceses;
o O código não é uma mera colectânea de leis, mas um corpo legislativo, que se propõe, de
modo racional, sistemático e unitário, a regulamentação total e exclusiva, e mesmo
idealmente definitiva, de um certo domínio jurídico.
o O Code Civil era diferente dos códigos setecentistas e de inspiração não revolucionária,
porque, nascido da Revolução, era tido como expressão acabada da razão jurídica +
nasceu no Estado que é berço do iluminismo (França) e foi alimentado pelas ideias
iluministas + teve grande influência na elaboração de outros códigos europeus.
▪ Recusa da história
▪ Racionalidade axiomática
▪ Crença na sua autossuficiência (artigo 4.º Code Civil)

Postulados capitais:
1. Identificação do Direito com a Lei: este é um pressuposto que nos abre para uma questão mais
profunda -> pressuposto fácil de explicar, porque contende com a questão das fontes do Direito –>
a lei, ou seja, as normas gerais emanadas pelo Estado, é a única fonte de Direito.
Busílis da questão -> bivalência da expressão “lei”.

Expressão do direito-razão natural Prescrição legislativo-estatal

Jusnaturalismo Estatismo jurídico

Adesão à noção metafísica do direito, como o Aceitação da doutrina estatista da


fizeram os redactores do Código omnipotência do legislador

Trata-se de uma contradição? Num certo sentido sim, mas existe em toda esta concepção uma última ideia
que permite conciliar esta bivalência: a conformidade da lei positiva à justiça é um pressuposto adquirido:

Legislador = intérprete racional da vontade geral, vontade essa que resulta do contrato social, pelo qual os
cidadãos limitam a sua liberdade, delegando-a no Estado, então a lei, expressão do pensamento do
legislador, é também ela conforme às aspirações de cada um –> princípio da omnipotência do legislador.
Isto é um pressuposto adquirido: a lei positiva é conforme à justiça – inversão das relações tradicionais
entre DN e DP: em lugar de mensurar a validade do DP com base na sua conformidade com o natural, afirma
que o DN é tanto mais relevante quanto seja consagrado pelo DP.

Em suma, mais tarde, este postulado da Escola da Exegese, de uma identificação do Direito com a Lei, vai
passar a ser entendido apenas no sentido da lei como prescrição do Estado, portanto, prevalece a conceção
estatista –> mentalidade dos juristas é de respeito pela autoridade do legislador, facilmente conhecida na
lei. Portanto, há um culto ao texto da lei – o intérprete deve ser rigorosamente subordinado às disposições
do Código.

2. Exclusividade da Lei como critério jurídico: só o conteúdo normativo da Lei contém os critérios dos
juízos jurídicos decisórios. Não se confunde com o anterior, pois poder-se-ia defender que o Direito
é apenas a Lei, mas considerar que a interpretação do Direito ou a aplicação do Direito exige o
recurso a critérios normativos complementares.
Crítica: este é um pensamento a-histórico do histórico, porque não atende a qualquer validade de
critérios que se encontrem fora da lei, ainda que eles decorram das necessidades concretas da
sociedade.

3. Postulado da suficiência da Lei: exclusão de lacunas. Esta concepção de Direito fomenta a criação de
um sistema completo e fechado. É diferente do critério anterior, porque o facto de se decidir com
base apenas em critérios legais não significa que se considere que todos os casos estão previstos pela
lei. Assim, o juiz é obrigado a decidir ele próprio em todos os casos, mas sem lhe ser reconhecida
uma tarefa criativa. Mas como? É aqui que entra a questão do método, que nunca poderá ser outro
que não aquele que dá nome à Escola – o de uma estrita exegética.

Metodologia

1. Incondicional fidelidade aos textos da lei


2. Interpretação:
• Com objetivo hermenêutico subjetivo-histórico:
i. Elemento filológico-gramatical: a letra da lei, mas não assume um valor autónomo
(como com o objectivismo interpretativo); o trabalho do jurista é declaratório, porque
a evolução do direito só se pode dar por via legislativa, nunca jurisprudencial, no
sistema legal está implícito algo que cabe ao intérprete tornar explícito!
ii. Em caso de dúvidas:
1. Vontade real: elemento da vontade do legislador histórico – subjectivismo
histórico. Como? Trabalhos preparatórios. Não se entendia aqui a vontade sem
mais, mas uma vontade racional, daí serem admitidos argumentos como a
maiori ad minus, a contrario… quanto mais a vida económica se desenvolviam
mais se aprofundavam os abismos entre a lei e a realidade, portanto, era cada
vez mais necessário recorrer a esta intenção presumida…
2. Vontade presumida: interpretação lógica, por se admitir o espírito da lei, que
se ia buscar à racionalidade do sistema, que visa a imanente vontade do
legislador.

• Com uma metodologia dedutivo-formal: a interpretação deveria explicar as proposições


textuais no contexto do sistema, formando categorias às quais possam ser reconduzidas as
situações da vida. Tudo isto sem atender a valores, nem à finalidade das normas, ou seja, ao
objectivo prático que elas possam querer atingir…

3. Recusa da demanda – então o que acontecia aos casos que não estavam previstos na lei? Já sabemos
que o juiz não pode denegar a justiça, ou seja, ele não pode deixar de julgar e de dar uma solução ao
caso… A não ser que considere que esse caso não é jurídico, ou seja, que não deve cair na alçada do
Direito. Ora, se o próprio Código considera que existem em si todas as soluções jurídicas e se
aparece um caso cuja solução não está no Código, então a conclusão lógica é que o problema
colocado perante o tribunal não é um problema jurídico… portanto, a solução é a recusa da
demanda.

diferença entre o pensamento tópico e o pensamento sistemático.


4. Esquema de aplicação concreta da lei de tipo lógico-dedutivo – o silogismo judiciário: o que nos leva
para o problema da forma como se transformam os problemas, ou seja, ao raciocínio que nos permite
pegar num problema e “encaixá-lo” nos conceitos do sistema. A forma que essa tarefa vai adoptar é
a do silogismo judiciário.

Estrutura do silogismo:

1. Premissa maior = antecedente de maior generalidade


2. Premissa menor = antecedente de menos extensão
3. Conclusão/síntese = articulação entre premissas

Dois grandes tipos de silogismo:

a) Dialéctico: as premissas são verosímeis, referindo-se ao possível, no âmbito do opinável;


b) Científico: as premissas são apodícticas, ou seja, absolutas, sem refutação possível. Exige-se
demonstração.

Então, o que vamos ter na EE é a apologia do silogismo judiciário, que seria a forma de raciocínio a adoptar
pelo juiz ao decidir o caso sub iudice. De facto, por muito que a EE identificasse o direito com a lei, a verdade
é que nem ela poderia negar que as proposições jurídicas, ou seja, as regras de direito existem para serem
aplicadas. A forma de aplicação da norma jurídica será então a do silogismo judiciário. Este silogismo, na
verdade, vai ser composto por duas operações lógicas, ou seja, por dois raciocínios:

a) Silogismo de determinação da consequência: a norma legal interpretada é a premissa maior de um


silogismo em que os factos (o caso decidendo) seriam a premissa menor e com elas se obteria a
decisão como conclusão! Para saber que consequência jurídica vigora para uma situação de facto ter-
se-ia que examinar se esta situação de facto é de subordinar, como caso, a uma determinada previsão
legal.

P –> C (para todo o caso de P vale a consequência C)

S = P1 (S é um caso de P)

S –> C (Para S, vigora C)

Esta é a forma simples, porque podemos ter variantes:

• Pode acontecer que a mesma situação da vida realiza as previsões de diferentes proposições
jurídicas, que são aplicáveis conjuntamente.
• Pode acontecer que a situação da vida, tendo todas as notas características de uma previsão legal,
ainda tenha mais alguma que vai excluir a aplicação dessa previsão legal para ser aplicada uma outra
previsão legal de uma norma especial ou excepcional.

Problema 1: obtenção de premissas, nomeadamente da premissa menor através de um processo silogístico.


Isto normalmente faz-se pelo chamado:

b) Silogismo de subsunção: a qualificação jurídico-conceitual dos factos para os subsumir às categorias


dogmático-legais.

Na lógica, diz-se que um silogismo de subsunção é aquele que ocorre de modo a que «os conceitos de menor
extensão se subordinem aos de maior extensão». Portanto, trabalha-se com conceitos. Ex: mesa.

Mas no silogismo nós não vamos subsumir conceitos a conceitos, mas uma situação da vida, ou seja, factos,
a um enunciado legal.

Ora, na verdade, esta afirmação também não é correcta, porque não vamos subsumir factos, mas sim
enunciados sobre uma situação de facto.

Para se poder produzir este enunciado, há que haver um julgamento da situação de facto enunciada, quer
dizer, o fenómeno da vida, em relação à presença das notas características respectivas –> este processo de
julgamento é o ponto fulcral da problemática da aplicação da lei.

A verdade é que a linguagem da lei e a linguagem das pessoas que contribuem para a formação do enunciado
da situação de facto não coincidem. É, por isso, necessário que o juiz faça aqui o papel de um tradutor,
daquilo que é a linguagem comum para a previsão legal. Ora, isto não se pode fazer através de múltiplos
processos de subsunção, porque a linguagem comum não corresponde a conceitos que se possam subsumir,
desde logo, à previsão legal. São necessários ainda outros juízos elementares, baseados na percepção ou na

1
O símbolo = é inadequado. Não é possível transpor a distância entre a situação geral que é enunciada (P) e a situação de facto
(S). Esta sempre vai apresentar outras notas, características da sua particularidade, para além daquelas que nos permitem
identificá-la com P.
experiência. Por isso não se pode dizer que a premissa menor é apenas de subsunção. Ao fazê-lo esquecemos
a parte do julgamento que permite obter a premissa menor.

Problema 2: o esquema de subsunção pressupõe que a premissa maior é definida segundo várias notas que
têm de estar presentes no seu conceito. Só que essa pressuposição é errada, porque nem sempre isso
acontece, nomeadamente quando nos encontramos perante «pautas de valoração carecidas de
preenchimento» (Larenz). Aqui não existe um processo de subsunção, mas de coordenação valorativa. Em
vez do juízo que diz que as notas distintivas existentes em P também existem em S, existe um juízo que diz
que S se equipara ou aproxima de a uma outra situação em todos os aspectos decisivos do julgamento, e
que deverá julgar-se, sem dúvida alguma, do mesmo modo. Ex: Este carro é vermelho –> “vermelho” não
pode ser definido – é um juízo assente na percepção. Percepção de quê? De que o objecto observado – o
carro – é da mesma cor que outro objectos que ele aprendeu a considerar vermelhos.

Problema 3: a conclusão do silogismo é muitas vezes insuficiente para determinar a consequência jurídica
no caso particular. C na premissa maior não é igual a C na conclusão. Ex: determinação de uma pena – é
preciso considerar critérios de medida da pena.

Juízo crítico

✓ Esta escola não pôde sobreviver muito tempo, porque a legislação rapidamente se mostrou estanque
e inadequada à resolução dos novos problemas que se suscitavam:
o Sociedade industrial
o Estado de compromisso social
✓ A doutrina analisa textos, mas não contribui para a evolução do direito, deixando de exercer a sua
vocação. Não reflecte sobre o conceito de Direito, porque assume que o Direito é a Lei. Isto imobiliza
o direito e impede qualquer nova ideia.
✓ Em relação ao raciocínio, mostrava-se muito difícil permanecer com a utilização excessiva de lógica
dedutiva, porque não se pode inferir como absoluta uma lei ou uma situação social se o homem e a
sociedade estão em constante transformação –> cria abismos entre os Códigos e a vida social e
económica. É um método muito pobre.
✓ Falta de sistema e de visão de conjunto – não se dá relevo a outras fontes de direito, quer formais
quer materiais –> prescinde de concepções sociológicas, morais, espirituais ou económicas…
inadaptabilidade a novas realidades sociais.
✓ Os códigos estavam a ser ultrapassados pela História e mostravam-se cada vez mais lacunosos, pelo
que foi necessário:
o Reconhecimento da distinção entre direito e lei;
o Integração;
o Recurso a uma normatividade extra-legal: o direito compreende-se não apenas como um
estatuto dogmático-formal, mas como uma intenção prática de uma racionalidade também
prática (prático-normativa) em que concorrem coordenadas axiológicas, políticas e
sociológicas.
o Reconhecimento da jurisprudência como criadora de direito na história.

A ESCOLA HISTÓRICA DO DIREITO

✓ Expressão particular, no âmbito do pensamento jurídico, do vasto movimento cultural alemão surgido
na última parte do século XVIII e inícios do século XIX e que atingiu todos os domínios culturais (filosofia,
arte, ciência, história, filologia, direito…): o historicismo.
✓ Contexto cultural:
1. Romantismo alemão
2. Historicismo

✓ Postulado Fundamental: o direito como uma normativa realidade histórico-cultural que se manifesta na
vida historicamente real de um «povo», de uma concreta comunidade nacional, e como expressão
sociocultural do espírito desse povo e da sua espiritual consciência comunitária.
Consequência: o direito como uma entidade cultural de raiz histórica. Como é conhecido? Através de
uma elaboração científica chamada á sua explicitação e determinação sistemáticas.

✓ Coordenadas fundamentais:

1. Crítica do jusracionalismo iluminista:

a) Do Direito Natural: não existe um direito único, igual para todos os tempos e lugares. O
direito não é produto da razão e não pode ser elaborado a priori um sistema jurídico ideal
(Burke). Nega-se a existência de um Direito Natural fruto da razão e de princípios jurídicos
naturais de validade universal, embora se possa admitir um postulado de justiça que
integre o Volksgeist, ou seja, tem também ele de ter um valor histórico. O direito é um
fenómeno social, vivo no espaço e no tempo, ou seja, é um produto da História.

b) Da codificação – Debate Thibaut vs. Savigny – oposição de Savigny à codificação –


opúsculo «Da vocação do nosso tempo para a legislação e a jurisprudência». Savigny
declara não ser em princípio contrário à codificação, mas constrói o seu pensamento de
tal forma que esta seria sempre indesejável em qualquer circunstância:
• Época primitiva –> direito em formação (direito popular) –> codificação bloqueia
o processo de desenvolvimento e organização do Direito.
• Época da maturidade –> juristas laicos –> codificação é possível, mas não é
oportuna nem necessária, porque o direito é sobretudo direito científico.
• Época de declínio –> direito legislativo –> codificação é perigosa, porque perpetua
um direito decadente.
Segundo Savigny a Alemanha encontrava-se numa fase de declínio, sendo necessário
promover o renascimento e o desenvolvimento do Direito Científico, isto é, a elaboração
do Direito pela Ciência Jurídica.

c) Da omnipotência do legislador – o Direito nasce como costume, expressão imediata da


consciência jurídica popular. A unificação nacional deve-se atingir pela unidade espiritual
do Povo, em virtude da História e mediante uma organização progressiva da Ciência do
Direito, comum a toda a nação. A lei tem assim uma função subsidiária, enquanto
eventual exteriorização e garantia do costume.

d) Da natureza volitivo-racionalista do Direito: sentido irracional da História.

2. Tese da natureza histórica do Direito (não volitivo-racionalista): reconhecer a historicidade


como princípio ou categoria verdadeiramente constitutivos –> o Homem não apenas tem uma
história mas é uma história. O passado não tem apenas valor pedagógico, mas um valor
ontológico.

3. Intenção de cientificidade – o Direito como pressuposto: é um corolário da anterior. O direito já


existe nas específicas objectivações culturais em que existe. Só assim pode ser objecto de
conhecimento (e não objectivo de uma normativa imposição). O pensamento jurídico dirige-se-
lhe numa intenção de ciência e não de especulação ou criação. O pensamento jurídico deveria
ser «ciência do direito». Aqui aparece ao lado de uma intenção história uma intenção de
cientificidade da EHD.
Onde é que ele aparece como dado? No direito consuetudinário. Limita-se assim a legislação a
um mero complemento e garantia do costume: determina o direito consuetudinário quando ele
se demonstra indeterminado, supre as suas lacunas, colabora no seu desenvolvimento
progressivo. Assim sendo, torna-se necessária uma elaboração determinante do direito originário
– essa função cabe aos juristas (quando o direito se aperfeiçoa toma uma direcção científica):

«Segundo os seus princípios, o direito continua a viver na consciência comum do povo, mas a sua
elaboração rigorosa e a sua aplicação concreta é a função específica da classe dos juristas»
(Savigny, System, 45).

A EHD atribui aos juristas a representação autêntica da consciência jurídica da comunidade.


Assim, a ciência do direito acaba por surgir como a decisiva fonte da determinação e produção
do Direito, porque cabe aos juristas, como representantes da nação, recompor o direito
consuetudinário e completar a sua unidade, traduzindo-o de uma forma lógica, como técnicos
do direito. O pensamento jurídico é ciência do direito –> ao lado da intenção histórica há uma
intenção de cientificidade.

4. Resultado paradoxal de exaltação do elemento científico-sistemático (ou recuperação de um


sistemático racionalismo normativo): recuperação de um sistemático racionalismo normativo, e
em termos justamente de se ter já reconhecido na escola histórica uma indesmentível herança
jusnaturalística, que sacrificava e acabou mesmo por expulsar a dimensão histórica. O cerne da
EHD é a reconstituição de uma CJ consciente dos seus próprios métodos e sistemática. Isto advém
de um processo de mutação interna da própria Ciência Jurídica, ao mesmo tempo positiva
(=autónoma) e sistemático-metódica. De facto, o que Savigny vai fazer é esboçar um programa
de ligação de uma elaboração histórica da ciência legislativa com uma outra de carácter
sistemático:
• Elaboração histórica: averiguação da matéria jurídica, a qual é necessariamente pré-
estabelecida pela história;
• Elaboração sistemática: organização da matéria jurídica num sistema interno, que não é
um agregado de n. j., mas manifesta a coerência espiritual de toda a matéria.

O problema era o conceito que Savigny tinha de sistema – que vinha de Kant – como uma unidade
racional de carácter formal-estrutural e não teleológico-material: «as relações jurídicas são,
segundo a sua natureza, alheias a um fim, têm uma existência em si, independente do reino dos
fins» -> exclui, na sua formal racionalidade, o relativo-material essencialmente histórico. Resulta
assim que a dimensão científico-sistemática não converge com a dimensão histórica – são uma
dualidade não integrada.

Sendo necessário optar, a EHD optou pelo sistemático em prejuízo do histórico. Isto sobretudo
porque a “dimensão histórica” não se afirmava numa real investigação histórica, mas justificava
apenas a utilização de materiais históricos; não era a procura do direito histórico-social ou da
comunidade real como história, era a mobilização de textos históricos do direito ou sobre o
direito. O que Savigny fez foi por a investigação histórica ao serviço da dogmática.

Por isso houve uma grande preocupação de Savigny em definir uma teoria da interpretação
jurídica, enquanto elemento metodológico essencial da tarefa do jurista. A ele se devem muitos
avanços neste campo e foi este um grande legado deste jurista.
• 1ª fase de Savigny: escritos da juventude – a fase legalista

Nas suas lições de Inverno de 1802, o jovem Savigny advoga já que a Ciência Jurídica deve ser
simultaneamente e integralmente uma ciência histórica e filosófica. Para Savigny, a filosofia é entendida
como a unidade que subjaz ao sistema e, portanto, aqui muito mais próximo do conceito “sistemático” do
que de qualquer outro que possamos ter de filosofia, muito menos o de uma proximidade com princípios
jusnaturalistas. Trata-se da orientação da Ciência Jurídica no sentido de uma unidade imanente pressuposta
pela própria Ciência Jurídica.

Há portanto, já aqui, uma separação entre a teoria filosófica do Direito e um elemento sistemático da ciência
(positiva) do Direito, que pode ser estudada tanto com referência àquela teoria filosófica do Direito como
sem ela.

Na primeira fase, Savigny equipara o Direito positivo ao Direito legislado. Mas a legislação acontece no
tempo e, sendo uma actividade do Estado, então a história do Direito conjuga-se com a história do Estado e
a história dos povos.

Savigny distingue elaboração interpretativa, histórica e sistemática do Direito. O objecto da interpretação é


a reconstrução do pensamento que é expresso na lei, na medida em que seja cognoscível a partir da lei. Para
tal convoca três elementos: lógico, gramatical e histórico. Cada um deles serve de base a uma especial
elaboração da CJ:

• Elaboração histórica: deve tomar o sistema no seu todo e pensá-lo como algo progressivo, i.e., como
história do sistema da jurisprudência no seu conjunto.
• Elaboração sistemática: deve olhar o múltiplo na sua articulação, interessando-lhe:
o O desenvolvimento de conceitos
o A exposição de regras jurídicas segundo o seu “nexo interno”
o O preenchimento de lacunas da lei por analogia

→ Há uma rejeição da interpretação extensiva e restritiva, entendida como resultado de uma


interpretação teleológica. Entendia Savigny que o fim não faz parte do conteúdo da norma. O juiz
deve atender não ao que o legislador busca atingir, mas só ao que a realidade preceituou. O juiz não
tem que aperfeiçoar a lei, de modo criador, mas deve apenas executá-la. A regra esclarece.

→ Admite a analogia, porque pela analogia nada se acrescenta à lei. Para ele analogia é descobrir na
lei, quando haja um caso omisso, uma regra especial que proveja a um caso semelhante e reduzi-la
a uma “regra superior” que decidirá então do caso não regulado. É a legislação por si própria que se
complementa. No fundo, pressupõe que a regra especial estatuída na lei pode ser vista como
expressão de uma regra geral não estatuída nessa lei, mas nela contida segundo o seu espírito/regra
superior contida na norma (concepção do jusnaturalismo tardio, não propriamente explicada).

• 2ª fase de Savigny: o amadurecimento

Savigny passa a considerar a fonte originária do Direito não a lei, mas o espírito do Povo (=comum convicção
jurídica do Povo). Nota: aconteceu pela primeira vez na “Vom Beruf unserer Zeit…”. Este espírito do povo
não corresponde a uma dedução lógica, mas a um sentimento e intuição imediatos:

• Não podem ser referidos a uma norma (produto do pensamento racional, geral e abstracto);
• Têm por objecto as concretas e típicas formas de conduta que, pela consciência da sua necessidade
intrínseca são observadas pelo conjunto dos cidadãos = relações da vida reconhecidas como típicas
pelo Direito (casamento, propriedade, compra e venda).
Na medida em que se pensam e organizam como uma ordem juridicamente vinculante, tais relações
constituem institutos jurídicos. Savigny passa então a considerar estes institutos a origem e o fundamento
de toda a evolução do Direito. Para Savigny eles têm uma natureza orgânica, ou seja, são um todo, pleno de
sentido e que se transforma no tempo => nunca pode ser inteiramente exposto pelo somatório das normas
que lhe dizem respeito!!

Não são as normas jurídicas que produzem os institutos jurídicos, mas é destes que aquelas se extraem,
artificialmente, por abstracção. É na intuição do instituto jurídico que as normas jurídicas encontram o seu
último fundamento. Consequências:

→ As regras não podem compreender-se por si, mas apenas pela intuição do instituto jurídico, pela qual
também se norteou o legislador; o juiz faz o caminho inverso do legislador: tem de restituir o nexo
orgânico de que a lei se mostra uma simples secção.
→ A n. j. corresponde a um único aspecto do instituto, que foi artificialmente isolado do todo,
originando um desajustamento cuja superação se impõe constantemente à CJ.
→ O PJ tem que conciliar intuição e conceito. O conceito precisa de ser constantemente alargado e
rectificado através da intuição. Esta exigência vai ser esquecida pela posterior Jurisprudência dos
Conceitos. Isso deve-se ao facto de Savigny nunca ter conseguido demonstrar como se efectua a
transição da intuição do instituto para a forma abstracta da regra jurídica e vice-versa, ou seja, desta
para a intuição originária. Larenz duvida até que tal seja possível, porque se a unidade do instituto
jurídico só se oferece na intuição, é claro que não pode ser compreensível cientificamente. O que
estrutura o sistema não é o nexo orgânico dos institutos, mas o nexo lógico dos conceitos.
→ Problema de Savigny e que levou a posterior desenvolvimento da jurisprudência dos conceitos:
considera que a apreensão dos institutos jurídicos só é possível através da intuição e não através do
pensamento conceptual, o que sucederia se ele tivesse visto no instituto jurídico um conceito geral
concreto em sentido hegeliano, o que permitiria corrigir o conceito abstracto da norma em vista do
conjunto de significação do instituto jurídico, nos casos-limite em que a norma levasse a uma
perversão de sentido.
→ Interpretação:
o Os 4 elementos da interpretação são os mesmos, mas já não se trata de quatro espécies de
interpretação, mas de quatro actividades que devem ser integradas para atingir um correcto
resultado interpretativo.
o O elemento sistemático orienta-se mais para uma ideia, para a actividade do espírito,
orientada a uma “intuição global” de que brota a regra jurídica => afastamento do legalismo
da juventude.
o Permite a utilização da “razão de ser” da lei na interpretação, embora continue a rejeitar que
integre o conteúdo da lei => por isso adverte que tem de ser usado sempre com “grande
precaução”. Admite a interpretação extensiva e restritiva para rectificar uma expressão
defeituosa.
o É por um caminho histórico que se procuram conhecer os pensamentos que o legislador ligou
à expressão imperfeita, mas também pela razão da lei (nexo interno).
o Analogia: já não consiste na remissão de cada regra especial para a regra “superior”
implicitamente contida nela, mas no regresso à intuição global do instituto jurídico
correspondente. Savigny distingue dois casos:
▪ Nova criação jurídica: novo instituto arquétipo que se forma, em afinidade com os
existentes e conhecidos.
▪ Dentro de um instituto já existente surge uma nova questão jurídica (proposições
pertencentes a esse instituto)

A ratio assenta na pressuposta coerência interna do direito, não logicamente, mas organicamente, entre
arquétipos.
✓ Legado:
1. Científico-jurídico: hermenêutica (teoria dos 4 elementos da interpretação) que culminou numa
dogmática (de carácter sistemático-institucional em Savigny e de carácter sistemático-conceitual
em Puchta).
2. Abre à Ciência Jurídica um processo que ainda não terminou – a relacionação entre o dever ser
(norma jurídica) e o ser histórico (a realidade social) – cf. Wieacker.
3. Jusnaturalista (Wieacker):
▪ Sistema pandectista: aplicado originariamente por Hugo e Heise, remonta aos discípulos
de Wolff… e, em última análise, ao sistema natural de Pufendorf;
▪ Método de construção sistemática e conceitual e dedução lógica da decisão jurídica a
partir do sistema e dos conceitos (copiado do método demonstrativo de Wolff);
▪ Princípios fundamentais da ciência pandectista (direito objetivo, direito subjetivo, negócio
jurídico, declaração de vontade, contrato bilateral, dever de prestação…).o formalismo
sistemático e conceitual foi ainda largamente utilizado por Puchta e pela jurisprudência
construtiva do jovem Ihering.
▪ Pressuposto de uma determinação ética geral para o Direito –> Savigny estava convencido
de que o direito serve a moral não porque dê execução a comandos morais, mas porque
garante a cada um o livre desenvolvimento da sua vontade individual.

A EHD conseguiu integrar a sufocante massa do ius commune num novo sistema de princípios que libertou
uma produtividade até aí insuspeitada, da inventiva jurídica e enriqueceu de forma desmedida o tesouro
das soluções jurídicas dogmáticas.

✓ Juízo crítico:

Críticas negativas:

1. Realidade histórico-social não chegou a ser cumprida por esta EHD


2. Sistematismo excessivamente teórico-académico
3. Tradicionalismo “de costas para o futuro”
4. Historicismo acrítico
5. O conceito de espírito do povo baseia-se em tendências místicas e não na verdadeira observação
dos factos

Críticas positivas:

1. Oposição a excessos racionalistas;


2. Fomenta estudos de História do Direito;
3. Desoculta o carácter social do Direito;
4. Nova concepção de Ciência Jurídica de carácter histórico e sistemático, com um método próprio;
5. Inicia a lógica jurídica e a dogmática jurídica, que se hão de aperfeiçoar em Ihering, tentando
suprir a falta de fundamentação metafísica e postergação da ordem moral.

–A EVOLUÇÃO PARA UMA JURISPRUDÊNCIA DOS CONCEITOS.

Puchta (1798-1846) foi quem conseguiu impor o formalismo conceitual rigoroso da pandectística. Puchta,
tal como Savigny, identifica três fases na vida dos povos:

• Período de inocência;
• Período de multiplicidade (=empirismo prático)

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